quinta-feira, 12 de janeiro de 2023

Afrânio Peixoto (Trovas Populares Brasileiras) – 6

Atenção: Na época da publicação deste livro (1919), ainda não havia a normalização da trova para rimar o 1. com o 3. Verso, sendo obrigatório apenas o 2. Com o 4. São trovas populares coletadas por Afrânio Peixoto.


Um suspiro de repente,
um certo mudar de cor,
são infalíveis sinais
de quem sofre o mal de amor.
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O amor, quando se encontra,
mete susto, mas dá gosto,
sobressalta o coração,
faz fugir a cor do rosto.
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Quem quiser amar direito,
para não se desconfiar,
quando olhar, não deve rir,
quando rir, não deve olhar.
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Amor é como pigarro,
não se pode disfarçar:
Se a cócega dá direito,
tem de tossir ou de olhar.
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Feliz quem ama na terra
inda que seja uma flor.
Pra que existir neste mundo
quem é incapaz de amor?
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Ainda eu não tinha dentes,
começava a engatinhar,
com a filha da vizinha
já me punha a namorar…
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Os pais não podem privar
os filhos de querer bem;
Se as leis dos pais são sagradas,
as do amor mais força têm.
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Querer bem não é pecado,
querer bem é devoção.
Santo não há só no céu,
há também no coração.
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Fui no mato buscar lenha,
Santo Antônio me chamou.
Quando santo chama a gente,
que fará quem é pecador…
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O amor de dois solteiros
é como a flor do feijão:
Quando olham um para o outro,
logo mudam de feição.
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Até menino pequeno
se consegue desmamar:
Coração acostumado
não pode deixar de amar.
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Amor não gosta de acaso,
amor gosta de esperar:
Comida sem apetite
farta ou faz enjoar.
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Plantei o amor no meu peito
pensando que não pegasse,
tanto pegou, que nasceu,
tanto nasceu, que inda nasce.
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Abra-me a porta, menina,
pra que eu entre devagar,
que amor que entra com fúria,
bem cedo se há de acabar.
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Contra faca, bala e cobra
eu tenho o corpo fechado,
mas contra o amor me esqueci:
Aproveitou-se o malvado!
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Se o amor não fosse cego
eu seria bem feliz,
porque tu, lendo em meu peito
verias o que ele diz.
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O primeiro amor da gente
deve ter gosto dobrado,
chegam uns e vão-se outros…
Aquele é sempre lembrado.
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Ai daqueles que perderam
seu primeiro e santo amor:
Pois nas próprias distrações
agravarão sua dor.
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O amor que eu te queria,
de subir se derramou,
botaste água na fervura,
encolheu-se e resfriou.
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Quem me dera livre ser
qual os peixinhos do mar,
que descuidados de amores
correm, brincam, sem cessar
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Uma ausência me retira,
uma saudade maltrata,
uma pena me atormenta,
uma dor é que me mata…
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Eu tomei amor ao longe
por ser a linha mais forte,
rebentou-se a linha ao meio
triste de quem não tem sorte!
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Não tenho onde me esconder
do meu amor inimigo:
Perto, estou fora de mim,
longe, está dentro comigo!
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Fui fraca, facilitei,
cuidei que amor n'era nada.
Amor é mal sem remédio,
hoje estou desenganada!
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Eu sofri e fiz sofrer,
amei e me fiz amar,
se a partida fosse errada,
que gosto principiar!
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Eu sofri por ter de amar
e sofri por ser amado,
mas tudo quanto sofri
eu dou por bem empregado.
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Na galera dos amores,
todos se embarcam cantando,
porém no fim da viagem
todos se apartam chorando.

Fonte:
Afrânio Peixoto (seleção). Trovas populares brasileiras. RJ: Francisco Alves, 1919.

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