terça-feira, 27 de outubro de 2020

Contos e Lendas do Mundo (Entre as Rosas)

Era final de inverno...

Mais um ano havia passado e não se chegara a nenhuma conclusão.

Os partidários das diversas facções, dia após dia, perdiam-se em longas e intermináveis discussões sobre esta ou aquela candidata, sem chegarem a um consenso.

Decantava-se a beleza da papoula, as qualidades das alfazemas, o perfume dos cravos, as virtudes de pureza e humildade de lírios e violetas.

Tudo em vão. Num canto despretensioso do mundo, onde as espécies vegetais cresciam silenciosamente, um pequeno arbusto travava sua luta diária pela sobrevivência, alheio a toda sorte de discussões.

Conformada com sua forma tosca, retorcida, prenhe de espinhos pontiagudos e consciente de que nunca alcançaria a beleza de um dente-de-leão, acostumara-se a ser desprezada e humilhada, sem no entanto deixar de prestar atenção nas pequenas criaturas que dependiam de sua existência para sobreviver.

A elas dedicava a sua vida, emprestando a segurança de seu tronco e ramos para abrigar insetos das chuvas e ventanias.

Era feliz, pois, se não tinha a beleza, tinha a utilidade, e isso lhe bastava.

Naquela manhã fria de final de invernia, ainda não totalmente desperta da noite, a plantinha rude viu despregar do céu uma linda estrela cor de prata. Sorrindo, acompanhou-lhe a trajetória em arco perfeito pelo céu escuro, descendo, descendo, em direção à floresta ainda adormecida. Era tão suave e linda aquela forma que, instintivamente, todos na floresta: árvores, arbustos, pássaros e flores, acordados pela luz repentina, curvavam-se para vê-la passar.

A estrela flutuou entre sorrisos, agradecendo a simpatia da floresta, até chegar perto do arbusto cheio de espinhos.

Aproximou-se lentamente da plantinha e falou-lhe docemente.

- Não te inscrevestes na eleição da rainha das flores, por isso vim pessoalmente buscar-te.

– Mas, senhora - gaguejou a planta - eu? Como posso aspirar a ser rainha de qualquer coisa, não vês o quanto sou feia?

- O Senhor da vida ordenou-me que viesse buscá-la.

- Se este é o seu desejo, aqui me tens, senhora.

E partiram em um rastro de luz, na direção do conselho das flores.

As demais candidatas riram-se da pretensiosa intenção daquele feio arbusto.

A plateia silenciou quando entrou no ambiente a primavera, anunciada pelo som de mil clarins.

O arbusto, espantado, reconheceu a estrela que a trouxera até ali.

- Então, senhores conselheiros - questionou a primavera - o Senhor da vida deseja saber se já encontraram a legítima representante de Seu reino!

- Não, senhora. Estávamos para decidir-nos, quando fomos interrompidos pela vaidade dessa planta sem qualidades que aí está. Veja! Quanta ousadia!

A primavera voltou-se para a plantinha que chorava de vergonha e humilhação e perguntou:

- O que mais desejas nesta vida?

E a planta respondeu entre lágrimas.

- Amar e ser amada.

A primavera, então, tocou os galhos espinhosos e, logo, botões surgiram dos galhos seminus, abrindo-se em mil pétalas sedosas, de perfume inesquecível.

– Qual é o teu nome? - perguntaram todos.

- Eu sou a Rosa.

Moral da Estória:
Quando o amor tocar os espinheiros do mundo, as rosas brotarão em cada alma.

Fonte:
Universo das Fábulas

Nenhum comentário: