- Estamos aqui sentados debaixo da árvore sagrada do seu quintal. Pode-me dizer qual o nome dessa árvore?
- Porquê?
- Porque gosto de conhecer os nomes das árvores.
- O senhor devia saber é o nome que a árvore lhe dá a si.
- Depois de tanta guerra: como vos sobreviveu a esperança?
- Mastigámo-la.
- E que aconteceu com as casas?
- As casas foram fumadas pela terra. Com tanta maldição só faltava a cobra ser canhota. Agora só me entristece a recordação. A lembrança do cajueiro me faz crescer cheiros nos olhos.
- E estes campos tradicionalmente vossos, foram-vos retirados?
- Sim. Nós ficamos só com o descampado. Agora somos descamponeses.
- E bichos, ainda há aqui bichos?
- Agora, aqui só há inorganismos. Só mais adiante, no mato é que abundam.
- Nós ainda ontem vimos flamingos...
- Esses se inflamam no crepúsculo: são os inflamingos.
- E outras aves da região, pode falar delas?
- Antes de haver deserto, a avestruz voava de galho em flor. Se chamava de arvorestruz. Mas há outras que necessitam de revisão. Exemplo do beija-flor. Beija-flor é nome que aqui deve ser consertado. A flor é que levaria título de beija-pássaro.
- Mas outros animais não há?
A bicharia vai acabando. O mabeco, dito cão-selvagem, vai sofrendo as humanas selvagerias. Acabada a lição, ele saberá não existir.
- Parece desiludido com os homens.
- O vaticínio da toupeira é que tem razão. Um dia, os bichos restantes lhe farão companhia em suas subterraneidades. Eu acredito é na sabedoria do que não existe. Afinal, nem tudo que tem luz é besouro. É o caso do pirilampo. Pirilampo morre? ou funde? Suas réstias mortais aumentam o escuro. Limpo é o pássaro que não evacua no céu.
- Acredita em ensinamento de bichos?
- Todo caranguejo é um engenheiro de buracos. Ele sabe tudo de nada. Há outros, demais. O mais idoso é o escaravelhinho. Mas, de todos, quem anda de janela é o cágado.
- Você não sofre um certo isolamento?
- Sou homem abastecido de solidões. Uns me chamam bicho do mato. Em vez de me diminuir, eu me incho com tal distinção. Como antes disse, a gente aprende do bicho a não desperdiçar. Como a vespa que do cuspe faz a casa.
- Mas a sua mulher lhe faz companhia...
- Ela é a minha patroa. Vez em quando a gente dedilha umas conversas.
– Uma última mensagem.
- Não sei. Feliz é a vaca que não pressente que, um dia, vai ser sapato.
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