quinta-feira, 8 de abril de 2010

Carlos Guimarães (Trovas: Cantigas que Alguém Espera)


Canto, feliz, para quem
é meu Sol de Primavera
e, em suas mãos, hoje, tem
CANTIGAS QUE ALGUÉM ESPERA.
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Ponho nas trovas amigas
um pouco do meu viver,
por isso, chamo-as Cantigas,
CANTIGAS DE BEM-QUERER.

A minha trova imperfeita
somente um destino almejo:
- pra tua boca ser feita,
como foi feito o meu beijo.

A tua mão carinhosa,
quando me vem afagar,
lembra a ternura da rosa
desabrochando ao luar.

Ai amor, que me fugiste
e deixaste tantas mágoas!
Sou, hoje um salgueiro triste
chorando à beira das águas

As coisas simples, pequenas,
bem pode o Amor transformar
- eu dei-te uma casa, apenas,
dela, tu fizeste um Lar!

Ao desespero me entrego.
Choro tanto, tanto, tanto,
que recaio ficar cego:
- olhos desfeitos em pranto.

A mais triste das notícias
tu me dás com tanta graça,
por entre tantas carícias,
que a tristeza vem e passa.

A ternura do meu beijo,
em vão, ocultar procura
este meu louco desejo
de beijar-te sem ternura.

A tua mão, que transforma
pesares meus em ventura,
é uma flor de estranha forma,
toda feita de ternura.

A Estrela d'Alva perdida
no céu, em plena alvorada,
é uma lágrima vertida
dos olhos da madrugada.

As roseiras tão vaidosas,
quando me vens visitar,
deitam pétalas de rosas
nas pedras que vais pisar.

A prece que tu fizeste,
mão unida à minha mão,
se não foi ao Pai Celeste,
entrou no meu coração.

As velas pandas ao vento...
Doidas gaivotas pelo ar...
Você no meu pensamento
E, entre nós dois, esse Mar...

A tua boca perfeita,
que tem do pecado a cor,
parece, amor, que foi feita
para os meus beijos de amor

Beijo teu beijo na rede,
com repassada ternura,
como quem mata a sede
numa fonte de água pura.

Contra a tua ingratidão,
transbordando indiferença,
meu remédio é a solidão,
meu refúgio é minha crença.

Cantando canções antigas,
a serenata me encanta
porque repete as cantigas,
que a minha saudade canta

Chora, amor, que o pranto encerra
lenitivo à alma ferida:
depois da chuva é que a terra
se apresenta mais florida

Deus que te deu tanta graça,
que te fez linda e faceira,
espero, amor, que te faça
minha eterna companheira

Devo tudo quanto sou
e a Vida me concedeu,
à mãe que Deus me levou
e à mulher que Ele me deu.

Desfaz-se a flor, mas, no galho,
deixa em pétala singela,
uma lágrima de orvalho,
que a noite chorou por ela.

Deixei-te, amor, e não sei
como aquilo aconteceu,
pois nunca mais encontrei
outro beijo igual ao teu

Devo a essa boca vermelha
ser o escravo que, hoje, sou:
foi o teu beijo a centelha,
que o meu peito incendiou!

Eu sou feliz - bem ou mal -
crendo nas tuas promessas,
porque a Esperança, afinal,
é um saudade às avessas.

Ela se vai eu aceito
o adeus com tranqüilidade
e o céu da distância enfeito
com estrelas de saudade

Essas tuas mãos morenas,
com que meu rosto acarinhas,
parecem feitas das penas
das asas das andorinhas.

Entre apagadas imagens,
fulguras como um clarão,
neste asilo de miragens,
que é, hoje, meu coração.

E esta lágrima contida,
medrosamente a brilhar,
é igual à conta perdida
de todo um grande colar...

Esta aflição que me invade
e esta dor que me consome,
não creio sejam saudade:
- devem ter um outro nome.

Esse teu beijo molhado
traz-me à idéia imagem louca:
- vinho rubro do pecado,
na taça da tua boca.

Enquanto a Lua comanda
as serenatas na Terra,
estrelas fazem ciranda
juntinho à crista da serra.

Entra as rosas mais formosas,
a razão dos meus enleios,
são as rosas perfumosas,
com que ornamentas teus seios.

Gemem, na praia, os coqueiros,
refletindo o soluçar
das noivas dos marinheiros,
que se perderam no Mar.

Já não me queres, porém,
é tranqüilo que eu te digo:
- tu não me impedes, meu bem,
que eu sonhe, sempre, contigo.

Lavadeira, o que insinuas,
um desejo em mim acorda:
ver minhas roupas e as tuas,
juntinhas, na mesma corda.

Lembro o beijo terno e amante,
que te dei quando menino:
espaço de um breve instante,
que mudou todo um destino.

Linda música de fato,
ouvida em noite de Lua,
é a que faz o teu sapato,
nas pedras de minha rua.

Maria, que é meu tesouro
e ee julga muito pobre,
não sabe que valem ouro
seus cabelos cor de cobre.

Minhas mãos formam dois ninhos
sempre de ternura cheios,
onde abrigo dois pombinhos,
dóceis e lindos: teus seios,

Meu lenço, na despedida,
tu não viste em movimento:
- Lenço molhado, querida,
não pode agitar-se ao vento.

Marcado por mil ausências,
que a distância evidencia,
meu pranto põe reticências,
em nossa história, Maria.

Mudou nosso lar depois
do triste adeus, que ela deu:
- um Paraíso de dois
tornou-se Inferno só meu

Meio tonto de desejo,
beijo teu beijo risonho
e, através desse teu beijo,
chego à fronteira do sonho...

No momento em que o
sol posto separa a noite do dia,
sinto roçarem meu rosto
as asas da nostalgia.

Na carta, ao dizer-te quanto
a saudade me consome,
as reticências do pranto
quase apagaram meu nome.

Não é desdém, malquerença,
antipatia ou rancor.
Essa tua indiferença
tem um nome: desamor

Nesta vida amargurada,
que eu vejo esvair-se aos poucos,
tu foste a chama migrada,
no altar dos meus sonhos loucos!

Numa carta alviçareira,
dizes que voltas e, então,
mais rosas veste a roseira,
mais sonoro é o carrilhão,

Não posso impedir que um beijo
lascivo, em meus lábios brote,
quando teu seio, entrevejo,
na janela do decote.

Na Rósea Estrada do Amor,
que, junto de ti, eu trilho,
rendo graças ao favor
de seres mãe do meu filho.

Nas noites de serenata
quantas cancões tenho escrito
usando as letras de prata
do livro azul do Infinito,

Na ausência do teu carinho
torturado de desejos,
rolo em meu leito, sozinho,
beijando meus próprios beijos.

Na festa do teu regresso,
desculpa o que eu te disser
e perdoa todo o excesso
dos carinhos que eu te der

Nessas minhas confidências,
repetidas, sempre iguais,
falam mais as reticências,
que as frases convencionais

Olhos presos à amazona,
velho palhaço risonho
faz, sob o teto de lona,
os seus castelos de sonho.

O sol, pelas madrugadas,
se as estrelas vão-se embora,
acende as velas doiradas
do candelabro da aurora,

O destino, em sua teia,
enredou-nos por maldade:
eu - pequeno grão de areia;
tu - cristal de qualidade

Ouço na alma a ressonância
da frase simples, sem brilho,
ouvida lá na distância:
- Que Deus te abençoe, meu filho!

O que me faz indeciso
- indecisão que eu não venço -
é pensar que teu sorriso
não quer dizer o que eu penso.

Os teus seios, provocando
o meu olhar atrevido,
são dois pássaros bicando
as rendas do teu vestido.

O Tempo ao Amor não mata
é, disso prova fiel,
as nossas Bodas de Prata,
em plena Lua de Mel...

Passaste... E eu recordo ainda
o pouco que me ficou:
Foste a promessa mais linda
com que a vida me enganou...

Por te querer me torturo,
sem saber, em minha dor,
que mistérios o futuro
reservou ao nosso amor!

Porque te foste, a revolta
não me deixa por um triz,
mas a crença em tua volta
quase me faz ser feliz.

Pobre amor que as nossas vidas
reduziu a quase nada:
- somos as brasas dormidas
de uma fogueira apagada...

Partiste, mas, sem desgosto,
lembro a nossa história louca,
pois, na boca, tenho o gosto
do gosto da tua boca.

Preso às garras da saudade,
quase feliz, eu bendigo
ter ainda a liberdade
de sonhar sempre contigo...

Pelo milagre do amor,
é que a mulher nos conduz,
transformando o espinho em flor,
fazendo, das trevas, luz.

Passam-se as horas felizes,
numa disparada louca,
quando as frases que tu dizes
são ditas na minha boca.

Passos leves sobre alfombra,
de roxa mágoa vestida,
a saudade é igual à sombra,
que acompanha a despedida...

Quando me deito e acontece,
que o sono logo não vem,
converso com Deus em prece,
rezo em trovas ao meu bem.

Quando a mulher seu amor
transforma em doida paixão,
ganha as asas de um condor
ou rasteja pelo chão,

Quando contigo velejo,
que prazer, ao te beijar,
sentir no teu doce beijo,
gosto salgado do Mar.

Quando aos teus beijos me entrego,
é tanta a minha alegria,
que eu me sinto como um cego,
que enxergasse a luz do dia.

Reacendendo meus desejos,
lembro saudoso, Maria,
da camisola de beijos,
que no teu corpo eu tecia.

Regresso e, de peito aberto,
dás-me perdão às mancheias:
- quem anda no rumo certo
entende as culpas alheias

Rendeiras, de toda a parte,
tecelãs de fina teia,
vinde à praia ver com que arte
o mar faz rendas na areia.

Saudoso de ti, tristonho,
procuro o sono com ânsia
porque, nas asas do sonho,
torno menor a distância.

Sem teu beijo, teu abraço
e o calor do teu carinho,
vou, de fracasso em fracasso,
morrendo devagarinho.

Se para a igreja ela passa,
penso pedir-lhe um favor:
- Maria, cheia de graça,
rogai por mim, pecador.

Tu me deixaste e eu, tristonho,
lamento o amor fracassado:
- cortaste as asas de um sonho
tanto tempo acalentado

Toda essa dor que me invade
e, constante, me angustia,
se não chega a ser saudade
é bem mais que nostaIgia...

Teu rosto vincado, triste,
é simples confirmação
de que o remorso persiste,
mesmo depois do perdão.

Teu amor, brasa dormida,
que o tempo apagada fez,
a um leve sopro, incendida,
pode brilhar outra vez...

Tentei o amor e os fracassos
se acumularam, meu bem:
- quem teve você nos braços
já não pode amar ninguém.

Tudo acabou... Não mais juntos,
seguimos rumo, diversos...
E eu te agradeço os assuntos,
que deste para os meus versos.

Tece a vida, a vida inteira,
a minha sina vadia,
mas, na trama, trapaceira,
põe fios de nostalgia!...

Taça cheia de doçura,
tua boca apetecida
faz milagres de ternura,
nos beijos de despedida...

Triste vida é minha vida,
pois, na vida, não consigo
a coisa melhor da vida:
- viver a vida contigo...

Teu beijo, doce acalanto
à noite, me embala, amor...
De manhãzinha, entretanto,
ele é meu despertador...

Tendo os olhos rasos d'água,
imploraste o meu perdão,
com tanta graça, que a mágoa
fugiu do meu coração.

Tuas mãos, flores morenas,
que eu colhi nos meus caminhos,
junto à maciez das penas
trazem ternura dos ninhos.

Tanta beleza e tal graça
valorizam teu amor,
pois que quanto mais linda a taça,
melhor do vinho o sabor...

Tantas vezes foi relida,
do meu triste pranto em meio,
que a carta de despedida
já não tem letras e eu leio...

Um violão preso à parede...
Canto alegre de um riacho...
Um doce embalo de rede...
Quatro chinelos debaixo...

Um grande amor permanece
dentro em nós, a vida inteira:
É igual à cinza que aquece,
depois de extinta a fogueira...

Vivo preso ao desencanto
que esse teu amor me traz:
teus olhos prometem tanto
e é tão pouco o que me dás...

Vestindo roupas de bruma,
envolta em seu negro véu,
a madrugada, uma a uma,
apaga estrelas no céu...

Vais ser mãe... Tua figura
perdeu a graça infinita...
Mas, revelas tal ventura,
que pareces mais bonita...

Voltaste! E, em meio à alegria,
nós nem contamos as horas,
que o carrilhão anuncia
pingando gotas sonoras!...
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Fonte:
União Brasileira dos Trovadores Juiz de Fora

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