quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Ademar Macedo (Mensagens Poética n. 496)

Monte do Galo - Carnauba dos Dantas/RN

Uma Trova de Ademar

Sem ter interlocutores,
aos Trovadores, diria:
quem faz trovas, são doutores,
com mestrados em poesia!!!
–ADEMAR MACEDO/RN–

Uma Trova Nacional


“Mãe-Natureza!” – eis o nome
de quem, em nome do amor,
gera o fruto e estanca a fome
do seu próprio predador!
–JOSÉ OUVERNEY/SP–

Uma Trova Potiguar


Certo vaqueiro, tristonho,
já vencido pela idade,
afaga, como num sonho,
seu alazão – a saudade...
–REVOREDO NETTO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


Tão calmo e frio eu te vejo,
que tristemente recordo:
acordava com o teu beijo
e hoje nem vês quando acordo...
–NYDIA IAGGI MARTINS/RJ–

Uma Trova Premiada


2009 - Cantagalo/RJ
Tema: SERTÃO - 6º Lugar

Sou sertanejo e não nego
crestei meus pés neste chão.
Nestas marcas que carrego ,
carrego o próprio sertão!
–PROF. GARCIA/RN–

Simplesmente Poesia

Não Sei
–ROLDÃO AIRES/SP–


Não sei se são os teus olhos,
ou se o teu jeito inocente,
faz com que eu sinta, pelo
meu corpo inteiro, algo que
não sentia, alguma coisa
diferente.
Me pego às vezes, pelos cantos
a falar, palavras que há muito
não dizia.
Sinto que renovo-me,
que procuro uma maneira,
de poder vir a possuir um novo
sonho para ser vivido,
um novo amor, que dentro tenho,
e não pode ser contido.

Estrofe do Dia

Sinto falta da voz de Gonzagão
decantando a canção "TRISTE PARTIDA"
que retrata a família e sua vida
apos retirar-se do Sertão.
Já não ouço Luiz Rei do Baião
cantando "DEPOIS DA DERRADEIRA"
Dominguinhos, sanfona de primeira
Genival e o "ROCK DO JUMENTO";
Precisamos fazer um movimento
Em defesa da música Brasileira.
–RODRIGUES LIMA/SP–

Soneto do Dia

Tempo de Amar
–JOSÉ LUCAS DE BARROS/RN–


Se a gente olhar a vida com carinho,
inda que more embaixo de uma ponte,
verá flores à margem do caminho
e sorrisos de estrelas no horizonte.

Quem sabe ouvir o borbulhar da fonte
e o sereno trinar de um passarinho
já não se entrega à dor, mesmo defronte
de ingratidões, de pedras e de espinho.

Nem a velhice pesa, quando a gente
se faz jovem no espírito e na mente,
cultivando a alegria de viver,

e, na existência pecadora e santa,
escuta a voz de um coração que canta
o amor que o tempo não logrou vencer.

Teatro da Terra (O Ciclista, de Karl Valentin) 1 a 11 de Março


Maria João Luís encena e encarna Karl Valentin, autor maior da dramaturgia alemã.

Valentin, artista dos sete ofícios cria, fotografa, representa, filma, escreve, enquanto a sua Alemanha atravessa duas guerras mundiais, sempre atento ás dificuldades que um pais em guerra impõe, sem se conformar com a tendência que a propaganda nazi alinhava com a superioridade da raça ariana, foi por isso censurado e esquecido. Só a partir dos anos 70, com traduções francesas, é redescoberto e reconhecido como um dos maiores autores cômicos de sempre.

O Teatro da Terra leva à cena o seu humor corrosivo e irreverente para que não caia outra vez no esquecimento, este talento gigante, muitas vezes apelidado como o Charles Chaplin dos dadaístas de Munique.

de 1 a 11 de Março

4ª a Sábado às 21h30 | Domingos às 16h00


Teatro Cinema de Ponte de Sor

Info e reservas
967 710 598 | 242 292 073
teatrodaterra@gmail.com

bilhetes preço único: 7€

texto Karl Valentin
tradução Maria Adélia Silva Melo e Jorge Silva Melo
encenação Maria João Luís
com Inês Pereira, Maria João Luís, Pedro Mendes, Joaquim Rocha, João Fernandes
cenografia Maria João Luís
figurinos Maria João Castelo
dir. produção e luz Pedro Domingos


Com os melhores cumprimentos
Pedro Domingos
(Direcção de Produção)


TEATRO DA TERRA
CENTRO DE CRIAÇÃO ARTÍSTICA DE PONTE DE SOR, CRL
Herdade do Colmeal, Ribeira das Vinhas
7400-070 Galveias
+351 967 710 598
teatrodaterra@gmail.com | https://teatrodaterra.wordpress.com

Escritório de Produção
Av. da Liberdade, 64
7400-218 Ponte de Sor
+351 242 292 073

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

J. G. de Araújo Jorge (Uma Casa na Lembrança)


Com a mecanização avassalante da vida moderna, muitas vezes me pergunto qual será a imagem do lar do futuro?

A dona-de-casa trabalha fora, absorvida por mil e uma preocupações estranhas ao seu tradicional mundo doméstico; desaparecem as empregadas; os apartamentos se resumem a cubículos, com peças únicas, escamoteáveis, armários embutidos, sofás e poltronas-camas, quitinetes; aparelhos elétricos capazes de improvisar papas liquidificadas à guisa de refeições. Os filhos amontoam-se em camas-beliches, em espaços exíguos de camarotes de navio.

Amanhã, numa sociedade-síntese, em que se unirão as conquistas do conforto capitalista ao sistema de vida socialista, como sobreviverão o homem, a mulher e os filhos?

Francamente, não sei se serão agradáveis as casas dos nossos tetranetos. E quando digo casa, na me refiro apenas ao espaço onde nos recolhemos depois da luta de cada dia, mais justamente aos elementos humanos que a compõem e que, somados, transforma a casa em lar.

Confesso que não gosto de imaginar essa casa solitária, despojada de tantos valores tradicionais, espécie de robô habitado, onde as coisas acontecem sumariamente, a simples toques mágicos, sem a presença necessária e o calor da convivência humana.

Lembro-me de como me senti, certa vez, num pós-operatório, imobilizado num leito de hospital, ligado por tubos que me alimentavam e satisfaziam necessidades, numa cama que se mexia por mim.

Temo que a casa do futuro desumanize o homem. Tire-lhe uns restos de paisagem que ainda resistem como decoração. A intromissão da máquina em nossa vida particular vai reduzindo ao mínimo as perspectivas desse poético mundo prosaico que é o mundo de nossas casas, tão rico de belezas singelas em seu aconchego e em sua tranqüilidade.

A casa do futuro talvez acabe tornando o homem mais solitário que o faroleiro, montado numa penha perdida, em mar alto.

E como será esse homem que prescinde de seus semelhantes, que vive cercado de instrumentos, alimentando-se de pastilhas, procriando por inseminação artificial, em companhia de seres que estarão mais longe de seu espírito que os planetas de seu universo?

Não acredito que a dona-de-casa feliz seja a dona-de-casa sem casa, sem empregadas, para quem os afazeres naturais que constituem a sua vida e a sua alegria se transformem em gestos mecânicos, em atos frios e automáticos.

Eu, por mim, gosto das casas grandes, antigas, impregnadas de histórias, de tradições. Numa delas deixei minha infância, minha adolescência. E quando falo de casas antigas, lembro-me da casa de meu avô, o casarão dos Tinoco, na Rua da Piedade, em Bota-fogo. Está num poema:

“Me lembro da minha rua
velha rua da Piedade
Mudou pra Clarice Índio
Clarisse Índio do Brasil;
o nome de alguma dama
muito importante, quem sabe?
Muito importante, quem viu?”

(A Outra Face).

Bem que o guardo na memória, abrindo suas janelas altas, com grades de ferro, para a rua; o jardim lateral, a grande amendoeira, as acácias; e ao fundo, como uma vaga reminiscência das senzalas, as casas das empregadas. E me ocorrem visões de nossa velha aristocracia patriarcal.

Os romances de Manuel de Macedo e de Alencar fixaram para sempre os aspectos e a paisagem dessa sociedade de fins do século passado. Casas com telhados coloniais; janelas com gelosias românticas; amplas varandas com cadeiras de balanço, com redes preguiçosas, arrastando franjados no assoalho; quintais com uma infinita variedade de árvores, cada vez mais raras: abieiros, caramboleiras, sapotizeiros; salas-de-visitas com lustres e candelabros como jóias cintilantes, espelhos bisotês, estofados rococós; uma quantidade de quadros, salas, corredores, onde os filhos dos senhores brancos andavam de cambulhada com toda uma gama de mulatinhos vivos, filhos das escravas, das mucamas, às vezes com o senhor branco, cuja elástica moral era a do “faça o que eu digo e não o que eu faço...”

O casarão do meu avô Tinoco era, evidentemente, mais recente, mas recendia a sociedade patriarcal, quase ao tempo dos “sinhôs” e das “sinhás”, quando os maridos tratavam respeitosamente as esposas por Vossa Mercê... Lá estava, junto ao quarto de dormir, o oratório dedicado a Nossa Senhora da Conceição, com a candeia de azeite sempre acesa, as jarras com flores, a palha benta.

E a copa e a cozinha, enormes, fervilhantes de empregadas e tias (nesse tempo eu tinha 16!) nos dias de festas, onde pontificava a Maria Cozinheira e seus quitutes! Minha infância está presa à memória pelo paladar. Falar nela é ficar com água na boca, e lembrar-me da hora do lanche, quando a grande mesa da sala-de-jantar (nosso reino encantado!) ficava rodeada por minha avó, tias, primos, primas e suas amigas. Lá estavam os biscoitos de polvilho, os rocamboles, os pãezinhos de minuto, de bolos, as tortas, por entre bules fumegantes de chocolate, café, chá, leite. E nos aniversários e festas vinham os quindins, canudinhos de coco, baba-de-moça, as ameixas recheadas, bolos de nozes, que sei eu?

Sim, ficou-me no coração a nostalgia das casas-grandes, povoadas pelo bulício e a algazarra de tantos parentes e amigos, numa época em que as próprias empregadas como que faziam parte da família também. Até hoje com a carapinha algodoada, ainda vive a Maria Cozinheira, mãe-preta de nossa infância, que recorda com os olhos marejados de lágrimas aquele tempo. E não me esqueci também da Juventina, da Conceição, da Adriana, e até das babás, moças e roliças, que me ajudaram em algumas primeiras “lições de coisas...” Não sei como serão as casas do futuro, cada vez mais apartamentos, ou “apertamentos”. Mas não trocaria, por nada deste mundo, algumas das casas da minha infância, intactas, de pé, nas ruas da memória e do coração.

As casas são como seres que nos envolvem, com suas paredes, nos abrigam e protegem; nos falam; partilham de tantos dos nossos momentos; nos amam e passam, e às vezes morrem, como entes queridos.

Assim ficou o velho casarão de meu avô Tinoco: não como uma casa comum, mas como a lembrança de um primeiro amor, ideal que nunca se esquece e que não morre nunca!

Fonte:
JG de Araujo Jorge. "No Mundo da Poesia " Edição do Autor -1969

Ademar Macedo (Mensagens Poética n. 495)


Uma Trova de Ademar

A minha fé não se abala
e sinto uma força estranha
toda vez que alguém me fala
sobre o sermão da montanha!...
–ADEMAR MACEDO/RN–

Uma Trova Nacional

A mentira mais fingida
que aprendi desde criança,
foi ouvir, que pela vida,
quem espera sempre alcança!
–EDUARDO A. O. TOLEDO/MG–

Uma Trova Potiguar

Gotinhas d'água na aurora
sobre a mata destruída,
traduzem pranto que chora
a Natureza agredida.
–CLARINDO BATISTA/RN–

...E Suas Trovas Ficaram

Pelo tamanho não deves
medir valor de ninguém.
Sendo quatro versos breves
como a trova nos faz bem.
–LUIZ OTÁVIO/RJ–

Uma Trova Premiada

2009 - Cantagalo/RJ
Tema: SERTÃO - 13º Lugar


Este silêncio enlutando
de cinzas o pobre chão...
é a voz do sertão chorando
a morte da plantação.
–VANDA FAGUNDES QUEIROZ/PR–

Simplesmente Poesia

Quem
–ISABEL CÂMARA/MG–


Quem diante do amor
ousa falar do Inferno?
Quem diante do Inferno
ousa falar do Amor?
Ninguém me ama
ninguém me quer
ninguém me chama de Baudelaire.

Estrofe do Dia

Como a onda que bate e deixa espuma
teu encanto chegou de sobressalto
invadindo meu mundo de assalto
como o vento que passa e deia a bruma;
teu sorriso me acalma e me perfuma
transformando meu mundo mais perfeito,
se te amar demais é meu defeito
mas a alma se sente aliviada;
teu olhar é trovejo de invernada
que inunda a vazante do meu peito.
–HÉLIO CRISANTO/RN–

Soneto do Dia

Mocidade Efêmera
–DIAMANTINO FERREIRA/RJ–


Reparaste, algum dia – na fumaça
que de um cigarro evola – em espirais?...
não poderás em breve vê-la mais,
de célere e fugaz que ela esvoaça...

Mas, nesse breve instante, à mente lassa,
quanta saudade e sonhos divinais
que tu não podes esquecer, jamais,
não vêm, enquanto aquele fumo passa!...

E assim, tão breve quanto o fumo, a vida
passa tão rápida e despercebida
que o nascimento e a morte são rivais;

tudo se esvai, tudo sucumbe e passa;
e parte, junto aos rolos de fumaça,
a mocidade – que não volta mais!...

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Alerta Sobre as Postagens

Esta semana, em virtude de que estarei mudando de residência, as postagens poderão ser irregulares. Procurarei ao menos manter uma certa regularidade, dentro do possível das Mensagens Poéticas do Ademar Macedo, para que não fiquem muito desatualizadas.

Espero a compreensão dos leitores do blog, caso ocorra algum dia sem postagem.

Estando instalado na nova residência, volto às postagens normais.

Aproveito este para solicitar aos irmãos trovadores de Minas Gerais que me enviem suas trovas ou dos trovadores mineiros falecidos ou não, para o lançamento do Minas Gerais Trovadoresco.

Obrigado
José Feldman

J. G. de Araújo Jorge (Um "Quadro " de Rimbaud)

Escrevi uma vez: um poema, um quadro, uma estátua, uma partitura, existem, têm vida própria, como um organismo, independente do artista que os criou.    Na realidade,  um poema tem sangue, nervos, coração, voz, alma, fala, comove, tal como ser, tal como o próprio homem. Daí um poeta chileno, Vicente Huidobro ter afirmado:

    “Um poema és um poema, tal como uma naranja és uma naranja y no uma manzana.”

A arte é o reverso da grande criação. Deus morre nos homens todos os dias. O artista se eterniza todos dias, em sua obra. O eterno criou o efêmero; o efêmero cria o eterno. Na realidade tudo é eterno e efêmero:  o artista, mortal, cria “seres” eternos; Deus eterno, cria seres  mortais.

Ocorreram-me estas idéias no dia em que me dispus a realizar as primeiras traduções. Preparava os originais da antologia que publicaria com o título de “Os Mais Belos Sonetos que o Amor Inspirou”.    

Lançaria o primeiro volume, só de sonetos brasileiros,  mas  queria  completar a obra,  com  um  volume de sonetos  estrangeiros.

Nossos leitores têm muito poucas oportunidades de conhecer a poesia de outros povos. Raros podem ler o francês, o inglês, ou mesmo o espanhol. Pedi, pois, a escritores, poetas, meus amigos, que me ajudassem. O que vinha encontrando, já realizado no passado,  pelos poetas românticos  e parnasianos,  era pouco, ou de difícil aceitação.  As traduções encontram-se  eivadas  de preciosismos, palavras mortas, expressões em completo desuso.                                                                  

Desde o momento, entretanto, em que comecei a receber a colaboração de meus amigos, senti-me na obrigação de participar também do livro, não apenas como seu idealizador, mas com alguns trabalhos. Tratava-se de uma experiência inteiramente  nova  para  mim,  mas,  que não se dissesse depois, que eu estava apenas explorando a produção alheia. E pus mãos a obra.                                     

Convenci-me, então, que traduzir é uma tarefa apaixonante. Não se trata de um simples  jogo  de  palavras.Em  sua  realização,  opera-se  uma  verdadeira “reencarnação” literária. Não trocamos apenas o corpo do poema  -suas palavras-,  de  um   idioma  para  outro,  mas  sopramos-lhes  um  novo   espírito,  o nosso, ao tentarmos captar a inspiração do original. E cada poema que sentimos, que se comunica conosco, que de alguma forma se identifica com a nossa sensibilidade, transforma-se num desafio, naquele justo momento em que nos dispomos a trocá- lo por um material diferente, para reconstruí-lo num idioma diverso.                     

Há no trabalho de recriação, todas as alegrias da verdadeira criação.                    

Surpreende-nos a emoção de suas revelações, quando  as vamos  descobrindo, assim como um arqueólogo em suas escavações, saboreando os detalhes do seu achado, um a um, a proporção que o vai vislumbrando.                                          

Foi  o  que  se deu, por   exemplo,  quando  me  dispus  a  escalar  as   alturas rimbausianas, atendendo a um concurso promovido pela página literária de um de nossos matutinos. Tratava-se de traduzir um soneto de Rimbaud; “Lê dormeur du Val”. E a escolha recaira intencionalmente, sobre uma das peças mais difíceis do grande  simbolista,  não  apenas  pela  sua   peculiar semântica poética, mas pela própria complexidade sintática de sua escola literária.                                          

Aceitei o desafio. Estava justamente com a “ mão na massa ”. Mandei a tradução, com um pseudônimo, e afinal para a minha surpresa, “entre mais de mil trabalhos lidos e selecionados”, como acentuou a Comissão julgadora, acabei saindo vencedor.

Eu trabalhava com cuidado. Para me manter, tanto quanto possível, fiel, não apenas à idéia central do soneto, mas à beleza das imagens, e a certos detalhes, indispensáveis à visão do conjunto e ao efeito final. E porque tentei reproduzir o ritmo dos versos, tive que sacrificar alguns elementos clássicos: adotei versos brancos (sem rimas, portanto), e não respeitei a cesura interna dos alexandrinos. No que diz respeito, aliás, a tonicidade, Rimbaud adotou liberdades que eram comuns entre os simbolistas.

Mas o soneto é uma pequena obra-prima. E Rimbaud, nele, não é apenas o poeta, mas  se desdobra  no  músico  e   no  pintor,  pela  sonoridade  de   alguns vocábulos, suas relações dentro dos versos, e pelo colorido do quadro esboçado.

Sim, trata-se de um pequeno quadro, descrito por um passeante, que avista a cena à distância, vai se aproximando encantado, e... o imprevisto final. O leitor o acompanha  despreocupado,  e  participa  da  emoção   do poeta  ante o desfecho surpreendente. Eis o “encontro” com                                                                       
LE DORMEUR DU VAL

C’est un trou de verdure, où chante une rivière
accrochant follement aux herbes des haillons
I’argent, oú le soleil, de la montangne fière
luit. C’est un petit val qui mousse de rayons.

Un soldat jeune, bouche ouverte, tête nue
et la nuque baignant dans le frais cresson bleu,
dort; il est étendu dans l’herbe, sous la nue,
pâle dans son lit vert où la lumière pleut.

Les pieds dans les glaïeuls, il dort. Souriant comme
sourirait un enfant malade, il fait un somme.
Nature, berce-le chaudement: il a froid!

Les parfuns ne font pas frissonner sa narine;
Il dort dans le soleil, la main sur sa poitrine,
tranquile. Il a deux trous rouges au côté droit.
    E a tradução:
O ADORMECIDO DO VALE

É uma clareira verde, onde canta um riacho
prendendo alegremente às ervas seus farrapos
prateados; onde o sol da orgulhosa montanha
brilha. É um verdadeiro a espumar claridades.

Um jovem soldado, a boca aberta, e a cabeça
descoberta a molhar-se na erva fresca, azul,
dorme; está estirado ao chão, a céu aberto,
pálido no seu leito verde, à luz que chora.

Os pés nos lírios roxos, dorme. E sorri como
sorriria uma criança enferma, em sono leve.
Natureza. - aconchega-o bem: êle tem frio!

Os perfumes não mais lhe excitam as narinas;
Dorme ao sol; tem a mão abandonada ao peito.
Dois rubros orifícios sangram-lhe à direita.

Repito: uma tradução é uma estranha e singular “reencarnação” em palavras.

Ninguém discutirá, está claro, que o original é o original, a cópia a cópia, a tradução a tradução. Mas, na medida do possível, quando as figuras de linguagem, as  imagens,  são  reconhecíveis;  quando  as   palavras  comunicam,  e t êm correspondentes nos dicionários; quando suas combinações fixam símbolos e realidades subjetivas universais, sem projeções esotéricas ou hermetismos pessoais,  uma  tradução pode  ser   tentada, de poeta para poeta, com bons resultados. Mas, só entre poetas. Como no caso de uma “transfusão” de sangue, só possível com sangues do mesmo tipo.                                                                 

Então vale a pena tentar.

Fonte:
JG de Araujo Jorge. "No Mundo da Poesia " Edição do Autor -1969

Gladis Deble/RS (Livro de Poemas)

BIOGRAFIA

Se o espelho conservasse as imagens
Eu desfilaria sem roupas
por extensas paisagens
mas o espelho não tem memória.
Não retém o formato dos corpos,
tão pouco devolve o feedback
das histórias vividas.
Da aparência de ontem
nem a sombra,
Na dispersão dos ventos
nenhum oi.
No pequeno infinito
do espelho do meu quarto
cruzo as asas...
Ao descer a cortina
pinto a boca distraída,
Não sei porque fui esquecer
a senha desse acesso.
Só os trevos cultivados
em torno da retina
continuam a gravar
minha biografia.

LÁPIS

Emcaixado confortável
bailando entre meus dedos
grava marcas no papel
este objeto delgado.

Fino lenho preparado
com recheio de grafite
traz a história preservada
torna a arte permanente.

A terna função de escriba
que assumo intuitiva,
não mais me torna cativa
dos sonhos que construí.

Seguindo o velho roteiro
dos sonhos que encoragei
Surgiu o esboço vivo,
no poema me libertei.

Esta pequena varinha
que carrego como fada
vai desenhando o caminho
risca o lápis minha estrada.

A POESIA

A poesia salta da idéia
e cria vida própria.
Sonda lugares fantásticos,
descreve outras paisagens

Percorre distantes países
pensa novas matrizes
dança e reluz
como grão de poeira
projetado na luz.

Descreve trajetória errante
esmiuça sentimentos alheios,
redescobre lugares
que nunca esteve,inventa matizes.
Abraça todos os povos,
faz acordos com o insólito.

A poesia saltitante itinerante
navega na rede,traduz signos gravados
para o mundo ela escapa...
depois de cansado seu corpo de letras,
enroscada na folha como bicho inocente
adormece no livro protegida na capa.

PASTORIL

Apascentei rebanhos nas encostas
conduzi os animais a boa aguada
trouxe ramos de alecrim e flor do campo.
Compuz versos singelos na caverna
junto as cabras espiando o chuvisqueiro
e a neblina pondo a capa na campina.

A luzir a lanterna nos caminhos
rodopiei audaz,desviando o precipício
onde rolam pedras sózinhas no desfiladeiro.

A voz do bosque atraente me chamando
para um encontro mágico na fonte
com água transparente e oração
margeiam musgos, fungos na vertente
santuário verde onde em versos pastoris
esparramei minha canção.

GARATUJAS

Da grafite silenciosa
surgem figuras reais,
rabisco na santa paz
imagens do inconsciente.

O desenho em fragmentos
surge livre no papel
faz deliciosos os momentos
pensando num tal rapaz.

O fundo dessa gravura
de tal forma é texturado
que parece usar recursos
da velha xilogravura.

Rabiscos que crio hoje
tentando fazer desenhos
fugiram pela tangente.
E a imagem que eu queria
desmanchou-se em garatujas
virou pequena poesia.

DAS NAVEGAÇÕES...

Se teu olhar oblíquo descobrisse
a viagem que acontece a revelia
eu nem me atreveria a explicar.

Esfarelo versos na ponta dos dedos
adormeço salpicada de vontades
no afã de te encontrar ...

Acarinho certas verdades
escovo a cabeleira revolta
querendo ancorar conforto.

Desdobrada e solitária
sigo a jornada, embora
navegues em mim

Nunca nós dois atracaremos
nossos barcos para dormir
juntos no mesmo porto.
Fonte:
http://gladisdeblepoesia.blogspot.com/

Gladis Deble

Gladis Cleonice Veloso Deble reside em Bagé, RS. Professora de artes e ativista cultural.

Formada em Educação Artística e Artes Plásticas com Pós-graduação em Arte-educação pela Urcamp-Universidade da Região da Campanha.

Foi presidente da AGA Associação Gaúcha de Arte-educação de 1987 até 1990.

Participou da oficina de Arte dramática do CENARTE da Urcamp.

Realizou projetos para a Secretaria Municipal de Cultura Desporto e Lazer como o 'Passeio Poético por Bagé' destacando os locais históricos da cidade e sua rica arquitetura.

Promoveu atividades culturais com jovens na comunidade da Colônia Nova.

Cultura alemã e gaúcha e características do povo da fronteira,[Uruguai e Brasil] no município de Aceguá.

Peça de teatro 'Nós Aceguá e o Meio Ambiente'.

Publicou seus poemas na Antologia da Poemas a Flor da Pele, lançada em Bento Gonçalves no XVII Congresso Brasileiro de Poesia.

É conselheira do CPERS Centro de Professores do Estado do Rio Grande do Sul.

Tem uma página no site;Poemas a flor da pele.ning, e os blogs;www.danacd.blogspot.com www.gladisdeblepoesia.blogspot.com

Nilto Maciel (A Salvação da Alma)

Constantino acordou sobressaltado. Mais um minuto de sono e chegaria atrasado à igreja. O padre estaria nervoso e seria capaz de o mandar embora.

— Você não se emenda, traste — brigava a mulher.

Aquilo acontecia quase todo dia. Saía da igreja e entrava nas bodegas. E bebia feito uma raposa. Insaciado, antes de ir para casa, Constantino pedia uma garrafa cheia e mandava o bodegueiro anotar a despesa. No fim do mês, quando o padre pagasse o ordenado, saldaria a dívida.

E assim era há muitos anos.

— Cala a boca, mulher — gritava.

E se preparava para sair. Mais um dia de muita labuta naquela igreja imensa e sempre cheia de poeira.

Como todo dia, pôs-se a espanar o altar e seus arredores. Nenhum cisco poderia ficar sobre nada. O padre exigia limpeza total. Padre exigente!

Passou aos bancos onde os fiéis se sentavam e oravam. Sempre havia sujeira. E objetos esquecidos: terços, missais, véus, dinheiro, bilhetes.

Imensa igreja para um homem só zelar. Aquele padre era também mesquinho. Podia arranjar mais um zelador. E pagar ordenado maior.

Ninguém, no entanto, falava mal do padre na cidade. Nem mesmo nas bodegas. Todos preferiam falar de si mesmos, dos vizinhos, dos cachorros de rua...

— Como vai a igreja, Constantino?

Além do altar e dos bancos dos fiéis, havia outros lugares e móveis a limpar. Como os confessionários.

E o cansado zelador abriu a portinhola de um dos confessionários. Olhou para o assento de palha. Nenhuma sujeira aparente. Nenhum cheiro de mofo ou peido. Nada a limpar. No entanto, que bom lugar para descansar! E Constantino sentou-se, puxou a porta, abraçou o espanador. Num minuto, virava padre. Do lado de fora do confessionário uma fiel contava pecados. Nem muito graves nem pouco leves.

— A senhora está perdoada.

— Nenhuma penitência, padre Constantino?

— Sim, a senhora vai limpar a igreja todo dia, até o fim de sua vida.

— E tem pagamento?

— Tem: a salvação de sua alma.

Mal ditou a penitência da pecadora, um berro o acordou:

— Constantino, saia já daí, seu preguiçoso!

Dos olhos do padre saltavam chispas de ódio.

Fonte:
MACIEL, Nilto. Pescoço de Girafa na Poeira, contos. Brasília: Secretaria de Cultura do Distrito Federal/Bárbara Bela Editora Gráfica, 1999.

Ademar Macedo (Mensagens Poética n. 494)

Uma Trova de Ademar

Luiz Otávio deu provas
ser bom em verso e poesia;
meu desejo é fazer trovas
como as que Luiz fazia!
–ADEMAR MACEDO/RN–

Uma Trova Nacional


Nesses teus olhos risonhos,
Senti que o amor chegaria...
foram-se os dias tristonhos,
chegaram, os de alegria!
–VICENTE ALENCAR/CE–

Uma Trova Potiguar

As portas do nosso lar
são largas e sempre abertas
para quem necessitar
de ajuda em horas incertas.
–HILTON DA CRUZ GOUVEIA/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


O que ele foi não importa...
Foi alguém que não me quis.
Folha branca, folha morta
de um poema que eu não fiz.
–CARMEM OTTAIANO/SP–

Uma Trova Premiada


2006 - Pindamonhangaba/SP
Tema: RESGATE - M/E


Amor de perdas e danos,
triste contabilidade:
resgate dos desenganos;
sobras de caixa-saudade!
–SELMA PATTI SPINELLI/SP–

Simplesmente Poesia

Mares e Shoppings
               –CARLOS LÚCIO GONTIJO/MG–


Por não saber nadar
O mar eu mal conheço
Nem shopping-center sou de frequentar
Pois na profundidade das águas
Ou na claridade das vitrinas
A chama do espírito humano
Vive o drama de afogar-se.

Estrofe do Dia

Eu já passei tanta coisa
Que na vida nem pensava,
Pra minha felicidade
A mulher que eu procurava,
Deus teve pena de mim
Mostrou aonde ela estava.
–JOÃO LOURENÇO/PB–

Soneto do Dia

Azul
                         –OSCAR MACEDO/RN–


Azul, cor que em meus versos divinizo
e que meu estro definir procura,
azul, cor da inocência e da candura ,
cor da graça infantil, cor do sorriso!

Azul, cor da pureza e da doçura,
cor dos salões, sem fim, do paraíso,
azul, cor que ao fitá-la me eletrizo
por ser das cores, de todas, a mais pura.

Azul é a cor que eu definir quisera,
cor que circunda e que emoldura a esfera,
cor dos céus, cor do mar, cor do berilo!

Azul, cor da safira e da turquesa,
nenhuma outra cor te excede na beleza
cor dos olhos da Virgem de Murilo!