quarta-feira, 21 de abril de 2021

Luís da Câmara Cascudo (Romãozinho)


Folclore do Centro-Oeste

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Filho de negro trabalhador, Romãozinho nasceu vadio e malcriado. Tinha todos os dentes, fisionomia fechada, hábitos errantes, nenhuma bondade no coração. Divertimento era maltratar animais e destruir plantas.

Menino absolutamente perverso.

Um meio-dia, a mãe mandou-o levar o almoço ao pai, que trabalhava num roçado, distante de casa.

Romãozinho foi, de má vontade.

No caminho, parou, abriu a cesta, comeu a galinha inteira, juntou os ossos, recolocou-os na toalhinha, e foi entregar ao pai.

Quando o velho deparou com ossos em vez de comida, perguntou que brincadeira sem graça era aquela.

Romãozinho pretendeu vingar-se da mãe, que ficara fiando algodão no alpendre da casinha:

- É o que me deram... Minha mãe comeu a galinha com um homem que aparece lá em casa quando o senhor não está por perto. Pegaram os ossos e disseram que trouxesse. Eu trouxe. É isso aí...

O negro meteu a enxada na terra, largou o serviço e veio correndo. Encontrou a mulher fiando, curvada, absorvida na tarefa. Dando crédito ao que lhe dissera o filho, puxou a faca e matou-a.

Morrendo, a velha amaldiçoou o filho, que estava rindo:

- Não morrerás nunca. Não conhecerás o céu, nem o inferno, nem o descanso enquanto o mundo for mundo...

Faz muito tempo que este caso sucedeu em Goiás.

O moleque ainda está vivo e do mesmo tamanho; anda por todas as estradas, fazendo o que não presta; quebra telhas a pedradas, espalha animais, assombra gente, tira galinha do choco, desnorteia quem viaja, espalhando um medo sem forma e sem nome; é pequeno, preto, risão, sem ter fé nem juízo.

Homens sérios têm visto Romãozinho.

Furtou uma moça na chapada de Veadeiros; conversou com o coletor de Cavalcanti; virou fogo azul, indo-e-vindo na estrada, perto de Porto
Nacional.

Não morrerá nunca enquanto uma pessoa humana existir no mundo. E, como levantou falso testemunho contra sua própria mãe, nem mesmo no inferno haverá lugar para ele.

Fonte:
Luís da Câmara Cascudo. Lendas brasileiras para jovens. 
Projeto Livro para Todos.

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