39.
Trovas de rima simples (rimando apenas o 2º com o 4º verso) foram muito cultivadas por grandes trovadores no passado, inclusive Luiz Otávio, o fundador da UBT. Algumas destas trovas, além de nos remeterem à origem popular do gênero, são tão bem feitas em conteúdo e métrica, que em nada ficam a dever às trovas com o formato hoje exigido nos concursos.
Reparem que a trova abaixo, além de possuir um belo achado, usa figuras como a Prosopopeia (personificação) da “saudade” (que não “gosta” da pessoa) e uma bela Antítese repetida em dois versos, com inversão da ordem dos termos comparados.
Trovas de rima simples (rimando apenas o 2º com o 4º verso) foram muito cultivadas por grandes trovadores no passado, inclusive Luiz Otávio, o fundador da UBT. Algumas destas trovas, além de nos remeterem à origem popular do gênero, são tão bem feitas em conteúdo e métrica, que em nada ficam a dever às trovas com o formato hoje exigido nos concursos.
Reparem que a trova abaixo, além de possuir um belo achado, usa figuras como a Prosopopeia (personificação) da “saudade” (que não “gosta” da pessoa) e uma bela Antítese repetida em dois versos, com inversão da ordem dos termos comparados.
Desconfio que a saudade
não gosta de ti, meu bem.
- Quando tu vens, ela vai...
Quando tu vais, ela vem!
(Luiz Otávio)
não gosta de ti, meu bem.
- Quando tu vens, ela vai...
Quando tu vais, ela vem!
(Luiz Otávio)
40.
Além do português castiço que se observa no uso das flexões verbais de 2ª pessoa do plural - rireis, saberdes, pousais - esta trova apresenta uma outra peculiaridade semântica bem interessante.
Reparem que o trovador, com muita criatividade, emprega no 3º verso a palavra “verde” com carga semântica dupla: “verde” tanto pode ser a cor dos olhos da amada, como pode significar “jovem”, em oposição aos olhos “maduros” (= velhos) do poeta.
Rireis talvez ao saberdes
como eu me sinto em apuros
se pousais os olhos verdes
nos meus olhos já maduros!
(José Fabiano)
como eu me sinto em apuros
se pousais os olhos verdes
nos meus olhos já maduros!
(José Fabiano)
41.
O valor de uma trova nunca está somente na qualidade das rimas ou na métrica impecável. Às vezes, rimas consideradas pobres, por exemplo, não diminuem em nada o efeito literário da trova, se ela for rica no achado ou no conteúdo metafórico empregado pelo trovador.
Observem que a trova abaixo usa rimas simples (“adas/indo”), não tem um achado inusitado porque é meramente descritiva e, no entanto, deu a um tema sério como “cemitério”, um belo efeito poético através do uso de três criativas metáforas:
terra do sono infindo (cemitério)
casas fechadas (túmulos)
todos dormindo (mortos)
Nas brancas ruas caiadas
da terra do sono infindo,
as casas estão fechadas
e todos estão dormindo...
(João Rangel Coelho)
da terra do sono infindo,
as casas estão fechadas
e todos estão dormindo...
(João Rangel Coelho)
42.
Quando uma trova é avaliada separadamente apenas por um de seus aspectos (forma ou conteúdo) de per si, corremos o risco de não atribuir o verdadeiro valor ao mais importante: O conjunto forma e achado poético. Às vezes, circulam entre nós “regras” excludentes, cuja paternidade desconhecemos, e que, sem qualquer embasamento técnico, condenam certos usos de linguagem. Exemplo: NÃO SE PODEM USAR FLEXÕES VERBAIS SEMELHANTES EM TODAS AS RIMAS!
No entanto, observemos que, na conhecida e louvada trova ao lado, e em muitas outras, o uso dessa prática em nada prejudicou a beleza poética da composição.
Sobre a mulher não discutam,
seus trejeitos não se medem,
as mais fracas também lutam,
as mais fortes também cedem!
(Nydia Iaggi Martins)
seus trejeitos não se medem,
as mais fracas também lutam,
as mais fortes também cedem!
(Nydia Iaggi Martins)
43.
Podemos dizer que os TEMAS propostos para concursos de trovas nunca são bons ou ruins por si mesmos. Muitas vezes um tema que à primeira vista nos parece “difícil”, quando passa pelo crivo de um trovador criativo, pode gerar uma excelente trova.
Reparem como o trovador Sérgio Fonseca encontrou um ótimo achado de humor para o tema VIGIA proposto nos Jogos Florais de Nova Friburgo/2017.
Observem também a riqueza das rimas usadas nos 2º e 4º versos: sublimas (verbo) / primas (substantivo)
Finalmente, vejam a habilidade do trovador, ao passar do clima lírico dos primeiros versos para um desfecho humorístico perfeito nos 3º/4º versos, uma autêntica chave de ouro na trova.
Eu era, na infância dura,
quando, Amor, tudo sublimas,
vigia da fechadura
do quarto das minhas primas!
(Sérgio Fonseca)
quando, Amor, tudo sublimas,
vigia da fechadura
do quarto das minhas primas!
(Sérgio Fonseca)
44.
Há, na literatura, muitas formas de se prestar homenagem às MÃES. Escrevem-se sobre elas textos de vários gêneros (crônicas, sonetos, canções) para a justa exaltação de suas virtudes. Creio, porém, que o que deve calar mais fundo na sensibilidade materna sejam as manifestações dos filhos que, às vezes, expõem com simplicidade, em pequeninas recordações da infância, um autêntico gesto de amor filial.
Reparem, na singeleza da trova abaixo, a delicadeza de um filho, que resgata da memória afetiva esta deliciosa imagem, pedindo à mãe que lhe “sopre um vento” para aliviar uma dor.
Voa longe o pensamento...
Ah, que saudade me dói:
–Assopra, mãe! Sopra um vento
para curar meu dodói...
(Gilvan Carneiro)
Ah, que saudade me dói:
–Assopra, mãe! Sopra um vento
para curar meu dodói...
(Gilvan Carneiro)
45.
O “ACHADO” em qualquer obra literária é aquela maneira pessoal, peculiar, de tratar o assunto ou tema. É aquele algo original, inusitado, diferente do que outros já fizeram. O achado é aquilo que faz valer a pena ter sido escrita a trova.
Na trova, o “ACHADO” pode estar não somente na exploração de uma ideia nova, mas também no uso de um jogo de palavras, na escolha de um vocabulário com sonoridade diferente, na maneira criativa de colocarem-se as ideias ou no emprego dos variados recursos estilísticos de que a língua dispõe.
Vejamos, nos exemplos a seguir, como o uso de jogos de palavras criativos valorizaram as trovas:
Poucos sabem que não sabem
tudo o que dizem saber.
Maiores saberes cabem
nos que sabem sem dizer.
(Aparício Fernandes)
Há coisas boas e más
que, para viver feliz,
a gente diz... e não faz,
a gente faz... e não diz.
(Guimarães Barreto)
tudo o que dizem saber.
Maiores saberes cabem
nos que sabem sem dizer.
(Aparício Fernandes)
Há coisas boas e más
que, para viver feliz,
a gente diz... e não faz,
a gente faz... e não diz.
(Guimarães Barreto)
Fonte:
Renato Alves. Comentando trovas.
Enviado pelo trovador.
Renato Alves. Comentando trovas.
Enviado pelo trovador.
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