quarta-feira, 14 de agosto de 2019

Antonio Carlos de Barros (Tropeiro de Sorocaba)


Salve todos os tropeiros,
protagonistas da história,
foram valentes pioneiros
incrustados na memória.
José Feldman


Tropeiro é o condutor de tropas, do gado vacum, cavalares ou muares. É a pessoa que se ocupa em comprar ou vender as tropas, ou a que ajuda a conduzir a tropa, seja ela xucra ou arreada (cargueira).

O escritor Sorocabano Francisco Luiz D’Abreu Medeiros, descreveu com muita propriedade o que foi a epopeia das tropas, como era a vida de Tropeiro.

Romper sertões extensos, só habitados por indígenas e feras bravias, penetrar até os mais recônditos lugares do Rio Grande do Sul, e, se necessário, transpor os limites da Província, ir até os castelhanos em busca da melhor fazenda e de negócio mais vantajoso; voltar debaixo de rigoroso sol e copiosas chuvas, com uma tropa de quinhentas, oitocentas ou mil bestas; correr a extensão dos campos, penetrar pelas espessas matas após aqueles animais que fogem da ronda, que se extraviam continuamente, e que, por um pequeno descuido, se entreveram com tropas de outros donos, atravessar com grande risco de vida os rios caudalosos que cortam as estradas, comer ao romper do dia e à noite o mal cozido feijão de caldeirão e o velho churrasco; ver-se obrigado por diversos motivos dormir ao relento, sem outro teto mais que a abobada celeste, estendido à beira de um arroio, sobre um chão duro, apenas forrado do xergão* e da carona*, repassadas de suor do matungo* lerdo e cansado, tendo por travesseiro o lombilho*, único arrimo que se conhece por esses despovoados para amparar a cabeça e um pobre corpo alquebrado pelas fadigas do dia.

Uma Quadrinha popular da época definia muito bem o que era a vida de Tropeiro:

“Triste vida a do tropeiro
que nem pode namorar.
De dia – reponta* o gado,
de noite – toca a rondar*”.

Já o poeta José Barros Vasconcellos, em sua obra, Rodeio Emotivo, nos conta:

“Não se perturba nem teme
A chuva, o frio, a geada,
Que são ônus da tropeada,
No cavalgar cotidiano,
O tropeiro é um bravo, um forte
Que enfrenta tranquilo a sorte
E no pampa é soberano”.

E o grande poeta Guilherme Schultz Filho, em sua obra Galponeiras, com saudade recorda:

“Relembro os velhos tropeiros
Da legendária Laguna
Rasgando a pampa reiúna* 
das extensões infinitas,
onde ficaram escritas
tantas páginas de glória,
que ainda refulgem na história
destas paragens benditas”.

Biriva, Beriba ou Beriva era esse o nome dado aos habitantes de Cima da Serra, descendentes de Bandeirantes, ou aos Tropeiros Paulistas, os quais geralmente andavam em mulas e tinham um sotaque especial diferente do da Fronteira ou da Região Sul do Estado.

Dos muitos Festivais de músicas do Rio Grande do Sul, destaco a cidade de Carazinho, onde lá acontece a SEARA DA CANÇÃO, Festival Nativista. O poeta, autor de grandes sucessos no Rio Grande do Sul, Aírton Pimentel, compôs a Canção BIRIVAS e deu para o jovem RUI DA SILVA LEONHARDT, defendê-la nesse Festival. O resultado foi esplendoroso, a música Birivas foi a grande vencedora do festival Seara da Canção Gaúcha, isso em 1982. O sucesso foi enorme e, como ninguém sabia pronunciar o nome Alemão do Rui, ele ficou sendo chamado e conhecido por todos como RUI BIRIVA, e até hoje, mesmo depois do seu prematuro falecimento, é chamado de RUI BIRIVA.

Letra da música Birivas**

Descendo a serra
Pra subir na vida
Abrindo estrada
Cheio de bruacas*
Tropeando mulas para Sorocaba
E semeando por onde passam
Versos, violas, chulas e guaiacas*
Chegando a alma do vale das antas
Domam feras de rio de corredeiras
Rasgam picadas* pra juntar lonjuras
E muitas das cidades do presente
Vem dos pousos birivas o tropeiro
Vem dos pousos birivas o tropeiro

Daqui miles e mulas para feira
De lá mascatarias regionais
Juntando o norte e o sul num vai e vem
Sem saber de que fato ele, o tropeiro
Intercambiava traços culturais
Por isso é que o biriva não morreu
Mudou foi seu produto de tropear
O tropeiro está vivo em todo aquele
Que traz ideias boas ao Rio-grande
E ideias também sabe levar.

Encerro este texto, prometendo escrever mais, pois o tema é de fundamental importância para nossa amada Sorocaba Tropeira, e também para o Rio Grande do Sul, com este verso do escritor amigo, poeta, Mário Mattos:

“Sou Tropeiro Nativista
Da Sorocaba Paulista
Igual a tu meu irmão
Carrego comigo a herança
O que aprendi desde a infância
Nas grandes Feiras da Integração”.
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* GLOSSÁRIO:
Bruacas – espécie de mala de couro cru, com alças laterais, apropriada para ser conduzida em lombo de animal, pendurada à cangalha, uma de cada lado.
Cangalha – peça do arreamento do animal de carga, constante de uma armação de madeira acolchoada.
Carona – peça dos arreios, constituída de couro, de forma retangular, composta de duas partes iguais cosidas entre si, em um dos lados, a qual é colocada por cima do baixeiro, xergão ou xerga.
Guaiacas – cinto largo de couro macio, às vezes com porte de armas e para guardar dinheiro e pequenos objetos.
Lombilho – é uma espécie de sela, usada no Rio Grande do Sul.
Matungo – cavalo velho, ruim, imprestável.
Picadas – caminhos geralmente estreitos, que se faz no mato, para transito de cavaleiros.
Reiúna – animal reiúno é aquele que pertence à Nação ou ao Estado e tem, para distingui-lo dos demais, a ponta de uma das orelhas, em geral da direita, cortada.
Reponta – tocar o gado por diante, de um lugar para outro.
Rondar – vigiar os animais nos pousos.
Xerga – tecido de lã grossa, que se coloca no lombo do animal.
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** Nota do Blog:
A música Birivas, interpretada pelo próprio Rui Biriva está disponível no youtube em: https://www.youtube.com/watch?v=dcuKvS9yIGY
 
Fonte:
Texto enviado pelo autor

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