terça-feira, 12 de setembro de 2023

Daniel Maurício (Leve-me) 1


A esperança
Costumava se vestir de verde.
Era reconhecida
Até no tremular
Das folhas ao vento.
Mas hoje,
Depois de muito lamento
Ela vem em doses pequenas
Disfarçada
Com vestido branquicento.
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Clandestino
Embarco neste teu sorriso,
Mesmo sabendo
Que não era pra mim.
Nele viajo
Ainda que por instantes
Embalado
Por um resto de paixão
Que ainda brinca
Tão solitária
Aqui dentro de mim.
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Com o apito do trem
Os corações
Despertavam.
Era gente que chegava
Era gente que partia
Com o apito do trem.
Com o apito do trem
Nos abraços
Desfaziam-se as saudades de uns,
Enquanto as lágrimas
Prenunciavam as saudades de outros.
Com o apito do trem
A vida pulsava
Até mesmo nas cidadezinhas mais remotas
E que hoje quase mortas
Sentem a falta
Do velho apito do trem.
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Não se mata a saudade
Impunemente.
Preso fiquei
No teu olhar.
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Nas tardes de domingo
Olho nos teus olhos
E deixo que
As minhas meninas
Brinquem
Com as meninas
Dos teus olhos
Sem me importar
De que já seja
Quase inverno.
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No desfilar dos dias
Aprendi a desbastar ideias,
A por ponto final
Em muitas frases inacabadas,
A lógica das crianças é simples
E a felicidade delas é tão plena.
Abandonei a pressa
Pois a vida passa até por uma fresta.
Melhor valorizar a pausa,
Mesmo que seja
Pra contrariar a Gramática
Ao se colocar vírgulas
Onde elas não caibam.
O amor é a definição de Deus,
O resto é coleção de "eus"
Sujeitos a ficarem perdidos no breu,
Ou quem sabe em caixas
A mofar.
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Nos meus silêncios
Adoro o falar
Das tuas mãos
Em minha pele.
Tudo fica bem!
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O "eu te amo"
Era pra ser pra sempre.
Mas na primeira "chuva"
Descobriu-se
Que tinha sido uma promessa
Escrita a giz.
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Os dias
Andavam
Pesados.
Vagarosas
Cinzas no olhar.
Mas eis
Que o menino
Que em mim
Habita
Começou
A pintar palavras
Com as sobras
De lápis de cor.
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Outono.
As folhas que caem
São lágrimas das árvores
Se despedindo.
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Quando disse
Que te queria,
Não estava a procurar
Apenas rima.
Rimar é fácil
Remar a dois, não.
E como é bom
Quando os corações
Batem no compasso
Do mesmo verso.
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Que pena!
Os seus "eus"
Eram tantos
Que o nós
Ficou num canto
E só de vez
Em quando
Em cima
Da cama.
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Ser escritor
é...
descrever
a própria dor,
dísfarçando-se
em um personagem.
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Sozinha?
Ah, se tu
Soubesses
Que era eu
Uma daquelas
Pétalas
Que desprezastes
Julgando ser um
Malmequer.
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Tem passado
Que não passa.
Um deles
É o meu amor
Por você.
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Teus beijos
São poesias escritas
Na minha pele.
E a minh'alma
Sabe todas de cor.

Fonte:
Daniel Maurício. Leve-me. Curitiba/PR: Ed. do Autor, 2021.
Enviado pelo poeta.

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