quarta-feira, 21 de agosto de 2019

Elisa Alderani (Jardim de Versos) I


BEIJA-FLOR

Bom dia, meu amigo beija-flor,
Você não acha que está atrasado?
São quase onze horas,
As flores das minhas jardineiras,
Há muito tempo estão à sua espera.
O sol já está alto no céu
A atmosfera preencheu-se de calor.
O barulho do trânsito não vai atrapalhar o seu revoar?
De frente à minha janela vibram suas pequenas asas.
Você chegou! Tão pequeno e tão gracioso
Veio me visitar,
Qual noticia vai me dar?
Eu, nada tenho para contar:
O ontem como o hoje, é igual.
Talvez você more longe,
Do seu reino encantado
Traga notícia alegre,
Com minha fantasia queira adivinhar;
A certeza da sua liberdade, não é segredo...
Você passa de flor em flor, de cor em cor.
Colhendo amor!
Parado no ar, já sei, vai dizer:
Não está sozinha.
Eu estou aqui.

CAMINHO DO ARCO-ÍRIS

Deixo o afã do meu dia,
Procuro serenidade olhando o céu.
A tempestade passou.
Surpreende-me o arco-íris coroando a Terra.
Uma gota de chuva,
Brilha sobre a pétala de uma flor,
Reflete minha imagem,
No meu vulto cansado, linhas profundas.
Tramas de uma história
Cujo enredo continua confuso.
Ficam sonhos vazios.
Lentamente o olhar segue o caminho do arco-íris
Que se arrasta até o horizonte
Pincelando lembranças.
Neste percurso recolho flores,
Enfeito com seus aromas os pensamentos.
O sol fulgurante transforma minhas lágrimas
Nas cores do arco-íris traçado no tempo sereno.
Neste encontro entre terra e céu,
Abraço o profundo silêncio.

GRADES

Piscam no ar parado os vaga-lumes,
São minhas palavras sem voz,
Sem rumo, sem sentido.
Nem uma estrela aparece
No preto veludo do céu.
Nem a lua aponta no horizonte.
No silêncio da casa,
Quebrado pelo chiado do velho ventilador
As horas avançam preguiçosas.
O cansaço mistura-se com sutil melancolia.
Pálpebras pesadas caem sobre o livro aberto.
Grades enferrujadas pelas intempéries da vida.
Falta só um capítulo.
Fim!

MÃOS

Mãos sobrepostas,
Mãos fechadas,
Mãos abertas,
Mãos entrelaçadas,
Dedos abertos, fechados,
Curvados...
Mãos que falam,
Mãos que produzem.

Mãos lindas,
Mãos carinhosas,
Mãos audaciosas,
Mãos calosas,
Todas são obras de arte.

Esculpidas pelo Artista da vida
Todas elas são diferentes,
Obras primas...
Clones? Nem pensar!
Todas têm digitais exclusivas...
Os cientistas... Podem pensar pesquisar...
Mas, jamais obras vivas irão criar!

PRAIA DESERTA

Quando o deserto da solidão me invade
Os pensamentos vagam como nuvens
Empoeiradas pelas lembranças…

Perdidos, na areia branca da praia,
Milhões de porquês
Enchem todo o vazio.

No vai e vem das ondas
Voltam às emoções perdidas...
Sem respostas
Pelo amanhã da vida!

RAÍZES

No coração da casa
Temos muitas coisas estranhamente guardadas.
Este fato é tão comum, não assusta, é só curioso.
Encontrar nas gavetas refugos de um tempo passado.
Fotografias amareladas, roupas desbotadas.
Agendas com páginas brancas...
Será que perdemos este dia,
Ou esquecemos de vivê-lo?
Lembranças são parasitas
Sugam o presente, como orquídeas perfumadas,
Ornam os galhos ressequidos.
Grudadas, na alheia árvore hospedeira,
Que afunda suas raízes...
Na escuridão da terra endurecida
Procura o sumo
Para concluir o ciclo inacabado.
Da vida.

SOMBRAS E LUZES

Quem acaricia os galhos da árvore?
Será o vento?
Ou serão os galhos que acariciam o vento?
Sonhos e realidade!
Serão os sonhos que acariciam a realidade?
Ou a realidade que acaricia os sonhos?
A árvore não sabe responder,
Ela continua firme. Suas raízes são profundas.
Ergue-se para o céu sem medo.
O cume frondoso balança sem barulho.
Encantada, descrevo este lindo cenário.
Meus pensamentos ascendem,
Chegam até o mais alto galho.
Não os deixo desabar como folhas amareladas.
Por trás da árvore, o céu está cinzento.
Nuvens escuras ameaçam chuva...
Logo cairá a noite.
As cortinas de veludo pretas
Fecham-se frente á plateia.

Fonte:
Livro enviado pela autora.
Elisa Alderani. Flores do meu jardim – Fiori del mio giardino. Edição bilíngue. Ribeirão Preto/SP: Legis Summa, 2008.

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