quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Ademar Macedo (A Minha Cirurgia...)



Ao doutor cirurgião
Digo de forma direta,
Não tenho doença alguma,
O único mal que me afeta
Eu vi na tomografia;
É o acúmulo de poesia
Na cabeça do poeta.

Pra fazer uma drenagem
Tiveram que me operar,
E durante a cirurgia
De tanto o médico drenar;
Naquele lugar nascia
Mais um pé de poesia
Na cabeça de ademar.

Vejam o que me receitaram
Pra eu fazer a cirurgia:
Quatorze injeções de versos
No lugar da anestesia
E pra não sair do clima
Trezentas gotas de rima
Três vezes durante o dia.

Aconteceu um fenômeno
No centro de cirurgia.
Quando operaram o poeta
Que a minha cabeça abria;
Antes de qualquer exame
Aconteceu um derrame...
De versos e de poesia.

Disse o doutor abismado
Oh! Meu deus que maravilha,
Já estou contaminado
Sinto em mim que o verso brilha;
E depois da operação
O grande cirurgião
Saiu fazendo sextilha.

O neuro cirurgião
Falou de forma direta:
Medicina é a profissão
Mas poesia é minha meta
E disse, já no repente:
– Eu mesmo daqui pra frente
Só vou operar poeta!

Ademar Macedo (O Vírus da Poesia)


Poesia é a minha paz,
meu mundo, meu universo;
um mar de sabedoria
onde eu vivo submerso;
é minha alimentação,
é meu sustento, é meu pão
feito de rima e de verso...

A partir da madrugada
é esse o meu dia a dia:
já de caneta na mão
recebo uma epifania,
cuja manifestação
é trazer-me inspiração
pra eu fazer minha poesia...

A poesia é minha luz,
é meu santo e meu altar,
feijão puro com farinha
que eu tenho para almoçar;
ela é minha própria vida
é meu lar, minha guarida
meu sol, meu céu e meu mar!

Ao ver poesias aos montes
nascendo em minha vertente,
tive um “derrame” de rimas
nas veias da minha mente
e um maravilhoso “infarto”
eu tive ao fazer o parto
do derradeiro repente!...

Quero então no meu jazigo,
feito em letras garrafais,
aquela minha poesia
que me deu nome e cartaz;
e escrito, seja onde for:
- eis aqui um trovador
que morreu feliz demais!

Quem carrega, como nós,
o vírus da poesia,
tem no sangue uma plaqueta
que se altera todo dia,
aumentando a quantidade
e pondo mais qualidade
nos versos que a gente cria.

Ademar Macedo (O Homem atrás do Escritor, o Escritor atrás do Homem)



Entrevista concedida pelo poeta potiguar para José Feldman,  em 26 de novembro de 2010.
O poeta faleceu anteontem, 15 de janeiro de 2013 de câncer.

INFANCIA E PRIMEIROS LIVROS

JF: Conte um pouco de sua trajetória de vida, onde nasceu, onde cresceu, o que estudou.

AM: Nasci em Santana do Matos/RN, no dia 10 de setembro de 1951, aos oito anos fui morar em Zabelê, município de Touros também no Rio Grande do Norte, onde fiquei até 1963, quando mudamos para Natal, onde terminei o primário e através de uma seleção (concurso), em 1965 fui para o Ginásio Agrícola de Ceará-Mirim/RN; terminando o ginásio voltei para Natal onde fiz o Científico (naquela época) que era o 2º Grau. Em 1971 entrei Para o Corpo de Fuzileiros Navais, passei no 1º concurso para Cabo, fui cursar no Rio de Janeiro e nunca mais estudei. Voltei para Natal em 1980 e em 81 perdi uma perna num acidente.

JF: Como era a formação de um jovem naquele tempo? E a disciplina, como era?

AM: No Ginásio agrícola (que era um Internato) Sob o duro comando de Paulo Mesquita, o Diretor, um Oficial Reformado da Aeronáutica, eu tive a melhor aprendizagem da minha vida, lá era um verdadeiro quartel, mas até hoje eu agradeço pelos seus ensinamentos, principalmente no que tange a moral, dignidade, honestidade que me acompanham até Hoje!

JF: Recebeu estímulo na casa da sua infância?

AM: Perdi meu Pai muito cedo, aos 7 anos, minha infância foi um tanto difícil, mas minha Mãe e meu irmão mais velho nunca deixaram faltar nada, Inclusive o estímulo.

JF: Quais livros foram marcantes antes de começar a escrever?

AM: Confesso que nunca fui muito de ler...Lembro bem de “O Pequeno Príncipe” e alguns pouco mais.

JF: Como foi que você chegou à poesia e às trovas?

AM: Tudo começou após o meu acidente. Numa maneira de passar melhor o tempo, comecei a frequentar cantorias de viola, festivais de Violeiros, tudo o que dizia respeito a Poesia Popular, e por meu Pai ter sido Poeta, eu sentia correr nas minhas veias o sangue da Poesia e comecei a fazer algumas estrofes; e meus irmãos Francisco Macedo e Augusto Macedo (falecido) que já eram poetas, me disseram que eu levava jeito pra coisa! Eu, já poeta popular, conhecido em todo estado devido as minhas declamações nas rádios: (Rural de Natal, Rádio Poti e 98FM), fui convidado por José Lucas de Barros, que assistia as minhas declamações nas cantorias e nos festivais e por Joamir Medeiros, que me ouvia nas Rádios, para ingressar na ATRN (Academia de Trovas do R.G.do Norte), fui sabatinado e após uma comissão analisar as trovas feitas por mim, fui aprovado e lá estou desde 2004.

SEUS TEXTOS E PREMIOS:

JF: Você possui livros? Se sim, em que você se inspirou em seus livros?

AM: Lancei o meu primeiro Livro em 1993: “...E DA DOR SE FEZ POESIA.” E tenho ainda os seguintes Livros (Em Parceria): “POESIAS EM QUATRO VERSOS”, “DOIS POETAS EM SETILHAS”, “UM DEBATE EM SETILHA AGALOPADA”, “NOS ARPEJOS DAS SETILHAS” e “UM ROJÃO EM SEXTILHA AGALOPADA”. Já prontos tenho: “SEXTETO EM SEXTILHAS”, “SEXTETO POTIGUAR”, “SEXTILHAS A QUATRO VOZES”, “TRÊS À MESA DA POESIA”, E em andamento: “NO COMPASSO DAS SETILHAS”. 

Editei um Cordel que intitulei: “DIVAGAÇÕES POÉTICAS”
E tenho dois CDs declamando Poesias: “NA CADÊNCIA DA POESIA” e “O POETA E A RAPOSA”(Com minhas declamações ao vivo, na 98 FM)
E tenho um Livro pronto esperando ajuda para publicação, que se chama: “...E DA POESIA SE FEZ O ABSURSO”, é um livro inspirado em ZÉ LIMEIRA, o Poeta do Absurdo.
A inspiração para tudo isso veio, com certeza, da Natureza e do Sertão!

JF: Como definiria seu estilo literário? 

AM: Como escrevo poesia popular nordestina, o estilo predominante é o Cordel.

JF: Dentre os livros escritos por você, qual te chamou mais atenção? E por quê?

AM: É muito difícil um Pai amar os seus Filhos de maneira diferente, assim é com os Livros; no entanto, para mim, o Livro onde mais eu me inspirei, onde estão as melhores poesias É: “UM DEBATE EM SETILHA AGALOPADA”.

JF: Qual a sua opinião a respeito da Internet? A seu ver, ela tem contribuído para a difusão do seu trabalho?

AM: Basta dizer que os livros em parceria (DEZ) foram todos feitos pela Internet, Por exemplo: “TRÊS À MESA DA POESIA”, Zé Lucas me mandou a sua estrofe, eu respondi e enviei as duas para o Professor Garcia, que por sua vez, me respondeu e as enviou para Zé Lucas e assim sucessivamente até chegar 150 estrofes. VEJAM AS TRÊS PRIMEIRAS:

01 - Zé Lucas
Com Ademar e Garcia
vou pelejar desta vez,
enchendo a taça dos versos
com carinho e lucidez,
para que o vinho sagrado
das musas dê para os três.

02 - Ademar
Vou beber com honradez
uma taça todo dia,
e eu peço a Deus neste verso
talento e sabedoria,
e que este vinho sagrado
me embriague de poesia.

03 - Prof. Garcia
Eu vou beber todo dia
para afastar o meu pranto,
deste vinho que embriaga
e nunca me causa espanto,
porque o vinho do verso
tanto é puro quanto é santo.

JF: Tem prêmios literários?

AM: Eu já fui premiado em 21 Cidades de diferentes estados da nossa federação; mas estas premiações foram todas em Concursos Nacionais de Trovas. Tive também alguns Prêmios em “Poesia” apenas aqui no meu Estado.


CRIAÇÃO LITERÁRIA :

JF: Você precisa ter uma situação psicologicamente muito definida ou já chegou num ponto em que é só fazer um “clic” e a musa pinta de lá de dentro? Para se inspirar literariamente, precisa de algum ambiente especial ?

AM: Esta eu vou responder com uma Trova e uma estrofe apenas:

“Vi à luz de lamparina,
em inspirações imerso
que a musa se faz menina
para brincar no meu verso.”

“Na inspiração do poeta
sinto um pouco de magia,
porque toda estrofe minha
me fascina e me extasia;
e em cada verso que faço
vou mastigando um pedaço
do pão da minha poesia.”

JF: Você projeta os seus textos? Ou seja, você projeta a ação, você projeta o esquema narrativo antes? Como é que você concebe os textos?

AM: Não projeto nada, os versos nascem assim...de repente.

JF: Você acredita que para ser poeta ou trovador basta somente exercitar a escrita ou vocação é essencial?

AM: A poesia é um dom divino, nenhuma escola ensina você se tornar Poeta...O Poeta já nasce feito!

A PESSOA POR TRÁS DO ESCRITOR :

JF: O que o choca hoje em dia?

AM: A violência. (que é a falta de Deus no coração das pessoa...)

JF: O que lê hoje?

AM: Livros de Poesias...

JF: Você possui algum projeto que pretende ainda desenvolver?

AM: Divulgar a poesia nas escolas...

JF: De que forma você vê a cultura popular nos tempos atuais de globalização?

AM: Com a mesma visão de sempre...Falta de apoio para a edição de Livros e Etc...

CONSELHOS PARA OS ESCRITORES :

JF: Que conselho daria a uma pessoa que começasse agora a escrever ?

AM: Que tenha muito amor pelo que faz e muita Fé. Quem sabe, um dia você encontre uma porta aberta!

JF: O que é preciso para ser um bom poeta ou/e trovador?

AM: ...Apenas Inspiração.

JF: Gostaria de acrescentar mais alguma coisa? Outros trabalhos culturais, opiniões, crítica, etc.

AM: Queria apenas agradecer esta oportunidade que me foi dada, para que eu pudesse aqui, da forma mais sincera, me desnudar poeticamente perante todos vocês...

JF: Se Deus parasse na tua frente e lhe concedesse três desejos, quais seriam?

AM: Seriam apenas de agradecimentos por tudo o que Ele tem feito na minha vida... Resumindo:

Nunca quis ganhar fama nem cartaz,
sou feliz no papel que desempenho,
sou um homem de fé, temente a Deus,
não reclamo do peso do meu lenho
nem de tudo na vida que padeço...
Eu já tenho até mais do que mereço
e me sinto feliz com o que tenho!

JF: Para finalizar, um poema e trovas de sua autoria que possui um carinho especial.

POESIA

Há sorriso que fere e que magoa
e há pranto que comove e traz alento,
e os que trazem a dor e o sofrimento
deixam marcas no rosto da pessoa;
e por mais que este pranto não lhe doa
deixará para sempre uma seqüela,
que se faz cicatriz no rosto dela
maculando esta dor que não termina;
se tiver que chorar feche a cortina,
quando for pra sorrir, abra a janela.

TROVAS:
Fiz minha casa de barro
ao lado de uma favela.
Lá fora, eu sei, não tem carro,
mas tem amor dentro dela!...

Após causar desencantos
e nos fazer peregrinos,
a seca faz chover prantos
nos olhos dos nordestinos!

O grande desmatamento,
por ganância ou esperteza,
põe rugas de sofrimento
no rosto da natureza...

Quando a inspiração lhe acena,
o bom Trovador se expande.
Numa Trova tão pequena,
faz um poema tão grande!

Quem se entrega a solidão
e dela se faz refém,
anda em meio à multidão
mas não enxerga ninguém!

Numa combatividade,
cheia de brilho e de glória,
saber perder, na verdade,
é também uma Vitória!

Na Floresta, a “derrubada”
deixa em minha alma seqüela,
pois a dor da machadada
dói mais em mim do que nela.

Ademar Macedo ainda complementa mais sobre ele:

UM POUCO MAIS DE MIM:

Como eu relatei no início, Eu Sou um Fuzileiro Naval (Reformado) perdi uma perna num acidente no ano de 1981, desde então me entreguei de corpo e alma a Poesia. Em 2006 tive um câncer no intestino, me operei no dia 09/05/2006, no Rio de Janeiro; fiz 52 Quimioterapias e 25 Radioterapias, terminei o tratamento no dia 20 de Outubro do mesmo ano, e como DEUS é Maravilhoso acredito que eu já esteja Curado, pois eu Estou sendo acompanhado aqui em Natal pela Liga contra o Câncer através de exames feitos de 6 em 6 meses, e agora em Setembro último fiz uma Colonoscopia e havia um pólipo que foi retirado para fazer a biópsia e deu o seguinte resultado: “ausência de malignidade no material Examinado” E Deus, na sua misericórdia, além do dom da Poesia deu-me também a Cura. E hoje a minha vida é regida pelo AMOR, pela ALEGRIA e pela FÉ, e são baseados nesses temas que nascem a inspiração para as minhas poesias e Graças ao nosso bom DEUS e a minha FÉ, é que estou hoje aqui contando a minha história...

Em Versos:
Guardei todos momentos que passei
de ternura, de carinho e de amor,
momentos que na vida mais gozei
e os momentos que mais eu senti dor.
O momento feliz da minha vida,
quando Deus curou em mim uma ferida,
que os médicos diziam não ter jeito,
e apesar de hoje eu ser um mutilado,
guardo sempre as lembranças do passado
pra curar as feridas do meu peito!...

A minha poesia é Santa
porque é Deus quem a projeta,
pois ele mesmo é quem planta
no coração do poeta;
pois todos os versos meus
vêm lá da mansão de Deus
como se fosse uma luz;
são escritos com emoção
pela minha própria mão,
mas seu autor, é Jesus!...

Quero então quando eu morrer,
feito em letras garrafais,
aquela minha poesia
que me deu nome e cartaz;
e escrito, seja onde for:
– Eis aqui um trovador
que morreu feliz demais!

Abraços Fraternos:
Ademar Macedo.

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Nota de Falecimento (O Brasil perde Ademar Macedo, o Poeta do Amanhecer)

Hoje estamos de luto

Morreu por volta das 07:00 horas de hoje, 15, Ademar Macedo

Ademar em 2006 teve um câncer no intestino, operou em maio deste ano , no Rio de Janeiro; fez 52 Quimioterapias e 25 Radioterapias, vinha lutando contra o câncer , mas infelizmente, após sentir muitas dores na noite de ontem, não resistiu e veio a óbito em sua residência.

Hoje ele foi encantar o Céu com seus versos.

A minha poesia é Santa
porque é Deus quem a projeta,
pois ele mesmo é quem planta
no coração do poeta;
pois todos os versos meus
vêm lá da mansão de Deus
como se fosse uma luz;
são escritos com emoção
pela minha própria mão,
mas seu autor, é Jesus!...

Quero então quando eu morrer,
feito em letras garrafais,
aquela minha poesia
que me deu nome e cartaz;
e escrito, seja onde for:


segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Antonio Roberto Fernandes (Poemas Escolhidos)


NOSSAS MÃOS

As tuas mãos tão belas, tão formosas.
 As tuas mãos afeitas aos carinhos.
 As minhas mãos tão feias, tão nervosas.
 As minhas mãos expostas aos espinhos.

As tuas mãos me tocam por piedade.
 As minhas mãos te afagam, mas com medo.
 As tuas mãos são mãos pra eternidade.
 As minhas mãos são mãos de morrer cedo.

As tuas mãos nas minhas, que contraste!
 Mas se não fossem elas, que desastre,
 nem sei das minhas mãos o que seria! 

Por isso às tuas mãos eu agradeço
 o carinho que eu sei que não mereço
 e que em outras mãos não acharia!…

LADAINHA

Olhai pra mim, mulher da minha vida!
 Senhora dos meus sonhos, me escutai!
 Minh' alma já não sabe aonde vai,
 neste vale de lágrimas perdida.

Com a luz de vossos olhos me mostrai
 um caminho, uma chance, uma saída,
 Senhora finalmente aparecida,
 meus negros horizontes clareai.

Não tenho vocação para o martírio,
 perdão se é heresia o meu delírio
 mas nestes lábios que têm fogo e mel.

Arrebatai-me agora, ao gozo eterno
 para que eu - que já conheço o inferno -
 possa, convosco, conhecer o céu!.…

FELICIDADE

Quando “eu era feliz e não sabia”,
 - como diz o poeta, na canção – 
 aos meus desejos, sempre, com ironia,
 o meu destino respondia: não. 

 E tudo o que eu sonhava, a cada dia,
 sempre ficava além da minha mão.
 Se era feliz quem tinha o que queria
 eu nunca pude ser feliz, então.

 Hoje, afogado na realidade,
 relembro a minha infância, com saudade,
 não por ter sido um tempo em que eu sonhei, 

 mas porque, ainda envolto em fantasia,
 eu não era feliz e não sabia,
 como hoje não sou...mas hoje eu sei.

OS PRATOS DE VOVÓ

A minha avó guardava, com alegria,
 muitos pratos, lindíssimos, de louça
 que ganhou de presente, quando moça,
 e que esperava usar – quem sabe? – um dia.

 Mas a vida passando tão insossa
 e nada de importante acontecia
 e ninguém pra jantar aparecia
 que compensasse abrir o guarda-louça.

 Vovó morreu. Dos pratos coloridos
 que hoje estão quebrados e perdidos
 ela jamais usou sequer um só.

Assim também meus sonhos, tão guardados,
 terão, por nunca serem realizados,
 o mesmo fim dos pratos de vovó.

POEMA DA MINHA TERNURA

A minha amada é pura como o orvalho
 que beija as flores pela madrugada.
 As suas mãos são feitas de veludo.
 Juntinho dela sou maior que tudo
 e longe dela sou menor que nada

 A minha amada mostra nos olhinhos
 a luminosidade da manhã.
 A sua voz perfuma a natureza.
 Juntinho dela a vida é uma certeza
 e longe dela uma esperança vã.

 A minha amada tem nos lábios rubros
 uma doçura sem definição.
 Ao seu sorriso desabrocham flores.
 Juntinho dela o mundo é luz e cores
 e longe dela negra solidão.

 A minha amada fala tão bonito
 que até me surpreende, até me assusta.
 Tem das rainhas o semblante e a graça.
 Juntinho dela como o tempo passa
 e longe dela como o tempo custa.

 A minha amada é minha há  mil milênios
 e eu dela sempre fui, antes de mim.
 O nosso amor respira eternidade.
 Juntinho dela é pouco a imensidade
 e longe dela o nada não tem fim. 

 A minha amada é pura como o orvalho
 que beija as flores pela madrugada,
 As suas mãos são feitas de veludo.
 Juntinho dela sou maior que tudo
 e longe dela sou menor que nada.

EMOÇÃO

Quando não há mais nada a ser falado,
 quando os olhares não se cruzam mais,
 é hora de se ver que há algo errado
 nos relacionamentos conjugais.

 Já não importa aí quem é culpado,
 nada resolvem cenas passionais
 nem simpatias contra o mau-olhado
 ou conselheiros matrimoniais. 

 É o fim. Pronto. Acabou. Não tem mais jeito.
 Se, de emoção, um dia ardeu o peito
 que dela reste uma lembrança boa.

 Não se deve é fechar-se numa esfera,
 sem ver que pode estar à nossa espera
 outra emoção no olhar de outra pessoa.

AINDA

Espero que você me ame ainda
 no dia em que bater à sua porta
 e lhe dizer que, agora, só me importa
 livrar-me, enfim, desta saudade infinda.

 E ver no seu olhar que me conforta
 e ouvir de sua boca doce e linda
 que esta minha presença foi bem-vinda,
 que sua casa ainda me comporta.

 Aí, então, num demorado beijo,
 terei pena de quem tem por desejo
 conquistar o dinheiro, a sorte, a fama,

 Pois nada terá tal encantamento
 do que, depois de tanto sofrimento,
 ouvir você dizer que ainda me ama.

RISCO E PETISCO

Minha avó sempre falava:
 - Só petisca quem arrisca.
 E eu, de inicio, perguntava:
 - Vovó, o que é petisca? 

 Ela, então, me respondia:
 - Petisca é de petiscar,
 conseguir alguma coisa
 que se sonhava ganhar. 

 E pra isso precisamos
 arriscar nosso pescoço,
 se não outros comem carne
 e nós roemos o osso.

 O mundo tem muita gente
 e a vida é um constante risco
 pra quem quer chegar na frente
 e conseguir um petisco.

 E o que seria um petisco?
 - Petisco é uma coisa boa,
 um filezinho de peixe,
 um lombinho de leitoa...

 Também pode ser um prêmio,
 pode ser até um beijo
 de alguém por quem se soluça
 e se mata de desejo.

 Vovó sabia das coisas,
 mas as coisas também mudam
 e as suas filosofias
 agora não mais me ajudam,

 pois o petisco que eu busco
 - com tanto risco a buscá-lo -
 não é lombinho de porco
 e nem filé de robalo,

 nem licor de jenipapo,
 nem goiabada ou chuvisco,
 é o petisco mais gostoso
 que compensa qualquer risco.

 Mais que lucro, mais que prêmio,
 é sentir, na ânsia louca,
 o sabor salgado e doce
 que mora na tua boca.

SEM MEDIDA

Quem diz que ama muito ou pouco, mente
 ou não conhece o amor, na realidade,
 pois não se mede o amor em quantidade,
 se ama ou não se ama, simplesmente.

Quem ama, embora sonhe com a eternidade,
 ainda assim não sonha o suficiente
 e em nada modifica o amor que se sente,
 seja na dor ou na felicidade.

Não há um meio olhar ou um meio beijo.
 Ninguém tem dez por cento de um desejo
 nem existe carícia desmedida.

 E o amor, sem ter tamanho, é tão profundo
 que podemos achá-lo num segundo
 ou procurá-lo, em vão, por toda vida.

Fonte:
Site Alma de Poeta (Antonio Manoel Abreu Sardenberg). Poesias de Amigos.

Antonio Roberto Fernandes (1945 – 2008)


CAMPOS

 “Não sou nascido aqui, planície amada,
 mas é como aqui nascido fosse,
 pois tenho a minha alma impregnada
 da brisa que te beija na alvorada,
 e do seu cheiro refrescante e doce.”

Médico, escritor, poeta, figura de destaque da literatura em Campos dos Goytacazes, onde fixou domicílio. 

Nasceu na cidade de São Fidélis, em 31 de maio de 1945. Faleceu em Campos dos Goytacazes em 20 de novembro de 2008.

Filho de Anleifer Leite Fernandes e Djanira Carvalho. Primogênito de uma família de oito irmãos. 

Aprendeu a ler em casa com o pai. 

Aos sete anos entrou para escola no interior de São Fidélis, mas, como era adiantado em relação aos colegas de classe, foi transferido para Escola Barão de Macaúbas no Centro da mesma cidade. 

Cursou o ensino fundamental e médio em sua cidade natal. 

Após passar no vestibular para a Faculdade de Medicina, mudou-se para Campos. Não exerceu a medicina porque passou num concurso e assumiu a postura de bancário para ajudar na criação dos irmãos. 

Poeta, trovador e escritor, Antônio Roberto foi membro da 
– Academia Fidelense de Letras, 
– Academia Pedralva Letras e Artes, 
– Academia Campista de Letras e 
representante da União Brasileira de Trovadores (UBT) em Campos. 

Fundou a Academia Infantil de Letras de São Fidélis. 

Grande idealizador do Café Literário, em Campos. 

Figura cativa dos eventos da Fundação Municipal Trianon, como o projeto “Choro e Cia” e o “Grupo Boa Noite Amor”, brindou o público com seu tradicional intervalo poético. 

Exerceu diversas atividades públicas: 
– diretor da Biblioteca Municipal de São Fidélis, 
– diretor da Biblioteca Municipal Nilo Peçanha e 
– diretor do Departamento de Literatura da Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima em Campos.

Obras:
 'Poesia, doce Poesia' – 1978
 'Substantivo abstrato' - 
 'Uma semana de sonetos' – 1993
 'Os pratos da vovó' – 2001
 'Potoc Potoc' -
 'A verve da saudade – Tributo a Antonio Roberto' (vários autores)  1ª ed. - 2009
 'A verve da saudade – Tributo a Antonio Roberto' (vários autores)  2ª ed. – 2009

Fonte:

Raquel Ordones (As Sementes)

Poema formatado obtido no facebook.

Mitos e Lendas (A Preguiça, o Quati e a Juriti)


Contam que a preguiça é muito preguiçosa, não quer fazer nada, não quer trabalhar e trabalha só de comer. Os outros animais não gostam disso e é por esse motivo que se zangam com a preguiça sempre que a encontram.

Um dia, o quati mandou a preguiça fazer um serviço, mas a preguiça não quis saber de trabalhar, só quis comer. O quati insistiu, insistiu, depois ficou zangado e começou a bater na preguiça, que não pôde fugir e se pôs a chorar. 

Estava a preguiça chorando quando chegou a juriti e perguntou: 

— Por que está chorando desse jeito, preguiça? 

— É que o quati me mandou fazer um serviço e como eu estava com preguiça, ele deu muito em mim.

A juriti ficou com muita pena da preguiça e começou a chorar com ela.

Pouco depois, o quati voltou e tornou a surrar a preguiça, dizendo:

— Preguiça mais preguiçosa! E pare de chorar, senão vai apanhar mais. 

A juriti, que se tinha escondido, ouviu aquilo e ficou muito zangada. Começou a pensar num meio de castigar o quati e resolveu fazer uma armadilha. Arrumou uma porção de pedaços de pau e fez um mundéu no caminho que o quati costumava percorrer. Pouco depois, o quati veio vindo, não viu a armadilha, caiu nela e ficou preso. Fez tudo o que pode para escapar mas, depois de muito tempo, nada tendo conseguido, começou a chorar e a gritar.

A juriti ouviu os seus gritos e se aproximou: 

— Olá, seu quati, porque está chorando tanto?

— Estou chorando porque a preguiça fez uma armadilha no meio do caminho, eu caí nela e quase morri. E agora não posso escapar.

— A preguiça fez isso porque você deu nela.

— Quem lhe disse isso? — Perguntou o quati, espantado. 

— Eu mesma vi. Você gostou de bancar o valente. Agora, está pagando por isso. 

E a juriti foi embora, deixando o quati a chorar e a debater-se na armadilha. Chegou ao lugar da preguiça e contou-lhe o que acontecera. 

A preguiça gostou. Riu muito e disse: 

— Muito bem feito. Se ele conseguir escapar da armadilha e vier para cá, nós bateremos nele de novo! 

Fonte:
Colhido por Jerônimo B. Monteiro e publicado em sua coluna Lendas, mitos e crendices
Jangada Brasil. Setembro 2010 - Ano XII - nº 140. Edição Especial de Aniversário.