MITOS E LENDAS DO RIO GRANDE DO SUL
Mito – segundo o dicionário da língua Portuguesa de Silveira Bueno, seria coisa inacreditável, sem realidade.
Lenda – segundo o mesmo dicionário, é conto, história fantástica, imaginosa.
Temos também a definição do escritor, pesquisador, folclorista, poeta, Antônio Augusto Fagundes, onde afirma que Mitos e Lendas são partes importantes do folclore de um povo e estuda-los é fundamental para o aprofundamento na alma popular. Os mitos e as lendas são a história do País, (em seu verdadeiro sentido), contada pelo seu povo. Enquanto o Mito é Universal, a Lenda é Local.
A 100 km de Rosário do Sul, localiza-se a bela Cidade de Santa Maria da Boca do Monte ou simplesmente Santa Maria. Foi de lá que soubemos dessa Lenda.
A LENDA DE IMEMBUÍ
Uma tribo de fala Guarani habitava a região rodeada de cerros, onde hoje está a cidade de Santa Maria, também conhecida como Santa Maria da Boca do Monte e cuja localização, os Gaúchos dizem: No Coração do Rio Grande.
Conta a lenda que na tribo dos Minuanos, um dos grupos indígenas habitantes nas margens do Arroio Itaimbé, morava Imembuí, uma índia muito bonita, de tez clara, cabelos longos e olhos muito negros. Seu nome significa a salva das águas, pois ela nasceu quando sua mãe, a índia Yboquitã, banhava-se nas águas do Arroio Itaimbé.
Era uma jovem muito querida e admirada por todos de sua tribo e despertava interesse dos jovens índios das tribos vizinhas. Acangatu, um jovem índio da tribo dos Tapes, que habitavam a outra margem do Arroio Itaimbé, apaixonou-se por Imembuí, e para testemunhar seu amor e sua coragem, todos os dias, trazia-lhe uma caça como presente. Porém, a jovem índia tinha por ele somente uma afeição de irmã. Certo dia encheu-se de coragem e disse a Acangatu o que sentia por ele. O índio, decepcionado, ferido em seu amor próprio, embrenhou-se na floresta e ninguém mais o viu na aldeia.
Nessa época, um grupo de Bandeirantes que regressava da Colônia do Sacramento, provavelmente, na segunda metade do século XVII, onde haviam ido levar provisões para a Guarnição Portuguesa, avistou a Aldeia dos Minuanos e julgaram eles presa fácil, pois só avistaram de longe, uma manada de cavalos, pacificamente pastando. Os Bandeirantes costumavam apreender índios, escravizá-los e levá-los para São Paulo, a fim de trabalharem nas lavouras. De longe, viram apenas uma cavalhada tranquila. E atacaram a Aldeia. Entretanto, surpreendente engano: em cada cavalo, um guerreiro escondia-se no flanco oculto da montaria. Os minuanos, avisados por seu vigia, do perigo que se avizinhava, em violenta carga dizimaram os atacantes. Os que não foram mortos fugiram, ou foram feitos prisioneiros.
O Bandeirante Português, Rodrigo, que estava entre os prisioneiros, foi também condenado à morte. O prisioneiro tocava uma música dolente no seu violão e cantava a saudade de sua terra e o destino triste que o levava a um doloroso fim. Era um moço simpático e valente.
Imembui, ouvindo seu canto e admirando aquele rosto bonito, comoveu-se e sempre se aproximava dele para ouvi-lo cantar. Seu coração jovem e sensível apaixonou-se por Rodrigo, e sabendo do destino cruel que o aguardava, foi suplicar a seu pai, o Cacique Apacani, para que o poupasse da dura sorte. Este que não negava nenhum pedido de sua filha, atendeu, tendo Rodrigo passado a viver com os índios.
Foi realizado o casamento de Imembuí e Rodrigo, em grandes festas, de acordo com o ritual indígena. A partir daí, Rodrigo passou a chamar-se Morotin que significa branco na linguagem Guarani. Casaram-se mais tarde nas Missões, onde também foi batizado o filho deles José.
O indiozinho José tornou-se um jovem forte e corajoso, e começou a afastar-se de casa, exercitando-se como caçador. Sua mãe sempre o recomendava para que tomasse cuidado, pois, como ele ainda era um menino, poderia ser uma presa fácil a alguma fera faminta.
Um dia, José embrenhou-se na mata para caçar e se perdeu. Não conseguiu encontrar o caminho de volta. Seus pais procuraram-no por toda a parte em vão. O menino havia desaparecido. Talvez um animal o tivesse ferido, ou uma cobra venenosa o tivesse picado.
Imembuí muito chorou o desaparecimento do filho. José, perdendo o caminho de casa, foi andando, andando pela mata, até que anoiteceu. Aconchegou-se no oco de uma árvore, abrigando-se do frio e das feras e aí passou a noite. E no dia seguinte, continuou a andar. Muito andou, até que chegou às margens de um grande rio, encontrando uma choupana, habitada por um índio que o acolheu.
Conversando com o índio, José contou-lhe sua história. O homem, comovido, dispôs-se a ajudá-lo, conduzindo José até a sua aldeia. José, considerado perdido, teve um retorno alegremente comemorado por toda a sua aldeia.
Imembuí e Morotin, agradecidos ao homem que encontrara o seu filho, convidaram-no a participar da alegria de toda a tribo. Reconheceram nesse homem, o índio Acangatu que já havia se curado de sua paixão por Imembuí.
De acordo com essa lenda, Santa Maria teve sua origem no amor que uniu uma índia com um branco, nas margens do Arroio Itaimbé, que hoje corre canalizado sob o calçamento do Parque Itaimbé nessa cidade.
Esse parque até hoje possui o formato de quando iniciava o rio. Eu sempre que posso, dou uma passada lá, costumo saudar os antigos que ali moravam, pois a sensação de paz e tranquilidade que esse local nos passa é imensamente incrível.
No Coração do Rio Grande
Interprete: Délcio Tavares
No coração do Rio Grande
Um dia eu fui morar
Lá encontrei muito amor
Lá aprendi a amar
Naqueles pagos chegado
Qual aconchego de um lar
Domei a força gauderia
E me apeguei ao lugar.
Nas entranhas do Rio Grande
A cultura e a tradição
Os valores se entrelaçam
Em confraternização
Lá eu vi a gauchinha
Vi também o velho peão
A cantar a prenda minha
A cantar a prenda minha
Com sua canha e o chimarrão
Na convivência crioula
O Rio Grande me mostrou
Toda a beleza da vida
O seu sentido e o que sou
Vi o guasca e a chinoca
O minuano e o pampeiro
Vi bandos de quero-quero
O chicote e o cavalo do Negro do Pastoreio.
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NOTAS
O Major João Cezimbra Jacques, que era Santa-Mariense de nascimento, publicou uma versão romanceada da Lenda de Imembuí, em seu “Assumptos do Rio Grande do Sul” (Officinas Graphicas da Escola de Engenharia, Porto Alegre, 1912, pag. 110 a 133). As coletâneas de Dante de Laytano “Lendas do Rio Grande do Sul. Coletânea de mais de 80 lendas dos diversos ciclos do folclore Gaúcho conforme os textos de sua literatura regionalista”. Publicação nº 9 da Comissão Estadual do Folclore do RGS, Rio de Janeiro, 1956. O autor faz a sistematização das lendas Gaúchas. A lenda de Imembuí está no Ciclo do Índio (p.44 a 46). E republicou o ensaio em seu livro “Folclore do Rio Grande do Sul” (Martins Livreiro, Porto Alegre, 1984, Capitulo V) e de Luiz Carlos Barbosa Lessa (Estórias e Lendas do Rio Grande do Sul”, Literart, São Paulo, 1960, “A Índia Missioneira e o Prisioneiro Paulista”, p. 151 a 155) apoiam-se declaradamente em Cezimbra Jacques.
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VOCABULÁRIO:
Arroio – riacho
Canha – cachaça
Cerros – monte, morro.
Chinoca – caboclinha, filha de china (mulheres que apresentam características de indígena).
Crioula – natural de determinado lugar.
Gaudéria(o) – denominação dada aos antigos gaúchos
Guasca – tem duplo sentido. Nesse caso era assim que os habitantes da cidade grande chamavam aos moradores do interior.
Minuano – vento frio e seco que sopra do sudoeste no inverno.
Pagos – lugar em que se nasceu.
Pampeiro – vento impetuoso que sopra de sudoeste, vindos dos pampas Argentinos.
Quero Quero – ave símbolo do Rio Grande do Sul
Fontes:
Texto enviado pelo autor.
Imagem da Lenda – https://santamariafoto.blogspot.com/lenda-de-imembui.html
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