domingo, 15 de janeiro de 2023

George Abrão (Folguedos e sabores da infância: gosto de saudade)


A velha Rua do Comércio (hoje tem outro nome), na Cidade Alta, em Jaguariaíva, minha querida terra natal, foi o palco das nossas brincadeiras de crianças. A nossa querida e saudosa rua não era pavimentada, mas para nós o pó e as pequenas pedras não incomodavam, pois em seu leito corríamos céleres quando das nossas brincadeiras. E os carrinhos de rolimãs então, quando nos pequenos declives descíamos com força total disputando velocidade. As nossas roupas e calçados sofriam quando de algum acidente ou das frenagens nas nossas “máquinas super possantes”. Reclamações das vizinhas pelo barulho e palmadas em casa pelo prejuízo nas roupas. E as escoriações nos joelhos, cotovelos e dedos, que eram os que mais sofriam.

A “piazada” da rua, de pouca idade e muita inocência, gastava as suas energias brincando muito de mãe da rua, pula-carniça, pique, balança caixão, bandido e mocinho, isso quando estávamos brincando sem as meninas, pois quando elas queriam brincar juntas, tudo era mais calmo, aí tínhamos que brincar de passa-anel, de adivinha, de escolinha, de passa-passa e até de roda, e aí eram diversas: o barquinho virou; senhora dona Sanja; bom dia minha senhorinha e outras tantas. E se nos fizéssemos de rogados e negássemos brincar com elas, quase apanhávamos.

E depois disso tudo a fome batia e todos corriam para as suas casas mitigá-la. E aí vinha a melhor parte do dia, pois o cheiro de feijão com arroz, carne e salada invadia nossas narinas e após lavarmos as mãos (obrigados pelas mães), sentávamos e haja apetite!

E por falar em comida, existem sabores que se entranharam em nossa memória e que, só de lembrar, vêm aguçar o nosso paladar e nos trazer doces lembranças. A mim, os mais marcantes são: o doce de chila* (eu apelidei de doce de vidro) que minha avó fazia; os doces de minha mãe: cajuzinho de amendoim; pudim de queijo; pamonha doce recheada com goiabada; rocambole tronco de chocolate; amor aos pedaços; bolo de fubá assado na panela, sobre a chapa; arroz-doce; cocada com creme. E seus salgados: pastel; quibe; empada; almôndegas; canudinho com salada de maionese, isso sem contar com a galinha recheada e o leitão pururuca assados no forno a lenha no quintal e do saboroso bolinho de milho verde.

E o sabor das balas de ovos e das cocadinhas de mel que comprávamos na Casa Cruzeiro do Sul e dos sorvetes do Bar Maracanã.

Além das saborosas limonadas feitas por minha mãe, lembro-me com saudade do refrigerante Crush* (que na época era produzido no Brasil) e da gasosa vermelha da Cini*.

E, acima de tudo, tínhamos a liberdade de podermos sair sozinhos, pois naquela nossa querida rua, e até em toda a cidade, todos conheciam todos, como se houvesse lá só uma família.

Minha doce Jaguariaíva!
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* Notas:
Doce de chila = doce de abóbora chila.

Crush =No Brasil, a Crush foi fabricada nos sabores laranja e uva pelas indústrias Golé e a Pakera, então franqueadas pela multinacional Cadbury Schweppes até o cancelamento da licença e a interrupção da produção.

Gasosa Cini = é uma marca de refrigerante característico e tradicional da região sul do Brasil, em especial nos estados do Paraná, onde foi fundada em São José dos Pinhais e onde se localiza a fábrica Cini Bebidas.

Fonte:
Enviado pelo autor.
George Roberto Washington Abrão. Momentos – (Crônicas e Poemas de um gordo). Maringá/PR, 2017.

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