quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Ronaldo Correia de Brito (Entre o Jornalismo e a Academia)



Um editor famoso afirmou que se foi o tempo em que uma crítica desfavorável condenava uma obra literária. Insistiu na irrelevância da crítica na promoção e venda de livros, reforçando o papel do editor e dos mecanismos de mídia e mercado. Ao fazer essa declaração, ele reforçou a imunidade do autor best-seller e a mudança de perfil do consumidor de livros. A crítica literária talvez ocupe, nos dias de hoje, um espaço limitado a um pequeno universo de leitores.

No jornalismo, os espaços reservados à literatura foram ocupados pelas resenhas, um tipo de texto que se afasta do ensaio acadêmico. Os leitores preferem informações ligeiras e superficiais. Ou talvez a literatura tenha perdido o prestígio em relação às outras artes. Há excesso de informação e escassez de tempo para ler.

Certa vez perguntaram a João Cabral de Melo Neto quanto os seus livros vendiam. Mesmo se tratando de um grande poeta, o jornalista procurava associar o valor da obra ao poder de venda. João Cabral citou um número irrisório, mas ressaltou um outro valor não mensurável: mesmo sendo pequena a tiragem de seus livros, o conteúdo se multiplicava pela força inerente à poesia, pela capacidade de transformar e transtornar.

Algumas críticas ficaram tão fortemente ligadas aos textos originais, que fazem parte da história desses livros. Posso citar o ensaio de Sartre sobre O Estrangeiro, de Camus; o de Emerson sobre "Folhas de Relva", de Whitman; e os de Edmund Wilson sobre os simbolistas Yeats, Valéry, Eliot, Proust, Joyce, Gertrude Stein, L'Isle-Adam e Rimbaud. Harold Bloom tornou-se um especialista em Shakespeare e seus estudos podem ser incluídos entre as formas de crítica a que Guimarães Rosa se referia, uma reinvenção ou redescoberta do autor.

Os exemplos de crítica que acabo de citar estão mais próximos do modelo acadêmico: análises minuciosas, profundas, para leitores que curtem literatura. Sartre e Emerson também eram escritores e exerceram a crítica numa perspectiva diferente de Edmund Wilson e Harold Bloom. Mas nada parecido com o atual abismo entre o ensaio e a resenha.

O pouco espaço reservado ao jornalismo literário e os novos tipos de leitores transformaram a crítica em divulgação e apreciação ligeira. Ela mais pontua que analisa. O jornalista inventa maneiras de chamar a atenção do leitor, através de resumos de obras e sugestões de leituras.

Chegamos a uma questão prosaica: continuam existindo várias formas de crítica literária, em função do público a quem se destina. Talvez o editor tenha razão ao afirmar que uma crítica não desbanca um autor da moda, por mais desfavorável que seja. A crítica sofre os embates do mercado, e tenta situar-se livre dos números e das listas de mais vendidos. Mesmo com baixo poder de fogo, mesmo dispondo de espaços menores e desprestigiados, a crítica continua ajudando não apenas a provocar e criar leitores, mas também a fazer escritores.

Fontes:
Colaboração de Digestivo Cultural. (http://www.digestivocultural.com)
– Imagem = http://overdriver.wordpress.com

Abertas inscrições para editais de literatura


Serão investidos R$ 915 mil em projetos de incentivo ao livro e a literatura. Inscrições vão até 19 de fevereiro na sede da Fundação Pedro Calmon.

A partir de segunda-feira, dia 21 de dezembro, a Secretaria de Cultura do Estado da Bahia, através da Fundação Pedro Calmon, estará com inscrições abertas para quatro editais de estímulo à cadeia produtiva do livro, através do apoio à editoras, escritores e à promoção da leitura. A iniciativa, realizada pela primeira vez em 2008, este ano traz ainda mais investimentos em cada categoria. Os quatro editais a serem lançados são: Edital de Apoio à edição de livros de autores baianos; Apoio à coleção editorial; Apoio à criação literária e Edital de incentivo à leitura. As inscrições vão até o dia 19 de fevereiro, na sede da FPC ou via Correio.

Desde 2008, a Secult, através da FPC, vem estimulando a dinamização da cadeia produtiva do livro através de editais, que segundo o diretor geral da Fundação Ubiratan Castro de Araújo, “é um instrumento transparente e democrático para fomentar a cultura, sem privilégios a pessoas ou grupos”. Os editais são lançados através do Fundo de Cultura da Bahia.

As inscrições deverão ser realizadas até 19 de fevereiro de 2010, na Fundação Pedro Calmon-FPC, localizada na Avenida Sete de Setembro, nº 282, Ed. Brasilgás, 7º andar, sala 709 - Centro, de segunda a sexta-feira, das 9h às 12h e das 14h às 17h, ou enviadas para Caixa Postal nº 2505, CEP 40060-001, Salvador/Bahia.

Editais –

Apoio a Edição de Livros de Literatura de Autores Baianos selecionará 15 (quinze) projetos inéditos nas categorias Poesia, Romance, Contos e Literatura Infanto-Juvenil. Também foi acrescentada a categoria, de memórias e ensaios, contemplando gêneros que até então não tinham apoio. O valor do apoio foi ajustado para R$25 mil, assim como o número mínimo da tiragem para 1500.

O Apoio a Coleção Editorial para edição de coleção de livros objetiva incentivar o mercado editorial e a criação literária na Bahia. O edital contemplará três editoras no valor de até R$ 70 mil (setenta mil reais) cada.

O Edital de Criação Literária selecionará oito projetos de apoio a autores baianos para criação literária nas categorias correspondentes aos gêneros lírico (poesia) e narrativo (romance, conto, crônica e novela), no valor de até R$18.750,00 (dezoito mil e setecentos e cinqüenta reais) cada.

O Edital de Incentivo à Leitura selecionará 10 (dez) projetos de estímulo ao hábito da leitura no valor de até R$18 mil (dezoito mil reais) cada, totalizando R$ 180 mil (cento e oitenta mil reais).

Fontes:
Colaboração de Douglas Lara.
http://ibahia.globo.com/plantao/noticia/default.asp?id_noticia=220466&id_secao=31
http://www.cultura.ba.gov.br/noticias/plugcultura/secretaria-de-cultura-lanca-novos-editais-de-literatura

Jean-Pierre Bayard (História das Lendas) Parte XXVII – final


IX. — Riquet à la Houppe
Ritual nupcial, Riquet mostra o poder mágico do amor sobre o ente amado.

1. — As variantes

Saintyves analisa esses contos nos quais o amor transforma a cônjuge. A mutação animal pode ser completa e constante (Le crapaud ) (O sapo) ou episódica (Le loup gris, L’homme Crapaud) (O lobo cinzento, O homem-sapo). O marido pode deixar sua mulher que não soube guardar um segredo (Le roi de Pietraverde). O homem, transformado em bicho, torna ao seu estado assim que uma mulher se decidir a beijá-lo ou a desposá-lo. (A Bela e a Fera, O Pentameron). As vezes a esposa é o personagem encantado (Perceval, La chaise de crapauds) (Parsifal, A cadeira dos sapos).

2. — Interpretações

A bela — a aurora — desposou o Sol que obscureceu; mas ao tornar-se cintilante ela deve segui-lo do Oriente ao Ocidente até a porta do palácio da noite.

Essa proibição de interrogar o ente amado significa para Saintyves o respeito de tabus nupciais. La veuve et ses filles torna-se ma das variantes de Barba-Azul: a história do casamento infeliz. Essas metamorfoses se referem às práticas de sociedades secretas pagãs ou religiosas: os membros, durante sua iniciação, revestiam peles de animais ou máscaras de animais.

É assim que essas narrativas mágicas de metamorfoses deram origem aos Pururavas, a Psiquê, a Riquet à la Houppa ou aos contos de Mme Leprince de Beaumont (Kusa le prince spirituel) (Cusa, o príncipe espiritual).

X. — O gato de botas

1. — Variantes

Se encontramos um conto semelhante em Pentameron (Gagluso), o conto de Zanzibar Sultant Darai assemelha-se muito ao nosso Gato de Botas. Mas quando a gazela benfeitora adoece, Darai esquece o que lhe deve; somente o povo lhe dedicará funerais públicos.

2. — Interpretações

A raposa da versão mongol é, sem dúvida, esse animal sagrado da Ásia mediterrânica, o gato é um animal feiticeiro (Europa); os gatos pretos acompanham as feiticeiras (Bodin). O gato calçado como os oficiantes persegue ritualmente a raposa e sem dúvida liga-se à liturgia egípcia: é o servidor do Sol.

Esse papel de proteção relaciona-se ao ritual da instauração dos antigos padres-reis das sociedades primitivas. Saintyves observa que o casamento prepara a ascensão ao trono e o futuro esposo troca de nome bem como o futuro rei.

Purificado pelas águas do rio, o herói veste novos trajes, é o cerimonial do coroamento; os súditos encontrados prestam obediência ao novo rei que toma posse do seu palácio: ritual de instauração real. Na maior parte dos contos o homem é ingrato; mas o animal pode demitir o rei que tem obrigações para com o seu povo.

A água é o emblema da ressurreição e da vida eterna. Com as águas maternais adquire-se um corpo novo que é o ritual do batismo. A água, essa fonte de Juvência, permitirá que Hera volte à virgindade depois de cada imersão na fonte de Canatos em Nauphie; eis ai uma reencarnação da qual aproveita o nosso marquês de Carabas.
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BIBLIOGRAFIA SUMÁRIA

LANGLOIS, Monuments littéraires de l’Inde (Lefêvre, 1827).
FALIGAN, Ernest. Histoire de la légend de Faust (Hachette, 1887).
A. VAN GENNEP, La formation des légendes (Flamamarion, 1910).
MENENDEZ PIDAL, L’épopée Gastillane (Colin, 1910).
GENDARME DE BEVOTTE, La légende de Don Juan (Hachette, 1906 e 1911).
J. LOTH, Romans de la Table Ronde (Paris, 1912).
PARIS, Gaston. Légendes du Moyen Age (Hachette, 1912).
BÉDIER, Joseph. Les légendea épiques (Champion, 1914).
COSQUIN, Emmanuel. Etudes folkloriques (Champion, 1922).
BOISSONNADE, La chanson de Roland (Champion, 1923).
PAUPHILET, Quête du Graal (Champion, 1923).
SAINTYVES, Les contes de Perrault (Nourry, 1923).
A. VAN GENNEP, Le folklore (Stock, 1924).
GUENON, Le roi da Monde (Paris, 1927).
LORENZI DE BRADI, Don Juan (Librairie de France, 1930).
BIANQUIS, Genevieve. Faust à travers quatre siècles (Droz, 1935).
SAINTYVES, Manuel de folklore (Nourry, 1936).
DONTENVILLE, Henri. La mythologie française (Payot, 1949).
LOEFFLER-DELACHAUX, La symbolisme des légendes (L’Aréhe, 1950).
MARX, Jean. La légende arthurienne (Presses Universitaires de France, 1952).
SAUVAGE, Micheline. Les cas Don Juan (Le Seuil, 1953).

Fonte:
BAYARD, Jean-Pierre. História das Lendas. (Tradução: Jeanne Marillier). Ed. Ridendo Castigat Mores

Jerônimo Mendes (História da Poesia Universal – Breve Relato ) Parte VIII


2. A POPULARIDADE DA POESIA ATRAVÉS DA MÚSICA

Alguns estudiosos da literatura afirmam que a poesia vive hoje o seu apogeu no mundo artístico através da música popular. Muitos compositores ou mesmo intérpretes se valeram de trechos encontrados em poemas de autores conhecidos e mesmo desconhecidos da poesia universal. Nos poetas da antigüidade descobrimos a conjunção da poesia e do teatro cênico, representada nas grandes tragédias e declamadas ao som da lira, como recurso único de elevação do espírito poético e provocação da emoção da platéia presente.

Robert Burns, poeta camponês e glória da literatura escocesa, levou uma vida atribulada e miserável, mas entre bebedeiras e prostitutas, compôs centenas de canções líricas e satíricas, que se adaptavam às melodias tradicionais correntes na Escócia de seu tempo e que são cantadas até hoje pelos escoceses; muitas delas, no entanto, mereceram composições originais – Mendelssohn ((Pianista, compositor e músico alemão do Século XIX) musicou algumas.

Apollinaire, estudado no capítulo Os Grandes Poetas, foi um dos primeiros a registrar seus poemas em disco com seu célebre poema “ Le Pont Mirabeau ” e descobriu que música e poesia estão intimamente ligadas. Discorrendo aqui por minha conta e risco, ao desenvolver o capítulo pareceu-me muito familiar a associação existente entre poesia e música, do ponto de vista cultural e artístico, ao lembrar as composições da nossa própria terra, expressa nos versos de Ari Barroso, Noel Rosa, Pixinguinha, Chico
Buarque, Milton Nascimento ou mesmo nos contemporâneos como Renato Russo e Herbert Viana entre outros.

Quem não consegue enxergar a poesia em estado puro presente nos versos da composição de Pais e Filhos, grande sucesso musical de Renato Russo, líder do conjunto Legião Urbana, falecido recentemente ?

“ É preciso amar as pessoas
como se não houvesse amanhã ”
.

Ou então nos versos inesquecíveis de John Lennon, ex-integrante dos Beattles quando, já separado de seus companheiros, foi capaz de exprimir em versos tudo que a população da Terra sentia, ao final da Guerra do Vietnã, através da composição Imagine, em 1970 :

Imagine there´s no heaven
(Imagine que não existe o céu)
It´s easy if you try
(é fácil se você tentar)
No hell below us
(nem inferno abaixo de nós)
Above us only sky
(acima de nós apenas o céu)
You may say I´m a dreamer
(você pode dizer que sou um sonhador)
But I´m not the only one
(mas eu não sou o único)
I hope someday you´ll join us
(Eu espero junte-se a nós algum dia)
And the world will be as one . . .
(e o mundo será somente um)

Não dá para separar a música do poema. Seguramente, a união é indissolúvel, existe a música e a poesia e uma sem a outra talvez não tivesse feito tanto sucesso nem surtido o efeito necessário para promover a reflexão e trabalhar a emoção dos ouvintes, nem seria eternizada na memória e na cultura do povo inglês e todos aqueles o idolatram.

Grandes compositores como Mozart, Schubert, Strauss, Vivaldi e Bach curvaram-se à exploração da poesia como forma de enriquecer suas músicas e ao ouvirmos as composições, lembramos e até chegamos a comprovar o conceito formal de poesia descrito no início da monografia, de autoria do estudioso e poeta Eno Teodoro Wanke : “ Quando ... o artista consegue transmitir sentimento, fazer com que o leitor, o ouvinte se sinta comovido, sublimado, arrebatado, terá ele atingido a poesia ”.

No Brasil, Noel de Medeiros Rosa, reconhecidamente O Poeta da Vila, era um carioca impenitente e acabou unindo o útil ao agradável quando resolveu musicar seus versos de amor à Vila Isabel, bairro famoso do Rio de Janeiro, e sensibilizou a alma do povo, não somente pela melodia contagiante, mas, sobretudo, pelo sabor dos seus versos. Em seu versos, o poeta Noel Rosa procurava retratar, ainda que metaforicamente, um país ilhado em pobreza, com a fome e a miséria alastrando-se como praga. Foi parabenizado pela originalidade de suas letras e engenho sidade do seu samba, que ele próprio cantava com graça e especial sabor, imprimindo sua marca pessoal, notável principalmente pelo fraseado, pela habilidade com que pronunciava, nítida e rapidamente, os versos longos nos quais um intérprete menos ágil tropeçaria.

Rendo aqui minha singela homenagem também ao poeta Luiz Gonzaga do Nascimento, o Rei do Baião , cantor, músico e compositor nordestino que popularizou a poesia de sua terra em todo o Brasil, tornando-se um dos artistas mais admirados no país. Asa Branca, toada de 1947, consagrou-se um hino nordestino e foi adaptada em diversas línguas, flagrante do folclore e espírito do povo do nordeste.

Em seu extenso reinado da música, o Rei do Baião gravou 192 discos e deixou um precioso legado musical. Com Asa Branca, soube transmitir com emoção todo sofrimento de um povo castigado pela seca e miséria :

Quando olhei a terra ardendo
qual fogueira de São João,
eu perguntei a Deus do céu,
por que tamanha judiação ?

Por fim, Vinícius de Moraes e Tom Jobim se revelaram os maiores expoentes da poesia aliada à musica no Brasil. Suas famosas canções, escritas em parceria, são dotadas da mais profunda inspiração poética, aliadas ao ritmo, balanço, melodia e harmonia existente entre os dois compositores. Vinícius sempre soube deixar as gerações para trás quando se sentia envelhecido. Ao sentir que a grande poesia estava tirando o vigor do seu coração, mudou de turma e soube perseguir o tempo sem perder o passo. Seus novos parceiros atuaram como zeladores do compromisso da experiência com a poesia.

Há quem afirme que a dupla Tom/Vinícius se desfez por ciúmes do encontro de Vinícius com novos parceiros. Tom nunca se afastou completamente de Vinícius. Em 1977, quando já contabilizam 56 músicas em parceria, os dois subiram ao palco do Canecão para mais um dos shows inesquecíveis da casa.

Tom Jobim nunca negou que devia tudo, ou quase tudo, ao sentimentalista poeta Vinícius de Moraes e tinha medo de que a música viesse a incomodar os versos e a poesia do amigo e companheiro. Vinícius sempre renegou a posição de mestre. Tom testemunhou que para o poeta, o mais atroz de todos os enigmas era a mulher, que tantos versos lhe inspirou. Juntos, unindo música e poesia, criaram belas canções como Garota de Ipanema, O Grande Amor, Eu Sei Que Vou te Amar e A Felicidade, aqui representada pelo seu refrão inesquecível : “Tristeza não tem fim, felicidade sim “.

Num curto espaço de tempo, consigo lembrar razoavelmente de alguns poucos mestres provável e perfeita união entre música e poesia, mesmo deixando diversos poetas-compositores de lado, por falta de tempo para aprofundar-me num assunto extremamente rico e cativante. Diversos artigos que consultei nos periódicos mais expressivos do país, tratam a música quase sempre como impossível de ser realizada sem a junção com a poesia, mesmo que não expressa em versos e somente no interior
daquele que se responsabilizou pela união de ambas.

Como exemplo, cito alguns títulos de reportagens envolvendo poetas e músicos ao mesmo tempo ou de músicas expressando poesias :
“ A VIVA VOZ - Poesias de Helena Kolody vão ser lançadas em CD até o final do ano”“ (Gazeta do Povo, 30/08/97).
“ AO SOM DA POESIA DA LETRAS BRASILEIRAS ” (O Estado do PR, 07.09.97).
“ O BARDO MULTIMÍDIA - Poesia Musical de Arnaldo Antunes ” (Folha de São Paulo, 05.12.97).
“ TOM E VINÍCIUS - Os Poetas compositores e parceria “ (Jornal Revista da Poesia, Ano III, N.º 10, Curitiba).

Muito mais encontraríamos, certamente, mas encerramos o capítulo com a mais profunda certeza de que poesia e música se completam, e talvez seja este o motivo que faça a poesia resistir a todas as tormentas provocadas pela mudança na cultura dos povos, divididos entre a leitura e o computador, a miséria e a riqueza, a paz e a guerra.

Fonte:
Monografia feita pelo autor em Curitiba / PR , março de 2001

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Mario Pontes (1932)



Mario Pontes nasceu em Novas Russas/CE (1932).

Reside no Rio de Janeiro desde 1958.

Além de contista, é romancista e ensaísta. É outro que, vivendo há muitos anos longe do Ceará, tem seu nome poucas vezes citado nos artigos e ensaios de literatura cearense.

Tornou-se jornalista aos 16 anos de idade. Durante meio século trabalhou em revistas culturais e suplementos literários, como o do Jornal do Brasil, que editou por muitos anos.

Estreou em 1977, com o volume Milagre na Salina, embora catalogado como romance. No entanto, o próprio Mario Pontes explica, em nota prévia, o que é seu livro: “histórias da Salina”.

Em 1999 editou pela Bertrand Brasil, do Rio de Janeiro, o volume Andante Com Morte – Quatro Ficções, composto das novelas “A Morte Infinita”, “Sentinelas da Noite”, “A Engrenagem Universal” e “A Nova Rota da Seda”, catalogadas como contos.

Tem traduzido importantes obras filosóficas e literárias, entre as quais do Prêmio Nobel espanhol Camilo José Cela e textos teatrais de Julio Cortázar.

Fonte:
MACIEL, Nilto. Panorama do Conto Cearense.

Mário Pontes em Xeque


A história de Mario Pontes dava para escrever um romance. Ele nasceu, há 74 anos, numa pequena cidade no Ceará chamada Nova Russas, e conta que houve um período na história recente do Brasil em que era necessário cautela quando tinha de dizer o nome daquela cidade: “Muita gente confundia Russas com Rússia”, lembra.

Filho de um carpinteiro interessado em livros, aprendeu a ler nos jornais que o pai levava para casa. Os grandes assuntos da ocasião, a Guerra Civil Espanhola e, depois, a Segunda Guerra Mundial, despertaram nele o sonho do jornalismo. Ainda adolescente, quando se mudou de sua cidade para outra maior, onde havia uma daquelas pequenas porém selecionadas bibliotecas do Instituto Nacional do Livro, extinto no governo Collor, passou a ler dezenas de volumes por ano, o que também ajudou a introduzir a literatura em sua corrente sangüínea.

Nesta entrevista a Associação Brasileira de Imprensa (ABI Online), Mario — que, algumas vezes, de longe em longe, também pinta aquarelas relacionadas com seus contos — revela, entre outras coisas, que sua preocupação com as mudanças climáticas vêm de longe. No Caderno Especial do Jornal do Brasil publicou muitos textos sobre assuntos como o fracasso da chamada Revolução Verde, que destruiu muitas terras nos países pobres, graças aos seus experimentos de produção acelerada. Nos anos 90, seu livro de ficção “Andante com morte” (publicado pela Bertrand), continha uma pequena novela sobre sangrentas guerras entre pedestres e motoristas, que aconteceriam neste século XXI, o fim do petróleo e a elevação dos mares. O título da novela era “A nova rota da seda”.

ABI Online — Antes de mais nada, por que esse nome, Nova Russas?

Mario Pontes — No Leste do Ceará há uma cidade muita antiga chamada Russas, do tempo das guerras holandesas. E no Oeste, então, tem Nova Russas, quase na divisa com o Piauí, em pleno sertão, sertãozão daqueles. Nasci ali, em 32.

ABI Online — Sertão muito pobre...

Mario — Sim. Lá, o progresso era representado unicamente pela a estrada de ferro (hoje dedicada somente ao transporte de cargas) que nos assegurava o contato com o mundo. Aprendi a ler com meu pai. Ele gostava de ler os jornais que, três vezes na semana, o trem trazia de Fortaleza. Aprendi a ler, lendo as notícias das guerras. Em 38, já lia muito bem. Foi bom, porque muito cedo comecei a adquirir uma consciência da História e do que se passava ao redor. Durante muito tempo os jornais foram, praticamente, minha única fonte de leitura. A cidade não tinha biblioteca, não tinha livraria.

ABI Online — Vivia longe dos livros e da escola?

Mario — De fato. Mas em 39, um jovem intelectual do Crato — uma cidade antiga, aristocrática, situada no Sul do Ceará — foi parar em Nova Russas e criou ali um colégio que, segundo seu plano, ensinaria até o segundo grau. O nome dele era Pedro Teles. Ele havia estudado no célebre seminário de sua cidade, pelo qual passaram rebeldes de 1817, mas na última hora desistiu da batina. Um tio meu, que estava em situação bem melhor do que nós, ofereceu-se para pagar meus estudos. E foi assim por dois anos. Mas em 41 houve uma grande seca e meu tio disse que não poderia mais pagar o colégio. Como meu pai também não tinha dinheiro, eu ia ficar sem escola. A essa altura, Pedro Telles resolvera mudar-se para Fortaleza, e tinha trazido do Crato um rapaz que já havia concluído seus estudos pré-universitários. Alderico Damasceno e eu descobrimos imediatamente que havia várias pontes entre nós: eu, como já disse, era filho de um carpinteiro e ele, de um telegrafista de estrada de ferro. Naquele tempo havia uma forte associação entre o telégrafo e a ferrovia. Alderico foi à minha casa e disse a meu pai que por falta de dinheiro eu não deixaria de estudar. Em troca, sempre que pudesse, meu pai devia fazer umas carteiras para os alunos do colégio.

ABI Online — São esses pequenos milagres que acontecem...

Mario — Pois é. E foi assim que completei o primário. O Alderico revelou-se, pelo menos para mim, uma figura notável, um mestre e não um mero professor. Ele me ensinou o francês — que acabei de aprender, mais tarde, lendo os romances e as peças de Sartre — e um pouco de inglês. Ele me emprestava livros de sua estante. O primeiro foi um volume sobre Viriato, o herói português na luta contra os romanos. Depois, passou a me emprestar biografias de grandes filósofos.

ABI Online — A família toda se mudou para Crateús?

Mario — Lá, nossa situação financeira continuou precária. Meu pai era muito pobre e tive de ajudá-lo de alguma forma. Mas havia uma biblioteca maravilhosa, daquelas distribuídas, naquela época, pelo Instituto Nacional do Livro. Foram criadas pelo poeta gaúcho Augusto Meyer, que tinha vindo para o Rio de Janeiro, no fim do Governo Vargas, para dirigir a Biblioteca Nacional. O Instituto tinha um sistema de distribuição de livros e criação de bibliotecas no interior, numa época em que o livro era uma coisa muito rara. Foi uma das grandes iniciativas em favor da leitura neste País. Augusto Meyer deveria ter um monumento que o lembrasse por isso.

ABI Online — Então leu muito em Crateús?

Mario — Em pouco mais de quatro anos, li quase todos os 400 livros da biblioteca, começando por “O mandarim”, de Eça, e terminando por “Sagarana”, de Guimarães Rosa. Aquela biblioteca foi minha universidade. Os livros — de história, literatura brasileira e estrangeira — eram muito bem selecionados pelo INL. Um dia, voltando a Nova Russas, fui visitar o professor Alderico. Ele quis saber o que eu estava lendo. Citei vários títulos. Ele me perguntou: “Já leu ’Dom Quixote’?” Respondi que não. “Então venha cá.” Tirou da prateleira o livro de Miguel de Cervantes, e disse: “Sente aí. Leia o que puder. Depois procura ler o resto.” Logo depois, de volta a Crateús, aconteceu uma coisa importante: me tornei tipógrafo. Trabalhava com uma caixa de tipos móveis e um prelo manual.

ABI Online — Nessa caixa, os tipos não são distribuídos conforme uma ordem lógica.

Mario — De fato. Era uma “caixa” francesa, e nela a distribuição é mais ou menos a seguinte: no alto à esquerda as maiúsculas, à direita às letras acentuadas, embaixo as minúsculas. Nas caixas inglesa e alemã a distribuição é diferente. Graças a estes conhecimentos, pude ir para Fortaleza, onde trabalhei, primeiramente, na tipografia do jornal O Democrata. Seis meses depois, já estava no linotipo.

ABI Online — Onde aspirou aqueles “saudáveis” gases de chumbo.

Mario — E onde levei um choque elétrico violento, quase morri. Logo depois me levaram para a redação e me tornei repórter. O Democrata circulava com seis páginas diárias. Era um pequeno jornal de esquerda e de oposição ao Governo do estado. De vez em quando, o Governador não gostava do que o jornal dizia e mandava empastelar as páginas já enramadas e dar umas cacetadas em que estivesse na redação e nas oficinas. Nesses dias o jornal não saía. Isso aconteceu várias vezes. Mas a editora tinha outros títulos registrados e, no dia seguinte, lá estava o jornal na banca, com outro nome. Meus começos foram por aí.

ABI Online — Um começo com choque elétrico e sopapos.

Mario — Cheguei a secretário de redação e fiquei naquele jornal de 49 a 56, o ano do levante dos húngaros contra a União Soviética. Em Fortaleza, fui para O Estado, que não existe mais; depois trabalhei em dois jornais dos Diários Associados — o matutino Unitário (fundado no século XIX por João Brígido, figura lendária e pioneira no jornalismo cearense, um homem de coragem que trabalhava com o bacamarte em cima da mesa) e no vespertino Correio do Ceará. Por ter passado pelos Diários Associados, também fiz um pouco de rádio, na Verdes Mares, sempre nos noticiários. Em 59 vim para o Rio.

ABI Online — Aqui, estreou onde?

Mario — No Diário Carioca, como copidesque. Trabalhei algum tempo na Petrobras, editando revistas, livros e outras publicações. Comecei a experimentar a tradução em O Detetive, uma revista do grupo O Cruzeiro. Em 69, fui para a Editora Vozes, onde me tornei editor de livros leigos,por vários anos. Uma grande experiência. Lá editei e traduzi livros sobre vários assuntos. Trabalhei também com os Bloch, para quem também traduzi dois livros, um deles de natureza filosófica. Em 69 fui para o Jornal do Brasil. Me tornei redator do Departamento de Pesquisa, formado por um grupo que tinha de ser necessariamente de bom nível intelectual. Quando saí do JB, traduzi muitos livros, principalmente para as editoras Zahar e Bertrand.

ABI Online — Como se faz tradução?

Mario — Hoje há cursos que ensinam como traduzir. Alguns, pelo que se publica sobre eles, me parecem muito teóricos. Traduzo com base nos meus conhecimentos, meu gosto pela literatura e a filosofia e minha curiosidades pelas línguas. Como sei que nunca é possível se saber de tudo, tenho muitos dicionários, perto de 300. Uns 20 de inglês, o mesmo de francês e de espanhol, e um monte de dicionários de línguas que não sei. Afora os temáticos.

ABI Online — Para evitar surpresas?

Mario — Posso estar traduzindo um livro sobre história dos gregos e topar, de repente, com um termo turco ou sânscrito. Como traduzir corretamente esses termos se não tiver um dicionário de turco e pelo menos um de sânscrito? Tenho dicionários muito específicos. Por exemplo, vários de expressões próprias de regiões da América Latina. Um dicionário de expressões usadas em Honduras...

ABI Online — Os hondurenhos têm um linguajar muito característico. A capital, por exemplo, eles chamam de “Teguz”.

Mario — Pois é, eles chamam Tegucigalpa desta forma mais curta e têm uma linguagem interiorana, do campo, muito diferente daquela que se fala nas cidades. Mesmo na Espanha isso acontece. Traduzi alguns livros do Camilo José Cela, que morreu em 2002; mesmo sendo membro da Real Academia Espanhola, nunca deixou de ser um galego. Quando escrevia, ele misturava as línguas e enchia o texto com palavras e expressões galegas, que eu não conhecia. Tive de aprender o essencial da língua galega para traduzir corretamente. Comprei gramática de galego, dicionários de galego...

ABI Online — E quanto tempo se gasta numa tradução?

Mario — Depende. Eu sempre gasto muito tempo, porque sou metódico. Apesar de os computadores informarem quantos milhares de letras ou palavras acabei de escrever, minha referência continua sendo a lauda de 30 linhas com média de 72 batidas cada. É com ela que meço meu trabalho.

ABI Online — Mas, digamos, um livro de 200 páginas...

Mario — Depende do livro.

ABI Online — Um mês?

Mario — Não, eu não seria capaz de fazer em um mês. Levo mais tempo, sou perfeccionista. Tenho amigos que traduzem em um mês. Eu não consigo.

ABI Online — Qual é a sua rotina? Vai de manhã para o escritório e...

Mario — Dedico umas seis horas por dia ao meu trabalho. Mais que isso não agüento. A exigência intelectual é muito grande. Há um livro que fiquei mais de um ano e meio traduzindo. Foi um dos últimos que traduzi, e ainda não está publicado, deve sair este ano, para a Bienal. Intitula-se “O saber grego”. Deverá sair pela Editora Bertrand, com a qual me dou muito bem. É uma obra de 1.200 páginas, dividida em três partes. A primeira dedicada aos filósofos gregos, dos primeiros até os do fim da Antigüidade. A segunda parte é dedicada aos outros saberes gregos. Medicina, matemática, cosmologia. Traduzir o capítulo sobre cosmologia foi de enlouquecer, porque, para os gregos, a Terra era o centro do Universo. A ginástica mental que eles fizeram para provar isso...

ABI Online — A teoria geocêntrica...

Mario — Os artifícios criados pela inteligência grega para comprovar essa tese são de deixar a gente tonta. Já a parte final do livro é dedicada às escolas que se desenvolveram a partir do pensamento dos filósofos abordados no início. Tivemos na primeira parte um grande capítulo sobre Aristóteles; agora, na última, outro sobre o aristotelismo. O mesmo no caso de Platão, Várias pessoas tinham olhado para aquele “tijolo” e desistido. Para mim era um desafio. Queria testar a que ponto havia chegado, provar a mim mesmo que havia adquirido cultura suficiente para encarar uma tarefa como aquela.

ABI Online — Quantos livros já traduziu?

Mario — Exatamente 30. Conheço colegas que já traduziram mais de 500. Mas nós, que trabalhávamos na pesquisa do Jornal do Brasil, estávamos sempre traduzindo textos estrangeiros, às vezes bem difíceis. Não sei quantos traduzi lá.

ABI Online — Dizem que um livro traduzido pelo senhor é tão bom quanto o original.

Mario — Não é verdade. Veja, ali está um livro que traduzi (aponta para a prateleira): “Verdade ao amanhecer”, do (Ernest) Hemingway, um original que a família publicou 50 anos depois de sua morte. Como tudo de Hemingway, tem passagens muito boas. E outras nada boas. Por causa da pressa. Porque Hemingway estava descontente com a vida, com tudo. Neste caso, claro, uma ou outra passagem da tradução pode ser melhor que o original. Mas isso é único na minha lista de traduções.

ABI Online — E os livros que o senhor escreveu?

Mario — Durante muitos anos não pude escrever os livros que tinha em mente, porque, no meu caso. sempre foram muito difíceis as condições de trabalho no JB. E foram 25 anos! Durante muito tempo, editei sozinho o caderno Livro. Não tinha ninguém para ajudar e por isso fiquei quatro anos sem tirar férias. Somente em 77, quando eu já tinha 40 e tantos anos, lancei meu primeiro livro, “Milagre na Salina”, um conjunto de contos. Publiquei pouco depois, pela Codecri, um volume de estudos sobre a poesia popular do Nordeste: “Doce como diabo”. Em 99, a Bertrand editou o volume “Andante com morte”, composto de quatro ficções mais ou menos curtas: “A morte infinita”, “Sentinelas da noite” e “A engrenagem universal” e “A nova rota da seda”. As três primeiras histórias dizem respeito ao sertão e as mudanças que lá vêm ocorrendo. Um resenhador de São Paulo disse que eu era conservador, só escrevia sobre coisas antigas... A última história — que, literariamente, considero um pouco fraca — prevê que, em algum momento desta primeira metade do século XXI, o excesso de automóveis fará explodir uma guerra violenta e sem fim, entre pedestres e motoristas, provocando milhares de mortes em cada grande cidade do mundo. A indústria automobilística cria, então, para os que têm mais dinheiro, uma gigantesca rodovia, que sai do centro da Europa, passa pela Turquia e chega até a China, com muitas pistas para o motorista reprimido e desesperado com os eternos engarrafamentos, correr a 300, 400 quilômetros por hora e morrer do jeito que quiser.

ABI Online — A rota da seda de Marco Pólo...

Mario — Só que, quando ela começa a alegrar a morte dos gloriosos suicidas da gasolina, o petróleo se acaba e as grandes potências, ou melhor, a grande potência vai lá e toma tudo ou o restinho que sobrou. A essa altura, as calotas polares já derreteram e os oceanos inundaram quase tudo. Um brasileiro da Baixada Fluminense, que vai para a Europa num navio velho, é quem conta como se chega à Nova Rota da Seda, a rota do embuste. Ele se associa a um grupo de vagabundos, liderados por um filósofo. Aquele mesmo resenhador, que disse que os três primeiros contos refletiam um pensamento atrasado, classificou este último de um devaneio do meu futurismo apocalíptico de nordestino...

ABI Online — Os três primeiros eram muito atrasados e este era muito moderno...

Mario — Tudo o que eu disse ali está agora em todas as manchetes do mundo. O petróleo vai acabar logo e estão aí o efeito estufa, o derretimento das calotas... Os mares vão subir exatamente como se descreve no meu conto. Ninguém mais tem dúvida de que este será o século de radicais mudanças climáticas. Este é, hoje, o maior problema da humanidade. Todos os estudos apontam nesse sentido. Até o Arnold Schwarzenegger — apesar de pertencer ao partido republicano — já tenta controlar as emissões de carbono na Califórnia, contra a vontade do Bush. Ele se opõe à política ambiental da Casa Branca. É um absurdo meter a cabeça na areia, tentar ignorar o problema. Tenho a impressão de que, em termos de ficção, fui o primeiro a escrever, no Brasil, sobre esses desastres que nos esperam. Parece que muitas pessoas têm medo de tocar certos assuntos como o do ambiente, encarar certas verdades. Parece que têm medo dos poderoso, sei lá.

ABI Online — Vamos falar agora sobre o JB.

Mario — Trabalhei dez anos na Editora Vozes. Um ano em Petrópolis, os outros nove no Rio, dividindo o dia com o JB. Na editora dos franciscanos, meu trabalho mais constante era o de participante da editoria da Revista de Cultura Vozes, dirigida por frei Clarêncio Neotti e editada por Moacy Cirne. Para mim foram anos de muita liberdade, muita criatividade. Como não podíamos falar sobre as coisas óbvias que aconteciam embaixo do nariz da gente, recorríamos à antropologia, à sociologia, à lingüística, para dizer pelo menos um pouco daquilo que nos era vetado. Em 69 fui para o Departamento de Pesquisa do JB, quando aquela editoria estava em um bom momento. Éramos oito redatores. Tínhamos de escrever bons textos sobre os mais diferentes assuntos. Era um trabalho que exigia muito, muito mesmo. Numa segunda-feira, ao chegar no jornal, mandaram que me apresentasse ao editor, Alberto Dines. Ele me disse: “Está vendo este livro? Quero que você vá pra casa e o leia. Sexta-feira você volta e me escreve uma página dupla do Caderno Especial.” Era um livro de umas 300 páginas, intitulado “The american way of war”, uma variação do conhecido american way of life. O livro tratava da idéia norte-americana de estratégia, das guerras da Independência até o Vietnã, a guerra deles naquele momento

ABI Online — Não era um assunto dos mais simples...

Mario — Não. Li tudo e, na sexta, voltei para o jornal com as páginas prontas. A gente trabalhava muito, mas tinha orgulho de pertencer ao grupo. Nem assinávamos as matérias. Saía só o crédito “Pesquisa JB”. Éramos anônimos, mas gostávamos do que fazíamos. Cada dia era um desafio intelectual para cada um de nós. Quando o Dines saiu, o Departamento — tal como existia — acabou. Fui para o Caderno B, onde fiquei vários anos como subeditor. O jornal publicava o suplemento Livro, criado em 72 e editado pelo Remy Gorga Filho. Sempre achei muito bom o trabalho do Remy, que, para variar, fazia aquilo sozinho, não tinha redator. Em 77, ele saiu do jornal e eu fui escolhido para editar o caderno, só que com várias restrições: na prática, ele passava a publicar unicamente resenhas, pequenas resenhas, conforme o modelo de The New York Times. E, como todos sabem, era uma época de censura e auto-censura. Muitos professores, escritores, pessoas que tinham o que dizer, não queriam ou não podiam escrever para o suplemento. Então, pensei: vou procurar jovens escritores e mexer com o orgulho deles. Eu lhes dizia mais ou menos o seguinte: “Dou a você uma oportunidade de aparecer; mas, como você não tem experiência de escrever para jornal, me autoriza a ‘mexer’ em sua resenha, não para mudar suas idéias, mas para torná-las mais legíveis. Uns 99% deles aceitaram.

ABI Online — Foi até quando isso?

Mario — Acho que até meados de 86. Creio que foi naquele ano que o Zuenir Ventura foi para lá, editar a Revista de Domingo e, em seguida, o Caderno B. Nesse meio tempo, fui cooptado para escrever editoriais, tarefa que não consegui desempenhar por muito tempo. Não é fácil tentar convencer todo o dia o leitor a aceitar como sua uma idéia que não é sua.

ABI Online — É a do jornal.

Mario — Pois é... Voltei para a editoria do B. Nesse meio tempo, Zuenir tinha transformado o Livro em Idéias — um tablóide com linha menos estrita. E que tinha, pelo menos, dois redatores para editá-lo: o Luciano Trigo e a Vivian Wiler. Com a saída do Zuenir e do Trigo, lá fui eu, de novo, para os livros e a literatura. Fiquei uns tempos fazendo o caderno, mais uma vez sozinho. Mas a certa altura adoeci gravemente, e então a editoria do caderno passou para outras mãos. Permaneci apenas como redator. Depois, a editoria do Idéias dividiu-se: na quinta editava-se um Idéias dedicado aos livros (publicado aos sábados), e na sexta, outro Idéias, que era o Caderno Especial de cara nova (publicado no domingo). Nessa época, trabalhei com três bons editores, Zé Castello, uma pessoa muito culta, Wilson Coutinho, um companheiro estimulante, com excelentes conhecimentos de filosofia, e o Cláudio Bojunga, que além de culto e experiente, sempre foi uma pessoa finíssima e de temperamento muito estável. Mas, para mim, essa junção de editorias significou, antes de tudo, um pouco mais de trabalho...

ABI Online — E quando o senhor deixou o JB?

Mario — Saí em meados dos anos 90 e me aposentei.
ABI Online — Vamos falar sobre meio ambiente, um tema que lhe interessa muito.

Mario — É um sinalzinho que apareceu muito cedo em minha consciência. Nasci num lugar muito seco. E, por causa da devastação secular, mais pobre de vegetação do que naturalmente era. Aprendi a valorizar a água, a árvore, o lagarto, a coruja. Foi uma coisa natural. E esse homem (aponta para a foto de Alderico Damasceno) também tinha essa consciência e se esforçava para que cada um de nós a adquirisse em alguma medida. Estive no ano passado em minha cidade. Fui lá para o aniversário do último tio que me resta, um homem muito inteligente que teve apenas 15 dias de escola. Foi lavrador, comerciante, e conseguiu juntar algumas propriedades. Agora, depois de velho, resolveu escrever. No primeiro livro, suas memórias. Ele me mandou os textos e eu tive de “traduzi-los” para o português, porque ele escreve em “outra coisa”... Mas fiz aquilo com o maior prazer, pois tenho muita admiração por ele, é um grande homem e uma boa pessoa. Mesmo sem ser muito religioso, sem ser beato, está sempre preocupado com o próximo. No segundo livro revela suas preocupações com a cidade e elogia aqueles que a construíram, os carreteiros, os sapateiros... O lançamento foi no clube da cidade. Estavam lá o vice-prefeito e o Secretário de Educação; teve sermão do padre, projeção de um pequeno documentário etc. Pelo programa, eu tinha de dizer algumas palavras sobre o meu tio e acabei pedindo desculpas para falar também algumas verdades que estavam entaladas na minha garganta.

ABI Online — Não podia perder a chance...

Mario — Pedi licença para falar, primeiro, do pequeno rio da cidade, que era bonito e hoje é um banco de areia com um filete d’água; da mata ciliar — com suas grandes árvores, como a oiticica, e arbustos, alguns deles aromáticos — que destruíram pelo simples prazer de destruir. A 200 metros da Prefeitura, eu tinha visto uma pirâmide de lixo, com milhares de garrafas “pet”. “Não sei como se consegue conviver com tanta sujeira”, disse. Se eu pudesse, teria procurado os estudantes da cidade a fim de convencê-los a replantar o que foi devastado. Porque isso — eu também disse na solenidade – deve ser feito pelo povo, pelos cidadãos. A experiência diz que não se deve esperar por nenhum dos governos, seja federal, estadual ou municipal.” Bem antes desse episódio, eu havia começado a pesquisar nos jornais e revistas do Rio e São Paulo, tudo que encontro sobre ecologia e meio ambiente. Recorto e envio para uma senhora, Dona Terezinha, que distribui esse material nas escolas.

ABI Online — E a garotada já adquiriu alguma consciência?

Mario — Olha, diz ela que algumas escolas estão conseguindo progressos com seus alunos. Mas isso não se consegue de uma vez. Nossa família — eu, meus cinco irmãos que vivem em Brasília e mais alguns parentes — criou em Nova Russas uma escola de música para tirar os meninos das ruas e lhes ensinar uma profissão. A escola funciona em um salãozinho da Sociedade São Vicente de Paula. Durante a semana, os meninos têm aulas regulares. No sábado e domingo, aprendem música. Antes, os instrumentos eram da própria Prefeitura. Mas eram muito ruins, mal conservados. Eu me lembro da primeira vez que fui vê-los. Fiquei absolutamente pasmo com o progresso dos meninos. Em dois anos de aprendizado, eles estavam tocando Pixinguinha, que compôs uma música supercomplexa. Um estava tocando o clarinete quando, de repente, metade do instrumento caiu no chão. As duas partes estavam ligadas com cera de abelha. Tirei o dinheiro que tinha no bolso e disse para os outros: bem, completem e comprem um clarinete para aquele menino. Nem que seja de segunda mão. Eu estava muito emocionado.

ABI Online — Em breve será uma orquestra.

Mario — Já conseguimos, aqui e ali, quase todos os instrumentos. O importante, porém, é que vários adolescentes já foram admitidos em orquestras populares de cidades vizinhas. Ou seja: estão empregados Também tirei 2.300 livros das minhas estantes e doei à prefeitura, para que criasse uma biblioteca. Tem uma área na cidade, onde funciona a Secretaria da Educação, que foi transformada em campus avançado de uma universidade regional, com sede em Sobral. Soube que agora temos uma faculdade nesse campus avançado. As coisas estão melhorando.

ABI Online — Hoje o senhor se considera mais tradutor, mais jornalista ou mais ambientalista?

Mario — Não sei o que sou. Traduzo, mas não penso só em tradução. E escrevo também. Às vezes me pedem colaboração para o Idéias, mas, em termos de jornalismo, a única coisa que estou fazendo com regularidade é escrever para um pequeno jornal de Minas, chamado O Cometa Itabirano. Uma folha que o Drummond prezava muito. Soube até que ele deixou uma cláusula no testamento, segundo a qual o Cometa pode sempre utilizar qualquer coisa dele sem ter de pagar direitos autorais. Mas como eles lá são muito sóbrios, raramente se valem desse direito. O jornalzinho estava no fim, mas alguns amigos, jornalistas e publicitários de Belo Horizonte, se juntaram e resolveram salvá-lo, editando-o gratuitamente, conseguindo alguns anúncios para garantir, pelo menos, a compra do papel. Eles me convidaram para colaborar gratuitamente e me deram um espaço para escrever com toda a liberdade. É claro que, aos 74 anos, já não sinto necessidade daquela ênfase juvenil. Digo mais com a razão.

ABI Online — O senhor também foi professor de Jornalismo?

Mario — Puro acaso. Nos anos 70, Moacy Cirne, Muniz Sodré e Antonio Sérgio Mendonça deram a partida ao Curso de Jornalismo da Universidade Federal Fluminense (UFF). A Nadiá, mulher do Antonio, o Samuel Katz e o Nelson Pereira dos Santos eram professores da faculdade de Comunicação. Havia lá uma cadeira de Desenho Jornalístico, que tem a ver com a história e uso dos tipos, a criação da página, a programação visual de um livro, uma revista, um jornal etc. Eles me chamaram para substituir um professor que morrera de repente. Ponderei que não tinha curso nenhum — apenas o primário. Apelaram lá para a brecha do “notório saber” e acabei contratado. Subia na barca com aqueles livros debaixo do braço, e na sala de aula tudo o que eu tinha era giz e um quadro-negro. Se houvesse algo que eu quisesse mostrar à turma, tinha de passar o volume de mão em mão. Disse ao Antonio Sérgio e ao Muniz que ficaria somente um ano. Quando fui legalizar minha situação, tive que ir ao Departamento de Ordem Política e Social.

ABI Online — Para ter o famigerado atestado ideológico...

Mario — Exato. O Dops se recusou a me dar o tal atestado. Eu tinha trabalhado no Ceará naquele jornal de oposição em que comecei a vida. E me demitiram da Petrobras sem dizer porquê. Resultado: trabalhei um ano inteiro na UFF e não recebi um centavo. Seis anos depois, já no processo da “abertura democrática”, conseguiram me pagar. Mas o dinheiro recebido só deu para convidar o Muniz e o Antonio Sérgio e pagar um almoço. A inflação tinha comido os meus salários.

ABI Online — Como nasceu “Milagre na Salina” e em que se baseia este seu primeiro livro?

Mario — Num dos momentos mais difíceis da vida de nossa família, lá em Nova Russas, fomos parar numa pequena rua de casas de taipa. A rua se chamava da Salina, porque, originariamente, aquelas casinhas tinham sido utilizadas por um rico comerciante como armazéns de sal grosso. O sal é um produto precioso no sertão. Como quase não há agricultura, a pequena pecuária é o mais comum. O fazendeiro mata o boi, e o preparo da carne-de-sol requer muito sal. A vaca também precisa de sal na sua alimentação, para melhorar a qualidade do leite. Enfim, o sal é importante, e aquela rua passou a ser conhecida como da Salina. Para todos nós era muito humilhante morar ali, até porque, antes do sal, algumas casinhas tinham sido habitadas por mulheres de “vida fácil”. Agora, a maioria dos habitantes era formada por carreteiros, homens fortes que carregavam os vagões dos trens de carga, principalmente com sacos de oiticica. Os americanos tinham perdido a China para os japoneses, o com ela o óleo de tungue, importante na produção de tintas. Mas logo descobriram que a oiticica, árvore do Nordeste brasileiro, produzia um óleo semelhante. Imediatamente criaram companhias para a exploração dos pequenos frutos da oiticica... Aquelas pessoas da Salina se tornaram importantes na minha vida. Mesmo quando saí de lá, eu me recordava de cada uma delas, de sua grandeza, da solidariedade, de como sabiam dividir o pouco que obtinham. O livro fala dessa gente.

ABI Online — Por que o senhor, que circula tão bem nos meios acadêmicos, nunca sonhou com uma cadeira na Academia Brasileira de Letras?

Mario — Várias vezes estive na ABL, até palestrei lá sobre “O conto em tempo de febre”, uma abordagem jornalística e sociológica do que aconteceu nos anos 70, quando milhares de jovens se transformaram em contistas da noite para o dia, porque necessitavam de um canal para se expressar. Acho que a Academia está em um bom momento, levou muita gente boa para lá nos últimos anos. Quanto a mim. Bem... não consigo me imaginar acadêmico. Pertenço a uma sociedade de cearenses no Rio, que, como outras do mesmo porte, embora seja bem informal, dá a si mesma o nome de “Academia”. Me convidaram muitas vezes para ser um deles. Como eu sempre escapava, puseram-se a dizer que eu esnobava o Ceará. Isso, sim, me incomodava. Assim, acabei por aceitar o convite. Mas, ao contrário de muitos amigos, não me sinto atraído pela vida realmente acadêmica.

Fonte:
Associação Brasileira de Imprensa. Entrevista realizada por Claudio Carneiro, em 12/01/2007. Disponível em http://www.abi.org.br/paginaindividual.asp?id=1814

Vilma Cunha Duarte (Album de Poesias Poetas del Mundo)



Mais versos...

Hoje’u amanheci poesia
Derramando em versos
Amor guardado no peito

Lágrimas salgam a rima
No rosto estrofe saudade
Poema que o vento levou

Ninar a noite...

Tomei a noite nos braços
Pra acarinhar sua insônia
Dos olhos abertos em lua
Faiscando tantas estrelas
Que ninguém sabe contar.

Por que noite não dorme?
Indagam meus devaneios
Acordados pela ansiedade
De adivinhar tais segredos
Que ela esconde da gente.

Noite conhece as histórias
Que dia nem ousa sonhar
Ah! Esses amores insones
E os desamores notívagos
Cochila.Hoje sou teu berço.

Nome de Flor

Se ... renascesse um dia
Com o ofício de ser flor
Ó, bom Deus, qual seria

A rosa rainha encarnada
Rubra paixão enfeitada
Em ramalhetes de amor?

Rosa, nunca eu voltaria
Tem espinhos e poderia
Ferir a beleza com a dor.

Violeta, tulipa agapanto
Consolo vigia no pranto
Cravo, lírio a margarida

Flores mil bem da vida
Têm nome e esplendor.
Se brotasse com alegria

No jardim desse mundo
Com nome Flor-Poesia
Aroma o amor profundo

Florava rimas e versos
Unia poemas dispersos
Para acalentar desamor.
------------------
Fonte:
Poetas del Mundo

Vilma Cunha Duarte



Escritora e Professora de Inglês. Nasceu em Araxá, Minas Gerais.

Fez Curso e Mestrado de Letras: Língua e Literaturas: Brasileira, Portuguesa e Inglesa.
Cursos de Inglês, no Instituto Cultural Brasil Estados Unidos: ICBEU. Instituto de Cultura Inglesa: CCAA; Seminários de Técnicas Modernas para o ensino da Língua Inglesa. Prática do Inglês em estágios no exterior.

Participou de encontros pedagógicos literários e culturais no Brasil e exterior.

Membro fundadora da Fundação Cultural Calmon Barreto de Araxá.

Pertence a Academias Araxaense de Letras,de Araxá, MG; Academia de Letras do Triângulo Mineiro, com sede em Uberaba, MG; Academia Municipalista de Letras de Belo Horizonte e Academia Pan-Americana de Letras e Artes, com sede no Rio de Janeiro.

Secretária da Academia Araxaense de Letras.

Presidente da SABIA. Sociedade dos Amigos da Biblioteca Municipal “Viriato Correia”, de Araxá.

Publicações
Crônicas Semanais no jornal “Correio de Araxá” desde 1984.
Crônicas Semanais no jornal: “O Planalto” desde Janeiro de 2004.

Livros
“Lágrimas de Telha”. 1986.
“Domingos, dias úteis e Santos 1990”.
“Prêmio de Viver, uma história de amor”. 2000.
Antologia Poética Prosa&Verso. Editora On-Line Book
“Pingos de Amor” On-line Book. 2003.
Antologia de Poesias, Contos e Crônicas. “Livre Pensador”. Editora Scortecci. 2004
Antologia. “Círculo de Poesia” Edición bilíngüe. Bianchi Editores. Montevideo -2004- Brasília
Antologia: 'Tertúlia na Primavera' Editora, Espaço do Autor. 2004
Editora On-Line Book: bailando Versos. 2005.

Fonte:
Poetas del Mundo

Andréa Motta (Poetas do Paraná)



Sublimação

Sem medos
abraça-me a alma arrepiada
solta os meus cabelos e toca-me
intensamente
intimamente

Deixa esta onda de calor percorrer-te a pele
não permitas que este momento de sublimação
se perca no tempo

Olha-me a alma por dentro das minhas entranhas
enxerga o invisível dos meus olhos
sente o meu corpo e ouve esta música

Deixa-te desvendar a cada toque sentido
desagua no meu prazer
Faze-me acreditar que o céu me sorri

Deita-te em chamas entre as minhas mãos
deixa-me explodir num orgasmo sagrado
de onde brotem lágrimas de felicidade
-----

[in]quietude

Na linha do destino
sorrisos e pranto
escuridão e luz.

A noite calada registra
as marcas inexoráveis do tempo.
No rastro da estrela-guia : a Paz.
===

Toccata

Não importa o decibel do riso,
Se o guizo do silêncio
No olhar do artista
Reinventa a luz

Pouco importa que o corpo,
Dos toques não traga as marcas
Ou que desperte o desejo
Agreste de amanhecer

Feito implosão de lábios
Pernas e braços.
Importa, que o tempo,
seduzido pelos poetas,

estanca, do amor
os desencontros
P'ra não ficar saudade
Ou romance pela metade.

Importa sim a ousadia
De enfrentar as tempestades
E a abundância de violinos
Enfeitiçando as asas dos colibris.
---------
Fonte:
Poetas del Mundo

Delasnieve Daspet (Tênue Linha)


A areia do tempo começa a cair.
A incerteza reclamando a vida,
A certeza clamando a morte!

Tênue linha separa
O novo e o velho.
A infância. A vida. O medo.
Existirá mesmo o adeus ao velho?
A felicidade no novo?

Lá no horizonte a linha divisória
Está incendiando.
Fogo!
Luz incandescente na noite escura.
Noite sem lua!

Mas é bonita a escuridão
Do ano que chega
Eis que tudo ainda pode ser!

Já o velho - ainda envolto em paetês,
Brilhando nas agrúrias
Segue seu lento caminhar
Rumo à poeira!
Sonhos. Vidas. Amores.
Todos em declínio
No seu rastro de cometa!

Mais um natal.
Festa da cristandade?!
Porque então tanta fome, frio
Injustiças já fazem o novo tão velho,
Os gemidos tão iguais?!

Tenho o espirito da lua.
Nasço e morro todos os dias.
Vivo o ano, vivo a vida,
Só - como todos os seres humanos,
Flutuando tristemente no ar!

Pólen sem abelha!
Flor sem perfume.
Um ano que passa,
Outro que chega,
Tudo - sempre - tão igual!
(17-10-2001 - Campo Grande MS.)
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Fonte:
A Autora.
Delasnieve Miranda Daspet de Souza
Embaixadora Universal da Paz - Genebra - Suiça - Cercle Universel des Ambassadeurs de la Paix – Embaixadora para o Brasil de Poetas del Mundo