(Sobre uma frase de Alexandre Dumas Filho)
Saída do colégio em dezembro último, Angelita recebeu da sua mamãe a promessa de um vestido de passeio, um verdadeiro vestido de moça, escolhido por ela mesma, assim que regressassem da fazenda, em Barra Mansa, depois do Carnaval. Inocente ainda, foi batendo os dois lírios das mãos que a menina ouviu a noticia. E foi, para ela, para os seus dezesseis anos incompletos, um momento de alegria irreprimível, aquele em que, sentado na sua cama alva, pura como um berço, escolheu, manuseando uma dúzia de revistas de modas, o figurino que mais lhe encantava os olhos.
Feita a encomenda a uma das modistas do bairro, foi esta, dias depois, levar o vestido à última prova. Contente, feliz, pulando pela casa, era com uma jovialidade descomedida que Angelita recebia a costureira. E não foi sem um certo calor na face, e sem um certo tremor nos dedinhos afilados, que desabotoou a sua blusinha leve, patenteando os encantos do seu colo virgem, do seu corpo desabrochante, aos olhos daquela senhora estranha, habituada a ver, certamente, por aí, por exigência do seu próprio ofício, centenas de corpos pecadores.
- Tire o corpinho também, mademoiselle. - ordenou a modista.
A menina enrubesceu mais:
- O corpinho, também?
Minutos depois, trajando o seu lindo vestido novo, Angelita abria de par em par a porta da sua alcova, onde estivera encerrada, sozinha, com a costureira. Estava deslumbrante. Era um maravilhoso figurino de verão, bordado a seda, com um rosário de pequeninas flores à cintura, que lhe punha em destaque, no colo e nos braços, a imaculada frescura da pele. Curvando-se, risonha, numa grande mesura, foi a mocinha perguntando, logo, à D. Adelaide:
- Então, estou linda?
A ilustre senhora, que a esperava na sala de jantar, junto à mesa, abriu os braços, para receber a filha.
- Que tal? - tornou a moça.
D. Adelaide beijou-a nos cabelos castanhos e, com um sorriso de bondade, em que lhe ia toda a sua alma, externou o seu pensamento:
- Está muito bom, muito lindo, mas falta uma coisa.
A menina arregalou os grandes olhos escuros, imobilizando no rosto um sorriso de espanto.
- É aqui! - explicou a senhora, pondo-lhe a mão aberta sobre o colo de neve.
E abraçando a menina:
- As mulheres, minha filha, são uma essência delicada, de que o vestido é um vidro desarrolhado, por onde se evola, insensivelmente, o pudor da mulher...
E lançou, maternalmente, sobre o colo da filha, a macia misericórdia do seu claro lenço de seda.
Saída do colégio em dezembro último, Angelita recebeu da sua mamãe a promessa de um vestido de passeio, um verdadeiro vestido de moça, escolhido por ela mesma, assim que regressassem da fazenda, em Barra Mansa, depois do Carnaval. Inocente ainda, foi batendo os dois lírios das mãos que a menina ouviu a noticia. E foi, para ela, para os seus dezesseis anos incompletos, um momento de alegria irreprimível, aquele em que, sentado na sua cama alva, pura como um berço, escolheu, manuseando uma dúzia de revistas de modas, o figurino que mais lhe encantava os olhos.
Feita a encomenda a uma das modistas do bairro, foi esta, dias depois, levar o vestido à última prova. Contente, feliz, pulando pela casa, era com uma jovialidade descomedida que Angelita recebia a costureira. E não foi sem um certo calor na face, e sem um certo tremor nos dedinhos afilados, que desabotoou a sua blusinha leve, patenteando os encantos do seu colo virgem, do seu corpo desabrochante, aos olhos daquela senhora estranha, habituada a ver, certamente, por aí, por exigência do seu próprio ofício, centenas de corpos pecadores.
- Tire o corpinho também, mademoiselle. - ordenou a modista.
A menina enrubesceu mais:
- O corpinho, também?
Minutos depois, trajando o seu lindo vestido novo, Angelita abria de par em par a porta da sua alcova, onde estivera encerrada, sozinha, com a costureira. Estava deslumbrante. Era um maravilhoso figurino de verão, bordado a seda, com um rosário de pequeninas flores à cintura, que lhe punha em destaque, no colo e nos braços, a imaculada frescura da pele. Curvando-se, risonha, numa grande mesura, foi a mocinha perguntando, logo, à D. Adelaide:
- Então, estou linda?
A ilustre senhora, que a esperava na sala de jantar, junto à mesa, abriu os braços, para receber a filha.
- Que tal? - tornou a moça.
D. Adelaide beijou-a nos cabelos castanhos e, com um sorriso de bondade, em que lhe ia toda a sua alma, externou o seu pensamento:
- Está muito bom, muito lindo, mas falta uma coisa.
A menina arregalou os grandes olhos escuros, imobilizando no rosto um sorriso de espanto.
- É aqui! - explicou a senhora, pondo-lhe a mão aberta sobre o colo de neve.
E abraçando a menina:
- As mulheres, minha filha, são uma essência delicada, de que o vestido é um vidro desarrolhado, por onde se evola, insensivelmente, o pudor da mulher...
E lançou, maternalmente, sobre o colo da filha, a macia misericórdia do seu claro lenço de seda.
Fonte:
Humberto de Campos. A Serpente de Bronze. Publicado originalmente em 1925.
Humberto de Campos. A Serpente de Bronze. Publicado originalmente em 1925.
Disponível em Domínio Público.
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