quarta-feira, 12 de maio de 2021

Aparecido Raimundo de Souza (Parte 41) A preciosidade ocultada

BELINHA ERA UMA CRIATURINHA encantadoramente sensual. Seu perfil de menina do interior, com seu sorriso terno e maroto, deixava os homens endoidecidos, principalmente os mais avançados na idade. Não à toa, desde que viera de Araguarí, em Minas Gerais, para trabalhar no Rio de Janeiro, na casa de tolerância de dona Rosa (por indicação de uma ‘amiga’ de infância que vivia, há tempos, no meio libertino), a freguesia masculina aumentara de forma assustadora.

Em razão disto, em menos de três meses, dona Rosa, a cafetina, começou a ver, com olhos esbugalhados, seus negócios passarem de um simples comércio capenga para deslanchar, de vento em popa, numa escala de progressão incrivelmente estonteante e meteórica. A rapaziada, a cada noite, aumentava mais e mais o rebuliço, fazendo com que a cáften enchesse as burras e saísse do vermelho à passos de Golias.

De repente, dona Rosa trocou de carro, aumentou a casa de alvenaria onde funcionava a muvuca, acrescentando mais de uma dúzia de quartos aos treze existentes. Mudou de uma residência relativamente simples, em Pedra de Guaratiba, para um condomínio de luxo, na avenida das Acácias, na Barra da Tijuca. Da noite para o dia, se firmou a alimentar uma conta bancária com numerários vultuosos, num banco onde, meses atrás, mantinha na conta corrente, o suficiente para os gastos com a manutenção e o sustento de suas ‘colaboradoras’ na requintada morada de prostituição.

A mineirinha Belinha se tornara a mais solicitada e a que contribuía com o maior acréscimo de programas para que os rendimentos do rendez-vous triplicassem num abrir e fechar de olhos. Caminho paralelo, a rapaziada só queria a Belinha e havia até uma fila de espera bastante significativa para conseguir subir com ela para o andar superior, onde ficavam dispostos os aposentos dos prazeres mais envolventes.

As outras partícipes da fratria da carne fraca, e fresca, não permaneciam ociosas. Pelo contrário, não davam conta, tamanha a movimentação que varava das cinco da tarde (hora em que o ‘inferninho’ abria) só terminando o tráfico do ‘entra e sai’ dos usuários, quase às primeiras horas de um novo amanhecer. Apesar da Belinha ser a ‘número um’, a azeitona da empada na preferência da plebe dos machos simpatizantes, as demais do grupo de ninfetas, num total de dezoito rameiras, careciam trabalhar dobrado.

Todas, sem exceção, se viravam literalmente nos trinta, para darem conta dos tresloucados que desembolsavam uma nota violenta por algumas horas de sexo e prazer regadas a bebidas importadas da zona franca de Manaus e até uns produtos diferenciados vindos diretamente da Cracolândia Paulista. O fato é que, entre trancos e barracos, altos e baixos, em pouco tempo, a Belinha igualmente fez seu pé de meia. Comprou um apartamento no bairro do Leme, um carro quase zero quilômetro e abriu uma conta poupança para, num futuro próximo, largar de vez daquela vida que ela, de antemão, sabia de cor e salteado, não a levaria muito longe.

Os caminhos da perdição são largos e desafogados, lucrativos e vantajosos, contudo, os passos dados, não permitem que se vá muito longe. Vida de quenga tem dia certo para começar, às vezes se vê interrompido, num abrir e fechar de olhos. Além da grana fácil (a maior parte vinda dos jovens em busca de aventuras), existiam os tais ‘coroas e idosos tarados’ que, por algumas horas de prazer, lhe abarrotavam de presentes os mais diversos, lembrancinhas generosas que ela, não se desfazia, ao contrário, guardava à sete chaves e com esmerado carinho.

Foi numa destas, que um velhusco conhecido no pedaço como ‘seu Perdulário Porreta’, de setenta e lá vai fumaça, os bolsos abarrotados e etc e tal, ao provar da fruta viciosa, se assanhou de vez com os deleites e arroubos da deidade. Os mimos, a cada encontro, se tornavam mais audaciosos até que, num final de semana, ganhou do ilustre senhorzinho, um colar de ouro puro, cujo valor (mandado à verificação depois, numa loja de comercialização de joias), descobriu que, se tivesse que comprar uma igual àquela, precisaria vender o apartamento, o carro, fechar a poupança e, ainda assim, não cobriria o valor da ‘prenda’ que lhe viera em troca de algumas horas em cima de uma cama redonda de um prostíbulo de segunda.

Flávia, a sua melhor amiga e confidente, em face da amizade nascida desde os tempos de Araguari e, como sempre, a primeira a tomar conhecimento das proezas do sessentão, aconselhou, com um sorriso mais escancarado que futricagem de vizinha de língua solta:

— Que legal, Belinha. Como você bem viu, na avaliação que fizemos em duas joalherias conceituadas aqui no Barra Shopping, este adorno vale uma pequena fortuna.

— Sei disso, Flavinha. Quando a vendedora revelou o valor, quase tive um piripaque... faltou pouco...

E completou, colocando o valioso presente em volta do pescoço, enquanto explicava que fim daria ao aparatoso tesouro:

— Por isto, vou colocar esta relíquia naquele lugarzinho do meu corpo (como um talismã da sorte) para me lembrar sempre de como esta coisa maravilhosa veio mudar a minha vida. Posso até parar de fazer programas amanhã, se eu quiser...

Flavinha saltou da cadeira, num gesto impensado e quase teve, de fato, um chilique:

— Tá louca, amiga? Pirou o cabeção?

E se fazendo, inteira, numa espécie de alegria falsificada e repleta de inveja, completou, enfática:

— Se você fizer isto, sua bobinha, só os seus clientes é que poderão ver, tocar e... apreciar...

Fonte:
Texto enviado pelo autor.

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