domingo, 26 de dezembro de 2010

Pedro Cezar em Recital de Poesia VIDA, em Salvador, BA


Desenvolvendo atividades artísticas e culturais a nível nacional e internacional, o poeta Pedro Cezar, Apresenta o recital de poesia Vida, poemas do livro CELEBRE.

Recital de poesia – Consiste na retomada da oralidade na poesia, com poemas, incursionando no modernismo vivenciando o pós modernismo com Pedro Cezar.

O recital é interativo, possibilitando o poeta presente declamar, sonetos, quadras, tercetos, viabilizando uma temática eclética, através do filosófico, romântico e social, possibilitando ao espectador, melhor possibilidade de reflexão sobre a vida.

Ora com a rima explicita, ora com a rima oculta, faz fluir do texto a poesia!

Fonte:
Poetas del Mundo

sábado, 25 de dezembro de 2010

Ialmar Pio Schneider (Soneto)


Fonte:
Soneto enviado pelo Autor
Montagem sobre imagem recebida por e-mail - autor anonimo.

Oswaldo Antônio Begiato (Oração a Mim Mesmo)


Que eu me permita
olhar e escutar e sonhar mais.
Falar menos.
Chorar menos.

Ver nos olhos de quem me vê
a admiração que eles me têm
e não a inveja que,
prepotentemente, penso que têm.
.
Escutar com meus ouvidos atentos
e minha boca estática,
as palavras que se fazem gestos
e os gestos que se fazem palavras.

Permitir sempre
escutar aquilo que eu não tenho
me permitido escutar.

Saber realizar
os sonhos que nascem em mim
e por mim
e comigo morrem por eu não os saber sonhos.

Então, que eu possa viver
os sonhos possíveis
e os impossíveis;
aqueles que morrem
e ressuscitam
a cada novo fruto,
a cada nova flor,
a cada novo calor,
a cada nova geada,
a cada novo dia.

Que eu possa sonhar o ar,
sonhar o mar,
sonhar o amar,
sonhar o amalgamar.

Que eu me permita o silêncio das formas,
dos movimentos,
do impossível,
da imensidão de toda profundeza.

Que eu possa substituir minhas palavras
pelo toque,
pelo sentir,
pelo compreender,
pelo segredo das coisas mais raras,
pela oração mental
(aquela que a alma cria e
que só ela, alma, ouve
e só ela, alma, responde).

Que eu saiba dimensionar o calor,
experimentar a forma,
vislumbrar as curvas,
desenhar as retas,
e aprender o sabor da exuberância
que se mostra
nas pequenas manifestações
da vida.

Que eu saiba reproduzir na alma a imagem
que entra pelos meus olhos
fazendo-me parte suprema da natureza,
criando-me
e recriando-me a cada instante.

Que eu possa chorar menos de tristeza
e mais de contentamentos.
Que meu choro não seja em vão,
que em vão não sejam
minhas dúvidas.

Que eu saiba perder meus caminhos
mas saiba recuperar meus destinos
com dignidade.

Que eu não tenha medo de nada,
principalmente de mim mesmo:
- Que eu não tenha medo de meus medos!

Que eu adormeça
toda vez que for derramar lágrimas inúteis,
e desperte com o coração cheio de esperanças.

Que eu faça de mim um homem sereno
dentro de minha própria turbulência,
sábio dentro de meus limites
pequenos e inexatos,
humilde diante de minhas grandezas
tolas e ingênuas
(que eu me mostre
o quanto são pequenas
minhas grandezas
e o quanto é valiosa
minha pequenez).

Que eu me permita ser mãe,
ser pai,
e, se for preciso,
ser órfão.

Permita-me eu ensinar o pouco que sei
e aprender o muito que não sei,
traduzir o que os mestres ensinaram
e compreender a alegria
com que os simples traduzem suas experiências;
respeitar incondicionalmente
o ser;
o ser por si só,
por mais nada que possa ter além de sua essência,
auxiliar a solidão de quem chegou,
render-me ao motivo de quem partiu
e aceitar a saudade de quem ficou.

Que eu possa amar
e ser amado.
Que eu possa amar mesmo sem ser amado,
fazer gentilezas quando recebo carinhos;
fazer carinhos mesmo quando não recebo
gentilezas.

Que eu jamais fique só,
mesmo quando
eu me queira só.
Amém.

Fonte:
Poetas del Mundo

Oswaldo Antônio Begiato (Livro de Poesias)


ANTEONTEM

Anteontem,
pé ante pé,
caminhei com anteolhos
por conta de uma antepaixão
que me veio de anteparo,
antepondo um dilema:
- Antes tarde do que nunca.

Diante de tudo isso
e ante minha descoberta,
fiz-me, antequanto,
ente e rente,
como dantes no quartel d’Abrantes.

PRESUNÇÃO

Há no Universo estrelas tolas.

Uma não suporta
a luz da outra.

Elas amam a escuridão;
sabem que sem escuridão
sequer vida teriam.

Não queiram me dar notoriedade.

Nasci no fundo do mar
com o destino de ser ostra.
Vivo da iridescência do nácar.

Meu cenário é a escuridão,
mas jamais serei estrela.

Não terei luz para iluminar tua passagem,
mas te fornecerei pérolas
para que tu sejas a luz no meio da festa.

DERMO-ÓTICA

Hoje estou feliz como nunca estive antes.

Sinto minhas alamedas cheias de bonanças,
Meus canteiros revirados pelo cuidado alheio,
Meus vácuos encurtados pela presença da verdade.

Sinto minhas sombras povoando os relógios de sol,
Minhas distâncias sendo medidas pelos sextantes.

Apesar de tudo, de todos.
Apesar de nada, de cada.
Apesar de pouco, de louco.

É que hoje você está mais radiante do que uma chuva de meteoros,
E suas mãos puderam me ler do princípio ao fim.

RESSURGIMENTO

Ganhei uma rosa
Leve como uma forma,
Breve como uma linha,
Fina como a esperança,
Bela como o mármore,
Donzela como a aurora,
Champanhe como o arroubo.

Ganhei uma rosa
Feita de brisa lenta,
Assim, como um alívio;
Feita de folhas virgens
Assim, como uma viagem.

Ganhei uma rosa
Feita de muitos versos,
Versos de plenos anversos.

Ganhei uma rosa. De ti.

POEMA RICO

Gostaria que abundantes me fossem
as palavras.
Mas elas me fogem
se fazem magras,
raquíticas,
e parcas.
(Me deixam mudo
diante desta mulher.)

Gostaria que intensos me fossem
os diamantes.
Mas tenho apenas uns cristais
que se quebram quando meu olhar
os toca sem sentido.
(Me deixam pobre
diante desta mulher.)

Mas tenho dentro de mim um coração,
que mesmo mudo,
bate enlouquecido
e como uma ostra vaidosa,
cria com o seu bater doído
a pérola mais linda
que já se viu.
(Me deixa como jóia rara
diante desta mulher.)

Me deixa como poeta
diante desta mulher.

REINÍCIO

Como me pediste, farei restauro de tuas obras-primas,
As que o tempo deteriorou por tua falta de cuidado,
E nada cobrarei de ti por isso. Nem um centavo.

Uma condição imponho. Peço que não me cobres
Os olhos tristes que querias ver no meu rosto,
Retrato que são do pouco-caso que me fizeste.

Estão a sete chaves no vácuo de meu desprezo.
Não os darei a ti. Juro que não. Nem que supliques.

SONETINHO BESTA

Correndo, vim aqui lhe mostrar encabulado,
Um sonetinho besta que fiz para você, às pressas,
Com palavras que encontrei, ontem à noite,
Presas por um fio na saudade que me exauria.

Fí-lo por ouvir seu canto no canto escuro do palco,
Por ver o brilho de seus olhos iluminando tudo,
Sem que me visse. Sei que anda zangada
Com o ciúme enlouquecido que sinto de sua voz.

Mas vim mesmo porque queria que soubesse
Que ando seduzido pelo seu canto de cigarra
Dando alívio às minhas noites solitárias de boemia;

E que quero ser, eternamente grato por sê-lo,
A formiga que sustenta com alegria pródiga
As suas fantasias de menina fugaz e volúvel.

CANTIGA DE NATAL

Quando o natal vem chegando
meus vácuos, prole da infância,
se enchem de Avenida Paulista,
de formas e lâmpadas surreais,
de presépios sobre-humanos,
de presentes multiangulares,
de Boas Festas de Assis Valente...

Todo ano, no mês de dezembro,
com as preces cheias de vitrines
e de dúvidas sobre um céu ouvidor,
desperta em mim a criança viva
que nunca fui. Que nunca vi.

Fonte:
http://oabegiato-poesias.blogspot.com/

Oswaldo Antônio Begiato (1953)



Pequena Autobiografia

SEM SOMBRAS

Ao meio dia
De um domingo
Prenhe de sol
E enamorado de outubro
Rompi espontâneo
Como um botão de rosa fêmea
Que nasce sem ser esperado.”


Nasci, sob o signo de escorpião, em 26 de outubro do ano de 1.953, na cidade de Mombuca,
um pequeno encanto no canto interior do Estado de São Paulo.

Menor que a cidade só eu mesmo.

Ainda pequeno vim para Jundiaí, também São Paulo, Terra da Uva, da qual experimentei o sabor do fruto e jamais a deixei.

Nela me fiz advogado sem banca, aposentado sem queixas e onde perambulo até hoje, buscando, perdidas nas sarjetas, as palavras que me usam para escrever poesias as quais publico na internet de um modo geral, além de ter participado com elas de algumas Antologias pelo Brasil.

Em 1988, publiquei um livro de poesias, sem muita importância e feito artesanalmente
em um mimeógrafo antigo, chamado "O Menino".

Carolina Ramos (Lição de Natal)


Pura e límpida, a estrela fulgurante
iluminou os céus da Palestina!
E pastores e reis levou avante
até a boca da gruta pequenina.

Naquele excelso e soberano instante,
reis e plebeus unia a luz divina
e a esperança, com brilho tremulante,
fazia a noite azul e cristalina!

E que lição, Senhor, nos deu a estrela!
Conduzindo, a Belém, adoradores,
mostrou a todos que puderam vê-la,

que os humildes serão sempre os primeiros!
Que, antes dos reis e que antes dos pastores,
aos Teus pés se ajoelharam os cordeiros!

Fontes:
A Autora
Imagem do Presépio = http://rosyluzes.jex.com.br

Nilton Manoel (A Poesia do Ribeirão Preto)


O ribeirão Preto
é o mais bonito da região;
abraça o Retiro
e nada deve ao Pardo
despojado pelos ranchos
e clubes sociais;
mas pardo não quer ser praia popular...
O Preto,não dá mais lambaris no anzol,
nem os “Cascudos” de nossa história
voltarão a amplos espaços no livro do povo.
o Preto, em tempo de chuvas,
ainda corre barrento;
mas à beira do Mercado,
esverdeado,desliza por longos meses do ano.
Suas palmeiras imperiais,
mais belas que as de Gonçalves Dias.
são eternas bandeiras de poesia.
O ribeirão Preto ainda chora
O assassinato onomástico de Barracão
quando ultrapassa o viaduto
que espera ser usado por metrô!
Ah! A nova Ribeirão com a via Norte?
O ribeirão Preto
de braços abertos para o futuro
é a eterna beleza da história da cidade.
O ribeirão Preto da antiga praça do mercado,
da ferrovia, da poente nova, do Triângulo,
da rodoviária Tiberense...
da centenária feira-livre em de redor do entreposto.
O palácio poderá até mudar-se para próximo do velho República,
mas o Preto sempre terá o caminho principal.
Ó Preto das palmeiras imperiais,
o mais bonito da região;
Sua beleza, poucas vezes foi matéria de Conselho de Cultura;;;
O ribeirão Preto é poético céu estrelado
da história da fundação...
Suas águas barrentas de outrora
são o eterno sangue da municipalidade.
sem este postal, a cidade deixará de existir?
O ribeirão Preto,
canta e chora a cidadania emérita de seus historiadores.
a Jerônimo Gonçalves fez-se importante avenida
com as palmeiras imperiais e o canto do preto...
É o populismo poético desde os poetas do café da capital do interior!
Com a ferrovia,foi-se Maria que,só levou de outrora a velha porteira
o túnel do xixi e o “muro da vergonha”...
A praça Smidht não é mais do povo,
não mais conta histórias dos tempos distantes.
Tem cargas e descargas de pouca atração.
A Augusto severo é um eterno abandono.
O antigo Barranco continua o mesmo
desde as plataformas ferroviárias.
Quando queda o movimento,tudo pode acontecer
bem próximo ao ribeirão preto...
nem sempre o detetive Fred ou o jornalista Clark Kent
podem estar por perto...
o Fantasma que anda,meio cansado,
namora com Diana e não atende a tambores.
Os nossos poetas por onde andarão?
longe dos batedouros,não sonham com varais;;;
O ribeirão Preto é a própria cidade...
Serpenteia pela geografia
projetando historias de nossa história social.
O ribeirão Preto
É o mais belo da região,abraça o retiro
e nada deve para o Pardo na sua reta final...

Fontes:
Cenas Urbanas,NILTON MANOEL,1989,p.23,Vermelhinho Ed.
Enviado pelo Autor.
Imagem = http://expressar.com/bruno/category/ribeirao-preto/

Monteiro Lobato (Jeca Tatu - A Ressurreição)


I
Jeca Tatu era um pobre caboclo que morava no mato, numa casinha de sapé. Vivia na maior pobreza, em companhia da mulher, muito magra e feia e de vários fichinhas pálidos e tristes.

Jeca Tatu passava os dias de cócoras, pitando enormes cigarrões de palha, sem ânimo de fazer coisa nenhuma. Ia ao mato caçar, tirar palmitos, cortar cachos de brejaúva, mas não tinha idéia de plantar um pé de couve atrás da casa. Perto um ribeirão, onde ele pescava de vez em quando uns lambaris e um ou outro bagre. E assim ia vivendo.

Dava pena ver a miséria do casebre. Nem móveis nem roupas, nem nada que significasse comodidade. Um banquinho de três pernas, umas peneiras furadas, a espingardinha de carregar pela boca, muito ordinária, e só.

Todos que passavam por ali murmuravam:
Que grandíssimo preguiçoso!

II

Jeca Tatu era tão fraco que quando ia lenhar vinha com um feixinho que parecia brincadeira. E vinha arcado, como se estivesse carregando um enorme peso.
Por que não traz de uma vez um feixe grande? Perguntaram-lhe um dia.

Jeca Tatu coçou a barbicha rala e respondeu:
Não paga a pena.

Tudo para ele não pagava a pena. Não pagava a pena consertar a casa, nem fazer uma horta, nem plantar arvores de fruta, nem remendar a roupa.

Só pagava a pena beber pinga.
- Por que você bebe, Jeca? Diziam-lhe.
- Bebo para esquecer.
- Esquecer o quê?
- Esquecer as desgraças da vida.

E os passantes murmuravam:
- Além de vadio, bêbado...

III

Jeca possuía muitos alqueires de terra, mas não sabia aproveitá-la. Plantava todos os anos uma rocinha de milho, outra de feijão, uns pés de abóbora e mais nada. Criava em redor da casa um ou outro porquinho e meia dúzia de galinhas. Mas o porco e as aves que cavassem a vida, porque Jeca não lhes dava o que comer. Por esse motivo o porquinho nunca engordava, e as galinhas punham poucos ovos.

Jeca possuía ainda um cachorro, o Brinquinho, magro e sarnento, mas bom companheiro e leal amigo.

Brinquinho vivia cheio de bernes no lombo e muito sofria com isso. Pois apesar dos ganidos do cachorro, Jeca não se lembrava de lhe tirar os bernes. Por quê? Desânimo, preguiça...

As pessoas que viam aquilo franziam o nariz.
- Que criatura imprestável! Não serve nem para tirar berne de cachorro...

IV

Jeca só queria beber pinga e espichar-se ao sol no terreiro. Ali ficava horas, com o cachorrinho rente; cochilando. A vida que rodasse, o mato que crescesse na roça, a casa que caísse. Jeca não queria saber de nada. Trabalhar não era com ele.

Perto morava um italiano já bastante arranjado, mas que ainda assim trabalhava o dia inteiro. Por que Jeca não fazia o mesmo?

Quando lhe perguntavam isso, ele dizia:
- Não paga a pena plantar. A formiga come tudo.
- Mas como é que o seu vizinho italiano não tem formiga no sítio?
- É que ele mata.
- E porque você não faz o mesmo?

Jeca coçava a cabeça, cuspia por entre os dentes e vinha sempre com a mesma história:
- Quá! Não paga a pena...
- Além de preguiçoso, bêbado; e além de bêbado, idiota, era o que todos diziam.

V

Um dia um doutor portou lá por causa da chuva e espantou-se de tanta miséria. Vendo o caboclo tão amarelo e chucro, resolveu examiná-lo.
- Amigo Jeca, o que você tem é doença.
- Pode ser. Sinto uma canseira sem fim, e dor de cabeça, e uma pontada aqui no peito que responde na cacunda.
- Isso mesmo. Você sofre de anquilostomiase.
- Anqui... o quê?
- Sofre de amarelão, entende? Uma doença que muitos confundem com a maleita.
- Essa tal maleita não é a sezão?
- Isso mesmo. Maleita, sezão, febre palustre ou febre intermitente: tudo é a mesma coisa, está entendendo? A sezão também produz anemia, moleza e esse desânimo do amarelão; mas é diferente. Conhece-se a maleita pelo arrepio, ou calafrio que dá, pois é uma febre que vem sempre em horas certas e com muito suor. O que você tem é outra coisa. É amarelão.

VI

O doutor receitou-se o remédio adequado; depois disse: "E trate de comprar um par de botinas e nunca mais me ande descalço nem beba pinga, ouviu?"
- Ouvi, sim, senhor!
- Pois é isso, rematou o doutor, tomando o chapéu. A chuva passou e vou-me embora. Faça o que mandei, que ficará forte, rijo e rico como o italiano. Na semana que vem estarei de volta.
- Até por lá, sêo doutor!

Jeca ficou cismando. Não acreditava muito nas palavras da ciência, mas por fim resolveu comprar os remédios, e também um par de botinas ringideiras.

Nos primeiros dias foi um horror. Ele andava pisando em ovos. Mas acostumou-se, afinal...

VII

Quando o doutor reapareceu, Jeca estava bem melhor, graças ao remédio tomado. O doutor mostrou-lhe com uma lente o que tinha saído das suas tripas.
- Veja, sêo Jeca, que bicharia tremenda estava se criando na sua barriga! São os tais anquilostomos, uns bichinhos dos lugares úmidos, que entram pelos pés, vão varando pela carne adentro até alcançarem os intestinos. Chegando lá, grudam-se nas tripas e escangalham com o freguês. Tomando este remédio você bota p'ra fora todos os anquilostomos que tem no corpo. E andando sempre calçado, não deixa que entrem os que estão na terra. Assim fica livre da doença pelo resto da vida.

Jeca abriu a boca, maravilhado.
- Os anjos digam amém, sêo doutor!

VIII

Mas Jeca não podia acreditar numa coisa: que os bichinhos entrassem pelo pé. Ele era "positivo" e dos tais que "só vendo". O doutor resolveu abrir-lhe os olhos. Levou-o a um lugar úmido, atrás da casa, e disse:
- Tire a botina e ande um pouco por aí.

Jeca obedeceu.
- Agora venha cá. Sente-se. Bote o pé em cima do joelho. Assim. Agora examine a pela com esta lente.

Jeca tomou a lente, olhou e percebeu vários vermes pequeninos que já estavam penetrando na sua pele, através dos poros. O pobre homem arregalou os olhos assombrado.
- E não é que é mesmo? Quem "havera" de dizer!...
- Pois é isso, sêo Jeca, e daqui por diante não duvide mais do que a ciência disser.
- Nunca mais! Daqui por diante nha ciência está dizendo e Jeca está jurando em cima! T'esconjuro! E pinga, então, nem p'ra remédio...

IX

Tudo o que o doutor disse aconteceu direitinho! Três meses depois ninguém mais conhecia o Jeca.

A preguiça desapareceu. Quando ele agarrava no machado, as arvores tremiam de pavor. Era pan, pan, pan... horas seguidas, e os maiores paus não tinham remédio senão cair.

Jeca, cheio de coragem, botou abaixo um capoeirão para fazer uma roça de três alqueires. E plantou eucaliptos nas terras que não se prestavam para cultura. E consertou todos os buracos da casa. E fez um chiqueiro para os porcos. E um galinheiro para as aves. O homem não parava, vivia a trabalhar com fúria que espantou até o seu vizinho italiano.
- Descanse um pouco, homem! Assim você arrebenta... diziam os passantes.
- Quero ganhar o tempo perdido, respondia ele sem largar do machado. Quero tirar a prosa do "intaliano".

X

Jeca, que era um medroso, virou valente. Não tinha mais medo de nada, nem de onça! Uma vez, ao entrar no mato, ouviu um miado estranho.
- Onça! Exclamou ele. É onça e eu aqui sem nem uma faca!...

Mas não perdeu a coragem. Esperou a onça, de pé firme. Quando a fera o atacou, ele ferrou-se tamanho murro na cara, que a bicha rolou no chão, tonta. Jeca avançou de novo, agarrou-a pelo pescoço e estrangulou-a
- Conheceu, papuda? Você pensa então que está lidando com algum pinguço opilado? Fique sabendo que tomei remédio do bom e uso botina ringideira...

A companheira da onça, ao ouvir tais palavras, não quis saber de histórias - azulou! Dizem que até hoje está correndo...

XI

Ele, que antigamente só trazia três pausinhos, carregava agora cada feixe de lenha que metia medo. E carregava-os sorrindo, como se o enorme peso não passasse de brincadeira.
- Amigo Jeca, você arrebenta! Diziam-lhe. Onde se viu carregar tanto pau de uma vez?
- Já não sou aquele de dantes! Isto para mim agora é canja, respondia o caboclo sorrindo.
- Quando teve de aumentar a casa, foi a mesma coisa. Derrubou no mato grossas perobas, atorou-as, lavrou-as e trouxe no muque para o terreiro as toras todas. Sozinho!
- Quero mostrar a esta paulama quanto vale um homem que tomou remédio de Nha Ciência, que usa botina cantadeira e não bebe nem um só martelinho de cachaça.

O italiano via aquilo e coçava a cabeça.
- Se eu não tropicar direito, este diabo me passa na frente, Per Bacco!

XII

Dava gosto ver as roças do Jeca. Comprou arados e bois, e não plantava nada sem primeiro afofar a terra. O resultado foi que os milhos vinham lindos e o feijão era uma beleza.

O italiano abria a boca, admirado, e confessava nunca Ter visto roças assim.

E Jeca já não plantava rocinhas como antigamente. Só queria saber de roças grandes, cada vez maiores, que fizessem inveja no bairro.

E se alguém lhe perguntava:
- Mas para que tanta roça, homem? Ele respondia:
- É que agora quero ficar rico. Não me contento com trabalhar para viver. Quero cultivar todas as minhas terras, e depois formar aqui uma enorme fazenda. E hei de ser até coronel...

E ninguém duvidava mais. O italiano dizia:
- E forma mesmo! E vira mesmo coronel! Per la Madonna!...

XIII

Por esse tempo o doutor passou por lá e ficou admiradíssimo da transformação do seu doente.

Esperara que ele sarasse, mas não contara com tal mudança.

Jeca o recebeu de braços abertos e apresentou-o à mulher e aos filhos.

Os meninos cresciam viçosos, e viviam brincando contentes como passarinhos.

E toda gente ali andava calçada. O caboclo ficara com tanta fé no calçado, que metera botinas até nos pés dos animais caseiros!

Galinhas, patos, porcos, tudo de sapatinho nos pés! O galo, esse andava de bota e espora!
- Isso também é demais, sêo Jeca, disse o doutor. Isso é contra a natureza!
- Bem sei. Mas quero dar um exemplo a esta caipirada bronca. Eles aparecem por aqui, vêem isso e não se esquecem mais da história.

XIV

Em pouco tempo os resultados foram maravilhosos. A porcada aumentou de tal modo, que vinha gente de longe admirar aquilo. Jeca adquiriu um caminhão Ford, e em vez de conduzir os porcos ao mercado pelo sistema antigo, levava-os de auto, num instantinho, buzinando pela estrada afora, fon-fon! fon-fon!...

As estradas eram péssimas; mas ele consertou-as à sua custa. Jeca parecia um doido. Só pensava em melhoramentos, progressos, coisas americanas. Aprendeu logo a ler, encheu a casa de livros e por fim tomou um professor de inglês.
- Quero falar a língua dos bifes para ir aos Estados Unidos ver como é lá a coisa.

O seu professor dizia:
- O Jeca só fala inglês agora. Não diz porco; é pig. Não diz galinha! É hen... Mas de álcool, nada. Antes quer ver o demônio do que um copinho da "branca"...

XV

Jeca só fumava charutos fabricados especialmente para ele, e só corria as roças montado em cavalos árabes de puro sangue.
- Quem o viu e quem o vê! Nem parece o mesmo. Está um "estranja" legítimo, até na fala.

Na sua fazenda havia de tudo. Campos de alfafa. Pomares belíssimos com quanta fruta há no mundo. Até criação de bicho da seda; Jeca formou um amoreiral que não tinha fim.
- Quero que tudo aqui ande na seda, mas seda fabricada em casa. Até os sacos aqui da fazenda têm que ser de seda, para moer os invejosos...

E ninguém duvidava de nada.
- O homem é mágico, diziam os vizinhos. Quando assenta de fazer uma coisa, faz mesmo, nem que seja um despropósito...

XVI

A fazenda do Jeca tornou-se famosa no país inteiro. Tudo ali era por meio do rádio e da eletricidade. Jeca, de dentro do seu escritório, tocava num botão e o cocho do chiqueiro se enchia automaticamente de rações muito bem dosadas. Tocava outro botão, e um repuxo de milho atraia todo o galinhame...

Suas roças eram ligadas por telefones. Da cadeira de balanço, na varanda, ele dava ordens aos feitores lá longe.

Chegou a mandar buscar no Estados Unidos um telescópio.
- Quero aqui desta varanda ver tudo que se passa em minha fazenda.

E tanto fez, que viu. Jeca instalou os aparelhos e assim pode, da sua varanda, com o charutão na boca, não só falar por meio do rádio para qualquer ponto da fazenda, como ainda ver, por meio do telescópio, o que os camaradas estavam fazendo.

XVII

Ficou rico e estimado, como era natural; mas não parou aí. Resolveu ensinar o caminho da saúde aos caipiras das redondezas. Para isso montou na fazenda e vilas próximas vários Postos de Maleita, onde tratava os enfermos de sezões; e também Postos de Anquilostomose, onde curava os doentes de amarelão e outras doenças causadas por bichinhos nas tripas.

O seu entusiasmo era enorme. "Hei de empregar toda a minha fortuna nesta obra de saúde geral, dizia ele. O meu patriotismo é este. Minha divisa: Curar gente. Abaixo a bicharia que devora o brasileiro..."

E a curar gente da roça passou Jeca toda a sua vida. Quando morreu, aos 89 anos, não teve estátua, nem grandes elogios nos jornais. Mas ninguém ainda morreu de consciência tranqüila. Havia cumprido o seu dever até o fim.

XVIII

Meninos: nunca se esqueçam desta história; e, quando crescerem, tratem de imitar o Jeca. Se forem fazendeiros, procurem curar os camaradas da fazenda. Além de ser para eles um grande benefício, é para você um alto negócio. Você verá o trabalho dessa gente produzir três vezes mais.

Um país não vale pelo tamanho, nem pela quantidade de habitantes. Vale pelo trabalho que realiza e pela qualidade da sua gente. Ter saúde é a grande qualidade de um povo. Tudo mais vem daí.
–––––––––––––––––––––––––-
Nota:
Este conto foi adotado como peça publicitária do Laboratório Fontoura. Adaptado em história em quadrinhos ou na forma de folheto, ou ainda fazendo parte de almanaques, teve até os anos 60 uma tiragem de cerca de 18 milhões de exemplares. Há testemunhos de que sua leitura transformou a vida de muita gente.

Fontes:
http://www.projetomemoria.art.br/MonteiroLobato/bibliografialobatiana/bibliot.html
Imagem = http://listasliterarias.blogspot.com

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n.75)


Trova do Dia

Quando este povo latino
não mais viver nesta arena,
o natal de um tal menino
terá, sim, valido a pena.
CONCEIÇÃO A. C. DE ASSIS/MG

Trova Potiguar

Muito obrigado, Senhor,
pelo Natal de Jesus:
que na terra reine o amor,
muita paz e muita luz!...
JOAMIR MEDEIROS/RN

Uma Trova Premiada

2002 > Garibaldi/RS
Tema > Natal > M/H

Para o Natal ser perfeito,
repleto de amor e luz,
enche de afeto o teu peito
para receber Jesus.
ANTONIO JURACI SIQUEIRA/PA

Uma Trova de Ademar

Tenho pena da criança
que, num cruel desvario,
enche de desesperança
seu sapatinho vazio!
ADEMAR MACEDO/RN

...E Suas Trovas Ficaram:

Natal... repicam os sinos...
banha-se o mundo de luz...
Há nos lábios dos meninos
o sorriso de Jesus!
COLBERT R. COELHO/MG

Estrofe do Dia

Bom seria se o Natal,
fosse um natal diferente;
não fosse somente luz,
papai Noel e presente;
mas a estrela da bondade,
mandasse a felicidade,
para o lar de toda gente.
LUIZ DUTRA/RN

Soneto do Dia

– Auta de Souza/RN –
NATAL.

É meia noite ... O sino alvissareiro,
lá da igrejinha branca pendurado,
como num sonho místico e fagueiro,
vem relembrar o tempo do passado.

Ó velho sino, ó bronze abençoado,
na alegria e na mágoa companheiro!
Tu me recordas o sorrir primeiro
de menino Jesus imaculado.

E enquanto escuto a tua voz dolente,
meu ser que geme dolorosamente
da desventura, aos gélidos açoites ...

Bebe em teus sons tanta alegria, tanta!
sino que lembras uma noite santa,
noite bendita mais que as outras noites!

Fonte:
Ademar Macedo

Monteiro Lobato (Emília no País da Gramática) Capítulo XVII: Epílogo

Quando Emília voltou para onde se achavam os meninos, viu-os em preparativos para o regresso. Estavam com uma fome danada.
— E o Visconde? — indagou ela. — Apareceu?

— Está aqui, sim — respondeu Pedrinho —, mas nega a pés juntos que haja furtado o Ditongo.

Emília aproximou-se do velho sábio, que tinha uma bochecha inchada de dor de dente.

— Então, onde está o Ditongo, Senhor Visconde? — interpelou ela, de mãozinha na cintura e olhar firme.

O pobre fidalgo pôs-se a tremer, todo gago.

— Eu. . . eu. . .

— Sim, o senhor mesmo! — disse Emília com vozinha de verruma. — O senhor raptou o Ditongo Ão e escondeu-o em qualquer lugar. Vamos. Confesse tudo.

— Eu. . . eu. . . — continuava o fidalgo, que não sabia lutar com a boneca.

Emília refletiu uns instantes. Depois agarrou-o e fê-lo abrir a boca à força. O Ditongo furtado caiu no chão. . .

— Vejam! — exclamou Emília, vitoriosa. — Ele tinha escondido o pobre Ditongo na boca, feito bala. Que vergonha, Visconde! Um homem da sua importância, grande sábio, ledor de álgebra, a furtar Ditongo. . .

— Eu explico tudo — declarou por fim o Visconde, muito vexado. — O caso é simples. Desde que caí no mar, naquela aventura no País da Fábula fiquei sofrendo do coração e muito sujeito a sustos. Ora, este Ditongo me fazia mal. Sempre que gritavam perto de mim uma palavra terminada em Ão, como Cão, Ladrão, Pão e outras, eu tinha a impressão dum tiro de canhão ou dum latido de canzarrão. Por isso me veio a idéia de furtar o maldito Ditongo, de modo que desaparecessem da língua portuguesa todos esses latidos e estouros horrendos. Foi isso só. Juro!

Emília ficou radiante de haver adivinhado.

— Eu não disse? — gritou para os meninos. — Eu não disse que devia ser isto?

E para o desapontadíssimo fidalgo:

— Pegue o Ditongo e vá botá-lo onde o achou. Você não é Academia de Letras para andar mexendo na língua. . .

Meia hora mais tarde já estavam todos no sítio, contando ao Burro Falante o maravilhoso passeio pelas terras da Gramática.

.•.•´¯`•.•. ( FIM ) .•.•´¯`•.•.

Fonte:
LOBATO, Monteiro. Emília no País da Gramática. SP: Círculo do Livro. Digitalizado por http://groups.google.com/group/digitalsource