- Não, senhor, não pode ir. Tem que contar-nos, agora, a virtude de todas as pedras preciosas exibidas pelas senhoras que aqui se acham.
- Eu? - obtemperou o ilustre marinheiro, levando a mão clara ao peitilho espelhante da camisa.
- Sim, senhor. É este o seu castigo.
E imperativa:
- Sente-se!
Generalizada, de novo, a palestra, a viscondessa de São Germano indagou, com sincero interesse:
- É verdade, almirante é certo, mesmo, que a ágata é "porte-malheur" (má sorte)?
- É verdade, afirmam isso... - acrescentou Mme. Sampaio Gomes.
O almirante contestou:
- É uma invenção recente, essa, D. Violeta. Os antigos, pelo menos, não dão notícia dessa propriedade. Plínio, que a ela se refere longamente, atribui-lhe a virtude de tornar os atletas invencíveis. Os egípcios indicavam-na como infalível contra mordedura das víboras, dizendo-se, mesmo, que as águias a colocavam no ninho para afugentar as serpentes, que lhes perseguiam os filhos.
- E o rubi? - indagou a baronesa.
- O rubi é a pedra dos espíritos esclarecidos. Teofrasto aponta-o como um dos incentivos misteriosos da inteligência, circunstância que a levou, ao que parece, a ser adotada como pedra simbólica dos bacharéis. Outros acreditam que ele preservava contra a peste, contra os venenos, e contra outros perigos da vida. É, mais ou menos, como a esmeralda.
- Como a esmeralda?
- Sim. A esmeralda fortalece, também a inteligência, e cura, segundo Plutarco, as mordeduras de cobra. Alberto, o Grande, recomendava-a contra a epilepsia e Cornélio Agripa contra as hemorragias.
Foi por essa altura que a encantadora D. Ritinha, que até então se limitara a sorrir, fazendo companhia ao contentamento dos outros, aventurou, cândida:
- Mas, há pedras portadoras de desgraças; não há, senhor almirante?
- Dizem que a opala é desse número, minha senhora; mas eu não creio.
- Não crê?
E entre a atenção geral:
- Pois, olhe, há dois anos, meu marido ia sendo vítima de uma dessas pedras de mau agouro. Esteve muito mal!
- E que pedra foi essa? Pode-se saber?
A moça não lhe sabia o nome; a baronesa correu, porém, pérfida, em seu auxílio:
- Era o carbúnculo; não era, Dona Ritinha?
A jovem senhora, desabituada àquele meio super-civilizado, bateu com a cabeça, confirmando, ingênua, a horrenda perversidade:
- É isso mesmo; era o carbúnculo. – e compadecida: - Quase ele morre, coitado!...
Fonte:
Disponível em Domínio Público
Humberto de Campos. A Serpente de Bronze. Publicado originalmente em 1925.
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