terça-feira, 19 de novembro de 2019

Francisco José Pessoa (Serra Enigmática)


Vens perfurando a terra desde o nadir, para respirar o ar puro de Guaramiranga?

Com que autoridade desalinhas o horizonte com as tuas corcovas indecisas, ora descendo humilhando-te, ora subindo orgulhando-te?

Mas, com teu orgulho ou com tua humildade, em reverência ao teu criador, propicia-me um visual místico, solar dos deuses de antão.

Minha linda e apaixonante cordilheira, onde o sol respeitosamente mergulha nas tuas misteriosas costas para dizer adeus ao dia e dar vida às estrelas, faz-te minha musa pois, enamorando-te, sinto o vento açoitar-te levando com ele meu beijo.

Estás mais cinza. Não sei no momento precisar tua cor mas, para que te dar cores, se és um caleidoscópio que muda com os passos do astro-rei, que te aquece num vespertino abraço conjugal?

Serra do hoje, do ontem, do amanhã, testemunha de gerações que outrora achavam-te incólume no buscar dos seus sustentos. Hoje, olho-te, admiro-te, e conversas comigo num diálogo mudo, quando os olhos são as letras e os sentimentos sílabas, que descrevem o que de mais belo existe em ti.

Encobre-te com um manto de névoas, na tentativa de esconder-te de mim, mas, espero pacientemente que o véu se espraie, quando poderei admirar-te, levantando o véu que te faz misteriosa.

Quantos caminhos de rios te nutrem o útero, fazendo-te mais rica e mais saudável para nós teus devastadores. São 17h30. 0 sol encabulado se esconde, rendendo-te homenagem, ó pedaço de terra abençoada.

Que da outra vez aqui vier, estejas disposta a ouvir os meus clamores, acordes maviosos capazes de fazer inveja aos mais virtuosos compositores de ópera.

Decifro-te, minha cordilheira enigmática. És a sombra do sol que se põe e o brilho das estrelas que nascem. E mais um dia se fez!

Fonte:
Francisco José Pessoa de Andrade Reis. Isso é coisa do Pessoa: em prosa e verso. Fortaleza/CE: Íris, 2013.
Livro enviado pelo autor.

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