Dirigida pelo argentino Néstor Monasterio, radicado em Porto Alegre, Bella Ciao é uma das mais premiadas montagens do teatro gaúcho. O texto do dramaturgo paulista Luís Alberto de Abreu mostra a saga de uma família de imigrantes italianos, no decorrer de quase 40 anos, desde sua chegada ao Brasil até a luta pela democratização do país no período do Estado Novo.
A história, centrada na figura do patriarca Giovanni Baracheta, interpretado por Carlos Cunha Filho, além de traçar um painel político e comportamental do período, mostra os dilemas da família, com base no conflito de opiniões entre o pai anarquista, o filho que adere ao comunismo e a jovem que renega o namorado por causa de sua militância revolucionária.
Monasterio, responsável também pela elogiada montagem gaúcha de Rasga Coração, de Oduvaldo Vianna Filho, em 1984, explica em entrevista, a escolha do texto: "Bella Ciao juntava tudo o que eu penso sobre teatro. É um texto generoso, saboroso, brilhante. Tem um motivo muito forte de estar ali. Vai recuperando a dignidade do ser humano. Vai dizendo o que é um ser humano que luta, que não desiste nunca. Que tem uma ideia".[1]
O elenco ensaia durante um ano e estreia no Centro de Cultura de Novo Hamburgo, em abril de 1989. A seguir faz uma temporada na região da Serra Gaúcha, fortemente marcada pela colonização italiana. Só então inicia sua temporada no Teatro Renascença, em Porto Alegre.
Apesar de cobrirem um longo período de tempo, as sessenta cenas que compõem o espetáculo se sucedem sem o recurso do black out. Um grande painel serve de cenário único em que os ambientes e a dramaticidade das cenas são sublinhados pelo jogo de luzes, especialmente em lilás e vermelho. Nas cenas iniciais, em que a família Baracheta deixa sua terra rumo ao Brasil, os atores falam em italiano. "No entanto, as dificuldades de compreensão idiomática são compensadas pela boa performance dos atores que, com gestos e expressões peculiares ao comportamento latino, estabelecem uma eficiente comunicação com a plateia. Além disso, à medida que transcorre a ação, os personagens vão mesclando os idiomas, permitindo maior clareza no entendimento do texto",[2] observa a crítica Maria Luiza Khaled, no Jornal do Comércio.
O espetáculo cai no gosto do público e da crítica, a ponto de permanecer dois anos em cartaz e viajar por outros estados e pelo interior do Rio Grande do Sul. Para o crítico Cláudio Heemann, "com o pitoresco linguajar italiano e as explosões temperamentais de latinidade, o texto encontra humor para desenhar seus personagens. Produz efeito do realismo e humanidade sem deixar esquecido o painel e retrato coletivo".[3] O crítico Décio Presser destaca que "o quarteto central, responsável pelos elementos da família, coloca uma sinceridade nos personagens que torna-se difícil ao espectador não ser envolvido pelas emoções".[4]
Bella Ciao recebe o Prêmio Açorianos de melhor espetáculo, diretor, trilha sonora original, para Néstor Monasterio e Paulo Campos; atriz, para Lurdes Eloy; atriz coadjuvante, para Heloísa Palaoro; e ator coadjuvante, para Fernando Waschburger. Ganha, ainda, o Prêmio Quero-Quero de melhor espetáculo e direção; ator, para Carlos Cunha Filho; e atriz, para Lurdes Eloy. A peça é premiada também no Festival de São José do Rio Preto, São Paulo, nas categorias de melhor espetáculo, direção, ator, atriz coadjuvante e ator coadjuvante.
Notas
1. ALABARSE, Luciano (Org.). Alguns diretores & muita conversa: entrevistas com diretores de teatro que trabalham em Porto Alegre. Porto Alegre: SMC, 2000.
2. KHALED, Maria Luiza. Com tempero latino. Jornal do Comércio, 26 jun. 1989.
3. HEEMANN, Cláudio. Bella Ciao. Zero Hora, Porto Alegre, 6 jun. 1979.
4. PRESSER, Décio. Jornal da Paraíba, 1991.
Fonte:
Nenhum comentário:
Postar um comentário