A cortina do meu quarto, contrariando a dos palcos teatrais, fecha-se nos finais de semana, fruto de um acordo matrimonial. Mesmo sem ser chocalhado pelo brilho matinal de um novo dia, no domingo, levanto-me cedo, procurando aproveitar os três turnos a que tenho direito.
Por ser um dia de graça, pela manhã engraço-me com meus escritos. À tarde, tenho as graças afetuosas do meu pai que, revestido dos seus 93 anos, alterna situações avoengas e atuais, num tempero de realidade e fantasia, No turno terceiro, dou graças por estar junto da família "au complet", quando os sentimentos paternais sorriem de contentamento e os filiais vão além dos carinhos.
Domingo é dia de graça, sim, quando meu time do coração joga e vence. Enche-se de mais graça quando é feriado na segunda. Torna-se malvado, querendo voltar o tempo e mexer com meu passado envelhecido, quando ia para a missa na Igreja das Missionárias e rezava para encontrar-me com a menina que eu namorava e ela nem sabia. Malvado por mexer com meu passado de um dia desses, quando deixava meu lar ainda em sossego e me dirigia para o plantão do IJF (Instituto José Frota). Ah! Domingo, lindo dia...
Já não me lembro do último domingo que fui à praia, embora ela fique no meu quintal, posto que, sou morador do Mucuripe. O prazer de saborear caranguejo, esquartejando-o num ritual quase macabro, são páginas passadas das minhas manhãs dominicais. Baco ausentou-se do meu Panteão por estar de férias, talvez...
Antes que o esfaimado cuco anuncie a hora do almoço, acelero o passo da imaginação para terminar meu escrito em tempo e curtir uma merecida sesta que se nega para mim no decorrer da semana.
Domingo, o dia do sol dos pagãos, o mesmo sol do qual me escondo por detrás de uma cortina. Sempre aos domingos.
Fonte:
Livro enviado pelo autor.
Francisco José Pessoa de Andrade Reis. Isso é coisa do Pessoa: em prosa e verso. Fortaleza/CE: Íris, 2013.
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