BALADA DO CAIXÃO
O meu vizinho é carpinteiro,
Algibebe de Dona Morte,
Ponteia e cose, o dia inteiro,
Fatos de pau de toda a sorte:
Mognos, debruados de veludo,
Flandres gentil, pinho do Norte...
Ora eu que trago um sobretudo
Que já me vai a aborrecer,
Fui-me lá, ontem: (Era Entrudo,
Havia imenso que fazer...)
- Olá, bom homem! quero um fato,
Tem que me sirva? - Vamos ver...
Olhou, mexeu na casa toda.
- Eis aqui um e bem barato.
- Está na moda? - Está na moda.
(Gostei e nem quis apreçá-lo:
Muito justinho, pouca roda...)
- Quando posso mandar buscá-lo?
- Ao pôr-do-Sol. Vou dá-lo a ferro:
(Pôs-se o bom homem a aplainá-lo...)
Ó meus Amigos! salvo erro,
Juro-o pela alma, pelo Céu:
Nenhum de vós, ao meu enterro,
Irá mais dândi, olhai! do que eu!
DA INFLUÊNCIA DA LUA
Outono. O sol, qual brigue em chamas, morre
Nos longes de água.... Ó tardes de novena!
Tardes de sonho em que a poesia escorre
E os bardos, a cismar, molham a pena!
Ao longe, os rios de águas prateadas
Por entre os verdes canaviais, esguios
São como estradas líquidas, e as estradas
Ao luar, parecem verdadeiros rios!
Os choupos nus, tremendo, arrepiadinhos
O xaile pedem a quem vai passando...
E os seus leitos nupciais, os ninhos
As lavandiscas noivas piando, piando!
O orvalho cai do céu como unguento.
Abrem as bocas, aparando-os, os goivos;
E a laranjeira, aos repelões do vento,
Deixa cair por terra a flor dos noivos.
E o orvalho cai... e a falta de água, rega
O vale sem fruto, a terra árida e nua!
E o Padre-Oceano, lá de longe, prega
O seu sermão de lágrimas à lua!
A Lua! Ela não tarda aí, espera!
O mágico poder que ela possui
Sobre as sementes, sobre o oceano impera,
Sobre as mulheres grávidas influi...
Ai os meus nervos, quando a lua é cheia!
Da arte novas concepções descubro
Todo me aflijo, lá fazem ideia...
Ai a ascensão da Lua em Outubro!
Tardes de Outubro! Ó tardes de novena
Outono! Mês de Maio, na Lareira!
Tardes.....
Lá vem a Lua, Gratia e plena
Do convento dos céus, a eterna freira!
LADAINHA
Teu coração dentro do meu descansa,
Teu coração, desde que lá entrou
Tem tão bom dormir essa criança,
Deitou-se, ali caiu, ali ficou.
Dorme, menino! Dorme… dorme...
O que te importa o que no mundo vai?
Ao acordares desse sono enorme
Tu julgarás que se passou num ai.
Dorme, criança! Dorme sossegada,
Teus sonos brancos ainda por abrir:
Depois, a morte não te custa nada,
Porque a ela te habituaste a dormir...
Dorme, meu anjo (a noite é tão comprida)
Que doces sonhos tu não hás-de Ter!
Assim, com o hábito de os Ter na vida
Continuarás depois de falecer....
Dorme, meu filho! Cheio de sossego
Esquece-te de tudo e até de mim.
Depois...de olhos fechados, és um cego,
Tu nada vês, meu filho e antes assim.
Dorme os teus sonhos, dorme e não mos digas,
Dorme, filhinho! Dorme, dorme "ó-ó"....
Dorme, a minha alma canta-te cantigas
Que ela é velhinha como a tua avó!
Nenhuma ama tem um pequenino
Tão bom, tão meigo; que feliz eu sou!
E tem tão bom dormir esse menino...
Deitou-se, ali caiu, ali ficou.
MENINO E MOÇO
Tombou da haste a flor da minha infância alada.
Murchou na jarra de ouro o pudico jasmim:
Voou aos altos céus a pomba enamorada
Que dantes estendia as asas sobre mim.
Julguei que fosse eterna a luz dessa alvorada,
E que era sempre dia, e nunca tinha fim
Essa visão de luar que vivia encantada,
Num castelo com torres de marfim!
Mas, hoje, as pombas de ouro, aves da minha infância,
Que me enchiam de lua o coração, outrora,
Partiram e no céu evolam-se à distancia!
Debalde clamo e choro, erguendo aos céus meus ais:
Voltam na asa do vento os ais que a alma chora,
Elas, porém, senhor, elas não voltam mais...
VOU SOBRE O OCEANO (O LUAR, DE DOCE, ENLEVA!)
Vou sobre o Oceano (o luar, de doce, enleva!)
Por este mar de Glória, em plena paz.
Terra da Pátria somem-se na treva,
Águas de Portugal ficam, atrás.
Onde vou eu? Meu fado onde me leva?
António, onde vais tu, doido rapaz?
Não sei. Mas o Vapor, quando se eleva,
Lembra o meu coração, na ânsia em que jaz.
Ó Lusitânia que te vais à vela!
Adeus! que eu parto (rezarei por ela)
Na minha Nau Catrineta, adeus!
Paquete, meu Paquete, anda ligeiro,
Sobe depressa à gávea, Marinheiro,
E grita, França! pelo amor de Deus!
VIRGENS QUE PASSAIS
Virgens que passais, ao Sol-poente,
Pelas estradas ermas, a cantar!
Eu quero ouvir uma canção ardente,
Que me transporte ao meu perdido lar.
Cantai-me, nessa voz onipotente,
O sol que tomba, aureolando o Mar
A fartura da seara reluzente,
O vinho, a graça, a formosura, o luar!
Cantai! Cantai as límpidas cantigas!
Das ruínas do meu lar desterrai
Todas aquelas ilusões antigas
Que eu vi morrer num sonho, como um ai....
Ó suaves e frescas raparigas,
adormecei-me nessa voz...cantai !
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