sábado, 1 de julho de 2023

Afrânio Peixoto (Trovas Populares Brasileiras) – 16


Atenção: Na época da publicação deste livro (1919), ainda não havia a normalização da trova para rimar o 1. com o 3. Verso, sendo obrigatório apenas o 2. Com o 4. São trovas populares coletadas por Afrânio Peixoto.

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A folha da hera verde
é verde da cor do mar,
o verde é cor da esperança,
da esperança de teu olhar.
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Alecrim da beira d’água
bate o vento, logo torce.
Os olhos deste ladrão
já de mim tomaram posse.
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Andorinha do coqueiro
dá-me novas do meu bem...
Os meus olhos estão cansados
de esperar por quem não vem.
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As penas do meu martírio
mais cruéis não podem ser:
Ter olhos para chorar,
não ter olhos pra te ver.
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Bela morena orgulhosa,
Dá-me água pra beber!
Mas olha que não é sede;
é vontade de te ver!
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Benzinho, quando te fores
vem cá me dizer adeus,
quero mandar os meus olhos
na companhia dos teus.
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Caí no mar e salvei-me
nele não pude afogar,
mas afoguei-me em teus olhos
mais pequenos de que o mar.
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Deus fez os teus belos olhos
para ver e pra encantar...
Mas a mim só fez os meus
pra te ver e pra chorar...
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Encantos que    não gozo
mas que não posso esquecer,
fazem de meus olhos tristes
meu triste pranto correr.
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Está chovendo, quer chover,
onde nos abrigaremos?
Na sombra desses teus olhos
seguro abrigo teremos.
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Eu amei, fui infeliz
e jurei não mais amar...
Os teus olhos me obrigaram
meu juramento a quebrar.
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Há quem seja réu de morte
sem consciência de o ser...
Digam, se podem, teus olhos
se não nos fazem morrer.
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Hei de pegar nos meus olhos,
hei de os furar com um pauzinho:
– Os meus olhos são a causa
de eu andar por mau caminho.
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Manjericão verde-escuro
tem a folha miudinha.
Só em te ver eu te amo,
que “fará” se fosses minha!...
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Menina dos olhos grandes,
olhos grandes como o mar,
não me olhes com tais olhos,
posso neles me afogar...
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Morena, minha morena,
cravo de minha almofada...
No dia que eu não te vejo
não como, não faço nada...
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Olhos que não veem seus olhos
senão de meses a meses,
esses são os mais amantes
porque logram poucas vezes...
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Ó meu junquilho amarelo,
teus cheiros estão perdidos...
Trata de ver outros olhos
que estes estão decididos.
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Para te amar não preciso
ver todo o dia teu rosto,
basta que tenha na ideia
lembranças que me dão gosto.
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Quando a raiz topa a pedra
a planta logo emurchece...
Coração que é desprezado
pelos olhos se conhece.
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Quando for para eu morrer
quero teus braços por leito,
por vela teus lindos olhos,
por sepultura teu peito.
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Quem quiser ver olhos tristes
olhe pra os meus, desgraçados,
já foram olhos queridos
e são hoje desprezados.
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Se o olhar fosse alfinete
e que desse alfinetada,
estavas toda furadinha
como renda de almofada.
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Sobrancelhas de retrós,
olhos de vera alegria,
vê o pago que me destes
a quem tanto te queria.
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Um craveiro na janela
certamente é pra vender.
Quem tem seu amor defronte
nunca se farta de o ver.
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Fonte:
Afrânio Peixoto (seleção). Trovas populares brasileiras. RJ: Francisco Alves, 1919.
Disponível em Domínio Público

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