sexta-feira, 21 de janeiro de 2022

José Fausto Toloy (O taxista e as cartas de amor)


“Todas as cartas de amor são ridículas,
não seriam cartas de amor
se não fossem ridículas”
- Fernando Pessoa


Ponto de táxi da rodoviária de cidade do interior do Paraná. Do ônibus desce um senhor comum até com ar respeitável de bom caráter.

— O senhor pode me levar neste endereço?

— Sim, sou o primeiro da fila, mas se quiser escolher um carro melhor, mais novo...

— Não, não, o seu está ótimo, cheguei de viagem de longe e estou muito cansado, será apenas uma visita...

— Aqui está , rua Porto Alegre,1086, dizia perto de um bosque.

— Esta rua agora mudou o nome. É Theobaldo Blume, nome de padre falecido num acidente!

— Vou enfim conhecer alguém muito especial e estou ansioso...

— É a primeira vez no Paraná?

— Sim, mas vou conhecer minha musa, que escreve cartas maravilhosas, sensível, uma mulher encantadora que todo homem sonha amar.

– Sei, sei, que ânimo, hein! — retruca José e olha desconfiado pelo retrovisor do Ford Corcel Del Rey.

Chegando ao endereço, o carro para a alguns metros do portão da casa de alvenaria, com enfeites de pedra São Tomé e jardim bem cuidado.

— Tá bom aqui, assim pode ter privacidade!

— Tá ótimo, meu bom homem, já volto!

Depois de apertar a campainha uma senhora, tipo idade da loba, questiona:

— Pois não! Seja breve, porque estou com bolo no forno, sim!

— Você é Sandra dos Santos?

— Sim, sou eu e o senhor que deseja?

—Vendedor de Enciclopédia Barsa...

– Não interessa… filhos já crescidos.

– Mas gosta de poesia e curte Drummond?

– Não leio muito!

Olha a mulher do semblante aos pés e dá desenxabido tchauzinho, depois esbaforido, corre de volta para o táxi ofegante:

– Vamos, vamos, taxista, de volta para a Rodoviária que quero pegar o próximo ônibus de volta pra São Paulo, nesta cidade maldita jamais colocarei os pés...

— Mas, o senhor conhece essa senhora?

— Não! Nunca tinha visto antes! Achei que fosse, pelas cartas, moça romântica e linda, que citava Drummond, Vinicius, Pessoa e...

— Quem são essas pessoas?

– Poetas, claro, já que vi que é ignaro em cultura, semi analfabeto também?

– Não precisa ofender, senão te largo na rua, seu frustrado!

Segue silêncio entre os dois homens.

– Ei, moço , estaciona naquela esquina que vou espairecer um pouco. Que droga!

Saiu correndo desesperado e entrou no bosque! Esqueceu o bauzinho no banco! Será que errei o endereço e não era a pessoa que procurava...

Ao abrir o baúzinho José encontra as cartas de amor e começa a ler…
= = = = = = = = = = = = = = = = = =

Conto integrante do livro Andanças pelo Mundo da Palavra (Prelo em Amazon books)

Fonte:
Texto enviado pelo autor.

Nenhum comentário: