quarta-feira, 25 de janeiro de 2023

Leandro Bertoldo Silva (Quem são os seus heróis?)


Ponte entre tempos...
Mundos que se completam...
Quem sou eu agora?


É comum termos personagens que marcam ou marcaram nossas vidas. Quem nunca se imaginou sobrevoar os arranha-céus das cidades como o Super-Homem, ou subir pelas paredes como o Homem-Aranha e até combater o crime ao usar um laço mágico como a Mulher-Maravilha? Eu também tenho os meus personagens, mas nenhum, por mais poderes existentes, me falou tão profundamente quanto um específico, e olha só: nem poder ele possui, a não ser sua inteligência… Engana-se quem pensou em Batman! O meu herói, sim, pois acabou por se transformar em um herói para mim, não era bravo, valente, nunca salvou ninguém de perigos, a não ser a mim, salvo do não saber das coisas, do não gostar de ler, de não conhecer histórias e mitologias, filosofias e inventores. O meu personagem é, e sempre foi um sábio sabugo de milho feito pelas mãos talentosas e generosas de Tia Nastácia, colhido em um milharal no Sítio do Picapau Amarelo: Visconde de Sabugosa.

Desde criança, Visconde povoa meu coração de sonhos e viagens inesquecíveis. Quantas vezes fui à lua em um foguete, ajudei Teseu a vencer o Minotauro e quase morri de susto ao ficar a poucos centímetros da boca do Boitatá! Sim, vivia as aventuras do Sítio como se fossem minhas e, embora admirado com a coragem de Pedrinho e sua música que me fazia chorar, como faz até hoje — ela, inclusive, foi o toque do meu celular por muito tempo —, diferente da maioria dos meninos da minha idade, era o Visconde que eu queria ser. Na minha imaginação, passava horas na biblioteca e os meus poucos livros reais se transformavam nas enciclopédias e compêndios lidos e estudados pelo sábio sabugo. Os pregadores de roupa da minha mãe se transformavam em máquinas e equipamentos moderníssimos capazes de nos transportar pelo tempo. Tampinhas de garrafa, alfinetes, papéis laminados de bombom, potes de vidro, tudo eu levava para o meu quarto, ou melhor, para o meu laboratório, e ficava lá inventando coisas. Afinal, eu era o Visconde!

Esse personagem vai além de um gosto de criança, de uma simpatia infantil que depois que a gente cresce desaparece. Visconde permanece em mim como uma entidade real, lúcida. Em todos os momentos da minha vida ele esteve presente, e sempre da melhor forma, silencioso, introspectivo, cúmplice… Poucas pessoas sabem disso (até agora). Até na minha história do pé de ameixa contada aos quatro cantos, Visconde estava lá. Era nele que eu me transformava ao subir na árvore e fazer de seus galhos as estantes dos meus livros. Hoje tenho uma filha já moça, e é uma das poucas a saber da minha “identidade secreta”… Ela faz os meus sonhos permanecerem acordados. Sou muito grato, pois, apesar dos tempos modernos, ela permitiu que eu a apresentasse ao meu mundo, às minhas aventuras e, além de conhecê-las, entrou nelas, compactuou com meus personagens, estendeu-lhes a mão e acolheu-os em seu coração. Não tenho dúvidas! Yasmin é uma daquelas princesas contadas pela Dona Benta e fazia com que eu, Visconde, pesquisasse a respeito nos livros de história. Mas me faltava uma coisa: faltava, além de ser o Visconde por dentro, ser também o Visconde por fora, deixá-lo se mostrar em mim assim como eu sempre me mostrei nele. E mais uma vez, foi ela, minha filha, a responsável por isso. Em seu aniversário de 11 anos onde todos podiam se fantasiar de alguma coisa, resolvi fazer o contrário; quando todos colocaram suas máscaras, resolvi tirar a minha…

O difícil foi, depois da festa, voltar à fantasia da vida. Mas qualquer dia eu volto à realidade. Obrigado, Visconde, por termos sido um só. Vamos às nossas aventuras. Elas ainda não acabaram.

Fonte:
Texto e imagem enviados pelo autor, disponível em http://arvoredasletras.com.br 

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