terça-feira, 16 de maio de 2023

Afrânio Peixoto (Trovas Populares Brasileiras) – 13

Atenção: Na época da publicação deste livro (1919), ainda não havia a normalização da trova para rimar o 1. com o 3. Verso, sendo obrigatório apenas o 2. Com o 4. São trovas populares coletadas por Afrânio Peixoto.


Entre tua casa e a minha
a estrada não é a mesma:
Vou daqui como cabrito,
volto de lá como lesma.
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Eu subi na laranjeira,
para ver se te enxergava,
cada folha que caía
era um suspiro qu'eu dava...
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Tanta laranja madura,
tanto limão pelo chão,
tanto sangue derramado,
dentro do meu coração!
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Laranjeira ao pé da serra
bota raízes de prata,
querer-te bem não me custa,
mas deixar-te é que me mata.
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As folhas da laranjeira,
de noite parecem prata.
Tomar ardores não custa,
separação é que mata.
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Os passarinhos que cantam
de madrugada com frio,
uns cantam de papo cheio,
outros de papo vazio...
= = = = = = = = = 

Beija-flor subiu a serra
para fazer seu testamento.
Não largue os amores velhos
sem saber do fundamento.
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Sabiá canta na mata,
descansa no pau agreste.
Um amor longe do outro
não dorme sono que preste.
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Patativa alegre canta
na palmeira do coqueiro,
eu não canto porque choro
o meu bem-querer primeiro.
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A rolinha canta alegre
os seus felizes amores,
Só eu vivo triste, errante,
curtindo pungentes dores.
= = = = = = = = = 

— Ó minha pombinha branca,
gavião quer te comer!
— A poder de pólvora e chumbo,
gavião há de morrer...
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Toda a tarde que Deus dá
pia a triste juriti...
Também não tenho descanso,
me canso pensando em ti.
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0 anum é pássaro preto,
passarinho de verão,
quando canta meia-noite,
Oh que dor de coração!
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Meu passarinho tão manso
das minhas mãos escapou,
para mais penas me dar,
penas nas mãos me deixou.
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Se vires a garça branca
pelos ares ir voando,
dirás que são os meus olhos
que te vão acompanhando.
= = = = = = = = = 

Os galos estão cantando,
e os passarinhos também,
quebram as barras do dia
e aquele ingrato não vem...
= = = = = = = = = 

Quando eu era galo novo
comia milho na mão...
Hoje que sou galo velho,
bato com o bico no chão.
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Já fui galo, já cantei,
já fui senhor do poleiro;
mas hoje sou desprezado
que nem cisco no terreiro.
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Senhor Padre, me confesse,
que eu sou filho do pecado.
Eu sou como a sanguessuga,
quando pego, estou pegado!
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A minhoca é bicho feio,
bicho que entrou no chão.
Tu também és muito feio
e entraste em meu coração.
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É bicho nojento o sapo
ou de noite, ou de manhã,
mas eu queria ser sapo
se você fosse uma rã...
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Os peixes nadam no rio,
as aves voam no ar;
Meu coração está preso
nos laços do teu olhar.
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Meu amor é como um rato,
duas vezes um ratinho,
fura aqui, fura acolá,
vai andando o seu caminho...
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Esta noite andei de ronda
como rato de parede.
Procurei, mas não achei,
o punho da tua rede.
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0 tatu me foi à roça,
toda a roça me comeu;
Plante roça quem quiser,
Que tatu quero ser eu.
= = = = = = = = = 
Fonte:
Disponível em Domínio Público.
Afrânio Peixoto (seleção). Trovas populares brasileiras. RJ: Francisco Alves, 1919.

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