quarta-feira, 19 de junho de 2019

Lúcia Constantino (Poemas Avulsos) 1


A JANELA

Vem de outras eras as fontes do espírito.
Os jasmins renascem nos canteiros,
a chuva já deu badaladas no telhado.
E quem sou? Me pergunto na noite morna.
Talvez uma ave noturna lenta demais
para atravessar as planícies.
Toda imensidão termina no ocaso.
E para além do sol... onde estão os meus olhos amados?
Sempre atravesso essas sombras ao anoitecer,
diante do quartel de estrelas que me policia.
E a janela é um avental que me convida
a continuar servindo.

AQUELAS MÃOS SERENAS

A minha alma ainda tem tranças de menina
que minha mãe fazia quando eu era pequena.
Quanta saudade na minha vida peregrina
deixou em mim aquelas mãos serenas.

Daqueles olhos, no verde dos campos tenho a cor.
E aquele perfume divinal, quando penso em Deus.
Ainda busco aquele rosto que era o próprio amor
no sol, na lua, nas estrelas, no azul do céu.

À noite, na varanda, quando sopra o vento,
renovando, uma a uma, as folhas dos meus sentimentos 
pra que eu sempre me renasça para ser melhor

ainda sinto a ternura daquelas mãos serenas
trançando os meus versos sobre a minha pena
pra que o amor sempre anule a metáfora da dor.

ARARUNA
à cidade de Araruna, norte do Paraná

Abro as mãos em prece ao luar:
asas de uma saudade transportada
às noites em que fui princesa a caminhar
por uma terra roxa e encantada.

Meus vaga-lumes brilhando no cristal,
meus tombos em tua areia de marfim
ainda me soam como noites de Natal
um paraíso que retenho em mim.

Do teu corpo ainda guardo as lembranças
dos meus sorrisos e silêncios de criança
a tecer sonhos à luz de tuas brumas.

E anuncia a voz dos cafezais
que há passos leves adentrando teus quintais
- é minha saudade, ó Araruna!

BUSCADOR

A tua presença fala em mim
apesar da distância,
apesar da dor.
E alçada à uma sabedoria eterna,
eu vou buscar respostas
a esta minha fome de infinito.
E caminhante de um universo
exclusivamente meu,
vou à procura da face do meu deus
retificando o labirinto.

CONFIANÇA 

O sol ainda não saiu.
Meus olhos ainda estão turvos.
Mas já pressinto tua presença:
- cheiro de rosas no escuro.

"DI PROFUNDIS"

Deixe-me cruzar esta fonte,
que é a fronte do teu espírito,
onde as águas sobem montes
e lavam os meus abismos.

Deixe-me estar assim, contigo,
cansada, na noite que chega.
E ser em ti aconchegada
como em um ninho de estrelas.

Estrelas que enlaçam meus sonhos,
assim como os braços de Deus,
onde, na noite escura da vida,
minha dor adormeceu.

Fonte:
A Poetisa

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