domingo, 13 de novembro de 2011

Guilherme Voitch (Curitiba de Musas e Símbolos)

Festa da Primavera,
na Rua XV de Novembro,
no início do século 20

Ao comentar o frisson que Emiliano Perneta causava na Curitiba do início do século 20, o crítico literário Andrade Muricy afirmou que o poeta parecia sempre andar com uma banda de música à frente, tamanha a agitação do séquito de seguidores que ele arrastava pelas ruas da cidade. O deslumbramento atingiu seu ponto máximo em agosto de 1911, quando Perneta, depois de chegar em uma carruagem, foi coroado – literalmente –“príncipe dos poetas paranaenses” diante de uma multidão que se espremia no Passeio Público.

A idolatria se explica. Perneta foi o mais destacado em uma geração de escritores curitibanos que contou com Dario Vellozo, Silveira Neto, Júlio Perneta, Leôncio Correia, Romário Martins, entre outros. O grupo de poetas fez Curitiba ser uma espécie de capital do movimento simbolista no Brasil e revolucionou a vida cultural curitibana. “Eles foram a representação artística de uma cidade que se transformava”, afirma o historiador Marcelo Sutil.

A transformação era evidente. Em dez anos, de 1890 a 1900, a população de Curitiba tinha duplicado. A cidade via nascer uma nova elite econômica, respaldada pelo dinheiro do mate. Com essa elite, surgia uma maior preocupação estética. A cidade avançava rumo a dois extremos: o Batel e o Alto da Glória. As casas e casarões construídos já não eram as meias-águas, umas grudadas nas outras. Pela primeira vez, as residências eram construídas mais para dentro dos terrenos, separadas de seus vizinhos. “As casas passaram e ter jardins e serem vistas em três eixos, o que garantia uma série de melhorias sanitárias e de iluminação”, conta o arquiteto e professor da Universidade Positivo, Irã Dudeque.

A transformação atingia também os espaços públicos. Parques e praças eram construídos. Surgem nesse período o Passeio Público, a Praça Carlos Gomes e a Pracinha do Batel, cujo desenho fazia as referências aos temas gregos cantados pelos simbolistas.

A Rua XV de Novembro, consolidada como centro da cidade, recebia cafés, livrarias, cinemas e teatros e via nascer, onde antes era um depósito de lixo, a Universidade Federal do Paraná (UFPR).

A XV era o trajeto obrigatório de quem queria ver e ser visto e os simbolistas, no melhor estilo dândi, eram especialistas em chamar a atenção dos passantes pelo refinamento dos trajes.

Era a Belle Époque curitibana.

Na biblioteca

O grupo que mandou na cultura curitibana nas primeiras décadas do século 20 está intimamente relacionado a dois dos principais símbolos da cidade: o Gymnásio Paranaense, atual Colégio Estadual, e o Clube Curitibano. “Foi na biblioteca do Curitibano, que funcionava no centro da cidade, que esse grupo de amigos resolveu criar sua primeira revista literária, a Cenáculo”, explica a pesquisadora e professora aposentada da UFPR, Cassiana Lacerda.

A Cenáculo foi a primeira de muitas revistas em que os poetas publicavam suas obras. Por muito tempo, a própria revista do Clube Curitibano foi conduzida por Vellozo e Perneta. Era no Salão do Clube que Daryo Vellozo, principal orador do grupo, fazia suas apresentações e recebia autores de fora.

Mais tarde, Vellozo decidiu criar uma sede para as reuniões dos poetas e seus pupilos. Em sua própria chácara, na Vila Isabel, foi levantado o Templo das Musas, sede do Instituto Neo-Pitagórico.

O instituto, mantido pelo genro de Vellozo é um dos poucos locais a conservar obras e documentos dos simbolistas e do tempo da Curitiba das musas.

Movimento deu início à literatura curitibana

Para o crítico literário Wilson Martins, o movimento simbolista marca uma espécie de nascimento da literatura curitibana. “Foi um movimento organizado que produziu bastante e teve relevância nacional”. Os autores curitibanos produziram algumas das principais revistas literárias nacionais, entre elas a Cenáculo, Victrix, A República, Palium e Jerusalém. Para Martins, o principal autor do grupo é mesmo Emiliano Perneta. “É um grande poeta e o que teve, merecidamente, mais destaque nacional.”

Na visão da professora aposentada da Universidade Federal do Paraná Cassiana Lacerda, uma das principais pesquisadoras do simbolismo brasileiro, o culto a Perneta, no entanto, foi prejudicial ao poeta. “A província o idolatrou pelo que ele não merecia e não o idolatou pelo que ele merecia”, explica. O melhor da produção do autor, segundo ela, foi feito quando ele estava longe de Curitiba, em contato com escritores de maior relevância. Mais do que pela obra em si, porém, Perneta era comemorado em Curitiba pelo seu reconhecimento nacional.

A influência dos simbolistas durou até a década de 30, quando o modernismo vindo de São Paulo e do Rio de Janeiro passou a ditar as regras na produção literária.

O simbolismo foi uma típica manifestação cultural da passagem do século. Teve como característica a sofisticação, o culto a valores aristocráticos, usados como uma reação ao pensamento racionalista, o misticismo e a influência de culturas orientais.

Fonte:
Gazeta do Povo

Nenhum comentário: