quarta-feira, 11 de dezembro de 2024

Vereda da Poesia = 175


Trova de
NERO DE ALMEIDA SENNA 
Jequitinhonha/MG (1874 – ????)

Muito esquisito eu acho
teus vestidos, minha prima:
são altos demais embaixo,
e baixos demais em cima…
= = = = = =

Poema de
CARLOS FERNANDO BONDOSO
Alcochete/Portugal

Um barco que nunca mais ancorou

vejo em ti a simbiose
do amor e da luz
da beleza
da valsa e do bolero
dançado
perto do vazio
é este silêncio
que me diz à consciência
que as danças
têm o brilho intenso
das almas
ó bolero ó valsa 
danças da minha infância
tenho como testemunho
o tempero do tempo
que marcou
e deixou traços
num barco que nunca mais ancorou
= = = = = = 

Trova de
SUELY BRAGA
Osório/RS

Muitas rosas só não falam...
Não nos ferem com espinhos,
 um doce perfume exalam
e nos cobrem de carinhos.
= = = = = = 

Poema de
ALBANO NEVES E SOUSA
Matozinhos/Portugal, 1921 – 1995, Salvador/Brasil

Angolano

Ser angolano é meu fado, é meu castigo
Branco eu sou e pois já não consigo
mudar jamais de cor ou condição...
Mas, será que tem cor o coração?

Ser africano não é questão de cor
é sentimento, vocação, talvez amor.
Não é questão nem mesmo de bandeiras
de língua, de costumes ou maneiras...

A questão é de dentro, é sentimento
e nas parecenças de outras terras
longe das disputas e das guerras
encontro na distância esquecimento!
= = = = = = 

Trova de
ANTONIO MARTINS
Piranguçu/MG

Nasci pobre e, na pobreza,
desconheci a abastança...
Mas sempre tive a riqueza
de possuir a esperança.
= = = = = = 

Poema de
CÉSAR DÁVILA ANDRADE
Cuenca/Equador, 1918 – 1967, Caracas/Venezuela

    Em Que Lugar

    Quero que me digas; de qualquer
    modo deves dizer-me,
    indicar-me. Seguirei teu dedo, ou
    a pedra que lances
    fazendo flamejar, em ângulo teu braço.

    Além, atrás dos fornos de queimar a cal,
ou mais além ainda,
além das valas onde
se acumulam as coroas alquímicas de Urano
e o ar chia como gengibre
deve estar Aquele.

    Tens que me indicar o lugar
    ainda antes que este dia se coagule.

    Aquele deve conter o eco
envolto em si mesmo,
    como uma pedra no interior de um pêssego.

    Tens que indicar-me, Tu,
    que repousas bem mais além da Fé
e até da Matemática.

    Poderei segui-lo no ruído que passa
e se detém
subitamente
    na orelha de papel?

    Por acaso ele está nesse sítio de trevas,
sob as camas,
onde se reúnem
    todos os sapatos deste mundo?  

(Tradução de José Jeronymo Rivera)
= = = = = = = = = 

Trova de
PROFESSOR GARCIA
Caicó/RN

Distante dos teus afagos,
nesta inquieta nostalgia,
meus olhos formam dois lagos
que me afogam todo dia!
= = = = = = 

Soneto de
CESÁRIO VERDE 
Lisboa/Portugal 1855 — 1886

Manias!

O mundo é velha cena ensanguentada,
Coberta de remendos, picaresca;
A vida é chula farsa assobiada,
Ou selvagem tragédia romanesca.

Eu sei um bom rapaz, - hoje uma ossada, -
Que amava certa dama pedantesca,
Perversíssima, esquálida e chagada,
Mas cheia de jactância quixotesca.

Aos domingos a deia já rugosa,
Concedia-lhe o braço, com preguiça,
E o dengue, em atitude receosa,

Na sujeição canina mais submissa,
Levava na tremente mão nervosa,
O livro com que a amante ia ouvir missa!
= = = = = = 

Trova Humorística de 
WANDA DE PAULA MOURTHÉ
Belo Horizonte/MG

– O meu marido é carteiro;
porém bem cedo aprendeu
que, no lar, o tempo inteiro,
quem dá as cartas sou eu!
= = = = = = 

Poema de 
CRISTOVAM PAVIA
(Francisco António Lahmeyer Flores Bugalho)
Lisboa/Portugal 1933 – 1968

“Na noite da minha morte”

Na noite da minha morte
Tudo voltará silenciosamente ao encanto antigo...
E os campos libertos enfim da sua mágoa
Serão tão surdos como o menino acabado de esquecer.

 Na noite da minha morte
Ninguém sentirá o encanto antigo
Que voltou e anda no ar como um perfume...
Há de haver velas pela casa
E xales negros e um silêncio que eu
Poderia entender.

 Mãe: talvez os teus olhos cansados de chorar
Vejam subitamente...
Talvez os teus ouvidos, só eles ouçam, no silêncio da casa velando,
E mesmo que não saibas de onde vem nem porque vem
Talvez só tu a não esqueças.
= = = = = = 

Trova de
ZAÉ JÚNIOR
Botucatu/SP, 1929 – 2020, São Paulo/SP

Sem querer quebrei o mundo,
que havia em teu coração;
mas, se o remorso dói fundo,
dói mais fundo o teu perdão!
= = = = = = 

Hino de
XEXÉU/ PE

Quem te vê, entre montes, surgindo
E teus raios tocando o véu
Não imagina que é o brio refulgente
Da estrela chamada Xexéu.

Uma pátria de berço heroico
De guerreiros, de paz e brandura
Essa luz te faz na alvorada
Como águia voando às alturas.

Meu Xexéu, no voo majestoso
Desafio não é uma quimera
Se há batalha me inscreve à luta
Que a vitória sorrindo te espera.

Elevamos a alma aos céus
Gratidão, com respeito e louvor
Que a bandeira hasteiem da paz
Da justiça, da crença, do amor.

Nossa gente feliz já na praça
Festejando emancipação
Seja sempre sagrado e suave
O teu canto de paz e união
= = = = = = 

Trova Premiada de
RITA MARCIANO MOURÃO 
Ribeirão Preto/SP

Não me curvo ante o fracasso
nem lamento as busca mortas,
na coragem dos meus passos
trago as chaves de outras portas.
= = = = = = 

Poema de
ANA PAULA LAVADO
Angola

Nenhum Verso…

Nenhum verso fala de mim
nem do que eu penso
nem do que eu sinto
nem do que eu sou.

Na realidade,
as palavras são apenas
um jogo de letras
mais ou menos cinzelado
ao gosto de cada um.
E poucos, muito poucos
fazem delas seres vivos e humanos.

Eu não lhes dou vida.
Trabalho-as com mais ou menos nexo
ou talvez sem nexo,
porque dele não sinto falta
nem faz falta o que sou!
= = = = = = = = =  

Trova de
ADERBAL MELO
Recife/PE, 1910 – 1931

Por mais que eu viva desperto,
meu porvir não descortino;
o destino é tão incerto,
que também não tem destino.
= = = = = = = = = 

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