segunda-feira, 24 de maio de 2010

Jorge Saraiva Anastácio (1934)


Nascido em Rio Pomba, Minas Gerais, em 27 de maio de 1934.

Professor Universitário da UFJF, aposentado, Advogado militante em comarcas mineiras.

Contista, cronista, historiador, articulista e poeta.

Membro de entidades lítero-culturais, dentre as quais o Instituto Histórico Geográfico de Juiz de Fora/MG; Associação dos Escritores do Amazonas (ASSEAM); Ordem Brasileira dos Poetas e Poetisas Sonetistas (OBRAPS- Camaçari/Bahia); International “Writers and Artists Association”, de Bluffton/USA; “Membro Emérito” da Academia de Ciências e Letras de Conselheiro Lafaiete/MG; Academia de Letras da Manchester Mineira; Academia de Poetas e Prosadores de Minas Gerais e Academia Brasileira de Estudos e Pesquisas Literárias, de Brasília/DF.

Participa de várias antologias nacionais e estrangeiras. É Verbete no Directory Of International Writers and Artists,” de Bluffton/USA (1999) e do Dicionário Bibliográfico de Escritores Brasileiros Contemporâneos, Adrião Neto (1998).

É possuidor de diversas medalhas de ouro, prata e bronze; destaque especial; certificados e de outros títulos honoríficos, conferidos por entidades literárias, por trabalhos literários em prova e verso.

Fonte:
Colaboração do Autor.

A. A. de Assis (A Língua da Gente) Parte 8


7. Somos todos poliglotas

Como refletimos anteriormente, falamos latim (argentífero, sericígeno); falamos também grego (idiossincrasia, prosopopeia); mas não somente grego e latim. Quem fala português fala ao mesmo tempo numerosas outras línguas. Vamos conferir.

Sabemos que o latim trazido pelos romanos para a península Ibérica (Espanha e Portugal) misturou-se ali com outras línguas, de outros povos. Dessa forma o vocabulário foi crescendo, e até hoje repetimos palavras que os nossos ancestrais aprenderam com os iberos (arroio, baía, barro, cama, sapo); com os celtas (cabana, caminho, cerveja, lança, légua); com os fenícios (barca, malha, mapa, mata, saco); com os germânicos (burgo, estribo, feudo, roupa, sabão). Dos árabes herdamos quase mil palavras (açúcar, aldeia, alface, álgebra, almofada, arroz, azeite, café, ciranda, enxaqueca, fulano, girafa, harém, jarra, marfim, oxalá, rima, sultão, xerife, zênite...).

De várias outras línguas tomamos por empréstimo (e não devolvemos) um punhado de palavras, das quais daremos a seguir pequena amostra. Do espanhol: apetrecho, baunilha, pandeiro, pimpolho, realejo; do francês: aprendiz, bilhete, etiqueta, paisagem, restaurante; do inglês: bife, cheque, esporte, túnel, uísque; do italiano: aquarela, camarim, confete, piano, talharim; do alemão: cãimbra, esgrima, folclore, harpa, valsa; do russo: czar, escorbuto, estepe, rublo, vodca; do persa: azul, bazar, jasmim, quiosque, turbante; do turco: caviar, iogurte, odalisca, paxá, sandália; do japonês: biombo, haicai, iquebana, quimono, saquê.

No Brasil, a língua portuguesa enriqueceu-se mais ainda, ao incorporar a preciosa contribuição indígena e africana. Com os africanos aprendemos palavras fortemente expressivas, tais como acarajé, agogô, angu, banguê, banguela, baobá, batuque, berimbau, caçula, cafundó, cafuné, caruru, caxambu, caxinguelê, dendê, fubá, jiló, marimbondo, maxixe, molambo, moleque, moringa, quilombo, quitute, tutu, vatapá. Os índios, por sua vez, nos deram de presente palavras que parecem música: araçá, caju, canoa, capim, carijó, cipó, cucuia, curió, embira, garapa, gaturamo, goiaba, guaraná, ingá, ipê, jabuticaba, jirau, jenipapo, jerimum, juriti, jururu, macaxera, mingau, mirim, mocotó, peroba, piaba, pipoca, piracema, pirão, pitanga, sabiá, saci, xará...

Mas o vocabulário não cessa nunca de crescer. A todo instante aparece alguma coisa nova, e tudo o que surge no mundo precisa ganhar um nome.

Fonte:
A. A. de Assis. A Língua da Gente. Maringá: Edição do Autor, 2010

III Feira Catarinense do Livro


A noite de segunda-feira (24) será de homenagens no espaço cultural da Feira Catarinense do Livro. Está agendada para as 18h30, solenidade de entrega do Prêmio Amigo do Livro, uma iniciativa da Câmara Catarinense do Livro criada para evidenciar o trabalho de pessoas e entidades voltado para a difusão da literatura catarinense e acesso à leitura. “A homenagem destaca o apoio que a CCL vem recebendo destes parceiros para a propagação da cultura literária catarinense. São apostadores, propagadores e comunicadores em prol da leitura”, afirma o presidente da CCL, Salézio Costa,

Os homenageados da noite são:
o desembargador e presidente do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, José Trindade dos Santos (Patrono),
escritor e desembargador Lédio Rosa de Andrade (Medalha do Mérito Escritor “Cruz e Sousa”,
advogado e presidente da CAASC Diogo Nicolau Pitsica (Medalha do Mérito Editor “Odilon Lunardelli),
livreiro da Casa do Saber Círio Vandresen (Medalha do Mérito Livreiro “Dikson Colombo”),
a UFSC será a Universidade Homenageada,
o jornalista Mario Motta recebe o prêmio Amigo do Livro e
o Governo do Estado de Santa Catarina destaque como Grande Incentivador da Literatura e Cultura Catarinense.

A III Feira Catarinense do Livro vai até o dia 2 de junho, no Largo da Alfândega em Florianópolis. Horário de funcionamento de segunda a sábado, das 9h às 20h. Aos domingos, das 13h às 20h. A entrada é franca.

Visitação – Os primeiros dias da feira surpreenderam a equipe de organização. Estima-se que passaram pelo Largo da Alfândega mais de 10 mil pessoas. A procura por livros infantis é grande, e nos estandes as opções são variadas para a criançada. Os preços também ajudam, por lá podem ser encontrados livros a partir de três reais. Os best sellers, muitos com descontos especiais, atraem os leitores que não dispensam boa literatura. O estande do Escritores da Ilha é o mais movimentado, e a agenda de sessão de autógrafos é intensa. As vendas de publicações catarinenses são animadoras, e até o final da feira, a expectativa é das melhores. Acompanhe a programação cultural no site www.cclivro.org.br

Dia 24/05 – segunda-feira

13 horas - Milka Plaza – contação de histórias
Sônia Ripoll – lançamenrto
Diálogo teatral com o convidado Lino

17 horas - Rudny Otto – lançamento
João Sergio Sell – lançamento

18h30 - Cerimonial de Homenagens

Dia 25/05 – terça-feira

10 horas - Inês Carmelita –sessão de autógrafos
contação de histórias infantil

14 horas - Inês Carmelita – sessão de autógrafos
contação de histórias infantil
Maria do Carmo Tridapalli – lançamento

15 horas - Recital pessoal da ALIFLOR – Associação Literária de Florianópolis

18 horas - Julião Goulart recital com declamação e canto, acompanhado de sax e
violão

Leno Saraiva Caldas – lançamento

Dia 26/05 – quarta-feira

12 horas - Odete Gonçalves – sessão de autógrafos

14 horas - Miriam Ramoniga – sessão de autógrafos
contação de histórias

15 horas - Danilo Aurich - lançamento

18 horas - Julião Goulart – recital com declamação acompanhado de sax e violão

Dia 27/05 – quinta-feira

10 horas - Dr. Lédio Costa de Andrade – sessão de autógrafos

14 horas - Vera Sônia Migliorini - lançamento

17 horas - Ubaldo César Balthazar – sessão de autógrafos

Dia 28/05 – sexta-feira

16 horas - Dulce Magalhães e Iradj Roberto e Eghrari – sessão de autógrafos

17 horas - Recital dos Associados Cronistas, Poetas e Contistas Catarinense - ACPCC

18 horas - Apresentação de músicas e poemas pelos alunos da Escola Fun Way
Zeni de Oliveira

Dia 29/05 – sábado

14 horas - Renata Kummer – lançamento

15 horas - Luiz Carlos Amorim – lançamento

16 horas - Milka Plaza e Cia. de Teatro Letras no Jardim
contação de histórias e dança

Fonte:
Delasnieve Daspet

Ialmar Pio Schneider (Soneto ao Dia do Datilógrafo – 24.05)


Quando saí de casa pra estudar
O curso ginasial que não havia,
Naqueles velhos tempos, no lugar
Em que nasci... Ó quanta nostalgia !

Levava tanto afã de triunfar
E com pouco dinheiro viveria...
Mas já portava, então, a me orgulhar,
Meu Diploma de Datilografia.

Hoje leio, saudoso, no jornal,
Pra minha vida muito especial,
Dia do Datilógrafo... Temática

Recordação ainda – que momento! –
A relembrar com tanto sentimento, –
A freirinha ensinando a bater máquina !

Tristeza, Porto Alegre, RS, 24.05.2010

Fontes:
Colaboração da autora.

domingo, 23 de maio de 2010

José Feldman (A Locomotiva da Vida)


A locomotiva corre
Corre que corre
Corre que corre.

Corre levando a gente
Corre trazendo a gente
E a gente corre e corre
Neste leva-e-traz.

A locomotiva corre e apita
Corre e apita
Corre e apita.

Apita o início do jogo,
Apita a voz de comando
Apita a batalha da vida
Apita a vida passando.

A locomotiva corre e pára
Corre e pára
Corre e pára.

Pára na estação
Pára na carga e descarga
De meus momentos de indecisão.

Vai que vai
Vou que vou
Fico que fico.

E a locomotiva apita
E ela corre que corre
E lá vai ela
E lá vou eu!

Corre que corre,
Corre que corre,
Corre que corre…

Fonte:
Imagem = http://web.ist.utl.pt/

A. A. de Assis (A Língua da Gente) Parte 7

6. Nossos dois latins

Como foi dito, falamos ainda latim; modificado a ponto de mudar de nome (passou a chamar-se português), mas sempre latim. E não apenas um, senão dois latins: o vulgar e o erudito (ou clássico). O vulgar veio com os romanos, quando invadiram a península Ibérica (Espanha e Portugal); o erudito “ressuscitou” durante a Renascença (séculos 15 e 16), quando as pessoas cultas voltaram a ler os clássicos da Antiguidade greco-romana: Aristóteles, Platão, Cícero, Virgílio... O vulgar chegou até nós pela boca do povo; o erudito pela escola e pelos livros.

No século 16, em Portugal, a boca do povo já havia “mastigado” o latim, simplificando-o e o ajustando ao sotaque local. Mas os eruditos da época, entre os quais o máximo poeta Luís de Camões, animados pela moda renascentista, decidiram ir de novo à fonte e de lá trouxeram, renascido, e em sua mais esmerada forma, o vocabulário clássico. Assim, cadeira voltou a ser cátedra, inteiro voltou a ser íntegro, mancha voltou a ser mácula, e por aí afora.

O povo fala mais do que escreve; o erudito escreve mais do que fala, ou tanto quanto. Na fala a língua se modifica muito mais rapidamente do que na escrita. Ou talvez até mais sabiamente, porque se guia pelas preferências do aparelho fonador (mestre em “lei do menor esforço”). Por exemplo: o erudito se delicia com as proparoxítonas – diz álacre; o povo acha mais fácil e mais bonito dizer alegre. Como supunha Gilberto Amado: se tivesse permanecido por mais tempo na boca do povo (sem a interferência dos clássicos), a língua portuguesa teria ficado inteiramente livre das proparoxítonas, tal como aconteceu com o francês. Abóbora seria abobra, chácara seria chacra, córrego seria corgo...

Por obra e arte desses dois canais de entrada do latim em nossa vida, acabamos formando uma língua ao mesmo tempo nobre e plebeia. Por via plebeia, escutamos; por via nobre, auscultamos. O povo diz chama; o erudito diz flama. Um diz cheio, outro diz pleno; um diz redondo, outro rotundo; um diz livrar, outro liberar...

Curioso também é observar que os substantivos (porque usados com maior frequência) mudaram mais que os adjetivos: do latim ecclesia temos em português o substantivo igreja, mas o adjetivo é eclesial; o substantivo é bispo, mas o adjetivo é episcopal (de episcopus). Do mesmo modo: cabelo e capilar (capillus); chumbo e plúmbeo (plumbum); chuva e pluvial (pluvia); dedo e digital (digitus); eixo e axial (axis); grau e gradual (gradus); ilha e insular (insula); mão e manual (manus); olho e ocular (oculus); orelha e auricular (auricula); pai e paterno (pater); perigo e periculoso (periculum); raiz e radical (radix); umbigo e umbilical (umbilicus)...

Fonte:
A. A. de Assis. A Língua da Gente. Maringá: Edição do Autor, 2010

Lançamento do Livro Personalicaturas 3

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Rede Grumin de Mulheres Indigenas apresenta Construindo Novos Horizontes

IV Festival Palabra en El Mundo no Recide/PE



Ação Poética Mundial – 20 a 25/maio/2010

Recife: 25/maio 17h às 21h CFCH/CAC – UFPE

Recitais de Poesia Leituras Artes Visuais Fotografia

Sussurros Poéticos Megaphone Twitter Sorteios

Programação

17h: Abertura da Exposição: Artistas da UFPE:
Lúcio Mustafá, Ricardo C. Melo, Mardilene Ferreira, Ilson
Intervenções Espontâneas Fotografia: Ercília Marques

17h25min: Megaphone da Poesia

17h30min: Sussuros Poéticos

17h35: Abertura Recital Poético-Musical
S. R. Tuppan Ícaro de Holanda Vertin
Lara Pedro Ernesto Convidados Comentários

Microfone Aberto Twitter o evento todo Https://twitter.com/PnM_Rec https://twitter.com/tuppan

Sorteio de Livros e Brindes Ciranda
Realização: Revista POÉTICA XXI

Apoio: Instituto Maximiano Campos – IMC
Centro de Filosofia e Ciências Humanas da UFPE

Coordenação no Recife: S. R. Tuppan
srtuppan@yahoo.com.br
Sílvio Romero Costa Lima - srtuppan@yahoo.com.br
__._,_.___
Fonte:
Colaboração de Delasnieve Daspet

Alexander Martins Vianna (Novo Moderno Prometeu: O Espelho de Victor Frankenstein )



O amanhã jamais igualará o ontem;
Nada, exceto o mutável, pode perdurar!”
(Mary Shelley, 1818)

Em 1818, Mary Shelley (1797-1851) publicou um conto fantástico em que um cientista, Victor Frankenstein, é tomado pela ânsia de alcançar a glória através da ciência. Em sua busca científica, desenvolve interesse pela física, pela química e, combinando ambas as formações, procura descobrir a origem do princípio vital latente em todas as coisas vivas. Descobrir, nesse sentido, significava poder dominar tal princípio e dar-lhe uma finalidade. Para ele, tal finalidade era “banir a doença do coração humano, tornando o homem invulnerável a todas as mortes, salvo a provocada pela violência…”; assim, ele “seria o criador de uma nova espécie, seres felizes, puros…” que lhe deveriam a própria existência (SHELLEY, 2001: 41-56). Deste modo, nasceu a tragédia neoprometéica de Victor Frankenstein. Como consideramos que a obra se desenvolve num plano de tragédia, poderemos identificar alguns pontos de “desmedidas” ou “desequilíbrios” que, com as próprias mortes física e social de Frankenstein, adquirem um sentido moral de reequilíbrio.

Laicizando o tema da (re)criação do (super)homem, Mary Shelley cria um plano dramático de condenação para Frankenstein por pretender romper a barreira entre a vida e a morte. A visão da natureza como exemplo perfeito de força vital pressupõe a existência do ciclo entre a vida e a morte, pois a vida brota da decomposição da matéria morta em uma projeção perpétua para o futuro. Nesse sentido, tal espiral não pode ser rompida e, caso ocorra, estaríamos diante de um novo paradigma, algo estranho a tudo existente em matéria de saber, normas, valores e convenções. Tal é a condição existencial de um monstro. O monstro, ou pária social, é o sinal de que algo dentro de uma sociedade vai mal. No entanto, longe de contemplarem a si mesmas na imagem do monstro, as sociedades tendem geralmente a criar fronteiras (reais/simbólicas) para projetar no alienígena social os seus males.

No entanto, Mary Shelley não concederá tal mecanismo de escape a Frankenstein: afinal, a sua “escultura viva” não seria uma abstração distante perdida numa estatística, mas um ser individual especial (Übermensch) que, desenvolvendo razão e sensibilidade, era capaz de se fazer presente à mente de seu criador como indivíduo e, portanto, tornou-se impossível para Victor alienar-se dos efeitos imprevistos de sua obra – desconforto do qual é poupada a maioria dos cientistas (do passado e do presente), sob o manto protetor da “neutralidade científica”, especialização e finalidades nobres. Assim, depois de ter aprendido a sua amarga lição, podemos ouvir a seguinte advertência de Frankenstein a Walton:

“(…)Aprenda, se não pelos meus preceitos, pelo menos por meu exemplo, o perigo que representa a assimilação indiscriminada da ciência, e quanto é mais feliz o homem para quem o mundo não vai além do ambiente cotidiano, do que aquele que aspira tornar-se maior do que sua natureza lhe permite.(…) Eu seria o primeiro a romper os laços entre a vida e a morte, fazendo jorrar uma nova luz nas trevas do mundo…”(Idem, p.56) [Grifo meu]

Para enfrentar problemas relacionados à fome, doenças infecto-contagiosas, à pauperização do espaço urbano e à formação de um número crescente de pessoas inclassificáveis (nesse sentido, “massa”), as elites governantes européias do século XIX criaram as suas próprias versões prometéicas de reforma e aperfeiçoamento dos espaços rurais e urbanos. Nessa trajetória, o novidade do século XIX foi firmar cada vez mais o discurso médico-científico como voz de autoridade na forma de se conceber “remédios” e “profilaxias” para a questão social. Assim, a questão social – muitas vezes tratada como uma “questão sanitária” – recebeu um tratamento elitista insensível a um justo equilíbrio entre meios e fins. Ora, pretender criar uma nova espécie de homem – nascida de um plano cientificamente traçado por um especialista – que fosse resistente à morte por doenças e privações materiais poderia até romper a barreira entre a vida e a morte, como pretendera Frankenstein, mas manteria sem abalos as fronteiras sociais. Entretanto, tal como as massas pauperizadas da modernidade, o monstro tem consciência, sensibilidade e migra para o “mal e a vingança” quando é privado de afeto por ter uma aparência pouco atrativa.

Portanto, a tragédia de Frankenstein contada por Mary Shelley não deixa de manifestar certos incômodos com a forma que as elites governantes tratavam a questão social na época. A arrogância social, a afetação nas afeições e a falta de solidariedade constróem seus próprios monstros sociais, que são jogados “para o nada social” ou “para o mal”. Nesse sentido, não é uma condenação moralista religiosa contra o saber médico-científico que Mary Shelley nos apresenta, mas uma provocação romântico-humanista que pretende lembrar que o homem, em sua ânsia de tentar aperfeiçoar a si mesmo e a seu mundo, não pode perder a sensibilidade, o que significa equilibrar de modo inclusivo as relações entre meios e fins. Tal é a lição que Frankenstein quer deixar para Walton em seus último momentos:

“(…) Num acesso de desmedido entusiasmo, criei uma criatura racional e cabia-me, dentro do limite dos meus poderes, assegurar-lhe a felicidade e o bem-estar.(…) Recusei-me a criar[-lhe] uma companheira(…). Ele demonstrou perversidade e egoísmo sem par. Destruiu meus amigos. Devotou-se ao extermínio de seres que possuíam sensibilidade, felicidade e saber. E não sei até onde a sua sanha vingativa poderá levá-lo. Por isso, devia morrer. Cabia a mim a tarefa de pôr-lhe fim à existência, mas fracassei(…). Perturba-me…o fato de que a sobrevivência do monstro signifique a continuidade do mal.(…)Adeus, Walton! Busque a felicidade num viver tranqüilo e evite ser dominado pela ambição, mesmo que seja essa – aparentemente construtiva – de distinguir-se no campo da ciência e dos descobrimentos. Mas por que falo isso? Na verdade, se eu me arruinei nessas esperanças, pode ser que outro seja bem sucedido(…)”(Idem, p.202) [Grifo meu]

Assim, as últimas palavras de Frankenstein que concluem seu ciclo trágico estão longe de anularem as esperanças de descobertas no campo da ciência, mas servem para corrigir em Walton (que está na mesma posição do leitor) um tipo de ânsia de saber que – por desequilibrar a relação entre meios e fins – perde a sensibilidade em relação à beleza da vida, em qualquer de suas expressões. No começo da tragédia, em uma carta à sua irmã, Walton conta as dificuldades de sua viagem científica no Ártico e refere-se à perda de um marinheiro nos seguintes termos:

“(…)A vida ou a morte de um homem seriam um preço ínfimo a pagar pelo conhecimento que eu buscava e pela vitória sobre as forças da natureza hostis à espécie humana que esse conhecimento legaria à posteridade(…).(Idem, p.32)

Para criar um contraponto sentimental a isso, Mary Shelley expõe logo em seguida a interlocução de Frankenstein com Walton e, assim, coloca o leitor num plano de suspense e segurança em relação àquilo que deve ser entendido como a “moral da história”:

“(…) Somos criaturas brutas, apenas semi-acabadas quando nos falta alguém mais sábio, melhor do que nós mesmos, para ajudar-nos no aperfeiçoamento da própria natureza – débil e falha.(…)Você tem esperança, o mundo à sua frente, e não tem motivo para desespero. Quanto a mim, perdi tudo, e não tenho como recomeçar a vida(…). Não creio que o simples relato de meus infortúnios lhe possa ser de alguma utilidade, mas quando reflito que está seguindo o mesmo rumo, expondo-se aos mesmos perigos que me tornaram o que sou, imagino que possa tirar algum proveito moral da minha história; e isso poderá constituir uma ajuda para orientá-lo em caso de êxito, ou para consolá-lo se fracassar. Prepare-se para ouvir o relato de acontecimentos que normalmente poderiam ser considerados fantásticos. Se estivéssemos em outro ambiente, como o que em outras épocas cercava o nosso dia-a-dia, eu temeria a sua descrença. Porém, muitas coisas parecem possíveis nestas regiões misteriosas; coisas que poderiam provocar o riso daqueles poucos afeitos às forças mutáveis e inelutáveis da natureza. Por outro lado, minha história guarda, em sua própria essência, provas insofismáveis da sua verdade(…).”(Idem, pp.32-34) [Grifo meu]

No primeiro terço do século XIX, a sensibilidade romântica não tolera um mundo que se torna monocromático e afetado por regras que impedem o livre desenvolvimento do conhecimento e da sensibilidade. Nesse sentido, ela se inscreve em larga medida na superação do ideal clássico como paradigma, buscando mais diversidade de cores e objetos, pois possibilitam ao homem aprender novas coisas e aperfeiçoar as antigas. Os escritos orientalistas deram aos românticos um repertório de imagens-conceito para onde projetar seus sonhos de reforma da civilização européia. No desenvolvimento da história de Mary Shelley, Clerval aparece como aquele que ajuda seu combalido amigo Frankenstein a recuperar o seu “verdadeiro eu”, perdido depois de uma longa e voluntária privação de luz, cores e sensibilidade em meio às trevas de dois anos de seu projeto prometéico:

“…Clerval jamais partilhara de meu gosto pela ciência natural. Suas inclinações, dirigidas para a literatura, divergiam totalmente das minhas. Ele viera para a universidade com a finalidade de aprofundar-se em línguas orientais…Voltando os olhos para o Oriente, buscava descortinar os horizontes propícios a uma carreira brilhante. Atraíam-no os idiomas persa, árabe e sânscrito, e eu resolvi acompanhá-lo nesses estudos com a esperança de dissipar minhas íntimas preocupações(…), de modo que o roteiro dos orientalistas me pareceu um agradável convite, e eu fiquei contente em tornar-me discípulo do meu amigo. Não tencionava, como ele, adquirir conhecimento crítico dos seus escritos, nem usufruir qualquer proveio prático. Procurava apenas distração, sem pretender ir além de compreender-lhes o significado. Meu esforço de aprendizagem foi compensado, pois descobri nos orientais um toque ameno de melancolia, uma poesia de aceitação tão singela quanto profunda, como também um grau de sabedoria e uma exaltação de alegria que jamais experimentei no convívio com autores ocidentais. Através de suas páginas, a vida parece um jardim florido dourado de sol. Que diferença da poesia épica e heróica de Grécia e Roma!” (Idem, pp.69-70). “(…)Em Clerval eu via refletido o meu antigo eu. Ele era um eterno curioso e ansiava por adquirir experiência e aumentar seus conhecimentos. A diferença de costumes que observava era para ele uma fonte inesgotável de instrução e diletantismo(…).Aspirava visitar a Índia, na crença de que, apoiado nos conhecimentos das várias línguas daquele país…e nos conceitos que formara sobre sua formação histórica, poderia colher observações aplicáveis ao desenvolvimento da sociedade européia(…)”(Idem, pp.151-152) [Grifo meu]

Clerval surge, então, como uma recuperação de luz, um novo experimentar da diversidade sensível de outrora. No entanto, em vez do marmóreo referencial clássico, Frankenstein teve nele a oportunidade singular de experimentar o brilho das luzes e sensibilidades orientais. A existência de Clerval – que associa as luzes do conhecimento e o diálogo sensível com a diversidade das coisas do mundo – surge na história como um axioma oposto ao paradoxo prometéico-existencial de Frankenstein. Este desequilibrou a relação entre meios e fins em sua ânsia egoísta de glória científica e superação de séculos de trevas. Como seu projeto foi executado às custas da privação de sol, paisagem natural e afetos familiares, Frankenstein desequilibrou psicologicamente a si mesmo e, por extensão, a sua obra. Assim, quanto mais anti-romanticamente tentava superar as trevas, mas caía nelas. Por isso mesmo, o paradoxo prometéico de Frankenstein é rico de implicações para a análise da sensibilidade romântica em matéria de conhecimento: ele tinha em mente uma escultura viva, uma criatura superior ao seu criador em beleza, sensibilidade, inteligência, força e resistência; mas como tal criação poderia ser a imagem da beleza se seu criador, para torná-la possível, privou-se de vida e afeição, acercando-se somente da morte? A afeição e a sensibilidade são apresentado por Mary Shelley como medidores para definir quando a busca do saber adquire feições monstruosas. Lição cara para a posteridade…
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Alexander Martins Vianna é Doutor em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil(2008); Professor Adjunto da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.

Fonte:
Colaboração de Antonio Ozaí da Silva: Revista Espaço Acadêmico., nº 26, julho de 2003, disponível em http://www.espacoacademico.com.br/026/26cvianna.htm

Aparecido Raimundo de Souza (A Misteriosa Elba)


Sentados na enorme sala pai e filha conversam sobre os acontecimentos mais recentes. Na frente deles uma televisão em volume baixo exibe um capítulo de novela.

- Quer dizer então, minha filha que definitivamente você largou seu marido?

- Sim, papai.

- E por quê?

- Fiquei sabendo que ele tem outra mulher...

- Cafajeste. Bem, não foi por falta de aviso. Você brigava comigo, me achava um chato quando eu tocava no assunto.

- Pois é, papai. O senhor tentou me abrir os olhos. Eu não quis escutar. Estava cega. Sinto ter lhe causado essa tristeza e, agora, mais este aborrecimento de voltar para sua casa quase que às pressas.

- Não é aborrecimento nenhum. Você é e sempre será bem vinda a qualquer tempo. Claro que estou me sentindo triste por você e até por ele – eu tinha o Sancler como a um filho. Só queria que ele lhe fizesse feliz. Mas, enfim, a felicidade nunca e completa. Como descobriu?

- Comecei a receber bilhetinhos anônimos. Depois telefonemas.

- E o que diziam esses bilhetes?

- Pouca coisa, tipo “se cuida, sua burra, seu marido tem outra, está te traindo”. Os telefonemas repetiam praticamente as mesmas palavras sem muitas variações.

- Ao menos descobriu quem é a despudorada?

- Sim, papai. Descobri.

- Gente conhecida da nossa família?

- Uma perua chamada Elba.

- Elba? Que loucura. Quase sua xará. Só faltou o a antes do l. Mais nova que você, mais velha?

- Mais nova. Um dos bilhetes fazia menção a 1992.

- Além de tudo o garotão aprecia mulheres mais novas? Interessante! Se essa Elba é de 1992 só tem 18 anos.

- Pai, eu tenho 35. O senhor insinua que sou velha ou que nesta idade já estaria ultrapassada para o Sancler?

- Claro que não, filha. De onde você tirou essa idéia?

- O senhor falou nesses 18 anos com tanto ênfase!

- Nada a ver, minha linda. Você, com 35, põem qualquer sirigaita de 18 no bolso. Me esclareça um ponto obscuro: onde o Sancler arranjou esse estrupício?

- Num weekend que fez ao Rio de Janeiro há questão de quatro meses.

- E onde ele enfiou essa moça desde então?

- O senhor não vai acreditar pai. Ele montou uma quitinete para ela.

- Quitinete?

- É.

- Aonde, filha?

- Na garagem da nossa antiga residência.

- Que filho da mãe! Você, por acaso, se deu ao trabalho de ir até lá para conferir?

- O senhor me conhece e sabe que tenho pavio curto. Se pintasse no pedaço, acabaria agredindo a infeliz dando na cara dela para extravasar minha ira. Para não armar barraco e perder a razão, preferi ficar na minha. Saí de casa e aqui estou. Já chega a avalanche de piadinhas que venho ouvindo das amigas.

- Piadinhas?

- Ora, pai, o senhor sabe como as pessoas gostam de rir da desgraça alheia. Minhas amigas tiram sarro dizendo que a tal da Elba veste prada.

- A Elba é prata? Quero dizer ela gosta de prata?

- Prada, pai. É alusão a um filme que estreou recentemente nos cinemas: O diabo veste Prada. Minhas colegas gozam de mim afirmando que Sancler me trocou pela Elba porque ela tem designer elegante além de um espaçoso porta malas...

- Porta malas?

- Bumbum, pai. Ela é rabuda, entende? Tem os quadris avantajados. Além de possuir... Além de possuir portas de entrada.

-Portas de entrada? Suas amigas falam de uma mulher ou de um carro?

- Claro que de uma mulher, pai. Preciso especificar quais são essas entradas? O senhor quando era moço e conheceu a mamãe não achou as portas?

Gargalhadas estridentes de ambos os lados.

- Ah, entendi. A ficha caiu. Por falar em sua mãe, que Deus a tenha, ela era o máximo da categoria: para minha época, em comparações aos dias de hoje, uma mulher um ponto cinco.

- Então, pai. A vagabunda segundo os bilhetes e a voz misteriosa dos telefonemas deixou bem evidente que essa Elba também é do tipo um ponto cinco como o senhor acabou de descrever. Um pedaço de mau caminho. Tem injeção eletrônica e atinge os oitenta em questão de segundos. É só acelerar.

O pai de Alba volta a cair numa estrondosa risada.

- Ainda bem que você não ficou pra baixo e faz piada da situação.

- Tenho outra saída? Acaso o senhor queria me ver em estado de depressão?

- Jamais. Espera um pouco, filha. Estou pensando aqui com meus botões: esses telefonemas não seriam do pessoal que alugou a casa quando vocês mudaram para o apartamento novo?

- Pensei nessa possibilidade e de pronto descartei a idéia. Quem mora em nossa (digo minha) casa hoje é um casal de velhinhos. Nenhum dos dois se prestaria a esse tipo de papel.

- Um filho, uma filha?

- Eles são sozinhos, pai.

- A voz da pessoa que liga. Como é?

- De gente nova.

- Fale da caligrafia dos bilhetes.

- Parece de homem...

- Algum vizinho?

- Talvez!

- Quer saber? Vou até lá conferir de perto e pôr essa pendenga em pratos limpos.

- Deixa baixo pai. Já sai do apartamento, passei a mão em tudo o que era meu. Na segunda procuro um advogado e fim de papo.

- Meu pai do céu, que situação. O que o Sancler diz de tudo isso? Ao menos falou com ele?

- Sim, pai. Tivemos uma conversa longa e franca. Ele nega, de pés juntos que não existe outra. Chora como uma criança e diz que me adora que sou a mulher da vida dele, e bla, bla, bla... O papo furado de sempre. No fundo é um pilantra, um safado. Eu que o amava tanto... Estou me sentindo um lixo. O maldito me trocou por uma qualquer. Só pelo fato de ser mais nova, mais bonita, mais elegante. Onde foi que errei, papai?

- Calma filha. Vamos descobrir a verdade. Amanha irei ver essa fulaninha com meus próprios olhos ou não me chamo Juarez da Costa Fiat.

- Melhor não, pai. Melhor não!...

***

Dia seguinte seu Juarez da Costa Fiat madrugou. Saiu antes das quatro da matina. Botou na cabeça que encostaria o genro na parede e não regressaria sem uma conversa de homem pra homem com o sujeito. Pegou o ex de sua filha saindo exatamente da garagem.

- Bom dia, Sancler. Precisamos conversar.

O rapaz levou um baita susto ao ver o sogro àquela hora da manhã, em pé, diante da porta da garagem.

- Seu Juarez, a que devo a honra de sua visita?

- Serei curto e grosso. Quero que me apresente a sua amante que mora ai dentro.

- Amante? Que amante?

- A Elba.

- Não é nenhuma amante, seu Juarez. Acredite em mim...

- Então abra a garagem. Quero entrar. Se estiver dizendo a verdade, lhe dou a palavra: minha filha estará de braços abertos a sua espera.

Quando seu Juarez meteu os pés dentro da garagem e gritou para que Sancler acendesse as luzes, o que o velho pai de Alba viu lá dentro, não passava de um automóvel Elba CS Fiat weekend 1.5, ano 1992, de cor prata, quatro portas, injeção eletrônica em perfeito estado de conservação.
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Observação: Este texto foi escrito pelo autor de forma humoristica devido ao fato de minha esposa se chamar Alba e eu possuir um carro Elba. (José Feldman)
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Fonte:
Colaboração do Autor.

sábado, 22 de maio de 2010

Pedro Dubois (Poesias no Papel)


DATAS

Não é o dia aprazado
o atraso me faz
fragilizado
ao encontro:

altero o calendário
ao necessário

nos dias seguintes
retorno ao anterior
acaso: incompleto
o ciclo se debate
em dúvidas estelares.

TODOS

Senhora de todas as horas,
refrão e canto; silêncio e hora
decorrida; na apresentação
mesquinha se diga revelada.

Em todos os balcões de bares,
senhora, em todos os caixas
de supermercados e nas filas
de ônibus, induza o espírito
ao retorno: como alimentar
corpos naturalmente expostos?

Senhora de todos os gostos, na hora
que é nossa em pertencer ao estado,
observe à sua volta e se revolte.

PODERES

Subverto o poder, condicionado ao mito,
retiro da força o apego ao gênio
literário; esmoreço o começo e me arrojo
ao mundo abaixo das vistas, entrevejo
a glória incensada das orquídeas, símbolos
e dogmas repisados ao orgulho determinado
do poder – agora subvertido – ocultado.

Reafirmo a crença no vazio
da pedra concreta da inação
do tempo: a temporalidade
do minério escavado ao corpo

despreparado, escuto gritos reais
de descobertas: o encoberto jogo
do poder sacralizado ao todo.

MÁCULA

Desprovido de mácula mancho o passo
com sangue: acetinado preço
do inocente declarado; o pecado
urdido em mortes se rebela
contra o antagonismo da verdade;
o sangue jorra minha vida esvaída
ao sentido de me dizer libertado;
maculo histórias em interpretações
despropositadas, reinvento atos
de coragem em paródias
prosódias

sarcasmo
desprovido em mácula.

O sangue cessa o alvor
do corpo despropositado.

Fonte:
Colaboração do Poeta

A. A. de Assis (A Língua da Gente) Parte 6


ELEMENTOS GREGOS

Acro (alto): acrobata, acrópole; acusi (audição): acústica, hiperacusia; agogo (que conduz): demagogo, pedagogo; algia (dor): analgésico, cefalalgia; alo (outro): alomorfo, alopatia; andro (homem, varão): andrógino, andrologia; anemo (vento): anemofilia; anemógrafo; angelo (anjo, mensagem): angelical, evangelho; angio (vaso, veia): angiografia, angiologia; arc (antigo, superior): arcaico, arcebispo; aritmo (número): aritmética, logaritmo); arquia (governo, poder): anarquia, monarquia; artro (articulação, junta): artralgia, artrite; aster (astro, estrela): asterisco, astrologia; auto (próprio): autobiografia, autodidata;
bata (que anda): acrobata, nefelibata; biblio (livro): bibliófilo, biblioteca; bio (vida): biografia, biologia;
cali (belo, bom): califonia, caligrafia; cardia (coração): cardíaco, cardiopatia; carpo (fruto): carpófago, carpologia; cinema (movimento): cinemática, cinematógrafo; cino (cão): cínico, cinódromo; ciste (bexiga): cistite, cistomia; cito (célula): citologia, leucócito; clasta (que destrói): biblioclasta, inconoclasta; clepto (roubo): cleptofobia, cleptomania; cosmo (belo, limpo, universo): cosmético, microcosmo; cracia (governo, poder): aristocracia, ginecocracia; criso (ouro): crisântemo, crisografia; cromo (cor): policromia, tricromia; crono (tempo): cronômetro, sincrônico...
Datilo (dedo): datilografia, quirodátilo; demo (povo): democracia, epidemia; dendro (árvore): dendrobata, dendroclasta,; derma (pele): dermatologia, epiderme; dinamo (força): aerodinâmica, dinamismo; dromo (pista de corrida): autódromo, hipódromo;
eco (casa, habitat): ecologia, economia; eno (vinho): enologia, enomania; entero (intestino): disenteria, enteralgia; entomo (inseto): entomofilia, entomologia; ergo (força, trabalho): energia, ergoterapia; espleno (baço): esplenalgia, esplenomegalia; estesia (sensibilidade): anestesia, telestesia; estoma (boca): estomatite, estomatoscópio; etno (povo, raça): etnia, etnografia; eto (costume): ética, etologia;
fago (que se alimenta de): geófago, ictiófago; filo (que gosta): cinófilo, hidrófilo; fito (planta): fitófago, fitogeografia; flebo (veia): flebectomia, flebite; fobia (aversão, medo): acrofobia, ergofobia; fone (som, voz): fonema, telefone; foto (luz): fotografia, fotossíntese...
Galato (leite): galactófago, galactorreia; gamia (casamento): monogamia, poligamia; gastro (estômago): gástrico, gastroenterite; genia (criação, origem): congênito, genética; geo (solo, terra): apogeu, geografia; gero (velhice): geriatra, gerontocracia; gimno (nu): ginásio, ginástica; gino (mulher): ginecocracia, ginecologia; gipso (gesso): gipsografia, gipsífero; glico (doce): glicômetro, glicose; glossa, glota (língua): glossário, poliglota; gnos (conhecer, saber): diagnóstico, ignorar; grama (letra, palavra, peso): gramática, quilograma;
hagio (sagrado, santo): hagiógrafo, hagiólogo; helio (sol): heliocêntrico, heliólatra; hema (sangue): anêmico, hemorragia; hemero (dia): efêmero, hemeroteca; hemi (meio): hemisfério, hemistíquio; hepa (fígado): hepatite, hepatotomia; hetero (diferente): heterogêneo, heterônimo; hialo (vidro): hialino, hialotecnia; hidro (água): hidrelétrica, hidrografia; higro (umidade): higrófilo, higrômetro; hipo (cavalo): hípico, hipódromo; histero (útero): histeralgia, histerografia; histo (tecido): histologia, histotomia; hodo (caminho): êxodo, hodômetro; holo (inteiro, todo): holístico, holofote; homo (igual, semelhante): homeopatia, homônimo;
icono (ídolo, imagem): íconólogo, iconoteca; ictio (peixe): ictiofagia, ictióide; idio (peculiar, próprio): idioleto, idiossincrasia; iso (igual): isocrônico, isotérmico;
leuco (branco): leucemia, leucocitose; limno (lago, lagoa): limnófilo, limnometria; lipo (gordura): lipoaspiração, lipoma; lito (pedra, rocha): litografia, litogravura; logo (palavra): diálogo, logorreia;
macro (grande, longo): macróbio, macrocéfalo; mega (grande): megafone, megalópole; micro (pequeno): micróbio, microscópio; mnes (memória): amnésia, mnemônica;
necro (morte): necrópole, necrotério; nefelo (nuvem): nefelibata, nefelóide; nefro (rim): nefrite, nefrólito; nomia (administração): agronomia, economia; noso (doença): nosocômio, nosomania.
Odonto (dente): odontológico, ortodontia; oftalmo (olho): oftalmia, oftalmoscópio; oligo (poucos): oligarquia, oligopólio; onimo (nome): antropônimo, pseudônimo; oniro (sonho): onírico, oniromancia; onto (ser): ontogênese, ontologia; orex (apetite): anorexia, heterorexia; orto (correto): ortografia, ortopedia; osteo (osso): osteometria, osteoporose; oto (ouvido): otite, otoscópio;
paleo (antigo): paleografia, paleontologia; pan (todos, tudo): panaceia, panteísmo; paqui (grosso): paquiderme, paquigástrico; para (próximo, ao lado): paralelo, parapsicologia; pedo (criança): pediatra, pedagogo; pepsia (digestão): dispepsia, péptico; piro (foro): pirogênico, pirotécnico; pteco (macaco): pitecantropo, pitecóide; plegia (paralisia): hemiplegia, tetraplégico; pneumo (ar, pulmão): dispneia, pneumonia; podo (pé): antípoda, podômetro; polis (cidade): política, Teresópolis; potamo (rio): hipopótamo, Mesopotâmia; pluto (rico): plutocracia, plutomania; ptero (asa): pterodátilo, helicóptero;
quiro (mão): cirurgia, quiromante.
rino (nariz): rinite, rinoceronte;
sauro (lagarto): dinossauro, megalossauro; scop (ver): periscópio, telescópio); seleno (lua): selenita, selenografia; sema (sinal, significado): semântica, semiótica; sidero (aço, ferro): siderotecnia, siderurgia; sofia (sabedoria): filosofia, teosofia; soma (corpo humano): psicossomático, somatologia;
alasso (mar): talassografia, talassoterapia; tanato (morte): eutanásia, tanatofobia; terapia (tratamento): terapêutico, psicoterapia; termo (calor): térmico, termodinâmica; tomo (divisão, parte): anatomia, átomo; topo (lugar): topografia, topônimo; trico (cabelo): tricotilomania, tricotomia; trofia (crescimento): hipertrofia, hipotrofia;
uru (cauda, rabo): anuro, macruro;
xeno (estrangeiro): xenofobia, xenomania; xero (seco): xerocópia, xerografia; xilo (madeira): xilogravura, xilófago;
zimo (fermento): ázimo, zimotecnia; zoo (animal): epizootia, zoófilo.

Fonte:
A. A. de Assis. A Língua da Gente. Maringá: Edição do Autor, 2010

Antonio Brás Constante (Martirizados no Mercado)


Todo mês é a mesma coisa, ir ao mercado fazer compras. Mais que uma obrigação ou necessidade, trata-se de uma penitência que muitos passam para abastecer seus lares. Na prática a pessoa que vai as compras entra com o bolso cheio de dinheiro e o carrinho vazio, para sair com o bolso vazio e o carrinho, digamos, se não totalmente cheio, ao menos não tão vazio como na entrada.

O mercado é um local onde acabamos revendo velhos conhecidos, talvez porque a grande maioria receba seus salários na mesma época do mês. Você entra e já vai logo dando de cara com algum rosto que há muito tempo não via. Geralmente são pessoas que apesar de conhecidas, não dispõe de vínculos muito fortes com você. Ou seja, ótimas para se ver uma vez lá que outra e dar um aceno ou um aperto de mão, mas não para se esbarrar a todo o momento, em um local onde o foco são as compras e não necessariamente reencontros casuais.

No primeiro contato, ambos ficam meio sem jeito, sorriem e trocam cumprimentos do tipo: “você por aqui fulano!” Ou “há quanto tempo hein?”. Cada um tenta seguir para um lado, mas se dão conta que estão indo pelo mesmo caminho. Trocam novos sorrisos amarelos, até que um dos dois resolve parar sob qualquer pretexto para deixar que o outro siga em frente.

O que acaba acontecendo, é que os dois passam o tempo inteiro se encontrando entre os corredores do mercado. Nas primeiras vezes, um passa pelo outro e diz alguma coisinha ou faz alguma careta do tipo: “lugar pequeno este!”. Por fim começam a disfarçar ao perceberem a aproximação do outro, procurando preços ou lendo algum rótulo, para não ter que olhá-lo novamente, pois não querem parecer indelicados.

Alguns tentam pular corredores, mas não adianta, pois o outro tem a mesma idéia e voltam a se encontrar novamente. A melhor forma de se resolver este impasse é passar a andar ao lado de seu conhecido e tentar iniciar um diálogo com ele. Porque a partir daí parece que todo mercado conspira para que vocês não consigam mais ficarem juntos.

Quem acha que fazer compras é fácil, esquece do stress que se passa nessas horas. Em cada corredor as pessoas têm que: cuidar de seus filhos para que não quebrem nada (nem se quebrem), olhar os preços, procurar o produto desejado, cuidar para não bater no carrinho da frente e verificar os itens da sua lista, calculando o quanto pode gastar.

Daí você entra em um novo corredor, olha novamente os preços, cuidando do carrinho da frente, procura o novo produto desejado, acerta sua lista, recalcula o valor disponível e sente que está se esquecendo de algo, mas o que será? Olha em volta e percebe que seu filho sumiu. Sente um frio na barriga quando lembra que a pouco viu ele junto a você no último corredor que passou. Ao relembrar disso, seu corpo todo estremece. Uma sensação terrível de desespero envolve você, pois se dá conta que o corredor que acabou de passar era justamente aquele onde ficavam as bebidas importadas, e pelo que você se recorda, os vinhos de cento e poucos dólares ficavam bem ao alcance das mãozinhas desajeitadas e curiosas de seu “anjinho”. Volta correndo pelo corredor a tempo de salvar as garrafas e seu bolso, passando a levar seu filho dentro do carrinho por medida de segurança.

Por fim deixo alguns conselhos: Evite ir ao mercado de estômago vazio. Pesquisas mostram que pessoas com fome compram uma porcentagem a mais em gêneros alimentícios. Outro conselho: se você for comer, não faça o lanche nas praças de alimentação dos mercados, pois certamente a tal porcentagem que você economizaria, acabará sendo gasta no seu “lanchinho”, e é bem provável ainda que você acabe se esbarrando novamente com aquele seu conhecido por lá.

Fontes:
Colaboração do autor.

Folclore Portugues : Distrito de Viseu (Lenda do Brasão de Viseu)


D. Ramiro II, Rei das Astúrias e de Leão, que reinou desde o ano 931 até o de 950, em uma excursão que fez de Vizeu, onde então residia, por terras de mouros, viu e enamorou-se da famosa Zahara, irmã de Alboazar, rei mouro, ou alcaide do castelo de Gaia sobre o rio Douro.

Recolheu-se D. Ramiro a Vizeu com o coração tão cativo, e a razão tão perdida, que sem respeito aos laços, que o uniam a sua esposa D. Urraca, ou como outros lhe chamam D. Gaia, premeditou e executou o rapto de Zahara.

Enquanto o esposo infiel se esquecia de Deus e do mundo nos braços da moura gentil n'um palácio à beira mar, o vingativo irmão de Zahara, trocando afronta por afronta, veio de cilada, protegido pela escuridão de uma noite, assaltar e roubar nos seus próprios paços a rainha D. Gaia.

A injúria vibra n'alma de Ramiro o ciúme e o desejo de vingança.

O ultrajado monarca voa à cidade de Vizeu, escolhe os mais valentes dentre os seus mais aguerridos soldados, e vai à sua frente caminho do Douro.

Chegando à vista do castelo d'Alboazar, deixa a sua coorte oculta em um pinhal, e disfarçado em trajes de peregrino, dirige-se ao castelo, e por meio de um anel, que faz chegar às mãos de D. Gaia lhe anuncia a sua vinda.

O peregrino é introduzido imediatamente à presença da rainha, que fica a sós com ele. Alboazar tinha ido para a caça. D. Ramiro atira para longe de si as vestes e as barbas, que o desfiguravam, e corre a abraçar a esposa. Esta porém repele-o indignada, e lança-lhe em rosto a sua traição.

No meio de um vivo diálogo de desculpas de uma parte, e de recriminações da outra, volta da caçada Alboazar. D. Ramiro não pode fugir. Já se sentem na próxima sala os passos do mouro. A rainha, parecendo serenar-se, oculta o marido em um armário, que na câmara havia. Mas apenas entrou Alboazar, ou fosse vencida de amor por ele, ou cheia de odio para com o esposo pela fé traida, abre de par em par as portas do armário, e pede vingança ao mouro contra o cristão traidor.

Dai a pouco era levado el-rei D. Ramiro a justiçar sobre as ameias do castelo. Chegado ao lugar de execução pediu o infeliz, que lhe fosse permitido antes de morrer despedir-se dos sons acordes da sua buzina. Sendo-lhe concedida esta derradeira graça, D. Ramiro empunha o instrumento, e toca por três vezes com todas as suas forças.

Era este o sinal ajustado com os seus soldados, escondidos no proximo pinhal, para que, ouvindo-o, lhe acudissem apressadamente. Portanto em um volver de olhos foi o castelo cercado, combatido, tomado, e depois incendiado. A desprevenida guarnição foi passada ao fio da espada, e Alboazar teve a morte dos valentes: expirou combatendo. E D. Gaia, como ao passar o Douro para a margem oposta, se lastimasse e mostrasse dor, vendo abrasar-se o castelo, foi vitima também do ciúme de D. Ramiro que cego de ira a fez debruçar sobre a borda do barco, cortando-lhe a cabeça de um golpe de espada.

Á fortaleza em ruínas ficou o povo chamando o castelo de Gaia, à margem do rio, onde aportou o barco de D. Ramiro, deu-lhe o nome de Miragaia, em memória daquele fatal mirar da misera rainha .
–––––––––––––––-
Esta é pois a lenda que se presume ter dado origem ao Brasão de Viseu.

Temos assim que o Castelo representa o de Alboazar, o tocador de corneta, o rei D. Ramiro e a árvore, o bosque em que se esconderam os habitantes de Viseu.

Lenda ou fábula ela representa uma forma de interpretação e porque carregada de antiguidade merece bem que se respeite como tal. Mas fazendo fé em Vilhena Barbosa, nem tudo será hipotético porque " D. Ramiro II roubou a moura Zahara, irmã ou filha d'Alboazar, a qual se fez cristã, tomando no batismo o nome de Artida ou Artiga. Repudiando a rainha D. Urraca, casou segundo uns, ou viveu amancebado segundo outros, com Zahara de quem teve um filho, chamado D. Alboazar Ramires que foi o primeiro fundador do Mosteiro de Santo Tirso ".

Fonte:
http://lendasdeportugal.no.sapo.pt/

Eduardo Mineo (Um Plano)


Não que eu pense muito em ter filhos, mas gosto de ficar planejando as coisas e eu já planejei toda a educação que darei aos meus, cada detalhezinho. É verdade que ainda terei de aprender boa parte do que pretendo ensinar a eles – como golpes mortais com a palma da mão – mas acho saudável ter este tipo de preocupação, em vez de esperar que um colégio caro os ensine a dar valor ao que realmente se deve dar valor. Ou vai me dizer que colégios caros ensinam o valor do tiro ao alvo e do teatro grego?

Admito: é um plano ousado. Eu sei que até os três anos terei problemas, pois não é possível ensinar muito a quem baba em si mesmo, o que talvez explique por que os bebês nunca fizeram nada muito relevante – esta eu peguei do Walter Huston em Yankee Doodle Dandy. Mas a partir daí, a partir do momento em que a criança começa a andar e a falar, já está pronta para aulas de piano. Nada muito exigente, mas com tendências clássicas, óbvio. Uma criança de quatro anos já tem que saber quem é Haydn da mesma forma como saberia quem é o bicho papão. "É o tio do piano" já me deixaria contente como resposta, mas aos cinco anos, já perderia a sobremesa.

Tenho alguma convicção de que música precisa ser ensinada desde muito cedo e com rigor, com regularidade, para um bom desenvolvimento intelectual de uma pessoa. Mozart, Beethoven, Chopin, Bach, Villa-Lobos, Strauss, Tchaikovski e Wagner, passaria por cada um destes. Música faz coisas boas em nossa mente, principalmente a música clássica. Toda pessoa que se interessa por música clássica tem mais sensibilidade, pois, cedo ou tarde, começa a se interessar pelas diferenças de sons, de instrumentos, de tempo e de entonação que lhe dão uma percepção muito fina para tudo mais que há na vida. A interpretação de sons precisa estar além do limite da língua para atingir compreensões mais profundas com mais facilidade, pois a interpretação da música é a forma mais crua e mais natural que há de compreensão. E pouco me importa se, aos quinze, meus filhos vão preferir punk rock: a música clássica faz parte de qualquer educação minimamente aceitável e é isto que vou fazer.

A criança também precisa aprender a falar não apenas em português, que é a minha língua e que eu gosto, mas em inglês, francês e alemão. Já considerei me basear no modelo de ensino do personagem de Albert Finney em The Browning Version, um professor conservadorzão que dá aulas de tragédias gregas com uma versão original de Agamêmnon, de Ésquilo, para crianças de uns dez anos. Mas grego, assim como russo e latim, já seria um pouco exagerado pra uns dez anos. E também não sei se vou conseguiria aprender essas línguas a tempo.

O que quero ter feito até lá com certeza é uma boa biblioteca. Na época em que meus filhos começarem a ler e a escrever, já quero ter em minha casa uma do tamanho da do pai do Jorge Luís Borges, com tudo que havia de bom e legal naquela biblioteca. Além disto, claro que terei os livros do Monteiro Lobato. Seria um bom começo para meus filhos, os livros infantís do Monteiro Lobato, embora a formação de uma criança não esteja completa sem o contato com o fantástico de Lewis Carroll e com os valores de Dickens. Sem esta base, não é de se espantar que existam idiotas, assassinos e praticantes de rapel.

Outros autores podem – ou devem – ser incluídos neste começo de vida. A que primeiro me veio a mente foi Jane Austen que, embora não seja exatamente divertida para uma criança, ajuda a entender de uma maneira extremamente delicada como alguém deve tratar um homem e uma mulher e como se portar diante dos outros. Enfim, ser alguém de respeito. Guerra e Paz, de Tolstói, também faz isto e até melhor, mas fico com receio de jogar nas mãos de um molequinho um livro de mil e poucas páginas. Pode traumatizar.

Mas uma hora meus filhos terão de encarar um livro maior. Talvez lá pelos treze anos, eu os tire um pouco da literatura infantil para lhes apresentar obras mais amplas. Penso em começar pela Odisséia, de Homero, que não é exatamente um livro grande, mas necessário. Os gregos, num geral, são necessários, embora os filósofos eu indicaria para depois dos quinze. Além disto, não pretendo aprofundá-los em filosofia. Quero que conheçam a razão em Aristóteles e a ética em Platão. Talvez leve um pouco adiante dos gregos, com Cândido de Voltaire. A partir daí, dependerá do interesse deles.

Acredito que, na adolescência, já não haja mais restrição para assuntos, o que me permitirá apresentar tudo que conheço e o que quero conhecer até lá. Isto não quer dizer que vou conversar sobre orgasmo com meus filhos, Jesus Cristo, mas apresentar livros que possuem estruturas de relacionamento um pouco mais desenvolvidas do que seria interessante para uma criança. Não consigo imaginar por que uma criança se interessaria por Madame Bovary, de Flaubert, por exemplo. É simplesmente incompatível.

Mas adolescentes estão prontos para qualquer coisa. No teatro, volto aos gregos, principalmente com Aristófanes, mas há muitos outros dramaturgos indispensáveis como Shakespeare, Ibsen, Nelson Rodrigues, Tchekhov, Bernard Shaw e Beckett que devem ocupar um espaço na mente de qualquer pessoa que tenha uma alma.

Na literatura brasileira, Machado de Assis deve ser lido de ponta a ponta. Começaria pela coleção de contos Várias Histórias e por Memórias póstumas de Brás Cubas. Depois de Machado, Os Sertões, de Euclides da Cunha; Fogo morto, de José Lins do Rego; Triste fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto; Urupês, de Monteiro Lobato e qualquer coisa de Guimarães Rosa. Ou tudo de Guimarães Rosa. E está aí o que importa no Brasil.

Fora do Brasil, a lista é grande. A literatura italiana não tem muito a oferecer, mas A divina comédia, de Dante, precisa ser lida. Subindo para a França, eu dispenso Victor Hugo. Talvez obrigue meu filho a ler Os miseráveis caso ele vá mal na escola, de castigo. Já Stendhal é aconselhável. Maupassant, como grande contista, também. E Flaubert fecharia a literatura francesa. Mais do que isso é lucro.

Literatura em inglês é a minha preferida e será a que eu darei mais importância. Começando pelos Estados Unidos: Edgar Allan Poe, Mark Twain, Henry James, F. Scott Fitzgerald, Herman Melville e Ernest Hemingway. No Reino Unido, Jane Austen, que já citei, assim como Lewis Carroll, Dickens, Bernard Shaw e Samuel Beckett. Mas também Swift, Conrad, Laurence Sterne, Chesterton, Oscar Wilde, Thackeray, Walter Scott, Evelyn Waugh e Emily Brontë. Joyce é um caso a parte, mas farei questão de apresentar pelo menos o Portrait of the artist as a young man, que é meu favorito. E sigamos adiante.

Goethe como representante da literatura alemã está de bom tamanho. Os sofrimentos do jovem Werther me parece ser um bom livro romântico de contraponto ao racionalismo iluminista, que até certa altura é interessante, mas pode levar facilmente qualquer pessoa à idiotice. Não que Werther também não seja um idiota, mas, mas, mas...deu pra entender. E seguindo esta mesma idéia de contraponto ao racionalismo, entro na literatura russa com Crime e Castigo de Dostoiévski, que trata deste assunto de uma forma mais clara e mais direta. Tolstói e Gógol entram na seqüência e meus filhos serão pessoas melhores conhecendo estes autores.

E eis que me vejo num dilema: quero que meus filhos sejam pessoas melhores, mas sinto que eles precisarão entrar em contato com este limitador espiritual que é a política. Tratarei do assunto, mas farei com que aprendam a usar a política como um revólver: com pudor e apenas em caso de emergência. E nada com muita ênfase aos acontecimentos, pois um colégio bom dá conta disto. Tampouco algo muito profundo. Quero que aprendam o suficiente para saber o que essa gente feiosa anda falando na televisão e qual é a pilantragem da vez.

No caso do Brasil, começaria pelo começo: crônicas de Machado de Assis e obras de Rui Barbosa. Na área econômica, por um lado daria Celso Furtado e, por outro, Roberto Campos. Sobre a ditadura, o Trinta anos esta noite do Paulo Francis e as obras do Elio Gaspari, que fez um trabalho extenso, chato pra burro, mas válido. Deixo a molecada ler; se alguém desmaiar, eu tiro.

Já em política clássica, não tem como fugir de Hobbes, Locke e Maquiavel. Já Adam Smith, David Ricardo e Schumpeter entram, mas com moderação. Posso pensar em algo mais elaborado para Keynes e Hayek; e uma conversinha de leve sobre Marx e Mises. Talvez não doa muito.

Só me preocupo mesmo com minha inaptidão em matéria de poesia. Sei que precisaria apresentar aos meus filhos Fernando Pessoa, Keats, Baudelaire, Camões, Bocage, Milton, etc., mas não consigo me interessar minimamente por poesia. Ainda bem que ensinar poesia é coisa de mãe.

E artes plásticas também. Eu sou muito ruim neste troço. Tentei aprender alguma coisa lendo Civilização, de Kenneth Clark, e até aprendi alguma coisa sobre os clássicos da arquitetura, pintura e escultura, mas nada além de alguns nomes decorados. Li algumas coisas de John Ruskin no projeto Gutenberg, mas nada muito promissor, também.

Há alguns dias, tentei comprar um conjunto de ensaios sobre a arte norte-americana por John Updike, falando sobre Pollock e tal, mas venderam a última unidade na livraria e como o preço era bem salgado, eu deixei de lado. Me incomoda deixar estes buracos na educação dos meus filhos, mas espero pelo menos estimulá-los à cultura. Sei que com tudo isso talvez meus filhos ainda continuem ignorantes, mas certamente darei a base para que deixem de ser naquilo que mais lhes interessar.

Fonte:
Digestivo Cultural. 02 de julho de 2007.

Luis Dolhnikoff (O Maior Espetáculo da Terra)


nossa imensa capacidade
de fazer da natureza
mais, muito mais do que a mesma natureza
fez de nós e de si mesma
criando a física e o cinema
capas de chuva e cidades
poemas, pontes, sobremesas
dentaduras, cuecas, epistemas
religiões, canetas, multidões
sonhos, luas, canções
é uma questão de treino

estranho, a princípio, o ser treinável
se a natureza cria apenas
o mínimo necessário

logo, o necessário, no mínimo:
porque, sem consciência
ciência ou projeto
desenha certo
por traços tortos

uma foca
não foi feita para brincar com bolas
futuras
nem um urso
para percorrer percursos curvos
de bicicleta
um homem para ser atleta
colecionador de selos ou poeta

porém um urso
tendo aprendido a fazer novo uso
e delicado
de cada enorme pata
deixou de ser um urso
para ser um atleta?

um poeta?

filho dos deuses
um homem que coleciona selos?

um urso numa bicicleta
difere de um urso na floresta
pela bicicleta, não pelo urso

que pode aprender seu uso
como um homem seu desenho

tudo feito
(todo feito
e fracasso)
por longuíssima tentativa
angustiantes erros
e alguma necessidade
como um urso ameaçado
pela dor, o medo e o treinador

urso que apesar de tudo
eventualmente ainda cai
da mais bela bicicleta
sobre o chão duro

como cai no escuro
na ruína ou na barbárie
a civilização mais complexa

Fonte:
DOLHNIKOFF, Luis. Sobre Sisifo. Ateliê Editorial, 2007.

Vicência Jaguaribe (A história do Mancha Branca)


- Está bem! Vou comprar um coelho. Agora vê se não me aperreia mais!

O menino saiu derrubando tudo que encontrava pela frente. Estava feliz, muito feliz. Tinha nove anos e fazia tempo que pedia um coelho aos pais. Mas sempre houvera uma dificuldade – a mãe dizia em-pe-ci-lho, palavra que o menino achava engraçada e gostava de repetir. Ele ria toda vida que a mãe a pronunciava, porque ele dividia mentalmente a palavra em vários pedaços, formando outras. Ele achava que ela era uma espécie de jogo de encaixe. Assim: dentro dela se encaixavam outras palavras. Querem ver? Empecilho – em, pé, em pé. E cabia até uma parecida: cílio.

Mas o empecilho era que, naquele imenso casarão onde sua família morava, não havia quintal. Quem já viu casa sem quintal? Principalmente no interior! Havia só umas áreas abertas: uma, entre a cozinha e a garagem, e outra, do lado, acompanhando a metade da casa. Então, onde se vai criar esse coelho? Dentro de casa, é? perguntava a mãe, já meio irritada.

O menino passou uma semana na expectativa da chegada do coelho. Foi uma espera que lhe pareceu longa demais. Até que, sete dias depois que o pai prometeu, chegou à casa do menino um animalzinho branquinho branquinho, que parecia ter nascido do amor entre duas nuvens, em um dia de céu claro. Ah! quando o menino o viu, ficou feliz demais! E lhe deu logo um nome: Mancha Branca.

- Mancha Branca, meu filho! Não tem um nome mais bonito, não?

- Mas esse, pai, é a cara dele!

E por Mancha Branca ficou. Mas o Mancha Branca era um bichinho muito nervoso, parecia que estava sempre com medo de alguma coisa. Suas orelhinhas e seu narizinho viviam sempre se mexendo. E não gostava muito de ficar nos braços do menino, não. A mamãe dizia que ele era um animal arisco. Outra palavra que o menino achou engraçada.

- Esse animal é desconfiado, tímido, arredio, parece que vive amedrontado. É mesmo arisco.

E o menino ficou matutando. Depois de pensar e pensar, concluiu que, dentro da palavra arisco, se encaixavam ar, ri, ris, risco. Ah! como ele gostava desse jogo! E ele concordava com a mãe, o Mancha Branca era mesmo arisco.

Mas a coisa começou a complicar-se quando o coelhinho resolveu ficar dentro de casa. Por mais que se fechassem as grades que separavam as áreas descobertas, ele sempre arranjava um jeito de entrar. E escondia-se tão bem escondido que ninguém conseguia achá-lo. E o pior! Começaram a aparecer peças de roupa rasgadas, sapatos roídos, redes com as varandas despregadas. Quem está fazendo essas reinações? A mamãe não teve dúvida – era o Mancha Branca. E deu um ultimato: dois dias para arranjarem outro pouso para o coelhinho.

O menino ficou chocado. E o pior é que ele nem podia defender o animal. Logo agora, que o Mancha estava começando a aceitar seus carinhos, suas ternurinhas! Primeiro pensou em amarrá-lo fora da casa, mas teve pena, coelho não é animal de viver preso. Depois, pensou em ficar com ele nos braços, todo o tempo em que estivesse dentro de casa. Também não dava certo. E quando saísse, fosse para o colégio? Além do mais, a mamãe havia falado sério, dissera até que era um ultimato. (Mas o menino estava tão preocupado que não ligou para aquela palavra.) Também, o papai dissera que o Mancha Branca se sentia muito sozinho, precisava arranjar uma namorada. E, se a mamãe achava o Mancha demais, imagine-se o Mancha mais uma namorada. Tinham que encontrar uma solução.

Foi aí que o menino se lembrou do sítio do vovô. Lá havia muito espaço, e o Mancha não sentiria vontade nem necessidade de ficar dentro de casa. E poderia arranjar quantas namoradas quisesse. Poderia até casar. E ter muitos filhotes. O menino já ouvira dizer que coelho tem muito filhote. Pronto, o menino vira uma luz no fim do túnel. E havia mais uma vantagem em levar o Mancha para o sítio do avô: o menino poderia ir lá na hora em que quisesse.

Ora, se bem pensou, melhor o fez. No dia seguinte, o menino levou o coelhinho para o sítio, e o pai dele providenciou uma coelhinha para casar com o Mancha.

O que posso adiantar desta história do Mancha Branca é que, dois anos depois, o sítio do vovô se transformou em um centro de criação e venda de coelhos. Porque era coelho saindo pelo ladrão. Em um único ano, a fêmea do Mancha Branca lhe deu setenta e dois filhotes. Isso tudo, meu Deus! É por isso que, quando uma mulher tem muitos filhos, costuma-se dizer: Esta mulher tem filho que nem coelho!

- É verdade, disse um dos tios do menino. Os coelhos são símbolos da fertilidade e da multiplicação dos seres.

Fer – ti – li – da – de! Puxa! Que palavra, pensou o menino. Essa é das boas. Dentro dela tem fértil, tem til, tem idade, tem ida, tem fé, tem de... Legal!

Fonte:
Colaboração da autora

Caravana da Leitura passará por seis cidades paulistas



O projeto realizado em praça pública disponibiliza ao público livros por um preço simbólico.

O projeto “Caravana da Leitura” criado pelo escritor Laé de Souza, depois de percorrer mais de 60 cidades brasileiras chega a diversas cidades do interior de São Paulo. Aplicado desde 2004, em parceria com as Secretarias de Educação e de Cultura dos municípios e apoio do Ministério da Cultura, o trabalho será iniciado com a participação na Virada Cultural Paulista 2010 em Santa Bárbara d'Oeste, no dia 23 e seguirá para os municípios de Sumaré, Hortolândia, Santo Antônio de Posse, Cosmópolis e Mogi Guaçu de 24 a 28 de maio.

Até o final de 2010 o público terá a oportunidade de conferir a passagem da “Caravana” em diferentes praças públicas do país, oferecendo livros para o público infantil, juvenil e adulto, pelo valor simbólico de R$1,99. O projeto reúne uma grande variedade de obras literárias do escritor Laé de Souza, apresentando histórias do cotidiano, em uma linguagem bem-humorada e pontuada por reflexões.

Aos amantes da literatura, a atividade oferece uma ótima oportunidade para rechear a estante e saciar o desejo de boa cultura. De acordo com Laé de Souza, idealizador do projeto, a ação é inédita e tem como objetivo gerar oportunidades de leitura a pessoas de todas as idades e classes sociais. “Buscamos quebrar o estigma que o brasileiro não gosta de ler. O brasileiro gosta de ler sim, o que lhe falta é oportunidade e acessibilidade aos livros que infelizmente custam muito caro no Brasil. O Caravana da Leitura vai na contramão dessa fórmula errada”, esclarece Laé de Souza.

Este ano, o evento deverá passar por mais de 40 cidades dos estados de São Paulo e Rio de Janeiro com previsão de distribuição de cerca de 120 mil livros. “O objetivo do trabalho é levar cultura e incentivar o hábito da leitura em todo o Brasil. Dessa forma acreditamos que a leitura pode ser democratizada”, destaca Laé de Souza.

Interessados poderão conhecer outros projetos de incentivo à leitura, de Laé de Souza e o roteiro da Caravana da Leitura, em "Agenda", no site http://www.projetosdeleitura.com.br/

Fonte:
Colaboração de Laé de Souza