quinta-feira, 6 de junho de 2019

Caldeirão Poético XXIV


ALFREDO SANTOS MENDES
Lisboa/Portugal

Máscara

Por que se escondem vós, forças do mal?
Abandonai de vez vosso covil!
Por que escondeis o vosso rosto vil,
atrás de um rosto puro, angelical?

Já chega de prosápia assaz banal,
de tanto fingimento, vão, servil!
Há muito conhecemos vosso ardil,
p’ra  tudo conseguirem no final!

Pois mal se apanham donos do poder…
Só querem seus discursos esquecer,
e não cumprir promessas propaladas!

E enquanto o Zé povinho vai sofrendo,
vós, tubarões, os bolsos vão enchendo,
sem nenhum preconceito, às descaradas!

ANIBAL BEÇA
Manaus/AM, 1946 – 2009

Soneto da Sentida Solidão

 A falta é complemento da saudade,
 servida em larga ausência nos ponteiros,
 bandeja dos segundos que se evade,
 em pasto das desoras, sorrateira.

 Estar é seduzir sem muito alarde,
 no avaro aqui agora companheiro,
 o porto da atenção que se me guarde
 o ser presente da sanha viageira.

 Partir é sentimento de voltar,
 liberta, eu sei, no vento e seu afoite,
 navega a sina em rasa preamar;

 ela, essa ausente, é dona e meu açoite,
 no seu impulso presto em navegar,
 vai se enfunando em névoa pela noite.

DIONÍSIO VILARINHO
Amarante/PI, 1921 – 1947, Alegrete/RS

Desenlace

Foste sincera em revelar, querida,
que não me queres mais. Muito obrigado:
já não serás por mim mais iludida,
já não serei por ti mais enganado.

Eu também já vivia amargurado
de suportar essa paixão fingida,
sabendo que não era mais amado
e que não eras mais a preferida.

Hoje, quebrando os derradeiros elos
que te traziam presa aos meus desejos,
que me traziam preso aos teus anelos,

troquemos, sem tristeza, o último adeus:
tu, sem saudade alguma dos meus beijos,
eu, sem pensar sequer nos beijos teus…

ELMO ELTON
Vitória/ES, 1925 – 1988

Vossas Mãos

   Vossas mãos de alabastro, ágeis e puras,
são para mim objetos de respeito:
– delas, em prece, todo bem que aceito
concede á minha vida mais venturas.

Vossas mãos, – delicadas esculturas,
em nada mostram o menor defeito,
e, unidas, lembram um jasmim perfeito
sempre cheio de aromas e canduras…

Vendo-as assim, tão leves como um sonho,
temo beijá-las, pois até suponho
ser um crime cruel, – e sem perdão

macular, com a volúpia de meu beijo,
umas sagradas mãos que apenas vejo
voltadas para Deus, em oração…

ERNÂNI ROSAS
Florianópolis/SC, 1886 – 1955, Rio de Janeiro/RJ

Rimas à Lua

Dorme em lascivo leito, reclinada…
Repontando de Astros e fogueiras,
Ateias a coivara prateada
Dos caminhos desertos, pegureira…

Lua! Da meia noite, solitária,
Urna errante p’la nave do infinito…
Cravas o lácteo incêndio funerária,
Às montanhas geladas de granito…

Peregrinando em tua marcha hiante
E exausta de fadiga em água amara
Buscas o mar, o oceano o teu amante…

Artista, cuja tela, ao ver-Te aclara!
N’esse sonambulismo inebriante…
Em suas vagas verdes Te enlaçara…

FRANCISCO MIGUEL DE MOURA
Teresina/PI

Contra a Teoria

Meus mestres do fazer por sentimento
me põem guardas contra as teorias,
de religiões, partidos, guerras frias,
quentes, mornas, e deuses…Que tormento!

Lendo o verbo, seus versos em poemas,
vindos de longe mas chegados cedo,
sem ter medo de ser, para que medo?
Humanidade, amor são nossos temas!

No mundo velho, o tudo é o tecer novo,
o melhor vem de nós e vem do povo,
porque, dizendo assim é que não minto.

E eu, sem acreditar em tanto aleijo,
descreio nas verdades que não vejo,
confio ao coração o que amo e sinto.

GREGÓRIO DE MATOS
Salvador/BA, 1636 – 1696, Recife/PE

Soneto II
(A uma dama dormindo junto a uma fonte)

À margem de uma fonte, que corria,
Lira doce dos pássaros cantores
A bela ocasião das minhas dores
Dormindo estava ao despertar do dia.

Mas como dorme Sílvia, não vestia
O céu seus horizontes de mil cores;
Dominava o silêncio entre as flores,
Calava o mar, e rio não se ouvia,

Não dão o parabéns à nova Aurora
Flores canoras, pássaros fragrantes,
Nem seu âmbar respira a rica Flora.

Porém abrindo Sílvia os dois diamantes,
Tudo a Sílvia festeja, tudo adora
Aves cheirosas, flores ressonantes.

LUIS VAZ DE CAMÕES
Coimbra/Portugal, 1524 – 1580, Lisboa/Portugal

Soneto 125

Este amor que vos tenho, limpo e puro,
de pensamento vil nunca tocado,
em minha tenra idade começado,
tê-lo dentro nesta alma só procuro.

De haver nele mudança estou seguro,
sem temer nenhum caso ou duro Fado,
nem o supremo bem ou baixo estado,
nem o tempo presente nem futuro.

A bonina e a flor asinha passa;
tudo por terra o Inverno e Estio
deita, só para meu amor é sempre Maio.

Mas ver-vos para mim, Senhora, escassa,
e que essa ingratidão tudo me enjeita,
traz este meu amor sempre em desmaio.

OLEGÁRIO MARIANO
Recife/PE, 1889 – 1958, Rio de Janeiro/RJ

A Velha Mangueira

No pátio da senzala que a corrida
Do tempo mau de assombrações povoa,
Uma velha mangueira, comovida,
Deita no chão maldito a sombra boa.

Tinir de ferros, música dorida,
Vago maracatu no espaço ecoa…
Ela, presa às raízes, toda a vida,
Seu cativeiro, em flores, abençoa…

Rondam na noite espectros infelizes
Que lhe atiram, dos galhos às raízes,
Em blasfêmias de dor, golpes violentos.

E, quando os ventos rugem nos espaços,
Os seus galhos se torcem como braços
De escravos vergastados pelos ventos.

TEREZINHA DANTAS
Peruíbe/SP

O Maior Poeta Que Existiu 

O maior Poeta que existiu 
Foi deixando sua luz; 
Num caminho que floriu 
Com seus versos nos conduz. 

Com seus versos nos conduz 
Mostrando as aves do céu; 
Este Poeta é Jesus 
Que foi retirando o véu. 

Que foi retirando o véu 
Revelando um Deus amor; 
Nos lírios do campo o céu 
Se transforma em esplendor. 

Se transforma em esplendor 
Com este Poeta Divino; 
Andando pelo campo em flor 
Com seu olhar cristalino. 

Com seu olhar cristalino 
Vai ensinando o perdão; 
O Evangelho é um ensino 
Pra guardar no coração. 

Pra guardar no coração 
Quais sementes de luz; 
Semeando pelo chão 
Por onde passou Jesus. 

Por onde passou Jesus 
O Poeta da humanidade; 
Pai Nosso nos conduz 
Ao poema da Verdade. 

Ao poema da Verdade 
Cantando ao Pai da vida 
Encontrando a felicidade 
Achando a dracma perdida. 

Achando a dracma perdida 
Este Poeta sem igual; 
A todos dava acolhida 
No seu amor incondicional. 

No seu amor incondicional 
A humanidade viu; 
Ele perdoar o mal 
O Maior Poeta que existiu! 

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