AOS QUINZE anos, o João chegava para a sua vizinha, a Maria, e mandava a pergunta. Fazia a proposta na lata, na bucha, sem titubear:
— Maria, quer se casar comigo?
A Maria (dois anos mais nova que ele), se mostrava rápida e taxativa:
— Não.
João, insistente se declarava como um menino bobo diante do primeiro amor da sua vida:
— Eu te amo.
Maria, fria e seca, sempre que o guri voltava à carga, atirava no infeliz um balde de água fria:
— Eu não te amo. Nunca me casaria com você. Um pobretão!...
João, entristecido sem, contudo, perder o brilho da paixão, insistia:
— Pense. Nos conhecemos desde criança. Passamos a ser vizinhos desde o momento em que as nossas famílias vieram morar aqui em Carapicuíba, mesmo bairro, nesse conjunto da Cohab e, coincidentemente, as nossas portarias bateram com seus narizes de frente e passaram a respirar o mesmo ar benfazejo...
Maria, enfezada e doida para encerrar a conversa não abria a guarda:
— E o que todo esse papo furado tem em comum?
João, sem perder o fulgor da ternura trazida no rosto, toda vez que conseguia se aproximar da graciosa, não desperdiçava as poucas migalhas da esperança. Se declarava um admirador inveterado:
— Casa comigo, minha linda. Fomos feitos um para o outro. Nossos destinos se cruzaram desde que você e eu nos vimos pela primeira vez na estação de Osasco. Você estava com seu pai, eu com minha mãe. Sinto aqui dentro do peito que você se fez prometida, desde então, para ser a mulher da minha vida.
Maria, intransigente e desdenhosa, parecia prestes a soltar fogo pelas ventas. Berrava:
— Culpa da minha mãe, que teve a maior cara de pau. Logo na semana em que mudamos para a Cohab, faltou açúcar lá em casa. A pobrezinha saiu feito uma desmiolada pedindo para os vizinhos. Com tantas espeluncas espalhadas, a coitada resolveu bater justo no miserento do seu bloco. Coincidentemente... desde aquele fatídico dia, você grudou na minha aba.
João, afoito e cheio de garbo, não desgarrava da altivez. Reiterava seus desejos não correspondidos pela desmiolada aproveitando os mínimos detalhes embutidos nos desprezos ventilados por ela:
— Prova do destino de que fomos feitos um para o outro. Nossas almas se cruzaram (além da estação), uma segunda vez, ou seja, exatamente em face daquela simples falta de açúcar. Por mais que você queria lutar contra, não terá escapatória. Você será minha, minha, entendeu? Farei de você a esposa mais linda aqui da comunidade. Como tal, você me dará um penca de filhos. E deixará de trabalhar como faxineira na fábrica de lâmpadas da Osram.
Maria fazia pouco caso e sorria em escárnio, desprestigiando as palavras que entravam por um ouvido e saiam pelos cotovelos:
— Uma ova, cara. Vai te lascar. Nem que a vaca tussa ou espirre.
João, paciente, fingia não ouvir os atrevimentos desaforados que a megera soltava, sem papas na língua e continuava a se abrir pior que mala velha num conformismo inigualável:
— Adoro esse seu lado humorístico. Nunca ouvi dizer que vaca tossisse ou espirrasse... de onde você tira essas frases saborosas e criativas para acariciar meu âmago?
O tempo passou voando. João se mudou de Carapicuíba. Maria, continuou por lá. Hoje a criatura conta vinte e cinco e João (mais velho que ela dois anos) se esbarraram, por mero acaso, na saída da missa dominical na Paróquia de São Paulo Apóstolo. A mesma localidade da Cohab, onde sempre viveram desde os primórdios da infância. João, ao reconhecer o seu amor impossível, seguiu a jovem e a alcançou montado em seu carrão, um Speedtail azul metálico da McLaren. Uma máquina de fazer inveja ao Audi R8 vermelho do Roberto Carlos. Ao vê-la, buzinou e meteu o pé no freio:
— Maria, ei, Maria! Lembra de mim? Sou eu, o João...
Maria, ao reconhecê-lo naquele possante, perdeu momentaneamente o fôlego e, igualmente, estancou a caminhada:
— Jo... Jo... João? - É você mesmo?
João, em resposta, saltou correndo e cheio de saudade se amoldou ao corpo escultural da moça. Falou, quase sem voz:
— Sou eu, Maria. Em carne e osso. Me formei em medicina. Comprei uma mansão em Aldeia da Serra para meus pais e, ao lado, adquiri uma outra para mim. Para nós. Ainda no correr desse mês, quero retirá-los daqui da Cohab e levá-los para uma vida mais digna e sem atropelos. Eu...
Naquele momento, Maria, em choro convulsivo, interrompeu João e mudou o rumo da prosa. Inopinadamente se enroscou como uma cadelinha no cio no pescoço do rapaz e mandou a pergunta:
—... João, meu amor... ainda quer se casar comigo?!
Embevecida de uma paixão claramente momentânea, completou, eufórica:
— Quero ser sua esposa de verdade e lhe dar uma penca de filhos...
— Maria, quer se casar comigo?
A Maria (dois anos mais nova que ele), se mostrava rápida e taxativa:
— Não.
João, insistente se declarava como um menino bobo diante do primeiro amor da sua vida:
— Eu te amo.
Maria, fria e seca, sempre que o guri voltava à carga, atirava no infeliz um balde de água fria:
— Eu não te amo. Nunca me casaria com você. Um pobretão!...
João, entristecido sem, contudo, perder o brilho da paixão, insistia:
— Pense. Nos conhecemos desde criança. Passamos a ser vizinhos desde o momento em que as nossas famílias vieram morar aqui em Carapicuíba, mesmo bairro, nesse conjunto da Cohab e, coincidentemente, as nossas portarias bateram com seus narizes de frente e passaram a respirar o mesmo ar benfazejo...
Maria, enfezada e doida para encerrar a conversa não abria a guarda:
— E o que todo esse papo furado tem em comum?
João, sem perder o fulgor da ternura trazida no rosto, toda vez que conseguia se aproximar da graciosa, não desperdiçava as poucas migalhas da esperança. Se declarava um admirador inveterado:
— Casa comigo, minha linda. Fomos feitos um para o outro. Nossos destinos se cruzaram desde que você e eu nos vimos pela primeira vez na estação de Osasco. Você estava com seu pai, eu com minha mãe. Sinto aqui dentro do peito que você se fez prometida, desde então, para ser a mulher da minha vida.
Maria, intransigente e desdenhosa, parecia prestes a soltar fogo pelas ventas. Berrava:
— Culpa da minha mãe, que teve a maior cara de pau. Logo na semana em que mudamos para a Cohab, faltou açúcar lá em casa. A pobrezinha saiu feito uma desmiolada pedindo para os vizinhos. Com tantas espeluncas espalhadas, a coitada resolveu bater justo no miserento do seu bloco. Coincidentemente... desde aquele fatídico dia, você grudou na minha aba.
João, afoito e cheio de garbo, não desgarrava da altivez. Reiterava seus desejos não correspondidos pela desmiolada aproveitando os mínimos detalhes embutidos nos desprezos ventilados por ela:
— Prova do destino de que fomos feitos um para o outro. Nossas almas se cruzaram (além da estação), uma segunda vez, ou seja, exatamente em face daquela simples falta de açúcar. Por mais que você queria lutar contra, não terá escapatória. Você será minha, minha, entendeu? Farei de você a esposa mais linda aqui da comunidade. Como tal, você me dará um penca de filhos. E deixará de trabalhar como faxineira na fábrica de lâmpadas da Osram.
Maria fazia pouco caso e sorria em escárnio, desprestigiando as palavras que entravam por um ouvido e saiam pelos cotovelos:
— Uma ova, cara. Vai te lascar. Nem que a vaca tussa ou espirre.
João, paciente, fingia não ouvir os atrevimentos desaforados que a megera soltava, sem papas na língua e continuava a se abrir pior que mala velha num conformismo inigualável:
— Adoro esse seu lado humorístico. Nunca ouvi dizer que vaca tossisse ou espirrasse... de onde você tira essas frases saborosas e criativas para acariciar meu âmago?
O tempo passou voando. João se mudou de Carapicuíba. Maria, continuou por lá. Hoje a criatura conta vinte e cinco e João (mais velho que ela dois anos) se esbarraram, por mero acaso, na saída da missa dominical na Paróquia de São Paulo Apóstolo. A mesma localidade da Cohab, onde sempre viveram desde os primórdios da infância. João, ao reconhecer o seu amor impossível, seguiu a jovem e a alcançou montado em seu carrão, um Speedtail azul metálico da McLaren. Uma máquina de fazer inveja ao Audi R8 vermelho do Roberto Carlos. Ao vê-la, buzinou e meteu o pé no freio:
— Maria, ei, Maria! Lembra de mim? Sou eu, o João...
Maria, ao reconhecê-lo naquele possante, perdeu momentaneamente o fôlego e, igualmente, estancou a caminhada:
— Jo... Jo... João? - É você mesmo?
João, em resposta, saltou correndo e cheio de saudade se amoldou ao corpo escultural da moça. Falou, quase sem voz:
— Sou eu, Maria. Em carne e osso. Me formei em medicina. Comprei uma mansão em Aldeia da Serra para meus pais e, ao lado, adquiri uma outra para mim. Para nós. Ainda no correr desse mês, quero retirá-los daqui da Cohab e levá-los para uma vida mais digna e sem atropelos. Eu...
Naquele momento, Maria, em choro convulsivo, interrompeu João e mudou o rumo da prosa. Inopinadamente se enroscou como uma cadelinha no cio no pescoço do rapaz e mandou a pergunta:
—... João, meu amor... ainda quer se casar comigo?!
Embevecida de uma paixão claramente momentânea, completou, eufórica:
— Quero ser sua esposa de verdade e lhe dar uma penca de filhos...
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