terça-feira, 19 de novembro de 2013

Nilto Maciel (Contistas do Ceará) Oliveira Paiva

Manuel de Oliveira Paiva (Fortaleza, 1861 – 1892), filho de João Francisco de Oliveira e Maria Isabel de Paiva, cursou o seminário e viajou em seguida para o Rio de Janeiro, onde se matriculou na Escola Militar e ali esteve até que a tuberculose pulmonar o obrigou a abandonar os estudos. De volta ao Ceará, se envolveu nas lutas abolicionistas. Foi um dos fundadores do Clube Literário, em 1884. Na revista A Quinzena colaborou assiduamente. Nela estão as ficções que em 1976 resultaram no livro Contos, por iniciativa da Academia Cearense de Letras, com prefácio de Sânzio de Azevedo, que, com Braga Montenegro, os tinha copiado. Na época do Clube escreveu o famoso romance Dona Guidinha do Poço e morreu sem conseguir publicá-lo. Em 1899 José Veríssimo iniciou a publicação, em capítulos, desse romance na Revista Brasileira. Mais tarde, Lúcia Miguel Pereira encontrou o manuscrito sob a guarda do poeta Américo Facó e promoveu a sua publicação pela Edição Saraiva, de São Paulo, em 1952. Era o início da reabilitação pública de Oliveira Paiva. Pouco antes de falecer, em 1889, o escritor publicou em folhetins do jornal Libertador o romance A Afilhada, editada em forma de livro em 1961. Oliveira Paiva escreveu ainda o drama Tal Filha, Tal Esposa, algumas crônicas e poemas.

Os 12 contos são “Corda Sensível”, “O Ar do Vento, Ave Maria”, “O Velho Vovô”, “A Melhor Cartada”, “Pobre Moisés que não o Foste!”, “O Ódio”, “A Barata e a Vela (Fábula)”, “Variação Sobre um Tema de Buffon”, “Ao Cair da Tarde”, “De Preto e de Vermelho”, “De Pena Atrás da Orelha” e “A Paixão”. Publicados em 1887 e 1888, podem ser considerados como exercícios para a elaboração dos romances A Afilhada e Dona Guidinha do Poço. Sânzio de Azevedo ensina: “Todos são unânimes em admitir que o escritor ainda não estava em pleno domínio de suas potencialidades criadoras ao compor os contos estampados n’A Quinzena”.

Sânzio de Azevedo, no estudo “Contos de Oliveira Paiva”, editado como apresentação do livro Contos e no livro Aspectos da Literatura Cearense, analisa as 12 histórias do criador de A Afilhada e conclui: “Quer-nos parecer que ‘Corda Sensível’, ‘O Ar do Vento, Ave-Maria’, ‘A Melhor Cartada’ e ‘O Ódio’ são os melhores contos de quantos escreveu Oliveira Paiva, podendo mesmo redimir o autor de quaisquer falhas porventura encontradas nos demais”.

Muitos historiadores desconheciam os contos de Oliveira Paiva, certamente porque não buscaram as fontes, isto é, não pesquisaram jornais e revistas, nos quais se iniciavam e se iniciam a maioria dos escritores. Em História Concisa da Literatura Brasileira, Alfredo Bosi, por exemplo, não se refere ao contista Oliveira Paiva, embora o considere “prosador terso, que sabia descrever e narrar com mão certeira e intervir no momento azado com talhos irônicos de inteligência fina e crítica”.

Oliveira Paiva se vale de variadas técnicas na composição dos contos, a partir do prisma dramático, como na montagem das três cenas da primeira história, no mesmo palco, como se fosse um drama teatral. Na primeira, uma sala e nela um fardão “enfiado sobre o espaldar de uma cadeira de balanço”. Ao fundo, a janela e parte da rua. Como personagens, a menina Maria (protagonista) e a “filha do cabo de ordens”. Na segunda cena, mais curta, no dia seguinte, a mesma sala, o mesmo fardão, e não mais as meninas, mas a criada, que se espanta diante do estrago feito pelos ratos na roupa do coronel. A última cena, a maior, dias depois, se dá em algum cômodo da casa, e nela as personagens das primeiras cenas aparecem de novo e, ao lado delas, outras, sobretudo os ratos, antes somente mencionados. Não se trata, porém, de conto composto de três células dramáticas. Talvez de drama em três atos.

Esta técnica, a de cenas estanques, separadas pelo tempo e pela substituição e apresentação de personagens, aparece em outros contos.

Nem sempre o espaço da ação em Oliveira Paiva se resume a uma sala, como no primeiro conto. No segundo, esse espaço se abre, se amplifica: um cabeço, a mata cavernosa, além do horizonte, o céu, a lua. Em outro, o mar, as embarcações, em perfeita descrição topográfica.

Uma das ferramentas de linguagem mais frequentes nos contos de Oliveira Paiva é a descrição de ambientes, pessoas e coisas. Não a descrição enfadonha, desnecessária, detalhista, mas aquela capaz de dar ao leitor perfeita visão do objeto descrito. Veja-se a descrição do fardão do coronel, no conto “Corda Sensível”. Ora, a indumentária descrita será como que o objeto principal da narrativa, o alvo dos olhares, dos cuidados de todos, eis que os ratos – personagens fundamentais na história – dele se servirão como objeto de sua sanha.

Um dos pontos culminantes deste livro está em “O Ódio”, em que narração e descrição se mesclam harmoniosamente: a amurada do navio, a gaiola de paus, onde se mantinha aprisionado um tigre, a fera “movendo-se com pés de seda e garbo de mulher”, os marinheiros, o mar – tudo descrito com cores de tempestade, a prenunciar o desfecho trágico – e os homens em movimento, a fera a se debater na gaiola, e, súbito, o entrechoque de embarcações, o tumulto, os olhos do tigre a “bruxulear” nas ondas, a luta do homem com a fera, o fim.

Utiliza Oliveira Paiva, em algumas ocasiões, a narração simultânea de duas ações, como em “A Melhor Cartada”, no qual narra uma procissão do Senhor Morto e, ao mesmo tempo, porque se dá no mesmo tempo, a movimentação de uns jogadores de baralho. O sacro e o profano em paralelas, como também no conto “A Paixão”, em que a cerimônia religiosa é narrada enquanto o narrador, apaixonado, se dilacera – drama psicológico – remoendo o seu amor profano.

O mesmo processo de elaboração narrativa se vê em “Variações sobre um Tema de Buffon”. E também alguns momentos de narração em estado de quase perfeição, como neste trecho, em que um capão sai em defesa de uns patinhos pela primeira vez em banho num açude: “Girava, acima e abaixo, já aflito, a percorrer a trincheira que isolava o abismo líquido. Agachava-se para entrar, recuando hidrófobo; olhava por baixo como galo a brigar; açoutava-se com as moles asas; eriçava a penaria do pescoço, ciscava nervosamente e penicava no chão, a chamar aqueles traquinas, cacarejando, gorgolejando, com a sua tocante responsabilidade de educador e aio”.

Talvez por se tratar de fábula, como a chamou o autor, em “A Barata e a Vela” a narração pura e simples ocorre durante toda a narrativa, não fosse o breve diálogo do narrador com a traça. Esta maneira de escrever não está presente nos demais contos.

Paiva utiliza ora o ponto de vista da terceira pessoa, ora o da primeira. Às vezes esta aparece no plural. Em outras ocasiões a primeira pessoa se oculta na narração, e o leitor tem a impressão de estar lendo sob o foco onisciente. Veja-se “A Paixão”, em que durante quase toda a história a narração parece estar sendo conduzida por narrador onisciente: Uma moça numa varanda a assistir às cerimônias da Paixão de Cristo, a descrição do templo, do ambiente, a multidão de fiéis, as irmãs de caridade, os padres, suas indumentárias, as velas, o tapete, o incenso no ar, o cantochão etc. Durante toda esta narração-descrição não mais aparece a moça, apenas chamada de “ela”, e muito menos o narrador, embora sejam os dois os protagonistas. Somente no final o personagem-narrador ou narrador-testemunha, sem nome também, se apresenta: “Eu ajoelhava prostrado ante a divina figura do Mestre e o meu olhar trespassava-lhe também o coração fonte do amor”. A jovem reaparece furtivamente na narração: “E as duas almas, feitas uma para a outra...” E mais adiante: “E do sudário desaparecera o Jesus sanguinolento, para pintar-se ela com o seu vestidinho preto e as suas pulseiras de ouro, a olhar-me para meu coração soluçante”.

A utilização do ponto de vista em primeira pessoa, seja ela protagonista ou narrador-testemunha, faz de Oliveira Paiva um dos bons elaboradores de dramas psicológicos do seu tempo. Leia-se “Ao Cair da Tarde”: personagens sem nome (um cocheiro, um velho e um moço), uma carruagem a conduzi-los a um cemitério, a descrição minuciosa da estrada, breves diálogos, nada de tragédias, nada de mortes, apesar da visita ao campo santo. Na mesma linha está “De Preto e de Vermelho”, outro drama psicológico. Novamente a descrição se funde à narração, em exemplos de pura arte: “Um sapato pisava na mesa, revirado, entre os livros e os frascos”. O verbo (narração) na mesma frase dos substantivos (descrição). Um personagem sem nome descreve e narra, como se fosse apenas um observador. Ou, então, o narrador é onisciente, sendo o escritor: “Ele (o personagem) sentia atroar pelos salões a pancadaria da quadrilha pavorosa e danada e louca, vermelha como o sangue vivo, e negra como uns olhos que conheço”. Em “De Pena Atrás da Orelha”, que Sânzio de Azevedo analisa como sendo “a continuação do precedente”, também quase não se vislumbra um enredo, uma trama, e em que se percebem até pedaços de frases constantes do outro conto, como “uma capa de rei”, sem contar o tema: Numa quarta-feira de cinzas um rapaz, entre dormido e acordado, rememora cenas do carnaval. Sem querer desmerecer esta composição, há um quê de crônica nela, mormente a partir do parágrafo assim iniciado: “Um belo dia que se alevantava na rua!”, até “... e cegos mendigos, com a mão no ombro dos guias de roupa suja e rota...”

Braga Montenegro vê nos contos de Oliveira Paiva “originalidade sem alarde, a força sugestiva dos símbolos, o inesperado da expressão valorizando os temas, estes muitas vezes perigosos pelo abuso do cotidiano”.

A manipulação da linguagem nos contos de Oliveira Paiva é admirável, mesmo não tendo alcançado ainda, naquele tempo, a maturidade de narrador que culminaria em Dona Guidinha do Poço. Observador atento, impassível, paciente e imparcial, feito a coruja que pousa no mais alto e firme galho da mais alta e robusta árvore, vê, capta as imagens, os movimentos, as falas, os gestos das personagens, a arquitetura do espaço e dos objetos e, sem olhos de julgador – o Bem e o Mal à sua frente –, descreve e narra como artista.

Fonte:
MACIEL, Nilto. Contistas do Ceará: D’A Quinzena ao Caos Portátil. Fortaleza/CE: Imprece, 2008.

Eliana Ruiz Jimenez (Caderno de Trovas)

Abra a porta, deixe a luz
resgatar seu coração.
Vá sem medo, faça jus
a viver nova paixão.

A caridade amplifica
o sentimento cristão,
que tão bem se multiplica
quando é feita a divisão.

Aceita a missão, labora,
que o bom exemplo propala:
não basta erguer uma tora,
é preciso carregá-la.

Acorda cedo o labor
da mãe que põe o café
na mesa do puro amor
e enlaça a família em fé.

Agir certo não tem custo,
sendo a igualdade premissa;
dar sempre ao justo o que é justo:
é assim que se faz justiça!

A prudência é uma balança
que equilibra a nossa vida
ao dosar, com temperança,
a tentação desmedida.

A saudade mais sentida
vem do tempo de estudante:
a melhor fase da vida,
que passa num breve instante.

Bem no alto, aqui estou;
neste ápice, a conquista.
Mas de nada adiantou:
tu não estavas à vista…

Bem-viver não se aposenta,
mostra o mar essa verdade:
casal na faixa dos “enta”
surfa a vida e dribla a idade.

Cada qual com seu quinhão
de tristeza ou de alegria;
bem viver é aceitação
da jornada, a cada dia.

Cai de tapa a Januária
no traste do maridão,
ao saber que a funcionária
ficou “gorda” de um serão.

Caminhar é minha sina,
em campo ou desfiladeiro,
nesta busca peregrina
por um amor verdadeiro.

Chave de casa perdida
por defeito da memória:
- Terceira idade assumida,
já não há escapatória.

Chega ao fim nossa jornada
em cruel bifurcação.
Vou seguir em outra estrada,
deixo aqui meu coração.

Cheiro de terra molhada
é convite à nostalgia
de minha infância encantada
onde morava a alegria.

Como é que pode, hoje em dia,
um homem achar prazer
na farra da covardia
que é ver um boi padecer…

Criança muito levada,
que corre, chuta e sacode…
Que disciplina, que nada:
- Casa da vó tudo pode!

Da janela do avião
aos receios dei um fim;
Deus está na imensidão
e também dentro de mim.

De nossa firme aliança
depende a preservação
do mundo, que é nossa herança,
à próxima geração.

Desfazendo a natureza,
vai o homem construtor
desconstruindo a certeza
de um futuro promissor.

Deu-me as asas o Senhor,
e, ao voar no infinito,
vou buscar meu grande amor,
o meu sonho mais bonito!

Dios es justo y es la salida
para cualquier situación.
El amor es la medida,
si hay fe en tu corazón.

Em pintura impressionista
a primavera desponta:
flores a perder de vista,
cores de perder-se a conta.

Enfrentando a tempestade,
vou remando na ilusão
de encontrar a claridade
que desnude a escuridão.

Enquanto se der endosso
à ganância insaciável,
futuro é fundo de poço
que não tem água potável.

Enveredando o caminho
das trilhas à beira-mar,
o meu pensamento alinho
para a luz eu encontrar.

É hora, Brasil... se agigante,
os céus clamam por um basta.
Só vote em quem o bem plante,
não no que o erário devasta!

É preciso uma aliança
entre o querer e o poder,
pois é só com temperança
que se alcança o bem-viver.

Esqueça o capitalismo
na rua ou televisão.
Natal não é consumismo
é festa de devoção.

Esse mundo feminino
de segredos permeado
é um gracejo do destino
pelos homens odiado.

Esta vida me sequestra
numa espera de ilusão…
- Só o amor tem chave-mestra
para abrir meu coração.

Estrondo, coisa danada,
será trem ou avião?
- Barulho na madrugada
é o ronco do maridão…

Fecha-se o tempo passado,
meia-noite, eu me depuro;
nasce o dia, iluminado,
abre-se o tempo futuro.

Felicidade almejada,
no meu futuro eu diviso:
- Em teus olhos, a alvorada;
no teu corpo, o paraíso.

Fingindo que foi tropeço,
garantiu o seu futuro…
O figurão paga o preço:
pensão para o nascituro!

Hesitei, o trem passou,
e, ao correr pelo seu trilho,
só a poeira me restou
e a lembrança do seu brilho.

Imagens de infindas cores
emocionam o turista:
- Povos, culturas, sabores
passando o mundo em revista.

Já não temos mais fraqueza:
- Fome zero… companheiro.
Olha só pra robusteza
que arredonda o brasileiro!

Jaz latente enternecido
nas vertentes do meu ser
um amor adormecido
esperando efervescer.

Justiça é a busca do bem,
da harmonia em sociedade;
é o respeito que se tem
ao próximo, em igualdade.

Lá no tempo da esperança
o futuro é tão risonho;
não se dá conta a criança
que a vida não é um sonho.

Lua cheia, céu em festa
é um momento inspirador,
nós na rede, uma seresta,
embalando o nosso amor.

Minha alma bailarina
foge em noites de luar...
Sob a luz da lamparina
com a sombra vai dançar.

Não é o homem proprietário
nem senhor da criação;
é somente um usuário
que fez usucapião.

Não mais se comove o homem
com os sons da natureza.
Seus maus instintos consomem
o rio, a mata, a beleza…

Não zombe de minoria
ao fazer trovas de humor;
como sogra é maioria,
use e abuse, sem pudor!

Na vida não busque atalhos;
desvios são ilusão,
nada mais do que atos falhos
que atrapalham a missão.

Nesta vida o encantador,
com maior significado,
dá-se ao cativar o amor
e ao render-se, cativado.

Noite quente, lua cheia,
é receita milenar:
- Paixão louca que incendeia
os casais sob o luar.

No baile dos trovadores
Angelina faz o clima:
provoca tantos calores
que até desconserta a rima.

Nos percalços dessa vida
já deixei muita pegada
como marca dolorida
dos reveses da jornada.

Nossa vida é aventura
de amor incondicional
com sabor de uva madura
à sombra do parreiral.

Nos trilhos vou sem temor
e com fé me determino;
sou trem nos campos em flor
em busca do meu destino.

Nos vales ou nos outeiros
levando a luz da instrução,
escolas são candeeiros
que aplacam a escuridão.

Numa empresa não há ócio
com um bom empreendedor,
mas o lucro do negócio
quem o mostra é o contador.

Numa profusão de cores
vem o outono, sedutor,
inspirar os sonhadores
num convite para o amor.

O amor inspira a vontade
de viver com alegria.
Não importa a tempestade,
cante e dance todo dia.

O futuro do planeta
não é segredo a ninguém;
preserve e se comprometa
que a vida assim se mantém.

O mar de um azul profundo
e as montanhas esverdeadas
são belezas deste mundo,
precisam ser preservadas.

O pedestal de granito,
que me tolhe o movimento,
eu reesculpo no grito
e um novo destino invento.

Os mistérios da conquista,
como olhares, sedução,
são enigmas cuja pista
bem esconde o coração.

Paraíso, Liberdade,
Morumbi, Consolação:
- se for amor de verdade,
tanto faz a direção.

Patrimônio bem cuidado
não é só na aplicação;
tem mais valor partilhado
fazendo o bem ao irmão.

Peço ao mar que não me esconda
em tamanha vastidão:
- Traga logo em sua onda
quem me cure a solidão.

Pensamento irresolvido
remoendo a mesma história:
- um amor não esquecido
reticente na memória.

Perpetuados lado a lado,
em acervo permanente:
são retratos do passado
que decoram meu presente.

Pescador mais esportivo
deixa seu peixe escapar,
melhor solto que cativo,
para assim o preservar.

Pescadores não se enganam
na sua avaliação:
- Redes vazias emanam
do descaso e poluição.

Poetas são pescadores
de palavras e emoção:
fisgam assim seus amores
com os versos da paixão.

Por ser eterno esse amor,
não amedronta a partida;
sendo Deus o condutor,
não existe despedida.

Por uns trocados banais
a extinção tem seu parceiro
na captura de animais
para fins de cativeiro.

Presença no firmamento
em noite clara, estrelada:
- É o amor de Deus que, atento,
nos guarda na madrugada.

Qual um mistério ancestral,
o luar, na vastidão,
ao luzir, tão passional,
ludibria-me a razão.

Quando, ao vestir-se, derrapa
e a falsa amiga a critica,
a resposta é um belo tapa…
mas com luva de pelica.

Quando chega a primavera
as emoções são pueris
e a natureza prospera
no tempo de ser feliz!

Quantas bênçãos recebidas
quando se caminha aos pares:
um ideal, duas vidas,
dois corações similares.

Quem tem amor entardece
em suave balançar,
contemplando o sol que tece
mais um poente no mar.

Rede que volta vazia
traz tristeza ao pescador
que apesar da nostalgia
leva adiante o seu labor.

São forças da natureza,
não se pode fazer nada:
– fogo, vulcão, correnteza…
e a mulher apaixonada!

São Paulo, gigante altiva
em constante agitação
é, em tudo, superlativa
mas cabe em meu coração.

Saudade é uma dor pousada
nos ombros da solidão:
felicidade passada,
vedada a repetição.

Segredos engarrafados
boiando ao sabor do vento…
Corações despedaçados
para os quais não houve alento!

Sentimento irresponsável
perturbando o coração:
- é o amor, força implacável
fez perder minha a razão.

Seu olhar insinuante,
que tanto brilha me atesta:
- Uma fagulha é o bastante
para incendiar a floresta.

Sigo o rumo, vou em frente,
mas não vai adiantar...
Ser feliz está na mente,
decisão ao acordar.

Sol e mar… calor, beleza…
vêm mostrar à humanidade
que o homem e a natureza
têm a mesma identidade.

Só o amor tem o condão
de avivar, resplandecer,
transformando a escuridão
em radioso amanhecer.

Sorria pra natureza,
respeite e sempre preserve,
só assim teremos certeza
que o mundo assim se conserve.

Sorte, aleatório caminho
que cada destino traça:
para alguns, tão farto vinho;
a outros, vazia taça.

Sua luz, como um farol,
me guiou na tempestade:
fez surgir um lindo sol,
que selou nossa amizade.

Tanta pompa na montagem
faz o enlace reluzir;
mas no bolo o enfeite é a imagem
da vida que está por vir.

Todos têm um professor
na memória bem guardado,
que ensinava com amor,
mesmo mal remunerado.

Traz o arco-íris à lembrança
que, ao criar tanta beleza,
Deus nos fez, em confiança,
tutores da natureza.

Triste destino bizarro
de um país na contramão:
alunos chegam de carro;
professor, de lotação.

Trovadores, em verdade,
são irmãos na inspiração,
na partilha da amizade,
no carinho e na emoção.

Um amor que se alardeia
não passa de sonho vão:
é só castelo de areia
escorrendo pela mão.

Uma vida sem amor
é qual comida sem sal:
em ambas falta sabor,
por ausente o principal.

Um barquinho num painel
em cenário tão bonito...
- São meus sonhos de papel
navegando no infinito.

Um casal apaixonado
faz da vida um carrossel
de emoções, desgovernado,
rodopiando rumo ao céu.

Um segredo bem guardado
para assim permanecer
não deve ser partilhado
para nunca se perder.

Urge o tempo, faz-se escasso,
e, ao sofrer na despedida,
o nosso amor, sem espaço,
mostra a vida não vivida.

Valorando o sem valor,
conjugando o verbo ter,
esqueceu-se quanto amor
num ranchinho pode haver.

Vejo no espaço infinito
e em cada constelação
nosso amor nos céus inscrito
como obra da criação.

Vivo sempre a divagar,
no silêncio em que me abrigo:
- Ah que bom poder voltar,
a estar outra vez contigo!

Voa, passarinho, voa,
que gaiola é só maldade.
Livre, lá nos céus entoa
o cantar da liberdade.

Eliana Ruiz Jimenez (Outros Versos)

HAICAIS E TERCETOS

Escritos na PRIMAVERA


Bem-te-vis em pares
preparam ninhos nos postes.
Em alta tensão.

Ah... o impressionismo...
Diante de mim, Monet
emoção etérea.

Rolinhas se enroscam
nas palmeiras do quintal.
Ovinhos à vista.

Trabalho, trabalho.
Formigas em carreirinha
levam folhas verdes.

Vida em tons pastéis
até encontrar seu olhar.
Paleta de cores.

Mais um dia nasce.
E esse amor que me vigia
é a luz da manhã.

Gorjeia em triversos
o trinca-ferro do sul.
Poeta do bosque.

Incessante chuva.
Em dia de escuridão
as luzes acesas.

Dissolve as estrelas
uma luz no firmamento.
O sol da manhã.

Estrelas do mar,
a maré nunca mais trouxe...
Detritos na areia.

Tantos professores
abriram nossos caminhos.
E quem abre os deles?

A sapa sapeca
sapeou pela lagoa.
E engirinou!

Teatro giratório.
Há lugar para sentar
em palco de sonhos?

Escritos no VERÃO

Deixar-se levar
é viajar sem e-tickets.
Pensamentos bons...

O verão, em férias,
acinzenta o céu e o mar.
Guarda-sóis guardados.

Moradas no morro.
Chove muito, chove mais,
morro abaixo, morte.

Boiando no rio
um sofá é entregue ao mar.
E quem vai sentar?

Escritos no OUTONO

Poeta na praia,
voyeur em noite encantada.
Excessos da lua.

Luona no mar
tinge de prata o horizonte.
Presente de maio.

Nuvens versus sol,
luta no ringue do céu.
E quem vencerá?

Lua em perigeu
gera preciosas saudades.
Reflexos no mar.

Voltaram as nuvens,
a luz cansou de brilhar.
Feriado solar.

Perigeu no mar
tinto de prata o horizonte
presente de maio.

Outono abre alas
para o sol quase verão.
Graça da estação.

A luz acanhada
dilui-se em serena alvura.
Procissão de nuvens.

Ameno domingo.
Bocejam as criaturas
na lenta manhã.

Doces caramelos.
Tantos sabores da infância
em tardes sem culpa.

Orgulhoso o sol
ostenta a pinta no rosto.
Passeio de Vênus.

Escritos no INVERNO

O frio de junho.
Casacos livres do armário
desfilam na rua.

Na tarde sisuda,
o vento arrepia as folhas
Chocolate quente.

Os balões no céu
já não são mais inocentes.
Florestas em chamas.

Dia em tons de cinza.
Num ninho de cobertores,
o calor das cores.

Marasmo diário.
Na rede do pescador,
garrafas e latas.

Fios por toda parte
levam notícias e sonhos.
As pessoas ficam.

Na história, o grito
lá nas margens do Ipiranga...
Hoje só detrito.

No carro de som
a propaganda política.
Vai ganhar no grito?
————-

POEMAS

ENCANTAMENTO


Encantamento.
Sobrevoo o mundo real
sem querer pousar.
A brisa leve me leva
sobre um mar de lembranças
da paisagem de sonho.
Dunas intocadas,
águas transparentes.
Verão.
A torre me dá instruções,
aterrissar é necessário.
Vou descendo
devagar, divagando.
Amenizo a reentrada
com um pensamento:
Vou voltar
sempre que puder
sempre que Deus quiser...

PERMITA-SE
O que é o presente
Senão o vão momento
Que o passado já engoliu?

O que é o futuro
Indelével destino
Que não se pode controlar?

Permita-se
Sentir a brisa,
Olhar o horizonte
Esperar a primeira estrela.

Permita-se
Beijar hoje
Não trabalhar
Esquecer as obrigações.

Permita-se
Sorver um bom vinho
Uma boa companhia,
Jogar conversa fora.

Permita-se
Acreditar no amor,
na sorte, no destino
e na bondade das pessoas.

Permita-se.

ESCRITÓRIO
Escritório
Sina de todo dia
Multidão comprimida
Na total monotonia.

A porta fecha
Deixando a vida lá fora
O relógio é moroso
E a saída demora.

Presos na caverna de luxo
Onde o sol não entra
Onde a chuva não molha
E até o ar é condicionado.

Escritório
Robôs de crachás
Sem pensamentos, sem vontade
Sem individualidade.

As melhores horas
De muitos dias
Em troca da breve alegria
Do dia dez.

O MURO

O muro gelado
Separa a cidade
De um lado a mentira
E de outro a verdade.

O muro mesquinho
Divide o amor
De um lado ele é puro
No outro é dor.

O muro pichado
Esconde a alegria
De um lado é noite
De outro é dia.

O muro maldito
Separa os humanos
De um lado carentes
De outro insanos.

O muro é eterno
E faz parte de nós
Deixando os homens
Isolados, a sós.

VEM E VAI

É a onda que vem
Vem e vai.

Como a cheia do rio
Que sobe e se esvai.

É a lua que surge
E depois se retrai.

Como o homem que nasce
Morre e “bye”.

É o ciclo da vida
Vem e vai.

Como o sol que nasceu
Sobe e decai.

É o amor que chegou
Entra e sai.

Mas a dor que deixou
Dói demais.

AGORA

Agora posso respirar
E sorrir
E jantar.

Agora posso ir
Pra um lugar
Divagar.

Agora posso ver
O meu eu
Renascer.

Agora posso parar
De sonhar
E lutar.

Agora estou livre
Para ser
E vencer.

Agora estou bem
Para o ano
Que vem.

MENINO POBRE

Menino pobre
Da noite quente
Abandonado
Menor carente.

Menino pobre
Da noite nua
Necessitado
No olho da rua.

Menino pobre
Do pé descalço
Chutando lata
Pela calçada.

Menino pobre
Menino sujo
Vagando triste
Um moribundo.

Menino inquieto
Girando o mundo
Sem casa e roupa
Sem mãe nem pai.

Menino triste
Pra onde vai
O que vai ser
Quando crescer?

MAR

Ventos
Valsando
Voltam
Vagando
Trazendo
O barulho
Do mar.

Brisas
Soprando
Ondas
Tragando
Fazendo
A beleza
Sem par.

Canários
Cantando
Aves
Voando
Planando
A leveza
Do ar.

Praias repletas
Luzes, atletas
Completam
Essa vida
No mar.

FOSSA

Sai dessa fossa, menina
Que isso não tem remédio
O que está feito é passado
E o passado só leva ao tédio.

Se as coisas dão errado
Se a sorte te despreza
Não fuja, não vá de lado
Vá em frente que não pesa.

Sai dessa fossa, menina
Que chorar não adianta não
A vida tem dessas mesmo
Mas chorar não é solução.

Deixe de caminhar a esmo
Pare de se sentir errada
As coisas acontecem para o bem
Não há mal que resulte em nada.

Existe um horizonte além
Dos conflitos do dia-a-dia
Sai dessa fossa, menina
Olhe em frente e sorria!

TALVEZ

Talvez seja esse
O amor que procurei por toda a vida
Que pedi às estrelas
Que pedi aos santos
Que procurei nos cantos.

Talvez seja esse
O amor que sonhei da despedida
Quando descobri o engano de um amor trocado
E senti o sofrimento sem pecado.

Talvez seja esse
O amor que me fará forte
E de tão forte me fará fraca
Por ter meu coração entregue à sorte.

Talvez seja esse
O amor que me fará feliz
E será firma e será tão sólido
Que poderemos formas nós dois
Um só tronco, uma só raiz.

Talvez seja esse, finalmente
O meu caminho, o meu destino
A chave que libertará do meu peito
Todo o amor que eu tenho para dar
A recompensa por querer tão somente
Partilhar de um sentimento sincero
A realização do simples, porém complexo
Desejo de amar.

Talvez seja esse, talvez…


Fonte:
poesiasurbanasetrovas.blogspot.com

Eliana Ruiz Jimenez (1960)

Eliana Ruiz Jimenez, nasceu em São Paulo, Capital. 

Com formação em Letras e em Direito, exerce a advocacia em Balneário Camboriú/SC.

Ligada a entidades de proteção ao meio ambiente, faz parte da Comissão de Meio Ambiente e Urbanismo da OAB.

Suas incursões literárias vão das crônicas a poesias livres, trovas e literatura infanto-juvenil.

É autora do livro “A tropa do ambiente em a internet do futuro”.

Tem vários trabalhos disponibilizados nos seguintes blogs:

poesiaemtrovas.blogspot.com (Trova-legenda)
elianaruizjimenez.blogspot.com (crônicas)
poesiasurbanasetrovas.blogspot.com (poesias livres e haicais)

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

2º Concurso da IV Etapa Projeto de Trovas Para uma Vida Melhor (Resultado Final) Grupo 1

TEMA:ESCOLA

1º LUGAR

Quisera ver conduzida
a infância que pede esmola,
do negro quadro da vida
ao quadro negro da escola. 
DULCÍDIO DE BARROS MOREIRA SOBRINHO
Juiz de Fora – MG


2º LUGAR

Quando na escola ensinar,
não esqueça, professor:
na grade curricular
deverá constar o amor.
RAYMUNDO DE SALLES BRASIL
Salvador – BA


3º LUGAR

A Fé, a Escola, a Família,   
caminhando de mãos dadas,
são três faróis, em vigília,
iluminando as estradas.
WANDIRA FAGUNDES QUEIROZ
Curitiba – PR


MENÇÃO HONROSA

1.
Qual planta, a Sabedoria,
dentro de um lar nasce e cresce;
para florir, todavia,
sem a Escola não floresce!
ANDRÉ BUENO OLIVEIRA
Piracicaba – SP


2.
A Escola se consolida     
quando o aluno, bem formado,
vai bem na escola da vida
por ter sido preparado!
GLÓRIA TABET MARSON
São José dos Campos – SP


3.
Educação garantida
vem do berço, próprio lar
(melhor escola da vida).
_ Não há quem possa negar.
RUTH FARAH NACIF LUTTERBACK
Cantagalo – RJ


4.
Nela aumentei minha fé 
e aprendi a crer na vida,
eu quero aplaudir em pé
a minha escola querida.
ARGEMIRA FERNANDES MARCONDES
Taubaté – SP


5.
Na escola, o verbo crescer,
se equipara com amar
e o direito de aprender
com o dever de ensinar.
 LUIZ DAMO
Caxias do Sul – RS


 MENÇÃO ESPECIAL

1.
Mais escolas, mais saberes,
mais apreço à Educação,
são ajustes, são deveres
de quem dirige a nação!
RITA MOURÃO
Ribeirão Preto – SP


2.
Luz que ilumina a partida,      
luz que brilha nos caminhos:
os alicerces da vida
são lar e escola, juntinhos...
 MILTON SOUZA
Porto Alegre - RS


3.
A Escola precisa ser
o complemento do lar;
socializar, dar saber
e bons cidadãos formar.
ANGELICA VILLELA SANTOS
Taubaté – SP


4.
Seriam bons os caminhos
dos políticos gabolas
se vendessem seus jatinhos
para construir escolas!
RENATA PACCOLA
São Paulo – SP


TROVA DESTAQUE:

Feliz aquele que ingressa
na escola, em qualquer idade.
– É ali que a gente começa
o voo para a liberdade!     
A. A. DE ASSIS
Maringá – PR


Fonte:
MIFORI

2º Concurso da IV Etapa Projeto de Trovas Para uma Vida Melhor (Resultado Final) Grupo 2

TEMA:ESCOLA
 
1º LUGAR

É na escola que se aprende
muita capacitação,
mas no lar também se acende
a chama da educação.
MARYLAND FAILLACE
Santos - SP


2º LUGAR

Indo à ESCOLA, eu aprendi
como ler, como escrever;
fui pra vida e consegui
vencer com esse aprender.
 TARCÍSIO JOSÉ FERNANDES LOPES
Brasília – DF


3º LUGAR

A escola da vida ensina
uma lição importante:
o saber é luz divina
e a amizade diamante.
LYRSS CABRAL BUOSO
Bragança Paulista – SP


MENÇÃO HONROSA

1. A boa escola melhora
a vida em comunidade
e o dom da pessoa aflora
na sustentabilidade!
MIFORI
São José dos Campos – SP


2.
Toda escola fortalece
esclarece com coragem;
profissão nenhuma esquece,
quem lhe deu sua roupagem.
 MARIA DIVA FONTES RICO
São José dos Campos – SP


3.
Espaço que dá saber,
que abole manipulados,
e estimula o bem-querer:
- escola - abre cadeados !
CRISTINA CACOSSI
Bragança Paulista – SP


4.
Uma escola é na verdade,     
um sonho bom esperado;
não há limite de idade,
é direito assegurado.
NADIR NOGUEIRA GIOVANELLI
São José dos Campos – SP


5.
Escola onde não existe  
Deve-se logo criar.
Se a ignorância persiste,
Onde o mundo vai parar?
DOM ANTÔNIO AFFONSO DE MIRANDA
Taubaté – SP

 MENÇÃO ESPECIAL


 Orgulho Negro era a escola,
um  esforço pessoal.
Hoje estudar é esmola
do governo Federal.
 CLARA VILAÇA ZARUR
São José dos Campos – SP


2.
A leitura? – Ninguém teme!
-A matéria? – É divertida.
A escola, é o nosso Leme,
Orientando... A nossa vida.
MARIA DE LURDES PINTO DE OLIVEIRA
Vila de Óbidos - Portugal


3. 
No “País do futebol”
cheio de “gênios da bola”,
sobejam, homens de escol...
então para que uma Escola?
ADAMO PASQUARELLI
São José dos Campos - SP


Fonte:
MIFORI

2º Concurso da IV Etapa Projeto de Trovas Para uma Vida Melhor (Resultado Final) Grupo 3 – Língua Hispânica

TEMA:ESCUELA
 

1º Lugar

Escuela que me formaste
con el venturoso empeño,
la sed del saber calmaste
en aquel ser tan pequeño
MARIA CRISTINA FERVIER
Argentina


2º Lugar

No es la escuela un edificio
sino una comunidad,
donde artesanos de oficio
nos enseñan dignidad.
ALMENDRA VICTORIA AGUIRRE
Argentina


3º Lugar

En la escuela de la vida
aprender  es la constante,
cada lección recibida
es un gran  paso adelante.
MARIA ELENA ESPINOSA MATA
México

MENÇÕES  HONROSAS:


1.
La escuela planta semillas
en la fértil mente humana,
que la conducen a orillas
de la inteligencia sana.
MARÍA ORETO MARTÍNEZ SANCHIS
España


2.
Esa escuela de mi vida
en el ayer que fui niño,
es amor que no se olvida
la recuerdo con cariño.
GERMÁN ECHEVERRÍA AROS
Chile


3.
La escuela sienta las bases
con la misión de enseñar,
y diariamente en las clases
a la persona formar.
JOSÉ HÉCTOR RODRÍGUEZ
Argentina


4.
Es la escuela en nuestra vida,
mucho más que aprendizaje,
es la estrella amanecida,
que ilumina un largo viaje.
CATALINA MARGARITA MANGIONE
Argentina


5.
El hogar es una escuela
y es un templo del saber
deja en la vida una estela
cumpliendo con su deber.
LIBIA BEATRIZ CARCIOFETTI
Argentina

MENÇÕES  ESPECIAIS:


1.
Hoy recuerdo emocionado
mis años en esta escuela;
son muchos los que han pasado
y estar vivo, me consuela.
CARLOS EDUARDO RODRÍGUEZ SÁNCHEZ
USA


2.
De tus labios he bebido
esa enseñanza de amar,
bella escuela sin olvido
yo te evoco al caminar.
CARLOS M VALENZUELA QUINTANAR
México


3.
Escuela de paz y amor
debe ser el mundo entero
y su lección el clamor
del cariño más sincero.
MANUEL SALVADOR LEYVA MARTÍNEZ
México


4.
Calle es la escuela del crimen
que gradúa delincuentes
con venia de los que oprimen
con cargas inconvenientes.
HÉCTOR JOSÉ CORREDOR CUERVO
Colômbia


5.
Fueron los años de escuela
los mejores que viví,
por que dejaron secuela
con todo lo que aprendí.
AGUSTÍN CARLOS IMAZ ALCAIDE
Francia


Fonte:
MIFORI

Ivan Ângelo (Amores Distantes)

Quem não amou sem, de repente, já não poder trocar um beijo, um olhar, um sim, ou mesmo um não? Amores distantes são fantasmas, presenças incorpóreas, arrepios de vento ou de lembranças – não de toques.

Quem não amou pelo breve tempo de uma viagem, sabendo que ali na frente estava a volta com suas impossibilidades? O alongado tempo da ausência? Como se interpõe um oceano entre dois desejos, como se plantam montanhas, meridianos, paralelos entre duas ânsias de estar junto? Amantes separados têm necessidades que nenhum e-mail alivia, nenhuma carta com beijo de batom ameniza, nenhum telefonema consola – ao contrário: mais apertam o coração e o resto.

Quem não se apaixonou e teve de se afastar, só, deixando para trás um pedaço de si, transformado em metade, roubado do amor por uma transferência do trabalho, uma oportunidade, uma família que se muda? Ou quem, por outro lado, teve de ficar e se resignar, também metade? Duas metades oxidando suas cicatrizes, como laranja partida.

Quem não se enganou, pensando que era fugaz o amor e o dispensou, sem pena de o ver partir? Amor que mais tarde se revelou brasa dormindo sob as cinzas, mas agora sem remédio, pois o preterido se tornara de outra o preferido.

E quem não amou secretamente, por algum motivo?

Já foram mais duros os impedimentos do amor; as distâncias, mais impossíveis de vencer. Filhas eram postas em conventos pelos pais, que queriam matar sufocado algum amor que repudiavam. Até princesas eram encerradas em torres. Hoje princesas namoram cavalariços.

O inconfidente preso Tomás Antônio Gonzaga, o Dirceu de Marília, consolava-se com os poemas que escrevia para a amada no presídio de Vila Rica, impossibilitado de vê-la:

"Nesta cruel masmorra tenebrosa
ainda vendo estou
teus olhos belos,
a testa formosa,
os dentes nevados,
os negros cabelos".

Ou este outro, escrito na prisão da Ilha das Cobras, no Rio de Janeiro, sempre figurando a noiva:

"Nesta triste masmorra,
de um semi-vivo corpo sepultura,
inda, Marília, adoro
a tua formosura.
Amor na minha idéia te retrata;
busca, extremoso, que eu assim resista
à dor imensa que me cerca e mata".

Foi de lá exilado para a África e nunca mais a viu. De tais tormentos não se podem queixar os presos de hoje, nestes tempos liberais que facultam a visita íntima – amor é abraço.

Até impedimentos banais foram cantados, como nesta canção do ano de 1940:
"Oi, eu de cá, você de lá
do outro lado da lagoa
de dia não tenho tempo
de noite não tem canoa".

Boleros, sambas, valsas, modas sertanejas, tangos, blues, baladas, axés, reggaes, rocks – em todos os ritmos as canções falaram de amores
a distância, porque a verdade é que amores venturosos não costumam dar ibope. "Quem parte leva saudade de alguém / que fica chorando de dor."

Há abismos que nós mesmos abrimos, por nos faltar ousadia para dar o passo; há Julietas frustradas em balcões que não galgamos, Romeus vacilantes; há barreiras como a guerra, a doença, o fanatismo, o racismo, o autoritarismo, o casamento, que os apaixonados, mesmo próximos, por fraqueza ou juízo não conseguem transpor – tudo é distância, pois amor é abraço.

– E você, poeta? – pergunto.

– Em outro hemisfério já deixei suspirosas Cristinas, Bárbaras e Ellens, suspiroso fiquei por ausentes Guidas e Vidinhas. Mas houve amores que venceram distâncias e não conseguiram vencer o tempo. E você, cronista?

– Cultivo o amor de convivência. Porque amor é abraço.

Fonte:
http://vejasaopaulo.abril.com.br/revista/vejasp/edicoes/2050/m0153261.html . Obtido no site www.quemtemsedevenha.com.br (desativado)

Nilto Maciel (Contistas do Ceará) Século XIX

Os escritores cearenses se iniciaram na prática da história curta e da literatura em geral muito tardiamente, em relação aos escritores dos centros culturais mais importantes. Segundo Dolor Barreira, “Cruz Filho é mais rigoroso quando afirma que só em 1872 é que se iniciou na Província a vida propriamente literária”.

São muitos os escritores cearenses nascidos no século XIX que escreveram e publicaram contos. Alguns se tornaram nomes muito conhecidos não somente no Estado. Dadas as dificuldades de se publicar livro, a maioria deles nunca conseguiu esse feito. Nem mesmo Adolfo Caminha e Oliveira Paiva, cujos contos foram primeiro publicados em jornais e só muito depois de suas mortes se enfeixaram em livro.

Juvenal Galeno (Fortaleza, 1836-1931), com suas Cenas Populares, de 1871, é um dos primeiros cultores da narrativa curta no Ceará. Este livro deve figurar, segundo Sânzio, “como precursor, ou mesmo como iniciador do conto em nossa terra”.

O segundo nome da história curta cearense, na ordem cronológica, é o de Araripe Júnior. Nascido em Fortaleza, em 1848, faleceu no Rio de Janeiro, em 1911. Sânzio assinala: “escreveu obras de ficção romântica, como os romances O Ninho do Beija-Flor (1874), Jacina, a Marabá (1875), Luizinha (1878)”. No entanto, sua vocação era a crítica literária. Teve editado Contos Brasileiros, em 1868. Sânzio acha “pouco provável que o indianismo desses textos tenha como cenário a paisagem cearense” e, assim, o exclui do rol dos primeiros contistas do Ceará.

Braga Montenegro considera José de Alencar (1829-1877) o primeiro contista cearense: “O ponto inicial da evolução do conto cearense retrai a meados do século 19, se incluirmos os Cinco Minutos e A Viuvinha, reunidos num só volume em 1860 (o primeiro em plaqueta, fora do mercado, em 1856), a despeito da intenção do autor que os denomina romances, na categoria de contos; verdadeiros contos ou novelas que são pelo conteúdo estético, pela duração, pelo grau de poesia e símbolo que encerram”. Sânzio ensina: As duas narrativas de Alencar “nada têm a ver com as letras cearenses”, eis que o cenário de ambas é a então Capital do Império. O segundo, na ordem cronológica, seria Franklin Távora (Baturité, 1842-1888). Autor de alguns romances, em 1861 deu a lume o livro Trindade Maldita, subintitulado “Contos no Botequim”. Sânzio não o considera escritor cearense, mas “nacional ou, quando muito, pernambucano”.

Já no final da penúltima década do século XIX surgem os verdadeiros primeiros cultores da história breve no Ceará, ligados ao Clube Literário (1887-1888): Oliveira Paiva, Francisca Clotilde, José Carlos Júnior e Rodolfo Teófilo. Divulgaram suas peças ficcionais no jornal A Quinzena, daquela agremiação. A Padaria Espiritual, com o jornal O Pão, também revelou diversos contistas. Afirma Braga Montenegro, em “Evolução e natureza do conto cearense”: “A Padaria Espiritual, movimento que melhor se define na produção poética – da msma sorte por que a Academia Francesa se caracteriza pelo ensaio e pela crítica – teve também os seus contistas, dos quais o mais representativo foi Eduardo Saboia, que publicou um pequeno volume intitulado Contos do Ceará (1894).”

Outros nomes conhecidos desse período são Álvaro Bomílcar, Álvaro Martins, Antônio Bezerra, Antônio Sales, Araripe Júnior, Artur Teófilo, Cabral de Alencar, Domingos Olímpio, Eduardo Saboia, Fernando Weyne, Francisco Carneiro, Frota Pessoa, Joaquim Carneiro, José Gil Amora, José Nava, José Carvalho, José Maria Brígido, José Pereira Martins, Leonidas e Sá, Lopes Filho, Manuel Miranda, Marcolino Fagundes, Olímpio da Rocha, Oscar Lopes, Papi Júnior, Pedro Muniz ou Moniz, Quintino Cunha, Roberto de Alencar, Soares Bulcão, Soriano Albuquerque, Tomás Lopes, Ulisses Bezerra e Viana de Carvalho.

Destacam-se, entre tantos nomes, Oliveira Paiva e Adolfo Caminha, ambos tidos como escritores de projeção nacional, embora não tenham publicado livro de contos em vida. Talvez outros de menor projeção tenham escrito histórias curtas até mais belas do que as deles.
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continua...
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Fonte:
MACIEL, Nilto. Contistas do Ceará: D’A Quinzena ao Caos Portátil. Fortaleza/CE: Imprece, 2008.

Lima Barreto (Conto argelino: Hussein Ben-Áli Al-Bálec e Miquéias Habacuc)

(Ao senhor Cincinato Braga)

Antes da conquista francesa, havia, na Argélia, uma família composta de um velho pai doente e seis filhos varões. Desde muito que o pai, devido aos achaques da idade, não se entregava diretamente aos trabalhos da sua lavoura; mas, sempre que o seu estado de saúde lhe permitia, tinha o cuidado de correr as suas terras com plantações, que eram de tâmaras, alfa, oliveiras, laranjeiras, havendo somente uma parte que era destinada à criação de ovelhas, cabras e bezerros. As plantações e a criação estavam entregues a cinco dos seus filhos, pois o mais velho, ele o tinha mandado ao Cairo, para estudar profundamente, na respectiva universidade, a lei do Profeta e vir a ser um ulemá digno e sábio no Corão.

Áli Bâlec Al-Bâlec era o nome desse filho do velho árabe e esteve de fato no Cairo; mas, bem depressa, abandonou o estudo das santas leis de Alâ e do Profeta e procurou a sociedade dos infiéis.

Foi ter nas suas aventuras à Grécia, onde se demorou muito tempo e adquiriu dos gregos muitos hábitos, costumes e vícios. Não se pode em confiança dizer que os atuais sejam bem netos dos antigos; mas são aparentados. A finura e sagacidade dos últimos para abstrações filosóficas, para especulações científicas, para a análise dos sentimentos e paixões, do que dão provas as suas obras de filosofia, as suas criações científicas e as suas grandes obras literárias, empregam nos nossos dias os atuais na mercancia, no tráfico, no escambo, em que sempre procuram, com a máxima habilidade e sabedoria enganar não só os estrangeiros, como os seus próprios patrícios.

No Oriente, só há um traficante que não seja enganado pelo grego: é o armênio. Diz-se mesmo lá: o judeu é enganado pelo grego, mas o armênio engana ambos.

Os turcos, de onde em onde, matam estes últimos aos milheiros, não tanto por motivos religiosos, mas por ódio do comprador cavalheiresco, do homem leal e crédulo, que se vê enganado despudoradamente, e sente que não há, no outro que o ludibriou, nenhum princípio de honra, de lealdade, de honestidade, que as relações entre os homens o exigem.

Ali Bálec AI-Bálec, apesar de ser muçulmano, foi atraído para o meio dos gregos e, com eles, aprendeu as suas espertezas, maroscas e habilidades para enganar os outros. E assim foi que ele andou fora da casa paterna, fazendo o escambo dos mares do Levante, indo de Alexandria para Constantinopla, daí para Jafa, deste porto para Salônica, desta cidade para Corfu, perlustrando todos aqueles mares azuis, cheios de história, de lenda, de sangue e piratas, comerciando e mesmo pirateando quando a ocasião se lhe oferecia.

Ao saber da morte do pai, vendeu logo a feluca que possuia e correu a receber a herança. Coube-lhe uma grande data de terra, coberta de pés de tâmaras, enquanto os irmãos tinham as suas cultivadas com alfa, com laranjeiras, oliveiras e um mesmo recebeu a sua parte em terrenos de pastagens magras, onde pasciam rebanhos enfezados de ovelhas e cabras.

Todos, porém, ficaram contentes com a partilha e iam vivendo. Áli Bálec Al-Bálec trouxera como sua mulher uma israelita que renegara o Talmude pelo Corão, mas, apesar disso, tinha o maior desprezo pelos muçulmanos, aos quais considerava grosseiros, convencendo de tal cousa o marido a ponto dele não dar mais importância aos seus próprios irmãos.

Logo ao voltar ainda os atendia e os visitava; mas a mulher lhe dizia sempre:

— Esses teus irmãos são uns brutos! Parecem mochos! Uns bobos! Que sandálias! O pano das suas chéchias é barato e sempre está sujo! Deixa-os lá!

Aos poucos, devido aos conselhos de sua mulher, Salisa, da sua insistência, ele deixou de procurar os irmãos, fez-lhes má cara, embora os filhos deles viessem de quando em quando, à casa do tio, para ver o primo Hussein, que se ia criando mais pérfido que o pai e mais orgulhoso que a mãe.

Em pouco, Ali ficou inteiramente convencido da sua imensa superioridade sobre os seus humildes e resignados irmãos. Por ter na sua sala um tapete de Esmirna, serem as suas armas de aço de Damasco, tauxiadas de ouro, julgava os seus manos, que se tinham habituado á simplicidade e à modéstia, como inferiores, iguais aos das tribos negras que viviam para além do deserto.

Julgando-os assim, esquecia-se que, enquanto ele viajava, enquanto ele aprendia aquelas cousas finais, os irmãos plantavam, ceifavam e colhiam, para ele aprender.

Além disso, Áli, como falasse alguns patoás levantinos, julgava-se muito mais que todos os do vilaiete e também, por possuir jóias de ouro e pedras caras, valendo muitas piastras, imaginava que tudo podia.

Por esse tempo, chegaram os franceses e o caid apelou para todos, a fim de socorrer o bei com homens e valores. Áli ofereceu uma das jóias do seu tesouro e quase por isso foi empalado. O joalheiro do palácio verificou que as jóias eram inteiramente falsas e, vindo o bei a saber disso, tomou a cousa como afronta e mandou castigar severamente o doador.

Salisa, sua mulher, ficou, ao conhecer a notícia, no mais completo desespero, não porque o marido estivesse em risco de vida, mas pelo fato que a fortuna representada por aquelas jóias não era mais que fumaça. Ali foi solto e jurou que havia de enriquecer de novo. Aceitou sem resistência a dominação francesa e, com alegria, viu que essa dominação trazia uma grande alta para as tâmaras que o seu terreno produzia prodigiosamente.

Seus irmãos, a seu exemplo, aceitaram os francos e continuaram na sua modéstia, observando muito religiosamente as leis do Corão. Áli, já habituado, em pouco se misturou com os infiéis a quem vendia as tâmaras por bom preço e gastava o grosso do rendimento que ia tendo em bebidas, apesar da proibição do Corão, em orgias com os ofidais e funcionários franceses. Construiu um palácio que ele pretendia parecido com aquele do grande califa Harum Al-Rashid, em Bagdá, conforme é descrito no livro de histórias da princesa Xerazade.

Vendo que as tâmaras eram muito procuradas pelos francos que, por elas, pagavam bom dinheiro, por toda a parte começaram a plantar tâmaras; os irmãos de Áli, porém, não quiseram fazer tal, pois sabiam por experiência de seu pai, que, desde que houvesse muitas tâmaras para vender e, não se precisando desse fruto para o nosso comer diário, não era possível que muita gente as quisesse comprar tão caro. Abundando tinham que vendê-las mais barato, para atingir e provocar os compradores mais pobres.

Continuaram com a sua alfa, as suas laranjeiras, a pascer os seus rebanhos, sem nenhuma inveja do irmão que parecia rico e os desprezava. Os seus sobrinhos, de quando em quando, iam às terras do tio e ele, por ostentação, por vaidade e para mostrar riqueza, lhes dava uma libra turca e as crianças voltavam para casa dos pais, dizendo:

— Tio Ali é que é gente! Tem tudo! Como ele é rico, por Alá!

Os seus pais respondiam:

— Cada um se deve conformar com o que Alá lhe dá! É bom que prospere, pois tem família... Deus é Deus e Maomé é seu profeta.

Veio a morrer Áli, quando as tâmaras começaram a cair de preço. Herdou-lhe os bens, além da mulher, o seu único filho Hussein Ben-Áli Al-Bálec que tinha todos os defeitos do pai aumentados com os de sua mãe. Era vaidoso, presunçoso, ávido, desprezando os parentes, para os quais era somítico e avaro, desprezando-os como se fossem animais imundos e tidos em maldição pelas Leis do Profeta. Com os franceses, entretanto, era mais pródigo do que o pai e fingia ter as suas maneiras e usos.

Nas gazetas que começaram a aparecer em Argel, Hussein Ben-Áli AI-Bálec era gabado e, apesar das leis do Corão proibirem a reprodução da figura humana, uma delas lhe publicou o retrato. As tâmaras começaram a descer; e, como Hussein tivesse notícias que, duas léguas próximas, um outro muçulmano possuia uma grande plantação delas, começou a pensar que era esta que fazia descer o preço das suas.

Em Argel, sobretudo no vilaiete de Hussein, personificam-se sempre os fenômenos e a sutileza de um plantador de tâmaras não pode bem conhecer, apesar de raça árabe, o filigranado das induções da economia política... Imaginou logo destruir a plantação e mesmo toda aquela que aparecesse na redondeza. Supôs de bom alvitre ir com alguns homens e queimar os coqueiros. O dono certamente queixar-se-ia ao caide às autoridades francas; e seria uma complicação. Homem de expedientes, lembrou-se de conseguir do capitão francês da guarnição, AL-Durand OU Al-Burhant, a destruição do plantio rival.

Habitualmente, fez-se amigo do rume, encheu-o de presentes, de festas, de bebidas, pois seguia o exemplo de seu pai nesse tocante; e o "cão do cristão" se fez afinal seu amigo. Um dia, depois de uma festa, o militar, que pisava indignamente a terra onde estavam os ossos do seu pai, após muitas queixas de Áli, apiedado do árabe, apressou-se em ir à plantação do vizinho e castigá-lo. Assim fez, com os seus soldados e os ferozes serviçais de Hussein. Houve queixa; o capitão foi punido; mas o saas de tâmaras não subiu nem meio gourde.

As suas finanças iam de mal a pior, a casa magnífica ia dando mostras de ruína e os seus móveis e alfaias deterioravam-se com o tempo. Sua mãe não cessava de censurar-lhe pelas faltas que não lhe cabiam. Ela, com aquela arrogância muito sua e inveja também muito sua, repreendia-o:

— Vês: as tâmaras caem de preço e tu não tomas providência alguma. Os meus não são assim... Mas tens o sangue de teu pai... E verdade que teus tios estão vendendo alfa, oliveiras, gado e laranjas e ganham... Se tu não fizeres esforço algum, ficarás como eles, uns macacos a viver em tocas e a dormir em pelegos de cameiro...

Xmed, o teu segundo tio, ganhou duzentas piastras em azeitonas e ficou contente. Queres ser como ele?

— Que hei de fazer, mãe?

— Pensa; e não fiques aí a chorar como mulher. Saúl chorou? Davi chorou? Só o Deus dos cristãos chorou: Jeová não ama o choro. Ele ama a guerra e o combate, até o extermínio. Lê os livros, os que foram os meus e os teus que são também agora os meus. Lembra-te de Débora e de Judite e eram mulheres!

Hussein Ben-Ali AI-Bálec não podia dormir com a impressão das palavras de sua mãe. O saas de tâmaras continuava a descer de gourde em gourde, e ele só se lembrava de Áli, de Ornar, de todos aqueles de sua raça que as tinham levado em meio século, do Ganges ao Ebro. Mas o saas de tâmaras parecia não temer aquelas sombras augustas e ferozes. Descia sempre.

Certo dia, apareceu-lhe um homem que queria falar a sua mãe, Salisa. Era o irmão dela, Miquéias Habacuc. A irmã e o sobrinho acolheram muito bem tão próximo parente e lhe falaram na baixa das tâmaras que os atormentava. Miquéias, que era homem esperto em negócios, disse para o sobrinho:

— Filho de minha irmã, tens meu sangue, mas não a minha fé nos livros santos da sinagoga; mas teus avós Isaac, Baruc, Daniel, Azaf, Etã, Zabulon, Neftali e tantos outros mandam que eu te auxilie nesse transe da tua vida que é preciosa a eles e a mim, pois ela é deles e também minha. Portanto, tal forem os presentes que tu me fizeres, eu posso purificar-me de ter socorrido um ente que não é de Israel. Dize-o que o rabino me perdoará.

Hussein ficou de pensar e, à noite, conferenciou com sua mãe Salisa.

— Filho, dá-lhe alguns cequins turcos e aquelas jóias falsas que quase custaram a morte de teu pai. Porque — ouve bem — o conselho dele pode ser falaz.

Despertando Miquéias, logo Hussein foi ter com ele e propôs-lhe o escambo. O israelita, ao ver as jóias, nem olhou mais os cequins. Ficou com os olhinhos fosforescentes de tigre na escuridão. Era como se fosse dar um salto de felino. Contou então ao sobrinho como devia proceder.

— Tu que tens o sangue de minhas avós Micaia, que era da tribo de
Jeroboão, e de Azarela, que era da casa de Leedã, ouve, comprarás todas as tâmaras que houver na redondeza, mesmo antes de amadurecerem, ficando elas nos pés. Quando for época de colhê-las, colhê-las-ás todas, guardando em surrões nos armazéns de tua casa e não venderás senão quando te oferecerem um lucro que dê a fartar para gastares...

— Tio amado e sábio: elas não apodrecerão?

— Não importa. As poucas "medidas" em que isto acontecer darão prejuízo, mas tu marcarás o lucro de modo que o cubras.

Hussein Ben-Ali Al-Bálec descansou um instante a cabeça sobre o peito, depois a ergueu de repente e exclamou:

— Falas com a sabedoria do Profeta, Miquéias Habacuc. Que Alá seja contigo!

Miquéias Habacuc, filho de Uriel de Sepetai, não se quis demorar mais e partiu despedindo-se da irmã Salisa e do sobrinho Hussein Ben-Áli AI-Bálec com lágrimas nos olhos, canastras pesadas com os cequins turcos e as jóias falsas com que o sobrinho lhe pagara o seu profundo conselho de economia política hebraica.

Hussein fez o que lhe foi aconselhado; e as tâmaras começaram a ter mais oferta de preço. Vendeu-as com grande lucro no primeiro ano; no segundo, se sentia uma certa resistência no mercado, ele as reteve em grande parte; mas, no terceiro ano, ele teve que comprar a produção e viu que ia aumentando o estoque do que, se pode chamar de valorização das tâmaras. Viu bem que se continuasse a comprar a produção, ficaria com ele demasiado aumentado, a sua fortuna comprometida e que fez? Cedeu. As tâmaras começaram a descer gourde a gourde. Teve uma idéia que um sargento francês lhe indicou. Vendo que elas encalhavam nos seus armazéns e os pedidos cresciam lentamente; vendo, pouco a pouco, os seus coquinhos perdendo o valor, alugou alguns gritadores que berrassem, nas ruas de Argel, a guerreira:

— Vivam as tâmaras! Não há cousa melhor que as tâmaras de Hussein Ben-Áli Al-Bálec!

Nas gazetas, ele pagava anúncios das suas tâmaras, mas não vendia mais que dantes. Deu-as de graça e, como toda cousa dada de graça, elas só agradavam desse modo. Em se tratando de vendê-las, nada! Os surrões de tâmaras aumentavam nos seus armazéns, pois teimava em comprá-las e guardá-las, para que elas não viessem afinal a não valer nada.

O tapete de Esmirna que o pai lhe deixara desfiava-se, empenhou as armas preciosas, também a herança do pai, para comprar mais sacas de tâmaras. Comprou um tapete falso e umas armas vagabundas de um cabila mais vagabundo ainda, para pôr no lugar das antigas preciosidades. Os outros plantadores, que se tinham limitado a colher e vender, iam vivendo das suas modestas plantações; ele, Hussein Ben-Áli AI-Bálec, corria para a ruína certa.

Foi por ai que, novamente, lhe apareceu Miquéias Habacuc, seu tio, homem hábil e esperto nos negócios. Hussein ficou espantado, mas o tio lhe disse:

— Rebento da minha querida irmã, pelo Deus de Abraão, de Israel e de Jacó, não te amedrontes: vendi as jóias por um bom preço a um grego, com o que ganhei duas cousas: dinheiro e a glória de ter enganado um cão dessa espécie. Mas, pelo Eterno! Esta idéia de pagar-me o conselho em jóias falsas não é tua... Isto tem dedo de pessoa inteiramente da minha raça de Mardoc e Malaquias... Isto é de minha irmã! Não foi tua mãe quem...

— Foi. E que fizeste do dinheiro, tio amado da minha alma; socorro da minha vida?

— Emprestei-o aos turcos com bons juros e quando os cobrei, quase me esfolaram. Muito tem sofrido a raça de Israel; mas o que sofri deles, nem contar te posso — ó descendente do grande Al-Bâlec, companheiro de Musa — conquistador das Espanhas!

Acabava de dizer estas palavras, quando entra no aposento em que estavam Salisa, a feroz Judite, a eloqüente Débora — que, ao dar com o irmão, se põe em prantos, exclamando:

— Irmão do coração, sábio Miquéias! Tu que descendes como eu de Micaia, da tribo de Jeroboão, e de Azarela, que era da casa de Leedã, salva-me pelo nosso Deus de Abraão, de Israel e de Jacó — salva-me!

E a feroz Judite e eloqüente Débora chorou não a sua dor, nem a dos outros, mas o dinheiro que se sumia.

Contou, então, Hussein ao tio, como a ruína se aproximava; como a
valorização das tâmaras, no começo dando tão bom resultado, viera a acabar, no fim, em desastre completo.

O velho Miquéias, filho de Uriel de Sepetai, coçou as barbas hirsutas; os seus olhinhos    luziram    naquele    quadro    de    pêlos    cerdosos;    depois,    faiscando-os malignamente, perguntou ao sobrinho:

— Com que dinheiro tu, sobrinho meu; com que dinheiro fizeste a operação?

Hussein disse-lhe que fora com o dinheiro dele e o da sua mãe.

Miquéias Habacuc, judeu de Salônica, homem esperto e hábil em negócios, sorriu com gosto e demora, dizendo após:

— Tolo que és!

— Por quê?

Habacuc assim falou de súbito, logo imediatamente á pergunta:

— Que me darás em troca pela explicação?

— A última bolsa de cequins de ouro que me resta.

— És generoso e grande, sobrinho meu, filho de Salisa, minha irmã, guarda-a. Ganharemos mais. Fizeste mal em empregar o teu dinheiro e o da tua mãe.

Devias empregar o dos outros.

— Como, tio Miquéias?

— Tu não sabes, meu sobrinho, essas operações de câmbio e de banco. Eu as sei. Nós agora vamos organizar a defesa das tâmaras, isto é, impedir que especuladores reduzam à miséria e à desolação esta rica região do Magreb, como dizia o teu grande avô, Al-Bálec. Vamos pedir dinheiro aos seus habitantes, para que não morram de fome e não pereçam à míngua por falta de trabalho.

— Não me darão, tio.

— Dar-te-ão, sobrinho do meu coração; dar-te-ão. Chama teus tios, irmãos de teu pai, e os filhos, e convence-os que devem dar as economias que têm, em moeda, para poderes lutar com os que querem acabar com as plantações de tâmaras do vilaiete. Dize-lhes que se não o fizerem as plantações morrerão, os habitantes fugirão, aqui ficará tudo deserto, sem água e sem pastagens; e os bens deles nada valerão e serão também eles obrigados a fugir, perdendo muito, senão tudo.

— E em troca?

— Tu lhes darás vales que vencerão juros e pagarás os vales em certo prazo.

— Mas...

Nada objetes, meio do meu sangue de Sepetai, mas meu sobrinho
inteiramente. Não sabes o que é a cobiça; não sabes o que é querer ter dinheiro sem trabalhar. Eles aceitarão na certa e, não sendo ricos em breve precisarão de dinheiro.

Eu vou pôr um "bazar" com o saco de cequins d'ouro que te resta e farei saber que desconto esses vales teus, em dinheiro ou em mercadoria. O pouco dinheiro que tens atrairá o deles, tu comprarás tâmaras, mas pagarás em vales que vencerão o juro de dois por cento, mas que eu descontarei a vinte, trinta e mais por cento.

— Se não quiserem descontar, tio que és sábio como o mais sábio dos ulemás, como há de ser?

— Tens o dinheiro dos teus parentes. Em começo, pagarás tudo em dinheiro. Mas teus parentes, precisando de dinheiro, irão, como te disse, procurar-me. Eu os atenderei imediatamente. A fama correrá e ninguém temerá receber os teus vales.

— Compreendo. E as tâmaras?

— Irás vendendo a bom preço e guardando o dinheiro, deixando que uma grande parte apodreça. Tu viverás na pompa, na grandeza, e um belo dia, em vez de eu descontar vales, adquiro-os com ágio. Toda a gente quererá os teus vales e encheremos as arcas de dinheiro.

— E no fim, no pagamento, como será?

— Marcarás um prazo longo, pela festa do Beirão, e daqui até lá teremos tempo de agir.

Hussein Ben-Áli AI-Bálec empregou todas as lábias que lhe ensinou Miquéias Habacuc. Seus tios e primos entregaram-lhe as economias, pois ficaram muito contentes que ele se lembrasse de defendê-los, de impedir a ser completa a miséria. Tio e sobrinho encheram os simplórios homens de todos os afagos, de todas as blandícias, e iniciaram a defesa das tâmaras, que era a própria defesa do vilaiete. Um único não quis entregar as terras de pastagem. Foi o tio que herdara as terras de pastagem. Dissera o velho:

— As tâmaras não são do gosto de todo o mundo e as que se colhem são de sobra para os que gostam delas. Hão de se as vender barato por força, pois são demais.

Hussein Ben-Áli AI-Bálec, porém, deu inicio à sua obra de grande eficácia para todo o vilaiete, ostentando uma riqueza, um luxo e uma magnificência que reduziram, fascinaram a imaginação do povo do lugar e das circunvizinhanças. O seu palácio foi aumentado; as suas estrebarias ficaram cheias de soberbos ginetes do Hedjaz, nas suas piscinas só corriam águas perfumadas — tudo ficou sendo um encanto no seu alcâçar e dependências. A fama de sua riqueza corria por toda a parte e até, em Argel, a branca, a guerreira, seu nome era falado. Dizia a boca do povo:

— Se todos fossem como Hussein Ben-Ali AI-Bâlec conquistaríamos todo o Magreb, expulsando os rumes.

O seu crédito ficou sendo tal que todo o dinheiro que havia naquelas terras entrou para as suas arcas. As tâmaras subiram de preço, de fato; mas pouco. Entretanto, enquanto vendia um terço, guardava dous. Miquéias Habacuc exultava, com os descontos que fazia e com o dinheiro que era trazido para as mãos do sobrinho. Só a irmã, a feroz Salisa, temia o fim e perguntava ao irmão:

— Como pagaremos tantos vales, se já gastamos o dinheiro deles e temos mais tâmaras guardadas que vendidas?

— Cala-te, irmã que és minha. Ai é que está a minha grande sabedoria.

O dinheiro amoedado desapareceu e os vales de Hussein corriam como moeda. No começo equivaliam ao seu valor em cequins; mas, bem depressa, para se comprar com eles um saco de trigo, tinha-se de gastar o duplo do que se gastava antigamente. O povo começava a desconfiar, quando veio rebentar a guerra de Abdelcáder, emir de Mascara. Andava ele precisando de homens e víveres. O emir, que sabia do prestígio de Hussein naquele vilaiete, oferece-lhe alguns milhares de libras turcas, para que mandasse homens.

Miquéias, que sabe do caso, intervém, e propõe que o sobrinho aceite, contanto que o emir lhe compre as tâmaras. O emir acede, paga as mil libras turcas, compra as tâmaras de que não precisava.
E Hussein convence os parentes que devem partir para os goums. Para isso falou como um santo marabute. Antes da festa do Beirão, época que era marcada para o vencimento dos vales, fugia, com a mãe, a feroz Salisa, o tio Miquéias Habacuc, homem hábil e esperto em negócios — cheios todos de ouro, ricos de apodrecer.

No vilaiete a população caiu na miséria, menos aquele tio de Hussein Ben-Áli Al-Bálec, que não quis entrar na defesa das tâmaras. Durante muito tempo, pastoreou as suas ovelhas e tosou os seus carneiros.

Os seus netos ainda hoje fazem a mesma cousa naquele lugarejo argelino, onde as inocentes tamareiras, se não constituem objeto de maldição, são tidas como simples árvores de adorno.

Fonte:
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