Maura pensou, com alívio, que o mais difícil já havia passado. Aqueles longos anos de um casamento convencional, frio e sem entusiasmo, que se limitava a um educado "Bom dia", a cada manhã, num café com torradas, que entalava na garganta, sufocada pelos longos silêncios que se alternavam com frases corriqueiras e ocasionais.
Não havia o que dizer. O que acontecera com eles. Maura não conseguia entender. Sem brigas, sem rancor, sem discussões, só aquele afastamento inexplicável, a falta de carinho, a apatia total. Até o sexo acabara, se fora distanciando, acontecendo às vezes, pela insistência de Maura, que sentindo na mecanização do ato, o cumprimento de uma obrigação, acabou desistindo. Passou a sonhar apenas, com a volta de um momento em que o marido lhe tomasse o rosto entre as mãos, suavemente, e murmurasse: Eu só queria te dizer que te amo muito, sim? — numa declaração inesperada, que poderia acontecer sem hora marcada e que seria seguida por um terno abraço, ao qual Maura corresponderia, cheia de emoção.
Se houvesse outra, teria sido mais fácil de entender. No princípio, fez perguntas e cobranças, dava indiretas, mostrava-se carente e insegura. O marido não parecia incomodar-se e nem mesmo se aborrecer com os questionamentos da esposa. Na verdade, à medida que o tempo passava, deixou até mesmo de responder, e Maura chegou à conclusão de que, por ele, não teria nenhum esclarecimento.
Apelou, então, para um detetive particular, indicado por uma amiga que, suspeitando do marido, havia comprovado a eficiente discrição do serviço. Este era um quesito fundamental, pois Maura sabia que, caso se descobrisse vigiado, o marido se sentiria alvo de uma ofensa mortal.
As investigações não levaram a nenhum fato desabonador, a nada que pudesse comprometer a reputação de Roberto como um marido fiel, mas o espaço entre os dois aumentava, cada vez mais, num constrangimento insuportável que a presença de um causava no outro.
Finalmente, Maura, sem premeditar, pôs fim á situação. No café da manhã, gritou desvairada:
— Chega! É impossível continuar assim! Não podemos mais viver este casamento de aparências!
Aquele rompante imprevisível, que não fora precedido por nenhuma conversa ou acontecimento, não causou qualquer reação em Roberto. Ele permaneceu impassível, sem manifestar espanto ou susto. Simplesmente, concorda.
— Está bem. Posso contratar um advogado que cuide dos trâmites legais, enquanto você pode ir escolhendo os objetos de sua preferência e separando nossos livros, discos e objetos pessoais...
Agora, que estes detalhes materiais e prosaicos já estavam resolvidos, Maura sentia-se cansada, muito cansada. Olhando-se ao espelho, observou que aqueles anos de agonia e dúvida haviam sulcado seu rosto e escrito várias linhas.
— Sem dúvida, falou consigo mesma, enquanto puxava a pele em direção às orelhas - não é nada tão grave que uma boa plástica não possa resolver…
Fonte:
Enviado pela autora.
Cecy Barbosa Campos. Recortes de Vida. Varginha/MG: Ed. Alba, 2009.
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