segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Roseana Murray (A Bailarina e Outros Poemas)


O LAMBE-LAMBE

O lambe-lambe lambe o tempo
(como se o tempo fosse
uma bala, um doce)
e vai pregando seus retratos.

No canto da praça
um velho, um menino,
lado a lado
o mesmo desbotado sorriso.

Atrás do pano preto
o lambe-lambe
e seus misteriosos pensamentos:
onde foi parar a moça
que ele fotografou um dia?
A moça rasgou seu coração
como uma velha fotografia
e partiu junto com o vento.

Num canto da praça
o lambe-lambe
e sua estranha galeria.

O MÉDICO

Para o médico, o corpo
não tem segredos:
é como uma fábrica,
uma orquestra,
uma casa com os móveis
todos no lugar.

O sangue corre nas veias
como um disciplinado rio.
O pulso bate com precisão,
afiado relógio marcando a vida.

Se alguma coisa se move
erradamente,
se alguma coisa se quebra,
o médico bota o corpo de castigo,
e vai escrevendo receitas
como cartas que o corpo entendesse.

A RENDEIRA

A rendeira... seu ofício de aranha
tecendo beleza
me ajuda a tecer meus poemas.

Tem mãos de maga,
a rendeira,
tem mãos de espuma.

Não assina seu trabalho
com um nome,
mas com magia,
como um vôo de pássaro
assina o céu.

O VENDEDOR DE COCADA

Lá vai o vendedor de cocada
com seu tabuleiro,
pano branco na cabeça.

Lá vai o vendedor de cocada
vendendo um mundo de coco:
cocada branca ou queimada
pra vida ficar mais gostosa.

Lá vai o vendedor,
tabuleiro na cabeça,
adoçando a calçada.

A ARQUITETA

A arquiteta gostaria
de projetar mil casas
por dia,
aéreas, subterrâneas,
casas de vidro e de paina,
redondas, de esvoaçantes
telhados.

Em frente à prancheta
a arquiteta sonha
o justo sonho
de todo mundo ter
onde morar.

OS CATADORES DE PAPEL

Pela cidade afora,
noite ou dia,
a qualquer hora,
os catadores de papel
são triste paisagem.

Vão juntando papel e pobreza,
moram assim,
nas praças, nos vãos,
em casa feita de nada.

Tenho tanta pena
dos catadores de papel,
agora moram aqui,
no meu poema.

OS MÚSICOS

Na casa dos músicos
as paredes são sonoras,
no teto moram acordes,
e nos vãos sustenidos se escondem.

Os pensamentos dos músicos
não são como os pensamentos comuns,
moram em outras altíssimas esferas.

Para nós, os outros,
eles constroem algodoados
caminhos de sons.

Para que nossa vida
fique mais leve,
fique mais bela.

A ATRIZ

No camarim a atriz
cola uma outra alma
na sua,
um outro rosto
no seu,
e vão pro palco
assim tão grudados,
que é como um rio
navegando em outro
rio.

O palco suspenso
por um fio de magia
é a casa da atriz.

A BAILARINA

A bailarina,
como frágil lamparina,
como pequeno colar,
faz do ar sua casa,
sua estrada pontilhada
de água.

Entre uma estrela e outra
a bailarina descansa.
Ali onde os humanos
não podem ir,
só os loucos, os loucos
e os que sabem
que com um desejo
se constrói um planeta.

O PESCADOR

Os sonhos do pescador
são feitos de espuma, de sal,
de muitos milhares de peixes,
como feixes de girassol.

Na rede do pescador
pedaços de luz e de prata,
seus sonhos materializados.

Em terra firme o pescador
é habitante provisório,
anda meio de lado,
cheio de silêncios marinhos,
suas mãos de alga.

AS FEITICEIRAS

Não sei se existe ainda
o ofício de feiticeira,
isso é coisa medieval.
Naqueles tempos
elas eram lenha de fogueira
com seus ardentes pensamentos.

Queria hoje ser uma delas,
virar tudo pelo avesso,
trocar as almas e os corações.

Fazer por um segundo
deste triste planeta
um outro mundo.

OS CARTEIROS

Abrir uma carta,
o coração batendo,
é precioso ritual.
O que terá dentro?
Um convite, um aviso,
uma palavra de amor
que atravessou oceanos
para sussurrar em meu ouvido?

São como conchas as cartas,
guardam o barulho do mar,
o ar das montanhas.
Para mim os carteiros
são quase sagrados,
unicórnios ou magos
no meio dessa vida barulhenta.

O POETA

O poeta vai tirando da vida
os seus poemas
como pássaros desobedientes
e amestrados.

A palavra é o seu castelo,
sua árvore encantada,
abracadabra construindo o universo.

RECEITA CONTRA DOR DE AMOR

Chore um mar inteiro
com todos os seus barcos a vela
chore o céu e suas estrelas
os seus mistérios o seu silêncio
chore um equilibrista caminhando
sobre a face de um poema
chore o sol e a lua
a chuva e o vento

para que uma nova semente
entre pela janela a dentro

RECEITA DE ACORDAR PALAVRAS

Palavras são como estrelas
facas ou flores
elas têm raízes pétalas espinhos
são lisas ásperas leves ou densas
para acordá-las basta um sopro
em sua alma
e como pássaros
vão encontrar seu caminho

RECEITA DE INVENTAR PRESENTES

Colher braçadas de flores
bambus folhas e ventos
e as sete cores do arco-íris
quando pousam no horizonte
juntar tudo por um instante
num caldeirão de magia
e então inventar um pássaro louco
um novo passo de dança
uma caixa de poesia

RECEITA DE PÃO

É coisa muito antiga
o ofício do pão
primeiro misture o fermento
com água morna e açúcar
e deixe crescer ao sol

depois numa vasilha
derrame a farinha e o sal
óleo de girassol manjericão

adicionado o fermento
vá dando o ponto com calma
água morna e farinha

mas o pão tem seus mistérios
na sua feitura há que entrar
um pouco da alma do que é etéreo

então estique a massa
enrole numa trança
e deixe que descanse
que o tempo faça a sua dança

asse em forno forte
até que o perfume do pão
se espalhe pela casa e pela vida

RECEITA DE TOCAR O OUTRO

Porteira aberta
para o universo cada
um é único
lugar sagrado
onde árvores antigas
e estrelas cantam

tocar o outro
em sua alma
como se fosse
uma flauta

RECEITA DE OLHAR O FOGO

Pula o fogo e dança
nos olhos
uma dança muito antiga

de rios caçadas cavernas
estrelas entrelaçadas

no fogo os pensamentos
se derramam
e os sonhos como poeira mágica

RECEITA DE ESPANTAR A TRISTEZA

Faça uma careta
e mande a tristeza
pra longe pro outro lado
do mar ou da lua

vá para o meio da rua
e plante bananeira
faça alguma besteira

depois estique os braços
apanhe a primeira estrela
e procure o melhor amigo
para um longo e apertado abraço

RECEITA DE OLHAR

Nas primeiras horas da manhã
desamarre o olhar
deixe que se derrame
sobre todas as coisas belas
o mundo é sempre novo
e a terra dança e acorda
em acordes de sol

faça do seu olhar imensa caravela

AMOR NÃO É SÓ

Amor não é só de homem
por uma mulher
ou de mulher por um homem
amor é amor por tudo
que é justo e livre
amor é horror a tudo
que o ser inventa
para humilhar outro ser

AMOR À PRIMEIRA VISTA

Amor à primeira vista
é alma trocando de corpo
feito pássaro de ninho
é sede repentina
sede da água do outro

PEQUENOS LUXOS

Amor tem seus pequenos luxos
um pôr-de-sol caprichado
luar derramando água
uma flor recém-colhida
um verso equilibrado
na ponta dos dedos
amor tem seus pequenos luxos
de planta nascendo ontem
pedindo terra adubada

FOLHA SECA

Amor não correspondido
vai virando tudo em deserto
vai calando a voz do mundo
vai tirando da água a sua nascente
amor não correspondido
vai tornando em folha seca
tudo o que toca com os dedos
até perder seus espinhos
e se deixar morrer nos vãos
de uma tarde qualquer

FRUTA NO PONTO

Às vezes dá vontade
de agarrar a vida
com uma duas
dez mãos
e levar à boca
e trincar nos dentes
como uma fruta
no ponto

BANHO-MARIA

Amor não deve ser mantido
em banho-maria
pois seus poderes
de luz e encantamento
se esvaem neste lento
cozinhar
amor pede fogo alto
grossas chamas
sol intenso
e muita pimenta
amor pede tempero forte
pede tudo em exagero
mel de se lambuzar

O PRIMEIRO BEIJO

O primeiro beijo
inaugura a casa
inaugura o corpo
talha a primeira pedra
do caminho

pode e deve ser doce
abelha inventando mel
pode e deve ser louco
doce vôo louco
no corpo do outro

RECADO

Ao vento da noite
sussurro sete segredos:
tudo que tenho por fora
tudo que tenho por dentro
que o vento vá levando
minha sede de amor
pule cercas pule sebes
abra porteiras no mar
derramando meu recado
nos quatro cantos do ar

Fonte:
Murray, Roseana. A bailarina e outros poemas. 1. ed. - São Paulo : FTD, 2001. (Coleção literatura em minha casa ; v. 1)

Roseana Murray (1950)


Roseana Murray (Rio de Janeiro, 27 de junho de 1950) é uma poetisa e escritora de obras infanto-juvenis brasileira.

Quando criança, Roseana gostava muito de ler, "tudo o que tinha disponível", segundo a própria autora. Gostava muito do Sítio do Pica-Pau Amarelo, Tesouro da Juventude, Contos de Fadas, entre outros.

Roseana é formada em Lingua e Literatura Francesa, pela Aliança Francesa, Universidade de Nancy. Mora em Saquarema, cidade de que é cidadã honorária. É casada com Juan Arias, jornalista e escritor espanhol, correspondente, no Brasil, do jornal El País, de Madrid. Tem dois filhos: André e Gustavo.

Começou a escrever poesia para crianças em 1980, com o livro Fardo de Carinho, influência direta de Ou isto ou aquilo, de Cecília Meireles.

A autora publicou mais de cinqüenta livros , entre eles Classificados Poéticos (Ed. Miguilim, 1984), Falando de Pássaros e Gatos (Edições Paulus, 1987) e Receitas de Olhar (Ed. F.T.D, 1992).

Recebeu por três vezes o Prêmio de Melhor de Poesia pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil, o Prêmio APCA, o Prêmio da Academia Brasileira de Letras de melhor livro infantil e faz parte da Lista de Honra do I.B.B.Y

Trabalha em Saquarema com o Projeto Uma Onda de Leitura junto com a Secretaria de Educação. Roseana, procura em suas obras mostrar maneiras de viver melhor, ela expressa seu dia a dia.

Fonte:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Roseana_Murray

Antonio Barbosa Bacelar (Poemas Avulsos)


À MORTE DE UMA DAMA

Sombras de um claro sol que me abrasava,
Cinzas de um doce fogo aonde ardia,
Ruínas de uma boca em que vivia,
Cadáver de uma vida que adorava,

Quem te trocou, senhora? O tempo estava
A teus pés, em teu rosto o sol nascia,
De tua vista se compunha o dia,
De tua ausência a noite se formava.

Pois como pôde o tempo pressuroso,
O dia breve, a noite fugitiva
Mudar um corpo e rosto tão fermoso?

Mas tanto sol e luz, tão excessiva
Ardendo de contínuo, era forçoso
Trocar-se em cinza morta a flama viva.

A UMAS SAUDADES

Saudades de meu bem, que noite e dia
A alma atormentais, se é vosso intento
Acabardes-me a vida com tormento,
Mais lisonja será que tirania.

Mas, quando me matar vossa porfia,
De morrer tenho tal contentamento,
Que em me matando vosso sentimento,
Me há-de ressuscitar minha alegria.

Porém matai-me embora, que pretendo
Satisfazer com mortes repetidas
O que à beleza sua estou devendo.

Vidas me dai para tirar-me vidas,
Que ao grande gosto com que as for perdendo
Serão todas as mortes bem devidas.

A UMA AUSÊNCIA

Sinto-me, sem sentir, todo abrasado
No rigoroso fogo que me alenta;
O mal, que me consome, me sustenta;
O bem, que me entretém, me dá cuidado.

Ando sem me mover, falo calado;
O que mais perto vejo, se me ausenta,
E o que estou sem ver, mais me atormenta;
Alegro-me de ver-me atormentado.

Choro no mesmo ponto em que me rio;
No mor risco me anima á confiança;
Do que menos se espera estou mais certo.

Mas se de confiado desconfio,
É porque, entre os receios da mudança,
Ando perdido em mim como em deserto.

À VARIEDADE DO MUNDO

Este nasce, outro morre, acolá soa
Um ribeiro que corre, aqui suave,
Um rouxinol se queixa brando e grave,
Um leão c'o rugido o monte atroa.

Aqui corre uma fera, acolá voa
C'o grãozinho na boca ao ninho üa ave,
Um demba o edifício, outro ergue a trave,
Um caça, outro pesca, outro enferoa.

Um nas armas se alista, outro as pendura
An soberbo Ministro aquele adora,
Outro segue do Paço a sombra amada,

Este muda de amor, aquele atura.
Do bem, de que um se alegra, o outro chora...
Oh mundo, oh sombra, oh zombaria, oh nada!

A UMA DAMA

(Romance)

Por fazer lisonja às flores
De flores touca o cabelo
Nise, a gala do donaire,
Nise, a glória dos desejos.
Invejosas as estrelas
Murmuraram tanto emprego,
Se as não contentara Nise
Com tê-las nos olhos negros.
De garbo, postura e talhe
Vai luzida em tanto extremo,
Que nas vidas que cativa
Tem muita parte o asseio.
Quanto pisa e quanto fala,
Vai brotando e florescendo
Uma rosa em cada passo,
Um jasmim em cada alento.
Caçadora ufana e dextra,
Quem viu caçadora Vénus?
Pede as armas emprestadas
Dizem que a um menino cego.
Galharda o arco exercita,
E, com movimento dextro,
De quantas setas lhe fia,
Nenhuma lhe leva o vento.
Guarde-se todo o alvedrio,
Que não dão as frechas erro,
Pois para acertar as vidas
Tomam nos olhos preceitos.
Despejada comunica
Ao monte seus raios belos,
Que nem sempre o majestoso
Há-de afectar o encoberto.
E, com deixar-se admirar,
Nada lhe perde o respeito;
Mas tais amas traz consigo...
Pastores, diga-o Fileno.

Fonte:
alfarrabio.di.uminho.pt/vercial/bacelar.htm

António Barbosa Bacelar (1610-1663)

Nasceu em Lisboa, Portugal de uma família remediada, frequentando o Colégio de Santo Antão e indo depois estudar Direito para Coimbra.

Tendo-se dedicado à magistratura, foi corregedor em Castelo Branco, provedor em Évora, desembargador no Porto e magistrado na Casa da Suplicação em Lisboa.

A par do trabalho no âmbito da justiça, dedicou-se à escrita, nomeadamente à historiografia e à poesia.

Dentro da historiografia, escreveu a Relação Diária do Sítio e Tomada da Forte Praça do Recife, publicada em Lisboa em 1654, a Relação da Vitória que Alcançaram as Armas do Muito Alto e Poderoso Rei D. Afonso VI, em 14 de Janeiro de 1609, Uma e Outra Fortuna do Marquês de Montalvor, D. João de Mascarenhas e a Vida de D. Francisco de Almeida.

A sua obra poética está essencialmente publicada na Fénix Renascida.

Fonte:
Projeto Vercial

Ialmar Pio Schneider (Soneto de um Solitário)


Por que a solidão me faz tremer
no escuro desta noite, sem ninguém?
Oh! quem sabe, eu nasci para sofrer
e tu que lês meus cânticos, também !...

Minha mágoa não posso descrever;
é uma vontade de possuir alguém
e ao mesmo tempo a ela pertencer
com toda força que minhalma tem.

Eu sei que a madrugada chegará
e o galo vai cantar; é o mensageiro
a prenunciar o dia que amanhece.

Maior tristeza que a minha não há:
mas se fores feliz, sem desespero,
não guardes estes versos e me esquece

Fontes:
Soneto enviado pelo autor
Imagem = www.suzetterizzo.com.br

Guerra Junqueiro: Contos para a Infância (Doçura e Bondade)


Há entre vós, meus filhos, índoles violentas, que não sabem dominar-se, e que se deixam arrastar pelas primeiras impressões. É um grande defeito, e urge emendá-lo: conduz a desavenças e à prática de ações, cujo arrependimento chega tarde. Citar-vos-ei dois casos, de que fui testemunha.

Um rapaz, sacudido violentamente na rua por um homem que vinha diante dele, volta-se e dá-lhe uma bofetada.

– Oh! senhor! exclamou o outro, mal sabe o remorso que vai ter! bateu num cego!

Um homem ainda novo montado num burro, atravessava uma aldeia, e uns camponeses grosseiros começaram a apupá-lo e a bater no burro, para o fazer correr. O homem apeou-se, foi direito a eles, e mostrando-lhes a sua perna aleijada, disse-lhes:

– Se soubésseis que eu era coxo, não teríeis sido tão covardes.

Os camponeses, envergonhados, coraram, afastando-se sem pronunciar uma palavra.

Que vos parece estas duas lições? Estou convencido que aproveitaram a quem as recebeu.

Fonte:
Guerra Junqueiro. Contos para a infância.

Manoel de Barros (Poemas Rupestres) Parte V


O QUE O POETA TIRA DAS PALAVRAS:

- Palavra sem alamares = sem fios dourados ou enfeites. Adereço para vestes cerimoniais ou de cargos importantes. A finalidade desse enfeite é produzir solenidade, no caso à palavra.

- sem chatilenas – originariamente “châtelaines” eram correntes metálicas usadas à cintura, com função decorativa e utilitária, na qual se dependuravam chaves e instrumentos de costura; também são ademanes de origem árabe para enrolar e conferir envolturas, meandros e curvaturas como um meneio de dança árabe, sempre enfeitada por véus de seda e com muita insinuação sensual.

- sem suspensórios = alças que sustentam a calça ou veste da palavra. Usados normalmente por pessoas de distinção quando querem embutir no traje a solenidade da pessoa ou do cargo; também suspensórios, antigamente, eram usados para sustentar as calças curtas dos meninos. Porém, os suspensórios não deixam de ser adereços que se acrescentam. O poeta não quer palavras que sejam sustentadas por algo, ele as quer íntegras, puras, sem o auxílio de algo para indicar a sua força de significar. Quer delas um sentido que brote de seu interior.

- sem talabartes – ou talim – também, um adereço de farda ou de roupagem solene. O poeta não quer palavras enguirlandadas por qualquer enfeite, mesmo que estes possam indicar a força militar de uma palavra, ou poder de pólvora, de fogo como as fardas podem indicar.

- sem paramentos = paramentos tomados como vestes usadas em cerimoniais religiosos estão em contraposição aos talabartes das fardas. Nem o poder do exército ou o poder religioso, nem a raiz de um ou de outro valem para o sentido da palavra; se não valem os enfeites externos, também o poeta rejeita que se agregue às palavras poderes mais profundos como o foram o das armas ou o numinoso.

- sem diademas – coroas ou símbolos de vitórias, de conquistas ou de belezas celebradas. Nada disso vale ao poeta, pois uma palavra caracterizada assim já expôs ao público o seu potencial de significar. Somente poderá mostrar ou ostentar aquele diadema que significa tal coisa, denotativamente. Ao passo que o poeta não quer nada que se finalizou ou foi conquistado, ele quer atingir a raiz funda e obscura, não pesquisada da palavra. Diadema de conquista de algo não lhe serve em relação a qualquer palavra. Uma palavra que se lhe apresentar com um diadema, será afastada, pois mostra um sentido adquirido.

- sem ademanes – também não vai agradar ao poeta uma palavra rica de meneios ou de várias máscaras que lhe configuram sentidos provisórios, que não lhe mostram consistência da fonte, da raiz. Nada de disfarce ou de tentativas de oferta, ou de tentativas insinuantes vai apetecer ao poeta. Uma palavra cheia de volteios ou meneios já se configurou em seu sentido, o poeta nada poderá fazer por ela.

- sem colarinho – como a história das vestes se mostrou farta no uso desse adereço... Mas colarinho em palavra indica muito um cargo provisório, um poder que não é original, enraizado, mas funcional, que em geral impressiona pela destreza do poder que maneja. Para o poeta esse poder não o seduz. Foge do poder efêmero de tudo, ele quer inaugurar algo perante o qual o dinheiro não pode nada, nem comprar, nem mostrar poder, nem manipular.

QUER A PALAVRA HUMILDE

- limpa de soberba – rude e capaz de se deixar inaugurar para um sentido inesperado, que indique uma novidade de vida ou para a vida. Soberba não combina com criatividade, com relação de beleza, de generosidade ou de oferta e, sobretudo de simplicidade. Soberba combina com poder, poeta vive de humildade, de entrega e de dedicação sem retorno. Soberba combina com público, poeta combina com solidão, com consistência da descoberta, com o escondido...

- limpa de melenas – sem cabelos longos de enfeite. Os cabelos longos conferem solenidade, o poeta prefere a palavra empobrecida até de uma crina que pode indicar a solenidade de um cavalo de raça ou a palavra ‘careca', de cabelos curtos como acontece com o prisioneiros, com os deserdados da sociedade ou até doentes. Nada é agradável ao poeta que na palavra traduza ordem, elegância, estirpe engalanada. Quer a palavra em estado de indigência, de pobreza e obscuridade.

COMO O POETA SE VÊ EM RELAÇÃO DE LUTA COM AS PALAVRAS – O HORIZONTE DE SEU DESEJO

- ‘Eu queria ficar mais porcaria com as palavras' . Não somente as palavras devem estar empobrecidas em relação a qualquer enfeite, mas o próprio poeta julga necessário se “emporcalhar” com o lixo da palavra empobrecida. ‘Porcaria', é a expressão do poeta; vem de porco e porco gosta da lama, de dejeto, sente-se bem no lamaçal tão evitado pelas pessoas. Ao passo que o poeta deseja um contato íntimo com a deterioração do sentido das palavras, tornar-se escória com a palavra, logicamente para fazê-la significar novamente, inaugurar algo jamais antevisto. Na ‘porcaria' o poeta perde-se com a palavra para todos os sentidos, dissolve-se em um magma rico de potencialidades que a escória ou o lamaçal lhe oferece, aí, nesta morte para o já adquirido, para o significado conhecido, no mergulho junto com a palavra a seu universo profundo, luta para que a palavra agregue outros valores novos. Do lixo, do lamaçal, da deterioração surge o belo, a leveza e o novo significado grudado na palavra que, por sua vez inaugura o poeta.

- ‘Eu não queria colher nenhum pendão com elas' – Somente ele quer, mesmo quando brotou o novo sentido para as palavras, permanecer na humildade e no escondimento. Não tem propensão para deixar-se levar pela sedução da glória; prefere a sedução do lamaçal que é mais criativo, apesar de doloroso e muito trabalhoso. Prefere o trabalho escondido ao passageiro e saboroso gozo da glória. Não quer que as palavras se iludam com os ‘pendões' da glória. Prefere ser oferta, gratuita e jubilosa.

- Queria ser apenas relativo de águas

Queria ser admirado pelos pássaros.' Por sua vez o poeta que inaugura as palavras também se inaugura porque percorreu a trajetória de mergulhar com as palavras para as fontes ou raízes potenciais de onde a novidade pode brotar. Ao fim do poema proclama sonoramente o resultado de seu estado inaugural e tem que afirmar que ele será poeta se voltar ao seu ‘terreno', ao seu manancial inesgotável: sua relação primeva com as águas. Segundo o livro do Gênesis, antes de tudo as águas eram o elemento primordial. Depois Deus foi mostrando a beleza da criação na distinção de tantas novidades inaugurais, deixando para Adão a tarefa de nomeá-las. O poeta quer apenas acessar suas águas primordiais e as palavras em estado de abandono ou de deterioração auxiliam-no a ir para esse manancial primeiro.

Elege, no outro verso, os pássaros como receptáculos ou capazes de maravilharem-se com as suas inaugurações. Talvez porque o percurso de um pássaro nunca será o mesmo ou ainda por sua natural humildade em suas grandezas e em sua natural, deslumbrante beleza de plumas e pelas notas de seus trinados. A humildade dos pássaros é proclamar a novidade que os constitui sempre. Pássaros não são afeitos à soberba ou a glórias efêmeras. São o que são, mesmo gloriosos e grandiosos, por humildade.

- ‘Eu queria sempre a palavra no áspero dela' – Devolve a palavra ao seu natural depois de ter percorrido o trajeto do poema resvalando pela aspereza de todas as palavras que compuseram a estação do percurso. A declaração do poeta ao final chancela o percurso como inaugural; mediante a palavra áspero ele percorreu sua trajetória iniciando-a com a supressão do ‘e' e encurtando-lhe uma sílaba. Esse procedimento foi obtido pela uso popular da palavra áspero que para os mais simples dos simples, em geral, seguindo a regra, tornam-se palavras simplificadas; assim ‘córrego' torna-se ‘corgo', ‘pássaro-preto' torna-se ‘passu-preto' e assim por diante.

Dessa forma o poema se torna consistente em sua inauguração dupla, do poema e do poeta. Ambas descobertas revelam as novidades originárias das latências potenciais de cada um, do poeta e da palavra. Unidos, impulsionados pelo Eros vital da palavra e da entrega do poeta, coroou-se o percurso em que o poema construiu-se no desvelamento do ser e da beleza contida.

O ser se explicitou pelas suas potencialidades e o poema se explicitará em tantas outras leituras quanto os leitores se deixarem conduzir pela trajetória que ele oferece. Em outras palavras, quem se permitir ler o poema deixando-se levar pelas afirmações e novidades dos versos, ao final estará inaugurando uma leitura nova de si mesmo. Também se pode afirmar que este poema cria o seu leitor na pessoa que o permitir, inaugura nova dimensão do ser, do ser do leitor. Conforme a inauguração do belo, original, firmou-se como obra de arte capaz de criar outros horizontes a partir da entrega ao percurso dos leitores. Essa é a força ou potencial intrínseco do belo acessado pelo poeta e pela palavra ao mais íntimo do Eros vital, capaz de ser também portador de novas inaugurações.

Em outra linguagem, o poema é portador da propriedade de mostrar a novidade do ser porque encontrou a fonte do desvelamento. O leitor que entender o poema acessará ao mais íntimo do seu ser e se compreenderá de uma forma que ainda não antevira a respeito de si mesmo. Desvela-se como ser capaz de aprofundamento.

12.

O LÁPIS

É por demais de grande a natureza de Deus.
Eu queria fazer para mim uma naturezinha
particular.
Tão pequena que coubesse na ponta do meu
lápis.
Fosse ela, quem me dera, só do tamanho do
meu quintal.
No quintal ia nascer um pé de tamarino apenas
para uso dos passarinhos.
E que as manhãs elaborassem outras aves para
compor o azul do céu.
E se não fosse pedir demais eu queria que no
fundo corresse um rio.
Na verdade na verdade a coisa mais importante
que eu desejava era o rio.
No rio eu e a nossa turma, a gente iria todo
dia jogar cangapé nas águas correntes.
Essa, eu penso, é que seria a minha naturezinha
particular:
Até onde o meu pequeno lápis poderia alcançar.

De forma semelhante ao poema anterior, o poeta inaugura este poema a partir do ínfimo, da ponta do lápis.

O LÁPIS EM SI E SUA NATUREZA

O ponto de partida é paradoxo entre o infinito e o ínfimo; entre o ponto de apoio ou consistência do ser: a natureza que o especifica e lhe determina o ser.

Define-se o Lápis, ou melhor, a ponta do Lápis como coisa minúscula. Porém, acontece uma circunstância particular, trata-se da “ponta do meu lápis”. Recentemente o poeta declarou em entrevista para o Jornal Correio do Estado que sempre trabalha, escreve a lápis, depois passa à máquina e jamais usa o computador em seu trabalho de compor poemas. Essa circunstância torna o lápis um ponto relacional com seu trabalho de produzir poemas. Da ponta do lápis é que saem as palavras, os versos e os poemas; de uma forma ou de outra a relação criadora do poeta integra o lápis como participante que determina o registro do pensado. Neste cenário, o lápis concede ao poeta a segurança necessária para o registro bem como lhe oferece a oportunidade de descartar qualquer parte do registrado. Sem o lápis o poeta estaria cego ou impossibilitado de prosseguir após qualquer ponto de chegada. Percebe-se que o lápis é muito importante nesse processo de criar e trabalhar as palavras. O lápis consigna visibilidade ao poema e não angustia o poeta. Mas sendo determinante, está com toda a sua natureza à disposição do poeta para prosseguir. É um pressuposto mesmo hoje, quase indispensável.

A natureza do lápis é a simplicidade de auxiliar a qualquer um registrar algo que julgou necessário. Sabe registrar e tornar visível. Para o poeta, ele insinua que a ponta do lápis resume tudo o que ele é; mas é bom acrescentar que o comprimento do lápis pode ou não auxiliar. No mínimo dará consistência ao processo de escrever, de registrar. Registra o nome, o verso, o poema e este será em definitivo. O que não se registrou teve uma existência efêmera e perdeu a capacidade de ser visto, lido, lembrado, decorado ou recitado até. Essa á a natureza funcional do lápis, não a material que é grafite e madeira.

O LÁPIS COMO PONTO PARADOXAL PARA O POETA

Perante ‘a natureza por demais de grande de Deus', o poeta declara seu desejo, ‘uma naturezinha particular' para ele. Sem dúvida que perante a natureza infinita de Deus, qualquer ‘naturezinha' criativa, participante do poder criador de Deus, seria muito poder, muita coisa para um poeta. O lápis é o referencial criador que ele possui diante de si o tempo todo; outorga-lhe muito poder, pois viu sempre seus poemas registrados a lápis ganharem vida e consistência. Perante esse fato muito concreto, parece que o poeta sente uma ponta de inveja do poder registrador do lápis e pede a Deus uma ‘naturezinha particular' para ele poder criar e inventar à vontade.

O poeta anseia ser criador e participar do poder infinito de Deus – poder deixar algo muito significativo e duradouro, como o lápis deixa. Um poder para criar, mas que seja pequeno, mas cuja obra perdure e seja visível, mesmo pequena e de pouca aparência.

COMO SERIA SUA “NATUREZINHA PARTICULAR”

Inicia uma série de situações, lugares e recordações da infância que ele presume sejam resultados ou possibilidades de se registrar ou inaugurar um tempo ou situação muito definitiva. Sempre o poeta julgou a infância o lugar privilegiado para se ‘brincar de Deus', para inverter a ordem das coisas e tornar o mundo independente da lógica que a racionalidade lhe imprimiu.

- ‘ Fosse ela (a naturezinha) só do tamanho do meu quintal... e ia nascer um pé de tamarino apenas para uso dos passarinhos.' O quintal para muitos poetas é o arquétipo das travessuras inocentes e das percepções extra-temporais; aí inaugura-se um mundo independente do tempo – e de sua inexorabilidade – e da lógica racional bem como de outras necessidades, por exemplo de trabalhar. Lá tudo é total e preenchente, não há espaços ociosos para elucubrações e nem lugar para fixação das coisas em suas especificidade. Lá no arquétipo do quintal tudo pode mudar e se transformar em sua natureza e nas relações; tudo depende da criatividade e da fantasia imaginante. O mundo lá, fantástico, não é irreal, mera fantasia. O sentido e o significado da vida, das descobertas mudam as pessoas e suas vidas.

Nesse quintal, o pé de tamarino não segue a ordem e finalidade que o homem lhe deu, somente vai ser para o deleite dos pássaros que se irmanam às pessoas para inaugurar a vida a todo instante como seus vôos inauguram rotas, continuamente. Passarinhos tornam-se mestres na invenção da vida, assim esse quintal seria muito poderoso e fértil.

- ‘E que as manhãs elaborassem outras aves para compor o azul do céu' - Dessa forma o universo se interliga na criação. Mesmo as aves deveriam tornar-se outras, inauguradas pelas manhãs. Nesse quintal arquetípico o céu seria sempre azul, prenunciando o tempo bom e afugentando toda e qualquer nuvem, tempestade ou raio.

- ‘E se não fosse pedir demais eu queria que no fundo corresse um rio'- O rio completa a extensão da vida. Somente o rio já é um arquétipo fortíssimo da vida que se renova a todo instante. Até para os filósofos gregos, ultra-racionais, o rio se tornou o símbolo da mutação constante. Nele a vida se renova e por sua presença a natureza ganha segurança da fertilidade da vida de que é portadora. O rio é também o caminho, o percurso que apenas percorrido se desfaz na expectativa de alguém para inaugurar outro percurso. O rio não registra percursos particulares, possibilita-os. Ele é a própria possibilidade da transformação constante da vida. O rio também aglomera o universo. Logo o poeta declara que ‘ a nossa turma iria todo dia jogar cangapé nas águas...'

- ‘No rio eu e a nossa turma, a gente iria todo dia jogar cangapé nas águas correntes' – impossível a vida lúdica sem a turma que sabe proclamar a vida sem tempo nem utilidade, a não ser para brincar e reinventar a vida. Esse jogo, o do cangapé condiz com tudo o que o poeta afirmou, pois trata-se de um jogo em cujo centro está sempre a surpresa de onde brotará um garoto do fundo rio para derriçar uma pernada certeira para ver se acerta o colega. Nesse jogo aparecem as características necessárias para uma reinvenção contínua do traçado do viver. Vive-se intensamente para fugir e para surpreender; todas as habilidades e aptidões são colocadas à prova; valores como a camaradagem, astúcia, esperteza, medo de levar uma pezada no lombo, tudo aguça a atenção e exige esperteza, leveza, e agradabilidade também, pois não se passa de uma brincadeira muito séria, em cujo processo o “eu” de cada um dos meninos se constrói e se inaugura para a vida.

- “Essa, eu penso, é que seria a minha naturezinha particular: / Até onde o meu pequeno lápis poderia alcançar.” A conclusão do poeta deposita na despropositada pequenez da ponta do lápis a grandeza de sua naturezinha criadora, capaz de reinventar constantemente a vida. Cabe à gloriosa ‘ponta do meu lápis', em sua insignificância – tão a gosto do poeta – conferir a grandeza de suas invenções ou inaugurações. A beleza do contraste passa pela pequenez necessária da ponta do lápis para se atingir a expressividade artística dos versos e do poema; a ponta do lápis, como o pensar do poeta, se consomem no gasto do nascimento/registro das palavras e dos versos, como um instante glorioso que se esvai e não será reconhecido, mas meramente suposto somente por quem, e muito poucos, se dedicar a examinar o poema além das palavras. Ou ainda ver o poema em seu processo de criação e registro. A sensibilidade do poeta integra a ponta do lápis como parceira de seu percurso e seu trabalho exaustivo em criar, em labutar e esfregar as palavras até chegar ao bom verso que, então se torna imortal; mas, com o auxílio da ponta do lápis.

Gloriosamente o poeta celebra a nobreza da ponta de seu lápis, parceira de suas lutas e registros.

Fonte:
Portal das Letras - Pe. Afonso de Castro
http://www.passeiweb.com/na_ponta_lingua/livros/analises_completas/p/poemas_rupestres

Monteiro Lobato (Reinações de Narizinho) O Gato Felix – I – A história do gato

Narizinho não teve o gosto de salvar o príncipe. Quando chegou ao ribeirão do pomar, já nada viu por ali. Certa de que ele se havia salvado a si próprio voltou correndo para casa, ansiosa por conhecer as aventuras do gato Félix. Chegou, botou o gato no colo e disse:

— Você tem que me contar a sua vida inteirinha, sabe?

— Pois não — respondeu o gato. — Mas só sei contar histórias de noite. De dia perdem a graça.

— Neste caso, vá dar um passeio e quando for de noite esteja aqui.

O gato saiu, passeou pelo sítio inteiro, caçou três ratos e de noite voltou. Tia Nastácia acendeu o lampião da sala. Depois disse:

— “É hora, gente!” Todos vieram postar-se em redor do ilustre personagem; dona Benta sentou-se na sua cadeirinha de pernas serradas; Narizinho e Pedrinho sentaram-se na rede; Emília foi para o colo da menina. Até o Visconde de Sabugosa quis ouvir as histórias. Narizinho teve dó do coitado; espanou-lhe o bolor e botou-o num canto da sala, dentro duma lata — para que não sujasse o chão com aquele pó verde. Logo que todos se acomodaram, Emília disse:

— Comece, seu Félix! E o gato Félix começou.

— Houve na França um gato muitíssimo ilustre, que era escudeiro do marquês de Carabás — tão ilustre que não há no mundo inteiro criança que o não conheça.

— Até eu! — gritou Emília. — Era o tal Gato de Botas!...

— Justamente, menina. Esse famoso gato era o escudeiro do marquês de Carabás. Fez coisas do arco-da-velha, como se sabe, até que se casou com uma linda gata amarela e teve muitos filhos. Esses filhos tiveram outros filhos. Estes outros filhos tiveram novos filhos, e veio vindo aquela gafaria que não acabava mais até que nasci eu.

— Que bom! — exclamou Narizinho. — Então você é bisneto ou tataraneto do Gato de Botas?

— Sou cinqüentaneto dele — disse o gato Félix — Mas não nasci na Europa. Meu avô veio para a América no navio de Cristóvão Colombo e naturalizou-se americano. Eu ainda alcancei meu avô. Era um velhinho muito velho, que gostava de contar histórias da sua viagem.

Emília bateu palmas.

— Conte, conte! Conte as histórias que ele contava. Conte como foi que o tal Colombo descobriu a América. O gato Félix tossiu e contou.

— Meu avô veio justamente no navio de Cristóvão Colombo, que se chamava “Santa Maria”. Veio no porão e durante toda a viagem não viu coisa nenhuma senão ratos. Havia mais ratos no “Santa Maria” do que pulgas num cachorro pulguento, e enquanto lá em cima os marinheiros lutavam com as tempestades, meu avô lá embaixo lutava com a rataria. Caçou mais de mil. Chegou a enfarar-se de rato a ponto de não poder ver nem um pelinho de camundongo. Afinal o navio parou e ele saiu do porão e foi lá para cima e viu um lindo sol e um lindo mar e bem na frente uma terra cheia de palmeiras.

— Então era o Brasil! — disse Emília. — Aqui é que é a terra das palmeiras com sabiá na ponta!...

— Viu a terra cheia de palmeiras, e na praia uma porção de índios nus, armados de arcos e flechas, a olharem para o navio como se estivessem vendo coisa do outro mundo. Era a primeira vez que um navio aparecia por ali.

— Imaginem se eles vissem o trem de ferro!... – observou Emília.

— Colombo, então — continuou o gato — resolveu desembarcar e saber que terra era aquela, porque estava na dúvida se seria realmente a América ou outra. Entrou num bote e foi para a praia. Pulou do bote e chamou os índios.

Os índios não se mexeram do lugar, mas o cacique deles criou coragem e adiantou-se e chegou perto de Colombo.

— Meus cumprimentos — disse Colombo, com toda a gentileza, fazendo uma cortesia com o chapéu de plumas.

— Bem-vindo seja! — respondeu o índio, sem tirar o chapéu, porque não usava chapéu. Colombo então perguntou:

— Poderá o cavalheiro dizer-me se isto por aqui é a tal América que eu ando procurando?

— Perfeitamente!” — respondeu o índio. Isto por aqui é a tal América que o senhor anda procurando. E o senhor já sei quem é. O senhor é o tal Cristóvão Colombo, não?

— Realmente, sou o tal. Mas como adivinhou?

— Pelo jeito! — respondeu o índio. — Assim que o senhor botou o pé na praia, senti uma batida na pacuera e disse cá comigo: É o senhor Cristóvão que está chegando, até aposto!

Colombo adiantou-se para apertar a mão do índio. Em seguida o índio virou-se para os companheiros lá longe e gritou:

— Estamos descobertos, rapaziada! Este é o tal Cristóvão Colombo que vem tomar conta das nossas terras. O tempo antigo lá se foi. Daqui por diante é vida nova — e vai ser um turumbamba danado...”

Nesse ponto da história o Visconde botou a cabeça fora da lata e disse:

— Não acreditem! A descoberta da América não foi assim, foi muito diferente. Eu li toda a história de Colombo num livro de dona Benta. Posso afirmar que o gato Félix está inventando.

— Não está inventando nada! — berrou Emília. — Foi assim mesmo. O livro não esteve lá e não pode saber mais do que o avô de seu Félix, que esteve presente e viu tudo.

— Mas essa história é absurda! — berrou o sábio Visconde. – Isso é um disparate!...

— Disparate é o seu nariz — berrou Emília. E voltando-se para a menina:

— Narizinho, por que é que você não tampa o Visconde?

Narizinho achou boa a idéia; foi lá e tampou a lata com o Visconde dentro.

Terminado o incidente, o gato Félix continuou:

— Depois disso houve muitas coisas, e mais coisas, e outras coisas, até que meu avô se casou e nasceu meu pai, e meu pai se casou e nasci eu.

— E onde nasceu? — perguntou Pedrinho.

— Nasci nos Estados Unidos, na cidade de Nova York. As casas lá são tão altas que se chamam arranha-céus. Eu nasci no quadragésimo terceiro andar do arranha-céu mais alto de todos.

— Quadragésimo! — murmurou Emília. — Que bonito nome! Eu, se fosse dona Benta, batizava a vaca mocha de Quadragésima...

— Não atrapalhe, Emília, deixe o gato falar – advertiu Narizinho. E, voltando-se para o gato Félix: — Mas essas casas arranham mesmo o céu ou é um modo de dizer?

— Arranham, sim — confirmou o gato — e às vezes até o furam. O céu de lá é todo furadinho.

— Quem deve ficar furioso é São Pedro — disse a boneca. — Eu, se fosse ele, suspendia o céu um pouco mais para cima.

Narizinho tapou-lhe com a mão a boca.

— Nasci num arranha-céu — continuou o gato — e criei-me na rua. Fui o gatinho mais travesso da América, o mais atropelador dos camundongos. Depois que cresci, atirei-me para cima das ratazanas com tamanha fúria que quase todas se mudaram da cidade. Um dia me deu na cabeça viajar. Fui ao porto, onde vi uma porção de navios, uns mais novos, outros mais velhos. Escolhi o mais velho, calculando que nele devia haver mais ratos. Entrei sem pagar passagem e dirigi me ao porão. Assim que entrei, a rataria disparou. Só pude apanhar quatro.

No dia seguinte peguei dez. No terceiro dia peguei vinte. No quarto....

— Pegou quarenta! — disse Emília.

— Não, trinta e nove só — corrigiu o gato. — E assim durante quinze dias. Ao fim desse tempo, gordo que nem um porquinho, deixei a rataria em paz. Foi nessa ocasião que aconteceu o desastre.

— Que desastre?

— Espere. Estava eu comendo o último rato que comi no navio, quando rompeu lá em cima um berreiro. Subi ao tombadilho para ver o que era e encontrei o capitão dizendo que o navio tinha batido numa pedra e ia afundar.

— Credo! — exclamou tia Nastácia, que estava cochilando e acordara nesse ponto. — Devia ser um quadro muito triste...

— Sim, ia afundar — continuou o gato. — Como houvesse arrebentado a proa, estava bebendo água que nem uma esponja. Os marinheiros corriam de um lado para outro, qual doidos. Uns tomavam os escaleres, outros amarravam à cintura os salva-vidas, outros lançavam-se à água. Eu disse comigo: “E agora, Félix, que vai ser de ti?” Pensei, pensei e por fim tive uma idéia. A única salvação seria fazer-me engolir vivo por algum dos tubarões que rodeavam o navio com as bocas abertas e aquelas dentuças que mais pareciam serrotes.

— Credo! — exclamou outra vez tia Nastácia fazendo o sinal da cruz. — É por essas e outras que nunca hei de sair do meu cantinho...

— Tive essa idéia — continuou o gato — e tratei de pô-la em prática. Escolhi o tubarão maior de todos e quando ele passou perto de mim, dei um pulo e caí, como pílula, bem no fundo da garganta dele!

— E não se arranhou? — disse Emília. — Não esbarrou nalgum dente?

— Nada! Caí na campainha do tubarão e nela me agarrei e fui entrando por aquele corredor vermelho afora até chegar ao estômago.

— Era grande?

— Tinha o tamanho desta sala — respondeu o gato com o maior caradurismo.

Nesse ponto o Visconde empurrou a tampa da lata, botou a cabeça de fora e gritou:

— Não acreditem! É mentira! Nem baleia tem estômago desse tamanho. Além disso, é impossível a um gato permanecer vivo num estômago de tubarão.

— Impossível por que, seu Embolorado? — disse Emília. – Não se lembra da história que dona Benta contou do profeta Jonas, que “permaneceu” uma porção de tempo dentro da barriga de um peixe?

— Sim — concordou o Visconde. — Mas Jonas era profeta.

— Jonas era profeta e seu Félix é quadragésimo. Dá na mesma.

Todos acharam que Emília tinha razão.

— Fiquei lá muito sossegado da minha vida — continuou o gato — mas vi logo que não podia morar ali por muito tempo. Não havia ratos — e gato não sabe viver onde não há ratos. Tinha que sair, mas como? Sair era cair n’água e morrer afogado. De que modo resolver o problema?

— Muito simples — disse Emília. — Era só fazer uma canoinha e entrar nela e ir remando...

— Cale essa boca, não seja tão sapeca! — interveio Narizinho.

— Quem está contando a história é o gato Félix, não é você.

O gato continuou: .

— O caso era dificílimo, e eu estava a pensar nele quando vi entrar no estômago da fera uma enorme isca com anzol dentro. Mais que depressa fisguei o anzol, bem fisgado, na pacuera do monstro.

Assim que ele sentiu a dor da fisgada, pôs-se a corcovear como burro bravo com domador em cima. Corcoveou, corcoveou, corcoveou até que não pôde mais e foi morrendo. Passaram-se algumas horas sem acontecer nada. O tubarão estava bem morto. Nisto vi uma réstia de luz e uma ponta de faca aparecendo. Encolhi-me bem encolhido para me livrar da faca e compreendi que estavam abrindo a barriga do peixe. Não esperei por mais. Dei um pulo para fora e caí no meio dum grupo de marinheiros, bem dentro dum navio!... Os marinheiros ficaram assombradíssimos de ver sair um gato vivo da barriga de um peixe e só sossegaram quando lhes contei toda a minha história. O capitão olhou para mim, alisou as barbas e disse:

— Para onde pretende ir? Meu navio está de rumo à Inglaterra, onde poderei desembarcar você?

— Muito obrigado” — respondi. — O país que eu procuro não é esse.

— Será a França?

— Não!

— Será a Alemanha? a Suécia? a Turquia? a Arábia? A Patagônia?

— Nada disso. A terra que eu procuro é aquela onde o demo perdeu as botas. Quero encontrar essas botas.

O capitão julgou que eu estivesse a mangar com ele e pregou me tamanho pontapé que fui parar no porão.

Todos deram gostosas risadas e tia Nastácia observou:

— Isso é invenção de gente sem serviço. Esse lugar nunca existiu.

— Como nunca existiu, se foi lá que o demo perdeu as botas? — replicou Emília. — Eu acho que seu Félix tem toda a razão e mais vale descobrir esse lugar do que descobrir a América. Continue, seu Félix.

O gato continuou:

— Fiquei no porão até que o navio entrou num porto. Desembarquei e fui andando por um caminho muito comprido. De repente apareceu uma velha, muito velha e coroca, de porretinho na mão.

— Vai ver que era uma fada — cochichou Emília ao ouvido de Narizinho.

— Cheguei-me para a velha e perguntei: “A senhora poderá dizer-me onde fica o lugar onde o demo perdeu as botas?

A velha admirou-se da pergunta; arregalou os olhos, abriu uma boca de bagre sem um só dente nas gengivas e respondeu:

— Não sei, gatinho. Mas se você for andando, andando, andando sem parar, aposto que um dia chega a essa terra.

Aceitei o conselho da velha e fui andando, andando, andando até que encontrei...

— Uma coruja! — interrompeu Emília.

— Não — disse o gato — encontrei um sábio muito velho, de grandes barbas brancas. Cheguei-me a ele e perguntei:

— Senhor velho, poderá dizer-me onde é o lugar em que o demo perdeu as botas?

— Posso, sim — respondeu o velho. — Fica pertinho dos confins do Judas.

Vi que o velho estava caçoando comigo e fui-me embora.

Andei, andei, andei...

— Pare de andar. Seu Félix. Chegue logo, que já está caceteando — disse Emília.

O gato desapontou um bocadinho, mas continuou:

— Andei, andei, andei, até que encontrei...

— Uma coruja! — interrompeu de novo Emília.

— Não amole mais com essa coruja, Emília! – disse Narizinho. — Ele não encontrou coruja nenhuma. Cara de coruja tem você. Continue, gato Félix.

— Encontrei outra velha, mais velha ainda e mais coroca do que a primeira.

Emília deu uma risada gostosa.

— Que terra esquisita!... Só velho para cá, velha para lá... Com certeza foi no país de Matusalém...

O gato Félix desapontou mais um bocadinho, mas continuou:

— Encontrei uma velha, muito velha e perguntei: “A senhora...”

— Etc. etc. — disse Emília. — E que é que ela respondeu?

O gato Félix, ainda mais desapontado, continuou:

— Ela respondeu:

— Esse lugar não existe, gatinho. O demo nunca teve botas. Você não sabe que o que ele tem são cascos?

— E aí? — indagou Emília, que estava achando aquela história muito sem jeito.

— Aí eu... eu... parei de procurar a tal terra e fui cuidar de outra coisa.

Dessa vez o desapontamento foi geral. Dona Benta olhou para Narizinho, tia Nastácia olhou para dona Benta, Pedrinho olhou para o forro. Só Emília teve coragem de olhar para o gato. Arrebitou o nariz de retrós, fez um muxoxo de pouco caso e disse:

— Não valeu a pena vir de tão longe para contar uma história tão sem pé nem cabeça. Eu, que nunca saí daqui, sou capaz de contar coisa muito mais bonita.

— Pois então vamos dormir — disse dona Benta levantando-se — e quem conta a história de amanhã vai ser a Emília.
––––––––
Continua... O Gato Felix – II – A história da Emília

Fonte:
LOBATO, Monteiro. Reinações de Narizinho. Col. O Sítio do Picapau Amarelo vol. I. Digitalização e Revisão: Arlindo_Sa

Campinas recebe Caravana da Leitura 15 a 17 de Dezembro


Nos dias 15 a 17 de dezembro/2011, o projeto literário Caravana da Leitura estará em Campinas pela segunda vez neste ano e disponibilizará livros para crianças, jovens e adultos pelo valor simbólico de R$2,00.

O objetivo do trabalho é incentivar o hábito da leitura e estimular a criação de novos agentes multiplicadores em defesa do livro e literatura. A iniciativa conta com a parceria da Secretaria de Educação e Cultura dos municípios envolvidos, apoio do Ministério da Cultura e patrocínio da ZF do Brasil.
Justificar
O evento, em parceria com Secretaria de Cultura de Campinas, acontecerá na Praça Rui Barbosa, próximo à Catedral, das 9h30 às 17h.

O projeto reúne uma grande variedade de obras literárias do escritor Laé de Souza, que apresenta histórias do cotidiano, em uma linguagem bem-humorada e pontuada por reflexões, dirigidas ao público infantil, juvenil e adulto.

Para Laé de Souza, coordenador do projeto, a leitura tem um papel decisivo na formação de cidadãos. “A fim de implementar e difundir o hábito de leitura de forma dinâmica, nós temos levado livros a várias regiões do país. A Caravana da Leitura atua fortemente no processo de formação de leitores, além de promover democratização da leitura para população, pelo fato de oferecer obras a preços simbólicos, facilitando o acesso”, destaca o autor.

Aplicado desde 2004, neste ano a Caravana da Leitura passará por 42 cidades com previsão de distribuição de cerca de 120 mil livros.

Interessados podem conhecer outros projetos de incentivo à leitura, de Laé de Souza e o roteiro da Caravana da Leitura, em "Agenda", no site www.projetosdeleitura.com.br

Fonte:
Laé de Souza

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 423)


Uma Trova Nacional

A Jesus nossos, louvores,
nesta Festa de Natal...
e aos amigos trovadores,
nosso abraço fraternal.
–VANDA ALVES/PR–

Uma Trova Potiguar

A manjedoura modesta,
berço repleto de luz,
simboliza a grande festa...
Natal do Cristo-Jesus.
–DJALMA MOTA/RN–

Uma Trova Premiada

2006 - Balneário Camboriú/SC
Tema: PESCADOR - Venc.

Cristo, o maior pescador,
pescou peixes, pescou almas,
resgatou do mundo a dor,
em manhãs belas e calmas!
–GLEDIS TISSOT/SC–

Uma Trova de Ademar

Que todos os Universos
transformem-se em refletores,
para iluminar, com versos,
o Natal dos Trovadores!
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram

Quanto mais festa e mais luz
nesses Natais de salões,
mais nós sentimos Jesus
ausente dos corações!
–LUIZ OTÁVIO/RJ–

Simplesmente Poesia

Todo el Año es Navidad
–CRISTINA OLIVEIRA CHÁVEZ/USA–

Todo el año es navidad
en un corazón por tierno,
desparrama su bondad
¡en Primavera o invierno!

Todo el año es Navidad
amando al niño Jesús,
al ofrecer amistad
aligerando la cruz!

Se viste el cielo de gala
en un corazón por tierno,
por el amor que regala
tan bondadoso y fraterno.

En su vida hay caridad,
socorre al necessitado
desparrama su bondad,
¡por amor al niño amado!

Navidad sin estación
con su paz y amor eterno,
es su mayor ilusión
¡en Primavera o Invierno!

Estrofe do Dia

Que o esplendor do natal
nos forneça farta luz;
e que o nascimento seja
a bússola que nos conduz,
e por toda geração
tenhamos a proteção
do divino e bom Jesus.
–MÁRCIO BARRETO/PB–

Soneto do Dia

Natal Profano
–DIVENEI BOSELI/SP–

Em meio ao tilintar de copos e talheres
do champanhe barato e o vinho de segunda,
o suor e o avental de simplórias mulheres
garantem saciar a gula que as circunda...

Na sala o pisca-pisca ofusca o olhar de alferes
dos pais sobre os guris que, à luz pouco profunda,
procuram na etiqueta os muitos caracteres,
rasgando embrulho a embrulho, em plena barafunda!

E dizem que é Natal... no costume imitando
os mesmos fariseus que acabaram matando
quem hoje se festeja sem lhe seguir o exemplo...

Neste “natal” profano imploro, e me comovo:
renasça, Nazareno, aqui, dentre o meu povo,
para expulsar, de novo, os vendilhões do templo.

Fonte:
Textos enviados pelo Autor

José Carlos Dutra do Carmo (Manual de Técnicas de Redação) Parte XII


LONGO.

Evite escrever palavras ou frases longas.

Construa frases que tenham, no máximo, três orações.

Períodos excessivamente longos tornam o estilo monótono e cansativo.

MEDO DO ERRO.

Muita gente não gosta de ser corrigida, fica constrangida. Em geral, esse sentimento acaba provocando uma aversão por escrever. Mas redigir não pode ser causa de sofrimento, principalmente em função da correção gramatical. Errar faz parte de qualquer atividade criativa, mas é preciso trabalhar – prestar atenção no que se lê e no que se escreve, procurar tirar as dúvidas, quando elas aparecem, ou estudar gramática para valer.

METÁFORA.

É o emprego de uma palavra fora de seu sentido normal, por efeito de analogia (comparação subentendida).

A Amazônia é o pulmão do mundo.

Esse homem é perigoso como uma fera!

As chamas eram centenas de línguas gigantescas.

MISTÉRIO.

Use a interrogação e a negativa quando quiser criar mistério e curiosidade em torno dos fatos.

Quem seria aquele homem que nos visitava todas as semanas e que ficava por horas conversando com meu pai? O que os dois tanto discutiam? Por que nunca podíamos estar presentes quando ele conversava com meu pai?

Se quiser criar expectativa e dúvidas, envolva sua personagem em mistério, falando dela sem a identificar no início da narrativa.

O homem do capote bateu na porta, foi atendido por meu pai, e passou umas duas horas no escritório trancado com ele. Voltou à minha casa durante anos e sempre que chegava meu pai mandava que eu fosse para o quarto. Mamãe ficava na cozinha.

MONÓLOGO.

É um tipo de texto em que alguém expressa sua maneira de ser, seu interior, suas emoções, seu pensamento. É uma conversa consigo mesmo.

Se não tem ninguém para conversar e fala sozinho (“com seus próprios botões”) ou com alguém (ou algo) que não pode responder, está, então, monologando.

Deveria falar-lhe, dizer-lhe o que sentia por ela? Talvez não pudesse conter as emoções toda vez que a visse. E então diria a ela tudo o que sempre quisera. Que a amara desde a primeira vez que a vira, que aguardava ansiosamente o momento em que a veria de novo. Que não hesitaria em fugir com ela, se essa fosse a condição para ficarmos juntos. Largaria tudo: casa, emprego, posição social, amigos...

NÃO USE.

Palavras ou frases ridículas, contraditórias, desnecessárias, que não se ajustem ao tema proposto.

Expressões vulgares, pobres, como:

Em primeiro lugar, em segundo lugar, essas mal traçadas linhas, etc.

NARRAÇÃO.

É o relato de um fato, de um acontecimento. Há personagens atuando e um narrador que relata a ação.

Tente fazer com que os diálogos escritos, em caso de narração, pareçam uma conversa.

A narração está vinculada à nossa vida, pois sempre temos algo a contar. Narrar é relatar fatos e acontecimentos, reais ou fictícios, vividos por indivíduos, envolvendo ação e movimento.

NATURALIDADE.

Seja natural. Evite o uso de palavras de efeito apenas para impressionar a banca corretora.

Imagine o leitor à sua frente ou ao telefone conversando com você.
Fique à vontade.
Espaceje suas frases com pausas.
Sempre que couber, introduza uma pergunta direta.
Confira a seu texto um toque humano. Está redigindo para pessoas. Gente de carne e osso.

NEOLOGISMOS.

O candidato a uma vaga nas universidades precisa usar a língua portuguesa de maneira adequada e se utilizar de termos semanticamente precisos e corretos. Jamais escreva uma palavra cujo sentido real não conhece.

Norma culta não quer dizer termos sofisticados, mas palavras simples e precisas no contexto da redação. Preciosismos (palavras complicadas)? Nem pensar!

Portanto, nunca use os neologismos incultos do tipo “imexível”, “windsurfar”, “inconstitucionalizável”, etc.

NOTÍCIA.

É a expressão de um fato novo, que desperta o interesse do público a que o jornal se destina. Caracteriza-se por ter uma linguagem clara, impessoal, concisa e adequada ao veículo que a transmite.

NÚMERO.

Escreva o número por extenso, como: dois, três, oito, quinze, vinte... antes de substantivo funcionando como adjunto adnominal.

OBJETIVIDADE.

Seja objetivo e imparcial. Não use de forma exagerada e nem abuse de verbos no imperativo.

Como 20 (vinte) a 30 (trinta) linhas proporcionam um espaço muito pequeno para você discorrer sobre qualquer assunto, procure ser objetivo, abordando, somente, os fatos principais, evitando entrar em detalhes que não interessam muito.

Você tem que expressar o máximo de conteúdo com o menor número de palavras possíveis.

Portanto, não repita idéias nem use palavras demais que só aumentem as linhas desnecessariamente.

Concentre-se no que é realmente indispensável para o texto.

A pesquisa prévia ajuda a selecionar melhor o que se deve usar.

OBSCURIDADE.

Significa falta de clareza, em razão de frases excessivamente longas (prolixas) ou exageradamente curtas (lacônicas), linguagem rebuscada, má pontuação ou pontuação defeituosa, impropriedade dos termos.

Tenho uma prima que trabalha num circo como mágica e uma das mágicas mais engraçadas era uma caneta com tinta invisível que em vez de tinta havia saído suco de lima.

Observe aí a incapacidade de se organizar sintaticamente o período. Selecionar as frases e organizar as idéias é imprescindível. Escrever com clareza é de fundamental importância.

EXEMPLO DE TEXTO OBSCURO:
A exegese de textos religiosos não pode prescindir do conhecimento filológico que o diletante não deve hesitar em considerar como propedêutica para qualquer trabalho heurístico com textos arcaicos.

O MESMO TEXTO, MAS COM ESTRUTURA MAIS CLARA E DIRETA:
Para interpretar textos religiosos é preciso ter conhecimento da história da evolução das línguas. Aquele que se inicia nesse estudo deve preparar-se, então, começando pela análise de textos antigos.

ÓBVIO.

Pleonasmo vicioso. É aquilo que “tá na cara”! Evite escrever, por exemplo: O homem é um ser que vive. Todo homem é mortal.

NUNCA ESCREVA
Viu o que tinha que ver e saiu.
Machado de Assis é um grande escritor, pois escreve muito bem.
O avião é o meio de transporte mais seguro, pois com ele ocorrem menos acidentes.

DEIXE O ÓBVIO DE LADO
Viu tudo a que se propôs anteriormente, em seguida saiu.
Machado de Assis é um grande escritor.
O avião é o meio de transporte mais seguro.

ONDE.

Não empregue ONDE como sinônimo de EM QUE, NO QUAL, ou até mesmo DE QUE. O ONDE só pode ser empregado nessa função quando substitui uma palavra que indica lugar.

OPINIÃO PESSOAL.

Não coloque sua opinião pessoal no texto. Analise um assunto proposto emitindo opiniões gerais. Pode até se posicionar sobre determinados temas, mas disserte de uma maneira mais imparcial, ou seja, sem exageros ou manifestações emocionais.

Eu acho que pessoas que assassinam inocentes criancinhas deveriam ser postas em cadeiras elétricas.

A Justiça no Brasil vai de mal a pior. Além dos contraventores usuais, agora também homens da lei imergem no crime, e a escala desses marginais oficiais já atingiu a Magistratura. O país precisa de novas e urgentes leis.

Fonte:
http://www.sitenotadez.net

domingo, 11 de dezembro de 2011

Paraná em Trovas Collection - 26 - Fahed Daher (Apucarana/PR)

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 422)


Uma Trova Nacional

A Lua, que nos clareia,
é diferente de quem,
recebendo luz alheia,
não ilumina...ninguém!
–JOÃO FREIRE FILHO/RJ–

Uma Trova Potiguar

Em rota pré-concebida,
sem parada ou estação,
vi que a razão desta vida
vai sempre na contra-mão!...
–FRANCISCO MACEDO/RN–

Uma Trova Premiada

2010 - Ribeirão Preto/SP
Tema: VIAGEM - 1º Lugar

A mais bonita homenagem,
concede-a Deus, qual troféu,
a quem completa a viagem,
sem mancha, do berço ao céu!
–A. A. DE ASSIS/PR–

Uma Trova de Ademar

O Deus que fez lago e monte,
que fez céu, mar, noite e dia,
fez do poeta uma fonte
por onde jorra poesia...
ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram

Em silêncio os cinco dedos
da minha mão de aprendiz,
guardam íntimos segredos
das trovas que eu nunca fiz.
–ALONSO ROCHA/PA–

Simplesmente Poesia

M O T E : Ademar Macedo/RN
Na floresta, a "derrubada"
deixa em minha alma sequela,
pois a dor da machadada
dói mais em mim do que nela.

G L O S A: Prof. Garcia/RN
Na floresta, a "derrubada"
destrói tudo sem ter dó;
sem piedade, a queimada,
transforma a floresta em pó.

Ao ver da floresta o corte,
deixa em minha alma sequela,
eu sinto as dores da morte
na dor dos gemidos dela.

A mão injusta, malvada,
destrói a mata inocente;
pois a dor da machadada
não sente a dor que ela sente.

Quem a floresta destrói,
não sente nada por ela.
Esta dor que tanto dói,
dói mais em mim do que nela.

Estrofe do Dia

Ao deitar faço o meu "aquecimento"
relembrando uns poemas que eu conheço
de poetas que eu gosto e não esqueço
de usá-los no meu "alongamento",
faço um "cooper" veloz no pensamento
sem o risco de ter taquicardia,
meu suor carregado de energia
pega o verso que eu sonho e o transforma;
pra manter minha mente sempre em forma
meu esporte é brincar de poesia.
–ISMAEL GAIÃO/PE–

Soneto do Dia

Dilema.
–MARIA NASCIMENTO/RJ–

Eu que pensei ser livre como o vento,
não fraquejar em cada despedida,
aceitar meus fracassos sem lamento
e nunca me queixar das leis da vida...

Eu que pensei domar meu sentimento,
e ser, na luta, justa e destemida,
agora, com você no pensamento,
pouco importa vencer ou ser vencida...

O nosso bem-querer gera perigos,
mas, como só podemos ser amigos,
é fácil controlar as emoções...

Difícil é lutar contra a saudade
e acreditar que os elos da amizade
têm mais poder que a fúria das paixões!...

Fonte:
Textos e imagem enviados pelo Autor

sábado, 10 de dezembro de 2011

Paraná em Trovas Collection - 25 - Harley Stocchero (Almirante Tamandaré/PR)


Obs:
Todas as pinturas do Paraná em Trovas Collection são de pintores paranaenses, que retratam imagens do estado paranaense.

João Costa (Falando de Amor)


Num mar de pura magia
o umbral do tempo transponho,
rumo ao reino da utopia,
na caravela do sonho.

Um gosto de fim de festa,
tristeza, desilusão
É tudo, enfim, que nos resta
depois que os sonhos se vão...

Em meu delírio, cansado
de tanto em vão te esperar,
a saudade canta um fado
e faz minha alma chorar.

Peço-te perdão, querida ,
pela audácia de querer-te,
de sonhar-te em minha vida,
de imaginar merecer-te.

Nossas emoções primeiras,
sob o efeito da paixão,
são fortes, mas passageiras,
como chuvas de verão.

Viva intensamente quem
tem um sonho a ser vivido
que a saudade sempre vem
atrás de um sonho perdido…

Não me indagues por que te amo.
Não saberia dizer.
Eu te amo só porque te amo.
Que outra razão pode haver?

A vida é triste, sombria,
nesta minha solidão.
Sem a tua companhia,
é inverno em pleno verão.

A noite é perfeita e bela,
a lua encanta e seduz,
tecendo em nossa janela
uma cortina de luz.

Poesia, vida, beleza,
bem-aventurança, dor,
felicidade, tristeza…
É isso e bem mais o amor.

Jurei que não voltaria,
ao partir, e assim o fiz.
Lamento essa teimosia
que só me fez infeliz…

De príncipe me chamava
e a gente era tão feliz.
E quando não mais se amava,
nem como escravo me quis.

Tu me prendes com abraços,
torturas com tal paixão,
que, sendo algemas teus braços,
bendita seja a prisão!

Nem ouro nem o fulgor
dos diamantes trago, e sim,
no peito, a rosa do amor;
nas mãos, carinhos sem fim.

Passa o tempo… Passa a vida…
E eu não consigo esquecer-te.
Não me perdôo, querida,
pelo crime de perder-te.

É noite… Insone, penando,
nesta triste solidão,
ouço o silêncio gritando
dentro do meu coração.

Na despedida, confiei
na promessa que fizeste:
– Espera-me, eu voltarei!
Mas quando… não me disseste.

Dos bons acontecimentos
de minha vida, bendigo
aqueles doces mementos
que pude viver contigo.

Desiludido da vida,
do amor – em total entrega -,
sou folha no chão caída
que nem o vento carrega.

Desfeito o sonho mais puro,
longe de quem tanto quis,
para não sofrer, procuro
esquecer que fui feliz…

Não ambiciono o Eldorado.
Meu mundo, embora singelo,
contigo sempre ao meu lado,
é dos mundos o mais belo.

Relembramdo tempos idos,
abro a agenda da memória
e encontro sonhos perdidos,
pedaços da nossa história.

Quero um relógio, querida,
cujo mágico processo,
atrase a tua partida
e abrevie o teu regresso.

– Eu volto! – me consolava.
Mas, em profunda agonia,
meu coração pressagiava
que ela jamais voltaria…

Somos metades perdidas
e eu espero te encontrar.
E esperarei quantas vidas
ainda tiver que esperar…

Cansado de tanto errar,
nessa procura infeliz,
já nem sei se ao te encontrar
eu me sentirei feliz.

Que te amo ao mundo proclamo.
Duvidas, mas eu insisto.
Se é mentira, amor, que eu te amo,
é mentira que eu existo.

O tempo passa…Demoras…
E eu aqui a te esperar.
Meu amor, quantas auroras,
nessa espera, vi chegar!…

Voltarás…Que importa quando?
Eu só sei que voltarás…
Estarei sempre esperando
o dia em que tu virás.

Por esta senda de espinhos,
vou sufocando meus ais,
pois eu sou, sem teus carinhos,
o mais triste dos mortais.

Quis-te para sempre, amor,
mas me deste a solidão.
Hoje és saudade e esta dor
é eterna em meu coração…

Quando as almas são unidas
pelo amor, completamente,
deixam de ser duas vidas
para ser uma somente.

A noite é toda poesia.
Lua e estrelas a brilhar…
Mas, sem tua companhia
de que me serve o luar?…

De exuberância suprema,
que nos encanta e extasia,
cada alvorada é um poema
que Deus compõe todo dia.

Tua presença é poesia,
tudo de bom para mim;
teu sorriso pressagia
felicidade sem fim…

Os meus dias são tristonhos.
Tu não vens e o tempo avança.
Nem mesmo no mar dos sonhos
vislumbro a nau da esperança.

Quando eu me for desta vida,
irei a meu Deus pedir
que ele me faça, querida,
reencontrar-te no porvir.

Descobri, ao te perder,
que, sem direito a perdão,
fui condenado a viver
algemado à solidão.

De saudade angustiado,
faço versos soluçando
e cada trova é um recado
por teu regresso implorando.

Mais triste e pior castigo
do que o meu não pode haver:
- Não pode viver contigo,
sem ti não saber viver...

Nós dois... A felicidade...
Muito amor... Sonhos... Depois,
a distância e a saudade
como abismo entre nós dois...

Que importa o tempo passado,
se é tão grata a descoberta?
- Ao ver-te ainda ao meu lado,
sei que fiz a escolha certa!

Dei a ti meu coração,
muito te amei e te quis.
Se tudo foi ilusão,
não importa, eu fui feliz!...

Os meus versos se calaram,
à saudade sucumbi,
minhas lágrimas secaram
de tanto chorar por ti...

Ao partires, me disseste:
- Espera-me, eu voltarei!
O tempo passou... Não vieste...
E o pior: eu te esperei.

Recomeça a nostalgia
quando o dia vai morrendo.
Não suporto esta agonia.
Volta, amor, estou sofrendo!

O tempo que tudo apaga,
promovendo o esquecimento,
em vez de apagar afaga
teu nome em meu pensamento.

Que em tua ausência dispare,
eu apelo ao tempo; e quando
estivermos juntos, pare,
o momento eternizando.

Fonte:
João Costa. Meu Caderno de Trovas. Saquarema, RJ: Edição Artesanal, 2011.

Ribeiro Braz (O Sapo e a Borboleta)


Esta é a história de Priscila Buterfly que nasceu e viveu na floresta de Florzi junto ao mar e ao lago verde-musgo.

Não, ela não era bonita quando nasceu. Ela era muito feia. O seu cabelo quebra pente era amarelo e marrom misturado e seus dentes eram muito dentro da boca, fazendo parecer rindo todo tempo. Raposas, coelhos e jacarés tinham medo dela.

Ela vivia pela floresta colhendo lenha para o fogão da mãe. Nunca ninguém brincava com ela, porque ela não tinha tempo. Quando não apanhava lenha, então carregava água ou então cuidava dos irmãos menores.

Não podia ir até o mar, onde a floresta terminava, porque os meninos atiravam pedras nela, então corria para dentro da floresta e se escondia.

Aos treze anos levou um grande susto. Quando olhou para dentro do lago verde-musgo, ela viu um rosto refletido na água. Descobriu que o rosto era o seu. Então ela percebeu que os meninos tinham razão para enxotá-la. E ela foi reclamar com a sua mãe e sua mãe levou-a até o quintal. Olhando bastante para as folhas conseguiu achar uma lagarta. A mãe explicou que aquela lagarta horrível ao sair do casulo seria então uma linda borboleta. E disse para Priscila que ela ficaria tão linda quanto uma borboleta. “Nós podemos ser feios, mas depois ficamos lindos”. Priscila sorriu e se sentiu feliz esperando que o tempo ao passar a fizesse bonita como as outras meninas. Mas ela não olhava mais para dentro do lago verde musgo.

Um dia ao apanhar lenha na floresta, viu um menino olhando para o lago verde-musgo. Ela quis saber dele, o por quê de olhar tanto para aquele lago. Ao chegar perto do menino, descobriu que ele era um dos quatro que sempre lhe jogava pedras. Então ela correu e se escondeu atrás das árvores. Quando o menino escutou o barulho de folhas se movendo, olhou para trás e conseguiu ver parte do vestido roxo listrado de branco de Priscila. Então ela notou que ele não olhava mais para o lago. Ele olhava sempre para o local em que ela estava escondida. Então não quis mais sair de trás da árvore, porque ele não mais desviava os olhos dali. Mas ela viu que ele estava só e por isso perdeu o medo. Os outros meninos malvados não estavam ali. Mesmo assim ela achou melhor não sair dali. Mas lembrou que a mãe a esperava com o feixe de lenhas para fazer a janta. Mesmo assim, não conseguia sair dali. "E se os meninos malvados aparecerem?" – pensava ela.

- Priscila! - gritou o menino.

Ela levou um grande susto porque nunca havia ouvido alguém gritar seu nome, exceto sua mãe. O pai ela não conheceu, havia sido morto por um leão.

- Priscila Buterfly! - gritou mais uma vez o menino.

Agora o susto foi maior, porque nem mesmo sua mãe gritava seu nome assim. Ele estava agora em pé e de costas para o lago. E ela resolveu aparecer. Gritou:

- O que você quer?

Ele levou tempo para responder. Quase um minuto para responder.

- Preciso falar com você!

Ela saiu lentamente por detrás das árvores. Neste momento ela leva outro susto. Uma borboleta azul pousa rapidamente em seu nariz. Quando ela levanta as mãos, a borboleta voa e some no meio das árvores. Ela, Priscila, anda bem devagar em direção ao menino, mas pára a cinco metros de distância. E diz:

- O que você quer?

- O que você acha de mim?

– Um sapo!!!

Ele abaixa a cabeça tristemente.

- Eu disse um sapo! – grita ela, - tem um atrás de você!

Ele pula para o lado. O sapo se assusta e pula no lago. Ele levanta a cabeça e diz:

– Pensei que o sapo era eu...

- E o que você acha de mim? - pergunta Priscila.

– Muito linda! - diz ele.

– Mentira! Eu não sou linda!- Retruca Priscila.

Ele aponta para a borboleta azul voando atrás dela.

- Tenho de ir, minha mãe me espera com a lenha! – diz ela.

Ele se abaixa para apanhar a lenha e se oferece para levar. Carrega a lenha no ombro pela trilha da floresta. Enquanto andam pela floresta, ele a convida.

–Vamos ao mar?

– Sou muito nova para amar!

– Eu disse vamos ao mar!

- Ela entende e diz – Minha mãe é quem sabe!

O dia amanheceu lindo com o sol vermelho por trás das serras e um céu cor de anil, azul bem escuro. Algumas nuvens bem brancas espalhadas pelo céu azul. Todas as crianças, seus irmãos pequenos estavam prontos para o passeio. Até a mãe de Priscila também queria ver o mar. Finalmente ela iria esquecer um pouco o fogão de lenha e a choupana no meio da floresta. Quando chegaram finalmente ao fim da trilha, com o final da trilha surge o mar.

As crianças pequenas ficaram encantadas com o mar e uma delas correu em direção a ele. Outra ficou agarrada a saia da mãe rindo muito de alegria. E o menorzinho chorou, mas era um choro de alegria. Porque enquanto chorava também sorria. A mãe de Priscila viu quando os quatro meninos apareceram e disse.

– Lá vem os quatro meninos malvados!

Priscila responde:

– Não mãe, agora só três são malvados, o mais lindo é muito bom!

Os quatros chegaram devagar... Quando um deles se aproxima de Priscila Baterfly, então a olha por um minuto e dá um sorriso e ela também sorri para ele. Os outros três ficam de longe observando sem nada entender. Não quiseram mais a amizade daquele que se aproximou de Priscila.

Por algum tempo ficaram ali próximo ao mar mas depois foram embora. Priscila correu na beira do mar e também fez um lanche junto dos seus irmãos e do novo amigo. Ao jogar para ela uma bola feita com pano e folhas ele lhe diz:

- Ontem você não me chamou de sapo, certo?

– Mas se eu te der um beijo você se torna um príncipe! E... daquele dia em diante, realmente ela o viu como um príncipe. Mas agora ela se via sempre no lago e no mar e, quando se via no espelho da água, se via cada vez mais linda e agora tinha a companhia de raposas, coelhos e jacarés.

Com quinze anos ela via o príncipe como um sapo novamente e vivia conversando com os três malvados que como raposas, coelhos e jacarés tinham a sua companhia.

Todos os meninos gostavam dela. Todas as meninas estiveram em sua festa. Cada um deles levou um presente para ela. Ela era odiada pelas meninas por ser a mais bonita da floresta.

O sapo já não aparecia por um bom tempo. Por pouco tempo ele foi um príncipe para ela. Mas ela preferiu a amizade de todos em vez do amor dele somente. Quando lembrava dele só lembrava do lago verde-musgo. Dos outros meninos malvados lembrava o mar de Florzi.

Esta foi a historia de Priscila Buterfly que nasceu e viveu na floresta de Florzi. Morreu com febre aos trinta anos numa casa abandonada. Seus irmãos não quiseram saber dela porque a consideravam ingrata.

Sua mãe havia sido morta por jacarés. Priscila Baterfly morreu muito feia e por isso os meninos malvados não quiseram vê-la mais.

Fonte:
http://www.quemtemsedevenha.com.br/sapo_e_a_borboleta.htm