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domingo, 19 de agosto de 2012

Monteiro Lobato (A Barca de Gleyre)

A Barca de Gleyre, obra em dois volumes, reúne a correspondência ativa de Monteiro Lobato com o escritor mineiro Godofredo Rangel entre 1903 e 1943. Relata seus sonhos, as lutas do cotidiano, as realizações e frustrações de seu trabalho de editor, nas primeiras décadas do século 20.

 A análise desse rico material, organizado pelo próprio Lobato, permite discernir os contornos da auto-imagem que o escritor pretendia construir para a posteridade. As missivas, que se iniciam ainda durante a época em que era estudante na Faculdade de Direito de São Paulo, fornecem dados a respeito de sua formação intelectual, atividades como escritor, editor, empresário e aspectos da vida pessoal. O título da obra constitui-se num importante indício para compreender a amargura do escritor pouco antes de sua morte.

 Entre as múltiplas facetas de Monteiro Lobato, a história da literatura brasileira privilegia, de um lado, o criador da mais importante obra infantil em nosso país, conhecida a partir de 1921. De outro, o regionalista, voltado para o atraso e a decadência do mundo rural. Por ser um nacionalista ferrenho, hostil à importação infrene das idéias européias, em particular das francesas, foi confundido com um intelectual retrógrado e passadista, incapaz, portanto, de compreender a modernidade e rotulado, ainda, de algoz de uma das mais talentosas pintoras do início do século e inimigo número um da Semana de 22. Essa visão é colocada em xeque em A Barca de Gleyre (1944).

 Durante o período que se corresponderam, os dois amigos trocaram impressões sobre a literatura nacional e estrangeira. Em mais de trezentas cartas, destaca-se a presença da literatura francesa de todos os tempos, abrangendo mais de noventa autores citados. Essa dissertação pretende mostrar, a partir das análises das missivas, a relevância da cultura francesa na formação do escritor Monteiro Lobato. Refutamos, num certo sentido, a idéia de autor xenófobo e anti-galicista. Ao contrário, suas cartas revelam um leitor e "crítico" maduro e original, sustentando posições que seriam endossadas por muitos críticos atuais. Entre a plêiade de autores abordados, enfocamos nossa pesquisa em alguns prosadores do século XIX, pois se situam entre os mais apreciados não apenas por Lobato e Rangel, mas por mais de uma geração de escritores brasileiros. Finalmente, detemo-nos na contribuição de Guy de Maupassant na poética do conto lobateano.

Textos escolhidos

Trecho I - São Paulo ... 1903

"Não és capaz, nunca, de adivinhar o que estou comendo. Estou comendo ... Tenho vergonha de dizer.

 Estou comendo um companheiro daquilo que alimentava S. João no deserto: içá torrado! Sabe, Rangel, que o içá torrado é o que no Olimpo grego tinha o nome de ambrosia? Está diante de mim uma latinha de içás torrados que me mandam de Taubaté. Nós, taubateanos, somos comedores de içás. Como é bom, Rangel! Prova mais a existência do Bom Deus do que todos os argumentos do Porfírio Aguiar. Só um ser Onipotente e Onisciente poderia criar semelhante petisco!"

Trecho II - Taubaté, 28.12.1903
Rangel:

"Escrevo ao pingar duma chuva miúda e sem fim que nos alaga há dois dias. As ruas são passagens de lama bem amassadinha pelas rodas dos carros e patas dos animais. Sair é um impossível, e chega a ser rasgo de ousadia pôr o nariz fora da janela. Estamos encarcerados numa prisão de fios de chuva _ coisa mais impressionante que grades de ferro. Leio, leio interminavelmente. Meus olhos já estão cansados."

Trecho III -Taubaté, 4 de "Bruno"de 1904
Rangel:

"Tua carta é um atestado da tua doença: literatura errada. Julgas que para ser um homem de letras vitorioso faz-se mister uma obsessão constante, uma consciente martelação na mesma idéia - e a mim a coisa me parece diferente. Tenho que o bom é que as aquisições sejam conscientes, num processo de sedimentação geológica. Qualquer coisa que cresça por si, como a árvore, apenas arrastada por aquilo que Aristóteles chamava entelequia _ e que em você é o rangelismo e em mim lobatismo. Deixa-te em paz, homem, não tortures assim o teu pobre cérebro." ( ...)

Trecho IV -Taubaté 2.6.1904

"Estou prestes a fechar o meu curso. Entro na "vida prática" em dezembro e creio que realizarei o meu sonho: ser fazendeiro. A minha vida ideal ( isto é, de idéias) está a pingar o ponto final. Vou morrer _ vai morrer este Lobato das cartas. E nascerá um que te fale em milho e porcos, e te dê receita para acabar com o piolho das galinhas.
 Está um frio de fim de vida. Meus dedos enregelam. Vou sair, andar, tomar sol. Adeus." Lobato

Trecho V - S. Paulo, 15.11.1904

 Rangel:

"É cheio do passado que te escrevo. Imagina que fui ao Rink (coisa que não conheces: patinação) e lá encontrei numa roda de quatro a moça mais bela que a Natureza ainda produziu. Bela, fina, elegante...

 Estes adjetivos já não dizem nada por causa dos abusos do Macuco. Sabe lá o que é o belo, Rangel? É o que alcança uma harmonia de formas absolutamente de acordo com nosso desejo. Se um mínimo senão na asa de um nariz rompe de leve essa harmonia, a criatura pode ser linda, bonita, encantadora - mas bela não é. Pois aquela moça era bela, Rangel. Chamava-se nos meus 14 anos, belita, Isabelita - Isabel. Foi o meu primeiro amor, em Taubaté.

 Mas falemos em coisas profanas. Li o teu último artigo... Nunca viste reprodução dum quadro de Gleyre, Ilusões Perdidas? Pois o teu artigo me deu a impressão do quadro de Gleyre posto em palavras. Num cais melancólico barcos saem; e um barco chega, trazendo à proa um velho com um braço pendido largadamente sobre uma lira - uma figura que a gente vê e nunca mais esquece (se há por aí os Ensaios da Crítica e História do Taine, lê o capítulo sobre Gleyre). O teu artigo me evocou a barca do velho. Em que estado voltaremos, Rangel, desta nossa aventura de arte pelos mares da vida em fora? Como o velho Gleyre? Cansados, rotos? As ilusões daquele homem eram as velas da barca - e não ficou nenhuma. Nossos dois barquinhos estão hoje cheios de velas novas e arrogantes, atadas ao mastro da nossa petulância. São as nossas ilusões. Que lhes acontecerá? " (...)

Você me pede um conselho e atrevidamente eu dou o Grande Conselho: seja você mesmo, porque ou somos nós mesmos ou não somos coisa nenhuma. E para ser si mesmo é preciso um trabalho de mouro e uma vigilância incessante na defesa, porque tudo conspira para que sejamos meros números, carneiros de vários rebanhos - os rebanhos políticos, religiosos, estéticos. Há no mundo ódio à exceção - e ser si mesmo é ser exceção.

Trecho VI - Taubaté, 30.12.1904
Rangel:

"Aqui no exílio a madorra é um mal ambiente que derruba até os mais fortes. Exílio, Rangel, pura verdade! Saltar da libérrima vida estudantina de S. Paulo e cair neste convencionalismo de aldeia, com trabalhos forçados... Sinto-me rodeado de conspiradores; todos tramam o meu achatamento. Tudo quanto mais prezávamos _ o nosso individualismo, etc, é crime de lesa-aldeia, de que o vigário, os parentes e as mais "pessoas gradas"nos querem curar. O ideal é fazer de nós mais uma "pessoa grada", mais um "cidadão prestante". É arredondar-nos como um pedregulho, lixar-nos todas as arestas _ as nossas queridas arestas! Um homem aqui só fica bem "grado"quando se confunde com todos os outros e é irmão do Santíssimo Sacramento. (...)

 Logo que cheguei ( que cheguei "formado"!) mimosearam-me com uma manifestação; foguetes (Taubaté não faz nada sem foguetes), a banda de música, molecada atrás e oito discursos, nos quais se falou em "raro brilhantismo", "um dos mais", "as venerandas arcadas"e outras cacuquices que tive de aguentar de pé firme em casa de meu avô. Eu percebia o jogo: a manifestação era mais dirigida a ele do que a mim, porque ele é um grande visconde e eu não passo dum simples "neto de visconde". (...)

 Não imaginas a estranheza da minha emoção quando estourou lá longe o primeiro foguete e alguém ao meu lado disse: "É a manifestação que vem vindo." Um foguete soltado por minha causa..." (...) Do teu desolado Lobato

 Trecho VII - Taubaté, 1907

Rangel:

Estou noivo. Pedi no dia 12 a obtive a 15 a mão de Purezinha, filha do Dr. Natividade que te examinou em Aritmética no Curso Anexo, minha prima longe, professora complementarista, loura, branca como pétala de magnólia, linda. Combinamos casar um dia."

Trecho VIII - São Paulo, 17.1.1920

Rangel:

Tens toda e não tens nenhuma razão. Tens-na no meu caso: não sou literato, não pretendo ser, não aspiro a louros acadêmicos, glórias , bobagens. Faço livros e vendo-os porque há mercado para a mercadoria; exatamente o negócio do que faz vassouras e vende-as, do que faz chouriços e vende-os. E timbro em avisar ao leitor de que não sei a língua. Se por acaso algum dia fizer outro livro, hei-de usar letreiros das fitas: "Contos de Monteiro Lobato, com pronomes por Álvaro Guerra; com a sintaxe visada por José Feliciano e a prosódia garantida no tabelião por Eduardo Carlos Pereira. As vírgulas são do insigne virgulógrafo Nunávares, etc."

 Trecho IX - S. Paulo, 20.2.43

Rangel:

Pois é. Perdi meu segundo filho, o Edgar, um menino de ouro, tal qual o Guilherme. Impossível filhos melhores que os meus, e talvez por isso, foram chamados tão cedo.(...)

 Eu não me desespero com mortes porque tenho a morte como alvará de soltura. Solta-nos deste estúpido estado sólido para o gasoso - dá-nos invisibilidade e expansão, exatamente o que acontece ao bloco de gelo que se passa a vapor. (...)

 E assim vamos também nós morrendo. Morrendo nos filhos, pedaços de nós mesmos que seguem na frente. Morrendo nas tremendas desilusões em que desfecham nossos sonhos."
 
Trecho X - S. Paulo, 27.10.43

Rangel:

Solto agora as minhas cartas a você, e depois você solta as tuas a mim.

 Outra coisa está me parecendo: que na literatura fiquei o que sou por causa dessa correspondência. Se não dispusesse do teu concurso tão aturado, tão paciente e amigo, o provável é que a chamazinha se apagasse. Você me sustentou firme na brecha _ e talvez eu te haja feito o mesmo. Fomos o porretinho um do outro, na longa travessia.

 Trecho XI - S. Paulo, Véspera de S. João, 1948

Rangel:

( ...)
 Tive a 21 de abril um "espasmo vascular", perturbação no cérebro da qual a gente sai sempre seriamente lesado de uma ou outra maneira. Depois de 3 horas de inconsciência voltei a mim, mas lesado. A principal lesão foi na vista que no começo me impedia de ler sequer uma frase. As outras perturbações ando agora eu a percebê-las: lerdeza mental, fraqueza de memória e outras "diminuições". Desci uns pontos.

 Não é impunemente que chegamos aos 66 anos de idade.

 O que eu tive foi uma demonstração convincente que estou próximo do fim - foi um aviso - um preparativo.

 E de agora por diante o que tenho a fazer é arrumar a quitanda para a "grande viagem", coisa que para mim perdeu a importância depois que aceitei a sobrevivência. (...) Estou com uma curiosidade imensa de mergulhar no Além. (...)

 Adeus, Rangel! Nossa viagem a dois está chegando ao fim. Continuaremos no Além? Tenho planos logo que lá chegar, de contratar o Chico Xavier para psicógrafo particular, só meu _ e a primeira comunicação vai ser dirigida justamente a você. Quero remover todas as tuas dúvidas. Do Lobato

Com esta carta, meio irônica, brincalhona, Lobato despedia-se do amigo Godofredo Rangel, escritor como ele. Doze dias depois, morria durante o sono.

 Em seu enterro, os estudantes saíram à rua, agitando faixas sobre a questão do petróleo. E o já consagrado ator Procópio Ferreira, amigo pessoal, fez um discurso onde proclamava:
 "Agora, os sem-vergonhas poderão agir à vontade: morreu Monteiro Lobato!”

Fonte:
http://www.passeiweb.com/na_ponta_lingua/livros/resumos_comentarios/a/a_barca_de_gleyre

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Murilo Rubião (A Casa do Girassol Vermelho)

No Brasil, Murilo Rubião é um dos pioneiros do conto fantástico, que se destacou na década de 70, por influência de alguns escritores latino-americanos. Mas a linhagem é clássica, machadiana, enveredando quase sempre pelo clima da fantasia. Em 1978, publicou o livro de contos A Casa do Girassol Vermelho.

A mais notável característica da obra de Murilo Rubião é o uso de epígrafes bíblicas que se desdobram num jogo intertextual: uma leitura inicial e isolada revela apenas o referente bíblico ou poético, já uma leitura mais atenta e crítica permite traçar uma profunda interdependência alegórica entre epígrafe e conto.

A contragosto, eis como os personagens de Murilo vivem ou narram os acontecimentos: gostariam de poder escapar da história em que foram lançados. E, além de viverem a contragosto, elaboram o discurso correspondente. Narram-se as descobertas pertencentes a um mundo não muito bom, e a condição de prisioneiro. A questão não interessa apenas aos personagens, atinge de cheio os leitores, que se sentem também prisioneiros.

Exemplo marcante do a contragosto é A casa do girassol vermelho. Os personagens movem-se dentro de um espaço fechado, um lugar atrasado, distante da civilização, em "imensos jardins longe da cidade e do mundo". O único espaço externo que nos damos conta é a vila onde anteriormente moravam os filhos adotivos de D. Belisária. Quando a história está para ser concluída, um trem passa lembrando aos membros da tribo que no mundo há mais alguém. Mas a lembrança nada traz. Naquele momento, coisa alguma poderia dar sentido aos acontecimentos.

A casa do girassol vermelho é o espaço onde se desenrolam os acontecimentos: campo, distante da vila, afastado da cidade. É ao mesmo tempo as pessoas que aí vivem, um tipo social. A brutalidade de Simeão e de Surubi parece ser própria do lugar.

O trem é o espaço em movimento. Não sabemos para de onde vem e nem quem são os passageiros. Ele é rápido e termina por captar alguma coisa da vida dos habitantes da casa de Simeão. O trem transporta ao menos o olhar do narrador: "Além de nós, havia no mundo mais alguém".

A casa do girassol vermelho se passa no meio rural. Seus personagens são seres do mundo agreste. Tudo neles é extremado, sem limites, refinamento e urbanidade. São incivilizados. São mais próximos da natureza. Um mundo de necessidade e escassez. Mundo ao mesmo tempo da orgia, da festa e da punição, da perversão sexual. O grupo é tribal: Simeão e Belisária são pais adotivos dos dois grupos de irmãos. O jogo da sexualidade oscila entre a mais completa repressão (Belisária morre virgem porque "o marido considerava pecado o ato sexual" e Xixiu mergulha na represa para aí desaparecer) e a mais completa permissividade (incestos etc.) Nesse universo, a morte dos pais significa libertação e é festejada.

Antes da passagem do trem, Xixiu mergulhara e desaparecera na represa: "...fora ao encontro de Simeão", o repressor, que morrera na véspera, para o último e verdadeiro combate. O mergulho também é uma forma de deslocamento, como o trem.

Após a morte de Simeão, os filhos comemoram dançando: a casa respirava uma alegria desvairada". Surubi, o narrador, afirma que "Todos os acontecimentos alegres da nossa existência eram comemorados com bailados coletivos".

É notável o determinismo natural a que estão submetidos os personagens. Para exercer o controle sobre os filhos, Simeão separa os homens das mulheres e vigia-os. Xixiu, o mais perseguido, é também o mais vigilante com relação à irmã. Simeão controla os instintos, a natureza interna do homem. Simeão é, assim, alguém que se considera responsável pela formação dos outros personagens, assim como o professor em Os dragões e o narrador de Teleco, o coelhinho.

Fonte:

domingo, 12 de agosto de 2012

Lygia Fagundes Telles (A Noite Escura e Mais Eu)

“Ela ficou mas a gota de sangue que pingou na minha luva, a gota de sangue veio comigo” - assim começa a coletânea de nove contos, A Noite Escura e Mais Eu, de Lygia Fagundes Telles, na primeira frase de "Dolly". E termina, na última frase de "Anão de Jardim", história que encerra o livro: “Seja feita a Vossa vontade e (...) então aceito também ser a estrela menor da grande cauda levantada no infinito no infinito deste céu de outubro”. Como dentro de um parêntese, todo o universo de Lygia concentra-se entre essas duas frases, o sangue inevitável das dores da condição humana e a talvez redentora aceitação não só do Divino, mas também da insignificância e humildade que essa condição impõe. A repetição da palavra “infinito” acentua a idéia de eterno retorno, e a referência ao “céu de outubro” remete à primavera e ao renascimento de tudo. Ou seja: o sangue pode ser transmutado, alquimicamente, em luz. Ou pelo menos em ótima literatura.

A Noite Escura e Mais Eu, entre todos os livros de contos de Lygia, talvez seja a sua obra-prima. Pela unidade, pela densidade, pela extraordinária dignidade que confere à língua portuguesa, mesmo quando trata de temas ou situações sórdidas, perversas, violentas.

Lygia volta a temas recorrentes de sua obra, como a morte, a solidão, o amor, a velhice, envolvendo-nos em um mundo riquíssimo em experiências humanas, povoado por anjos e demônios, angústias e alegrias, medos, ilusões e desilusões. A autora está de volta ao seu leque de perplexidades, e suas personagens, aqui, são garotinhas, cachorros, anões, que espiam os homens e suas extravagâncias.

Esse universo misterioso das histórias de Lygia pode ser observado e sentido logo no primeiro conto, "Dolly", ambientado nos anos 20. A personagem é uma moça na faixa dos vinte anos que queria ser artista de cinema mudo. O conto é narrado por Adelaide, da mesma idade, mas de personalidade ingênua e conservadora, com quem Dolly quer dividir a moradia enquanto não alcançava as luzes da ribalta. Adelaide encontra o cadáver de Dolly violentada depois de uma noite de farra e suja suas luvas de sangue ficando, aparentemente, apavorada.

Personagens em crise diante da velhice são apresentados no conto "Boa noite, Maria", que enfoca o amor de uma mulher de sessenta e cinco anos por um homem de cinqüenta. É um conto sobre um possível direito à eutanásia, sobre o horror da decomposição e a fuga da morte como aviltamento. A solidão é o pano de fundo dessa história, a mesma solidão que permeia quase todas as personagens deste livro que, a exemplo dos anteriores da autora, traz enredos ambíguos que às vezes se aproximam do realismo fantástico.

Em "Anões de jardim", um dos melhores da coletânea, o narrador é um ser de pedra que tem alma e quer sobreviver à demolição da casa cujo jardim habita. Fala de uma perseguição à imortalidade, de uma continuação da vida em qualquer forma, mesmo a mais vil. Neste conto, Lygia Fagundes Telles rompe com a linearidade do tempo, calça a sua escritura com “botas de nuvens” e revela a vida como um pesadelo envolvido pela crueldade do homem de todos os tempos a contrastar (fantástico paradoxo!) com a ‘humanidade’ de uma estátua de pedra que pensa e sofre, como testemunha muda e memória dos dramas vividos em uma casa.

Nos outros contos, a autora desliza em verdadeiros instantâneos das relações humanas, como o da mãe à beira do túmulo da filha tentando compreender como ela foi capaz de ter como amante uma outra mulher. Ou a história de Kori, mulher rica e infeliz no casamento, que vai para a cama com o homem que ela sabe que é apaixonado pelo seu marido.

Lygia aposta no absurdo, mantém seu estilo intimista em suas reflexões sobre as fraquezas humanas nesses nove contos de mistério e paixão de A noite escura e mais eu, cujo título nasceu de um poema de Cecília Meirelles: "Ninguém abra a sua porta / pra ver o que aconteceu: / saímos de braço dado / a noite escura e mais eu."

As histórias não se esgotam no enredo. Terminadas de ler pela primeira vez, deixam a vontade de reler uma segunda ou terceira, por suas inúmeras camadas de significados e pela carga de mistério sempre deixada no ar. Às vezes, todo um conflito revela-se numa frase aparentemente perdida no meio do texto, num detalhe. Assim é, por exemplo, em "Dolly"; na perfeição de "Você não Acha que Esfriou?" ou na ousadia do tema lésbico de "Uma Branca Sombra Pálida".

Títulos como "Você não Acha que Esfriou?" e "Papoulas em Feltro Negro" têm um adensamento do ceticismo das mulheres maduras e de sua capacidade de reação. Em "Papoulas em Feltro Negro", por exemplo, uma professora de piano coloca em dúvida o passado de criança perseguida que construíra para si ao reencontrar uma mestra megera, ainda destrutiva, que acusa a ex-aluna de mentirosa e gaga, as falhas da comunicação tornando ambígua a própria memória, roubando-lhe as certezas, ocultando-as sob trevas espessas. Na cama fria do amante improvisado, uma mãe de 45 anos ergue-se para a vingança verbal que derrubará a pose do amigo do marido. Neste conto admiração e respeito à sensibilidade do outro são confundidos com ódio e desprezo. No final, a velha professora Elzira evita de todas as maneiras o olhar da ex-aluna.

Fonte:
Passeiweb

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Godofredo de Oliveira Neto (Ana e a Margem do Rio)

Em Ana e a margem do rio, publicado em 2002, o autor, Godofredo de Oliveira Neto, cria um universo onde mitos indígenas brasileiros se chocam com valores da civilização ocidental. Uma narrativa fluida e elegante conduzida através de fábulas repletas de paixões, revoltas, frustrações, raivas, medos e ambições presentes nas sociedades, primitivas ou não, do mundo inteiro.

Ana e a margem do rio conta a história de Ana (a narradora), índia da nação Nauá, educada numa missão de freiras em plena floresta amazônica. Ana possui um talento inato: o de escrever. E isso foi notado não apenas pelos professores locais, mas por pesquisadores do Brasil e do exterior. Ana registra em um caderno uma das velhas histórias que ouviu da mãe: a da parceria entre um jacaré e uma jibóia, com o concurso de outros animais e de dois índios que vagam à procura de sua gente, uma odisséia que parece não ter fim, tão complexa é a questão da identidade para os nativos americanos. Assim é também para Ana, cuja história vai sendo contada à medida que sua narrativa avança e se aprofunda, mesclando à lenda Nauá elementos de outras tradições e da própria cultura do colonizador. Quem é essa jovem, tão sensível, tão consciente e ao mesmo insegura de sua própria identidade? Qual dos caminhos que lhe são apresentados ela vai escolher? Em que margem do rio e da vida decidirá ficar?

Aos poucos, a jovem índia, dividida entre o mundo da oralidade, herdado de sua tribo, e a religiosidade, imposta pelo sistema educacional, divide com os amigos as aventuras fabulosas tantas vezes ouvidas de sua mãe. Mas a história vai sendo modificada pela influência que Ana recebe das freiras salesianas.

Em Ana e a margem do rio, o autor intercala, como recurso literário, a vida de Ana e a lenda narrada (A jibóia e o jacaré), separando-as em capítulos escritos na primeira e na terceira pessoas. O efeito é revelar ao leitor as dificuldades da índia de etnia Nauá em montar sua própria identidade, tornando-o cúmplice desse conflito interno. Nessas narrativas, o autor demonstra a dificuldade que Ana enfrenta para montar sua própria identidade. Além disso, como já citado, há narrações de várias lendas amazônicas realizadas por animais, evidenciando o respeito à diferença.

Ana e a margem do rio aborda, ainda, a explicação indígena para os mais diferentes fenômenos naturais e segredos do universo. Com a fala hipotética de animais, Godofredo explora como a tolerância pode, e deve, coexistir com a diferença.

No começo da obra, Ana tenta delinear uma identidade segregada, dividida:

Resolvi, então, escrever uma lenda que sempre ouvi de minha mãe, lenda que ela dizia ter ouvido da minha vó, e assim para trás, até as origens da nossa nação. Eu escutava aquela história maravilhada e tomava cuidado para que mamãe repetisse exatamente os mesmos detalhes [...] Uma viva emoção me invade só de pensar que vou passar para o papel imagens impregnadas do perfume da minha infância e assim perpetuar uma parte da história do povo Nauá [...] Sei que, na lenda, irá também, necessariamente, muito de mim em pedaços de personagens, trechos de rio, pétalas de flores e em fragmentos de reações animalistas humanamente plasmadas. Tudo bem. E vou tentar fugir no texto, do sonho que sempre vem, em que me vejo cercada por animais da floresta que obedecem ao meu canto, rios que escoam sob meu comando, raios que se fixam no céu escuro por minha simples ordem. (2002: 13-14)

Mas, no decorrer da escrita, percebe o intercurso, o entrelaçamento de sujeitos, posições, diferenças e identidades que fazem parte dela, que a constituem como um ser em pleno processo identitário. Mas essa percepção não foi fácil, pois ao mesmo tempo em que decidia aceitar e negar o outro, tinha medo de se perder, de se desfigurar.

Ana está em plena floresta amazônica, mais especificamente Xapuri – Rio Branco. E este lugar é uma das regiões ameaçadas do mundo; e junto com a região, a cultura, as lendas, as histórias, os costumes. Quando percebe que sua escrita está sendo esperada ansiosamente por pesquisadores sulistas e estrangeiros, sente-se ameaçada, vigiada, controlada, e, a partir daí, tenta estabelecer uma territorialização fechada, una, centrada.

Fonte:
Passeiweb

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Manuel Bandeira (50 Poemas Escolhidos Pelo Autor)


Artigo por Ana Lúcia Santana

50 poemas escolhidos pelo autor”, de Manuel Bandeira, não é uma mera antologia, mas uma seleção de poemas realizada pelo próprio autor em 1955. Contém, portanto, os melhores e mais inspirados momentos do poeta em sua trajetória literária. Bandeira recortou em sua obra o que há de mais representativo e essencial na sua produção.

50 Poemas Escolhidos Pelo Autor – Manuel Bandeira – Cosac Naify – São Paulo – 88 pp. – Acompanha CD.

Este trabalho foi empreendido pelo autor a pedido de José Simão Leal, responsável pela edição da coleção “Os Cadernos de Cultura do MEC”. Mas o poeta não encarou esta oportunidade como uma encomenda, e sim como um meio de reafirmar a unidade de sua obra e nela destacar a essência, compondo assim nesta versão um todo renovado, que ganha uma nova significação. Não se encontra nesta obra nenhum poema de sua fase parnasiana. Pelo contrário, ele ironiza este momento de sua poética com o eterno “Os Sapos”, que provocou frissom na Semana de Arte Moderna, em 1922, e não por acaso abre esta publicação.

O poeta passeia pelos temas comuns à sua poesia – crítica ao Parnasianismo, o erotismo, a morte, religião e o Recife de sua infância. Eros e Tanatos estão sempre presentes no cerne das preocupações do autor. Ora aparentemente em conflito, como em “A Dama Branca”, ora confundindo-se no poema como se fossem ambos uma coisa só, tal como no “Rondó dos Cavalinhos”.

A morte se oculta sob a face do tempo e traz consigo o aprendizado, em poemas como “Canção do vento e da minha vida”, e a vida infinita, presente nos versos de “Maçã”. Não somente os corpos encontram seu fim nos braços da Morte, mas também os dias, a infância, casas e ruas antigas, personagens freqüentes na poesia de Manuel Bandeira. É o que se percebe nos poemas “Evocação do Recife”, “Profundamente” e “Última Canção do Beco”, entre outras. Ao mesmo tempo, a morte assume outros significados, como o mergulho no nada, um “morrer completamente”, sem deixar rastros, “A Morte Absoluta”.

A esfera do sagrado atrai o poeta. Reflexões sobre a transcendência da vida, sobre anjos e arcanjos – como no poema “Eu vi uma Rosa” – perpassam sua obra como uma corrente de energia que a vitaliza e estabelece um certo equilíbrio entre o profano e o sagrado. Muitos desses poemas retratam também a religião do ponto de vista da cultura popular, enfocando este tema sob a ótica do tão celebrado sincretismo brasileiro. É o caso de “Os Sinos” e “Boca de Forno”.

A solidão do homem destaca-se também na poesia de Bandeira, sinalizando a condição humana como a de um ser exilado, embora no caso do poeta esta sensação seja a de um exílio no tempo, uma vez que este o distanciou dos personagens e cenários de sua infância, criando no mesmo espaço uma paisagem diferente, que ele não mais reconhece. È em suas lembranças que o poeta reencontra a vida palpitante, a perenidade de suas experiências afetivas. “Marinheiro Triste” e “Eu vi uma Rosa” são exemplos desses poemas perpassados pelo insulamento.

Esta obra tecida delicadamente pelas mãos do poeta é rematada por um Posfácio à edição, de Augusto Massi e Carlito Azevedo – “Manuel Bandeira, Intérprete de Si Mesmo”. Nele os autores definem antologia poética como “um gênero antigo e arbitrário”, e destacam a importância de saber incluir com coerência e excluir com rigor. Manuel Bandeira foi com certeza um mestre nessa arte, pois sabia como ninguém realizar a mais perfeita bricolagem poética, o que se pode perceber com clareza em um poema intitulado “Antologia”, de 1965, incluído neste Posfácio, no qual Bandeira extrai cada verso de um poema diferente. O poeta o define como um poema construído “com versos ou pedaços de versos” mais marcantes para ele, que também poderia ser lido como um poema autônomo por quem nada conhecesse de sua obra. Assim como esta antologia pode ser igualmente considerada, de certa forma, como uma publicação independente, tal a sua lógica própria. 

  Manuel Bandeira praticamente especializou-se em antologias, desde obras-primas da poesia brasileira, superando as fronteiras das estreitas classificações por períodos, até as de autores, dedicando-se depois a reorganizar constantemente sua própria obra, revelando-se seu mais acurado “leitor”. Para ele, é possível lançar um olhar para o passado e resgatar o que há de essencial, criando para a posteridade uma imagem ideal, sua desejada “mitologia pessoal”. Além disso, reunidos neste volume poemas antes dispersos em outras publicações, é possível flagrá-los em diálogo renovador, gerando entre eles laços originais.

Ler esta antologia e poder complementar a compreensão de seus poemas e a relação entre eles através da audição do CD que o acompanha, possibilita ao leitor-ouvinte se aprofundar no conhecimento do poeta e de sua obra, bem como surpreender faces desconhecidas de Manuel Bandeira, ampliando assim a visão muitas vezes restrita que se tem do poeta. 

Fonte

quarta-feira, 4 de julho de 2012

João Antonio (Meninão do Caixote)


artigo por Felipe Araújo

O conto do escritor paulistano João Antônio, Meninão do Caixote, publicado no livro de contos Malagueta, Perus e Bacanaço, de 1963, apresenta a história de um menino que descobre ser um talento da sinuca. O garoto é fã de seu pai, que dirige um caminhão e o leva para o bairro da Vila Mariana, onde se diverte em uma lagoa. Por outro lado, o relacionamento do menino com a mãe é diferente. Ela vive repreendendo-o, dizendo o que fazer e lhe castigando.

O garoto descobre o talento da sinuca quando, a pedido de sua mãe, vai fazer compras no Bar Paulistinha. Com o início de uma chuva, ele é obrigado a ficar no estabelecimento, onde alguns homens estão jogando sinuca, entre eles Vitorino, que fica amigo do jovem. O menino, mais baixo pela idade, pega um caixote e coloca na beira da mesa, sobe nele para assistir o jogo. Então tem a oportunidade de jogar, vai aprendendo, jogando, e, aos poucos, se torna um taco, como eram chamados os bons jogadores.

No seguinte trecho, João Antônio descreve como foi a descoberta do garoto: “Joguei, joguei muito, levado pela mão de Vitorino, joguei demais. Porque Vitorino era um bárbaro, o maior taco da Lapa e uma das maiores bossas de São Paulo. Quando nos topamos Vitorino era um taco. Um cobra. E para mim, menino que jogava sem medo, porque era um menino e não tinha medo, o que tinha era muito jeito, Vitorino ensinava tudo, não escondia nada”.

Porém, a vida do novo jogador de sinuca entra em confronto com suas obrigações escolares e as preocupações de sua mãe. Ele começa a cabular aulas, tem discussões com a mãe e foge pela janela de casa para jogar. Agora a jogatina vale dinheiro, Vitorino torna-se uma espécie de agenciador do garoto, arrumando adversários, fazendo grana e passando sua fama no boca a boca dos botecos suburbanos.

O menino tentava largar o “joguinho”, como é descrito no trecho: “Larguei uma, larguei duas, larguei muitas vezes o joguinho. Entrava nos eixos. No colégio melhorava, tornava-me outro, me ajustava ao meu nome”. 

Porém, Vitorino, sedento por mais dinheiro e por ver o menino jogar, voltava para convencer o garoto a retornar ao salão.  “Vitorino arrumava um jogo bom, me vinha buscar. Eu desguiando, desguiando, resistia. Ele dando em cima. Se papai estava fora, eu acabava na mesa. Tornava à mesa com fome das bolas, e era: uma piranha, um relógio, um bárbaro. Jogando como sabia”.

Porém, a preocupação da mãe com o menino é representada em seu ápice quando, em uma das sessões de jogatinha do bar, ela aparece com a marmita para o filho. O garoto vê aquela cena, a mãe saindo de cortinhas verdes com sua comida em mãos, não aguenta e começa a chorar. É acudido pelos seus companheiros de sinuca, “Que é? Que é isso? ô Meninão!”. Então promete a si mesmo que vai abandonar o jogo novamente. De forma lírica, João Antônio encerra o conto: “Larguei as coisas e fui saindo. Passei a cortina, num passo arrastado. Depois a rua. Mamãe ia lá em cima. Ninguém precisava dizer que aquilo era um domingo… Havia namoros, havia vozes e havia brinquedos na rua, mas eu não olhava. Apertei meu passo, apertei, apertando, chispei. Ia quase chegando. Nossas mãos se acharam. Nós nos olhamos, não dissemos nada. E fomos subindo a rua”.

Fontes:
 ANTÔNIO, João. Malagueta, Perus e Bacanaço. São Paulo: Cosac Naify, 2004.
http://jamantabege.blogspot.com.br/2012/05/conto-de-joao-antonio-meninao-do.html

Charles Kiefer (A Menina e o Mendigo)

artigo de Ana Lucia Santana.

Esta história sensível toca em pontos delicados e polêmicos da nossa vida em sociedade; ela é um retrato das chagas sociais que maculam o país, da discriminação e das manifestações de solidariedade que insistem em se impor, independente das hesitações morais de muitos brasileiros.

Carolina é uma garota já fisicamente desenvolvida, e por esta razão ela pode ir toda tarde na padaria próxima a sua casa para buscar leite e pão. Não há problemas em ir sozinha. Afinal, é só caminhar até a Avenida São Pedro, virar à esquerda e dar mais alguns passos. Pronto, lá está a mercearia.

Mas em um sábado que deveria ser como outro qualquer, ela não conta com um imprevisto em sua jornada: um garotinho sem rumo, aos prantos e sem se lembrar onde é sua casa. Ela fica confusa, pois não sabe como levar Digão de volta ao lar. E o pior de tudo é que a vizinhança também desconhece seu endereço.

Pouco antes, a menina havia passado por um mendigo sempre presente naquela região. Ele era um enigma para Carolina; a protagonista não compreendia a forma como o homem era tratado. Enquanto ela e sua mãe podiam se esconder sob as fachadas dos edifícios quando caía uma tempestade, o pedinte era proibido de fazer o mesmo.

A princípio a menina temia o mendigo, mas depois seu pai lhe fez perceber que não havia razão para temê-lo, porque era apenas uma pessoa que trazia em suas costas toda sua bagagem. Pois é justamente da parte dele que vem a solução para o problema de Digão e de Carolina.

Por meio de mensagens escritas o homem mudo interage com Carolina e a leva até a casa do menino. Mas, ao invés de gratidão, ele é recepcionado com rudeza e desagrado pelo pai do garoto. Com profunda delicadeza a voz do autor, em parceria com as lindas imagens tecidas por Marília Bruno, narra uma história de preconceito e de assimilação de seres marginalizados ao seio de uma comunidade social.

Apesar de o autor emprestar uma tonalidade adulta à narrativa, ela é vista do ponto de vista infantil, impresso, aliás, em um diário mais tarde convertido em criação literária. Portanto, é também uma representação do ato de contar histórias, com a ajuda de belas ilustrações.
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Charles Kiefer nasceu na cidade de Três de Maio, no Rio Grande do Sul, no dia 5 de novembro de 1958. Seu ingresso nas veredas literárias se deu com o livro Caminhando na Chuva, dirigida ao público juvenil. Com a obra O Pêndulo do Relógio, de 1985, o autor foi reconhecido nacionalmente e conquistou o Prêmio Jabuti.

No ano de 1993 ele recebe outro Prêmio Jabuti pelo livro de contos Um Outro Olhar. Três anos depois o escritor é agraciado com a mesma premiação pela obra Antologia Pessoal. Desde então ele vem recebendo vários outros prêmios.

Fontes:
http://palavraria.wordpress.com/tag/a-menina-e-o-mendigo/
http://consulteecompre.blogspot.com/2011/12/obras-infanto-juvenis-em-destaque-para.html
http://livrosdeliteraturainfantojuvenil.pontofrio.com.br/A-Menina-e-o-Mendigo-475447.html

sábado, 21 de abril de 2012

Herbert de Souza (A Lista de Alice)


Era uma vez Bocaiúva e seus habitantes... Esta poderia ser a maneira de ler o livro de Herbert de Souza, o Betinho, que retorna à cidade onde nasceu através de uma lista de nomes preparados a seu pedido pela prima Ailce. Só que teríamos de aumentar a frase : Era uma vez Bocaiúva e seus habitantes... que morreram. Os nomes listados dão origem a pequenos necrológios, só que diferentes das notícias de morte publicadas nos jornais que tratam de gente ilustre. Os necrológios de A lista de Ailce contam breves e saborosas histórias de vidas de homens e mulheres que habitaram a infância de Betinho na pequena cidade mineira. Uma galeria de figuras ímpares, que inclui o tio colecionador de tudo e chefe do correio local, os casais perfeitos e os imperfeitos, o médico que errava diagnósticos, o primo suicida, os mendigos e os padres, as mulheres avançadas para o seu tempo.

E outra galeria: a dos tipos mineiramente chamados de sistemáticos, os loucos internados na casa da própria família, além da mulher opiniática, que toma decisões à revelia do marido, e do apaixonado, o homem desiludido que adoece de frustração. Até o político famoso - José Maria Alkimin - ganha seu necrológio, em que se destaca a capacidade de fazer promessas e nunca cumpri-las. A genealogia familiar comparece em peso: José Maria, o primeiro irmão hemofílico a morrer, a avó Dona Mariquinha - a mãe-grande e controladora de todos os movimentos da família -, as tias, a irmã, os irmãos mortos pela AIDS, o pai Henrique e a mãe, Dona Maria, destinatária das famosas cartas para a mãe escritas por Henfil para a imprensa e para a TV nos anos 70. De cada personagem se narra um pedacinho da vida, aquele que melhor define uma fragilidade ou uma grandeza.

Afinal, quase todos, antes de morrerem, viveram muito. Fazendo a crônica dos mortos de Bocaiúva, Betinho vai reunindo lembranças: as namoradas encantadas da infância, o quarto de menino tuberculoso nos fundos da casa, a iniciação na militância política ainda na juventude e, ao final, desenha um esboço de auto-retrato. Narrando histórias de cidades do interior, que se repetem em qualquer parte do mundo, Betinho cria uma família literária para si mesmo: a família dos escritores Guimarães Rosa e Gabriel Garcia Marques. Mais do que isso, aprende com Genesco, o grande contador de histórias de Bocaiúva, que é possível avisar às pessoas que se vai morrer, mas que a hora ainda pode demorar a chegar. Enquanto isso há tempo de descobrir a razão de se estar vivo.

Fonte:
Resumos de Livros