terça-feira, 27 de dezembro de 2022

Dorothy Jansson Moretti (Folhas Esparsas) 2


DE VOLTA ÀS RAÍZES


Viajando por caminhos olvidados,
Eunice, deslumbrada, se reclina
às janelas de tempos já passados
que a luz do seu talento descortina.

E vêm à tona vultos embuçados
viver de novo as sagas da campina,
atravessando escarpas e valados,
ao sol, à chuva, ao vento ou à neblina.

Nessa volta saudosa até as raízes,
ela nos mostra, em gama de matizes,
o que foi nossa terra e nossa gente.

E nos envolve tanto em seu relato
que nos sentimos parte do retrato,
quais fantasmas roubados ao presente.
* * * * * * * * * * * * * * * * * *

GRAÇAS À MINHA CIDADE

Itararé que amo tanto,
que me viste, pequenina,
da brisa ao meigo acalanto,
a correr pela campina,

ou de teus rios num recanto,
me envolver na espuma fina,
ver o sol no eterno encanto
ir descansar na colina...

Segui sempre te querendo,
e extasiada estou vivendo
a sublime maravilha

de entre sonhos tão antigos,
ter IRMÃOS nos meus amigos,
e me chamares de FILHA!

(Declamada pela autora ao receber seu título de CIDADÃ ITARAREENSE)
* * * * * * * * * * * * * * * * * * 

GRUTA DAS ANDORINHAS

Um cataclismo parte o chão rochoso
E o rio se atira para o novo leito;
em paredões de granito limoso,
corre o Itararé, rude e violento.

Agora para, retomando alento,
na gruta escura, no silêncio umbroso,
mas logo segue aos saltos, barulhento,
e some, além, esquivo e misterioso,

À tarde, as andorinhas, em revoadas,
descem, doidas, quais flechas disparadas,
buscando nas cavernas o degredo.

E o mistério do rio... sempre inviolável...
Nada se sabe do abismo insondável.
Só as andorinhas... mas guardam segredo.
* * * * * * * * * * * * * * * * * *

RIO VERDE

Mudaste quase nada... eu mudei tanto, tanto,
que nem sabes quem. sou, se me encontras agora;
mas tu conservas sempre o teu eterno encanto,
és ainda o meu doce e lindo rio de outrora.

Ao sabor da água verde e da calma sonora,
eu flutuava, feliz, ao teu meigo acalanto,
e os sonhos que afagava, então, a mil por hora,
vinham estimular-me o cérebro, entretanto.

És sempre o mesmo rio, as encantadas águas
Em que segues levando as delícias e as mágoas,
rolando ao mesmo tom, mesma tranquilidade.


Não mudaste... eu mudei... porém, se na memória,
revives, como eu, daquele tempo a história,
hás de estar, como estou... morrendo de saudade.
* * * * * * * * * * * * * * * * * *

RUA SÃO PEDRO

Nossa rua comprida, tão bonita...
Sobre a raiz da árvore eu sentava,
e quanta vez corri, chorosa e aflita,
quando um “bicho peludo” me queimava!

Bonito quando as tropas de boiada
ou de mulas, que vinham lá do Sul,
passavam lentas, em fila espaçada,
erguendo poeira para o céu azul!

Meus pais e alguns amigos, na calçada,
divertidos, a olhar a criançada,
sorviam goles de bom chimarrão.

E à noite, em roda, sob a luz da lua,
nosso riso inocente enchia a rua,
na cadência feliz de uma canção!
* * * * * * * * * * * * * * * * * *
Fonte:
Dorothy Jansson Moretti. Folhas esparsas: sonetos. Itu/SP: Ottoni, 2006.
Livro enviado pela poetisa.

Nenhum comentário: