Duas semanas antes, em casa era uma reviravolta. Fazia-se uma faxina especial, em que além da limpeza ordinária, engomavam-se toalhinhas e cortinas, poliam-se objetos de enfeite, e estendia-se na mesa uma bonita toalha bordada com motivos de Natal.
Nosso jardim era grande e fornecia as flores para embelezar nossa casa e até as de alguns vizinhos.
Na cozinha preparavam-se os doces. Lembro-me da grande tábua de estender massas e de minha irmã Sílvia cortando nela gostosas bolachinhas de formatos variados: bichinhos, estrelinhas, cometas, Papai Noel...
Mamãe, com um lenço amarrado nos cabelos, temperava as massas dos cuques e bolos de chocolate e nozes. Fazia também docinhos de leite cortados em losangos, e deliciosas balas de leite e mel que eu e meus irmãos Gustavo e Linéa, ajudávamos a embrulhar.
Tudo pronto, guardava-se em grandes latas quadradas com tampo de dobradiças (Biscoitos Aymoré).
Chegava o grande dia. Ganhávamos vestidinhos novos e brinquedos. Que festa! Lavávamos o gato para ele também ficar limpo e bonito para o Natal.
Durante o dia todo, que movimento! Todo mundo queria aproveitar a roupa nova para tirar fotografia. Vendiam-se filmes o dia inteiro.
À tarde vinham visitas e as gulodices eram oferecidas acompanhadas de um licorzinho ou café.
À noite havia festa na Igreja Presbiteriana. Dona Dirce e Domitila nos ensaiavam durante um mês para as apresentações. Cantávamos "Deitado em mangedoura", "Nasce Jesus", "Meu presente de Natal", "Na gruta da Belém"...
Havia também muitas declamações, e ao final distribuíam-se às crianças docinhos acondicionados em vistosos saquinhos coloridos de papel-crepom.
Não havia televisão...
E no meu tempo de mocinha, também não havia televisão. A festa era a mesma, com poucas alterações. O vestido novo, a casa enfeitada e os doces continuavam mantendo as posições, mas à noite, além da Igreja, a gente ia também ao jardim e à Rua Quinze, encontrar as amigas e os amigos para fazer o footing tradicional,
Tra-di-ci-o-nal... Que palavra remota! Algum dicionário ainda a define? Ou os modismos do tempo a absorveram, como absorveram o meu Natal de antigamente, tão doce, tão ingênuo, mas tão... tão... tão Natal!...
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(Tribuna de Itararé 24/12/1992)
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Dorothy Jansson Moretti nasceu em Três Barras/SC, 1926 e faleceu em Sorocaba/S`, 2017.
Fontes:
Dorothy Jansson Moretti. Instantâneos. São Paulo: Dialeto, 2012. Enviado pela escritora.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing
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