domingo, 25 de dezembro de 2022

George Abrão (Coincidência)


Há alguns anos, quando eu ainda trabalhava na Caixa, em visita a uma empresa a qual eu estava tentando conquistar como cliente, conversando com o seu proprietário - um senhor já idoso - e com o gerente da mesma - um pouco mais jovem - falávamos sobre amenidades.

A certa altura o assunto versava sobre nossas naturalidades. O proprietário disse-nos ser natural de São Paulo e perguntou-me de onde eu era: respondi-lhe ser de Jaguariaíva. Quando o gerente declinou a sua, riu um pouco e nos disse:

- Sou de Ortigueira, na realidade da localidade denominada Serra dos Mulatos.

Como eu conhecia bem aquela região, elogiei sua beleza natural, ressaltando a bela mata e a serra em si, passando a lhes narrar um episódio ocorrido comigo naquele local:

“Estando viajando com mais dois amigos e, ao passar pela Serra dos Mulatos, um deles comentou que gostaria de comprar mel de um produtor, pois naquela região quase todos os sitiantes eram pequenos apicultores. Então resolvemos adentrar no primeiro sítio que encontrássemos para tentar comprar o mel desejado.

“Fizemos isso e ao encontrar um portão bem feito e ladeado por plantas ornamentais, seguimos pela estrada bem cuidada até que chegamos a uma residência toda pintada de banco e com um jardim florido na frente.

“Batemos palmas e um senhor, apresentando-se como Bianor de Almeida, nos atendeu. Após explicarmos o que queríamos, ele nos disse ter mel de alguns tipos (conforme a flor de onde era extraído o néctar), sendo que o melhor deles era o de flor de laranjeira, que estava sendo centrifugado e que isso demoraria um pouco, mas que entrássemos para esperar.

“Então convidou-nos para ir até o barracão onde estava sendo executada a centrifugação, mas antes pediu-nos licença e entrou na casa, voltando logo em seguida. Ao chegarmos ao barracão onde o mel era beneficiado, vimos um jovem girando a manivela de uma centrífuga manual. O mel, separado da cera, caia num recipiente de metal passando por uma peneira onde ficavam algumas impurezas. Ele nos mostrou as instalações, bem como os tipos de mel que produzia: de capixinguí, de eucalipto e o de laranjeira, explicando-nos também os procedimentos para a coleta dos variados néctares.

“A seguir, verificando a quantidade de mel no recipiente de metal, pegou alguns vidros e encheu-os com o líquido dourado através de uma torneirinha. Então convidou-nos para irmos até à sua residência que era uma casa simples, mas de muito bom gosto, com muitas flores no jardim e tendo na frente uma ampla varanda também com diversas folhagens ornamentais. Num amplo anexo, havia uma grande cozinha para onde ele nos dirigiu apresentando-nos à senhora sua esposa. Era uma cozinha muito bem cuidada, com um grande fogão de barro aos fundos e, sobre o mesmo em varas nas dependuradas nas vigas, com arame, havia abundância de defumados como linguiça e peças de suíno. Sobre a mesa coberta com uma bela toalha e ladeada por bancos de madeira, já estavam arrumadas as xícaras, tendo no meio um grande pão caseiro, uma broa de centeio, um pote com mel e biscoitos caseiros de polvilho.

“O Sr Bianor convidou-nos a sentar e nós não nos fizemos de rogados, pois era um verdadeiro banquete o que se encontrava à nossa disposição, complementados por café, leite e linguiça frita. Escusado dizer o tanto que comemos, parecia que havíamos voltado da guerra. O casal sentou-se conosco e logo entabulamos uma gostosa conversa, na qual ele contou-nos ser ali mesmo da região e ter dois filhos que estudavam em Curitiba vindo somente em feriados prolongados ou nas férias. Disse também que gostavam muito quando recebiam visitas, pois isso era raro.

“Apresentamo-nos também e quando eu disse-lhes ser natural de Jaguariaíva, disse-me conhecer um amigo que morava lá, deu-me seu nome e, por coincidência, tratava-se de meu avô materno, que já havia falecido há alguns anos.

“Após terminarmos o lanche, conversamos mais um pouco e lhe dissemos estar na hora de ir, pois já se fazia tarde.

“Meu amigo pediu-lhe cinco vidros de mel e o outro um. Eu disse-lhe que levaria dois. Ele preparou uma caixinha com os vidros e disse que nada cobraria, pois havíamos lhe dado grande prazer com a visita e a conversa. Fizemos-lhe ver que isso não seria justo, pagamos e nos despedimos, sendo que eu disse-lhe vir visitá-lo em outra ocasião, o que acabou não ocorrendo.”

Quando concluí o relato, percebi que o gerente tinha um sorriso nos lábios, dizendo:

- Senhor George, coincidências sempre acontecem, mas como a de hoje foi uma coisa incrível, pois o Sr. Bianor de Almeida era o meu pai, e o senhor esteve em minha casa quando eu estudava na capital!

Fonte:
George Roberto Washington Abrão. Momentos – (Crônicas e Poemas de um gordo). Maringá/PR, 2017.
Ebook enviado pelo autor.

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