A GENTE NUNCA SE LEMBRA
A gente nunca se lembra
que sempre nos ronda a Morte...
E não há coisa mais certa
escrita na nossa Sorte…
Na mais profunda alegria
ou na tristeza mais forte,
— ela nunca escolhe o dia —
sorrateira vem a Morte...
Quem está hoje conosco,
amanhã vemos morrer;
mas pensamos que tal coisa
não nos pode acontecer...
E sempre estamos sonhando
em nossa vida futura,
projetos, sonhos, que vão
depois para sepultura...
Um atravessar de rua…
Uma só bala perdida...
Toda vida — a minha, a sua,
por um só fio é mantida...
E a gente nunca se lembra,
que sempre nos ronda a Morte,
E não há coisa mais certa
escrita na nossa Sorte…
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CONTRIÇÃO
Eu, pecador, humilde e arrependido,
venho até Vós, Senhor, me confessar,
de todo e qualquer passo em mau sentido,
de todo gesto mau ou mal pensar.
Pesa-me Deus por ter-Vos ofendido,
por Pensamento, um gesto ou um olhar...
E pela Vossa Graça socorrido,
proponho para sempre me emendar!
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RENÚNCIA
Ela voltou de novo, e de surpresa,
reabrindo-me curadas cicatrizes…
Pois terei de mostrar igual frieza,
dos dias que fomos tão felizes...
Outrora eu demonstrava indiferença,
por julgar tudo apenas amizade...
Ela partiu... e eu vi então que imensa,
quão desoladora era a Saudade!
…E o Destino mudou a nossa vida...
E ela sofreu como também sofri!
E tendo o corpo e alma combalida,
que a amava como um louco então senti!
Ela porém pode perceber,
que grande mal eu trago dentro em mim…
E eu não tenho coragem de dizer
e confessar-lhe meu tristonho fim...
... E assim eu duplamente castigado,
me agiganto nas grades dessa Dor:
— A morte pela Vida condenado!
Condenado à renúncia de um amor!…
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SÚPLICA
À tia Nônô, minha enfermeira
Eu sou Moço, Senhor, e adoro a Vida !
E por isso, minh'alma agora inquieta,
envia aos Céus esta oração sentida...
Aflita e humilde prece de um poeta...
Sim... sou bem moço ainda, meu Senhor;
eu ia entrar em plena Primavera!
— Vinte e um anos — é como que uma flor
que sonha... mas ser fruto ainda espera...
Quanta coisa, meu Deus, eu esperava:
Ser bem rico, bem culto, bem atleta...
— Em amor, não... eu nem sequer pensava!
E nem sequer pensava em ser poeta...
Mas a Vida é volúvel como o vento,
e como o vento, arrasador, medonho,
ela arrasa, destrói, num só momento,
o mais prudente arquitetado sonho...
E estou agora assim; triste e doente...
(Eu que fui tão feliz, alegre e forte!)
pedindo a VÓS, Senhor, humildemente,
que me livreis, desta sentença: a Morte...
Pois eu sou Moço, Senhor, e adoro a Vida!
(Eu a quero volúvel mesmo assim...)
Como eu sofro ao pensar na despedida!
Quanta angústia ao sentir que vem o Fim!...
E morrendo... morrendo... lentamente...
Que cruel sina, meu Deus! Que triste fado!
Lá fora a Vida a gargalhar contente,
e eu tão triste, aqui dentro, neste estado. . .
Eu sou Moço, Senhor, e adoro a Vida!…
E por isso, minh’alma agora inquieta,
envia aos Céus esta oração sentida...
Aflita e humilde prece de um poeta...
Fonte:
Luiz Otávio. Um coração em ternura…: poesias. RJ: Irmãos Pongetti, 1947.
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