segunda-feira, 23 de dezembro de 2024

Sammis Reachers (Deambulações urbanas num domingo carioca)

São dezessete horas de um domingo de primavera. Cumprindo uma missão agora há pouco na UERJ do Maracanã, aquele monstro de concreto, ao sair me deparei com os vazios e desertos de uma cidade grande aos domingos de tarde. Foi instantâneo: me recordei de quando era rodoviário e solteiro e, ao trabalhar nos domingos, por vezes ao largar daquele “trampo” feito de sacolejar e de pessoas, saía sozinho pelos vazios urbanos de Niterói ou Rio, desarvorada, desavisada e destemidamente. Sem destino ou maiores objetivos. Que solidão especial, trotando lotada de melancolia e levando na carroça sua refém apaixonada-pois-adoentada da Síndrome de Estocolmo, a poesia... Sim, muitos poemas nasceram nessas andanças. Não, nunca fui assaltado ou indagado. Deus e minha cara de cana (e minha decana bolsa atravessada nas costas) talvez tenham me guardado.

Outro detalhe que me traz reflexão é que a melancolia de andar numa mata, campo ou descampado deserto é diferente da de andar num deserto urbano. Cada qual tem sua docilidade, mas o campo fala de sentimentos atávicos, instintivos ou transcendentes do que é puramente humano; já a urbe possui uma "linha de ansiedade" (é o melhor termo que pude) toda própria, o humano se celebra e exaure em seus próprios maquinários concretos e simbólicos, num jogo de topofilia*/ topofobia* que nos faz querer continuar o jogo do ver e do rever, do estar e do deixar de estar, enquanto somos acolhidos/ moídos pelo espaço que incessantemente nos ressignifica enquanto o ressignificamos. Jogo por sinal tão caro à corrente da Geografia que me apraz, a Geografia Humanista ou Fenomenológica.

Divagações livres, mas as deambulações (deambular é justamente andar à toa) hoje interditadas a um homem casado. 

Bem, melhor assim.
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* Vocabulário:
Topofilia = Preferência ou conexão sentimental que alguém apresenta em relação a determinados lugares.
Topofobia = Medo mórbido de um lugar ou localização específica.
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Sammis Reachers Cristence Silva nasceu em 1978, em Niterói/RJ, mas desde sempre morador de São Gonçalo/RJ, ambos municípios fluminenses. Sammis é poeta, escritor, antologista e editor. Licenciado em Geografia atua em redes públicas de ensino de municípios fluminenses. É autor de dez livros de poesia, três de contos/crônicas e um romance, e organizador de mais de cinquenta antologias.  Aos 16 anos inicia seus escritos e logo edita fanzines, participando do assim chamado circuito alternativo da poesia brasileira, com presença em jornais e informativos culturais. Possui contos e poemas premiados em concursos do Brasil, bem como textos publicados em antologias e renomadas revistas de literatura.

Fontes: Texto enviado pelo autor.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing 

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