sexta-feira, 27 de julho de 2018

Lima Barreto (Quase ela deu o “sim” ; mas...)


JOÃO CAZU era um moço suburbano, forte e saudável, mas pouco ativo e amigo do trabalho. Vivia em casa dos tios, numa estação de subúrbios, onde tinha moradia, comida, roupa, calçado e algum dinheiro que a sua bondosa tia e madrinha lhe dava para os cigarros. Ele, porém, não os comprava; “filava-os” dos outros. “Refundia” os niqueis que lhe dava a tia, para flores a dar às namoradas e comprar bilhetes de tômbolas, nos vários “mafuás”, mais ou menos eclesiásticos, que há por aquelas redondezas.

O conhecimento do seu hábito de “filar” cigarros aos camaradas e amigos, estava tão espalhado que, mal um deles o via, logo tirava da algibeira um cigarro; e, antes de saudá-lo, dizia:

– Toma lá o cigarro, Cazu.

Vivia assim muito bem, sem ambições nem tenções. A maior parte do dia, especialmente a tarde, empregava ele, com outros companheiros, em dar loucos pontapés numa bola, tendo por arena um terreno baldio das vizinhanças da residência dele ou melhor: dos seus tios e padrinhos.

Contudo, ainda não estava satisfeito. Restava-lhe a grave preocupação de encontrar quem lhe lavasse e engomasse a roupa, remendasse as calças e outras peças do vestuário, cerzisse as meias, etc., etc. Em resumo: ele queria uma mulher, uma esposa, adaptável ao seu jeito descansado.

Tinha visto falar em sujeitos que se casam com moças ricas e não precisam trabalhar; em outros que esposam professoras e adquirem a meritória profissão de “maridos da professora”; ele, porém, não aspirava a tanto. Apesar disso, não desanimou de descobrir uma mulher que lhe servisse convenientemente. Continuou a jogar displicentemente, o seu futebol vagabundo e a viver cheio de segurança e abundância com os seus tios e padrinhos.

Certo dia, passando pela porteira da casa de uma sua vizinha mais ou menos conhecida, ela lhe pediu:

– “Seu” Cazu, o senhor vai até à estação?

– Vou, dª Ermelinda.

– Podia me fazer um favor?

– Pois não.

– É ver se o “Seu” Gustavo da padaria “Rosa de Ouro”, me pode ceder duas estampilhas de seiscentos réis. Tenho que fazer um requerimento ao Tesouro, sobre coisas do meu montepio, com urgência, precisava muito.

– Não há dúvida, minha senhora.

Cazu, dizendo isto, pensava de si para si: “É um bom partido. Tem montepio, é viúva; o diabo são os filhos!” dª Ermelinda, à vista da resposta dele, disse:

– Está aqui o dinheiro.

Conquanto dissesse várias vezes que não precisava daquilo – o dinheiro – o impenitente jogador de football e feliz hóspede dos tios, foi embolsando os nicolaus, por causa das dúvidas.

Fez o que tinha a fazer na estação, adquiriu as estampilhas e voltou para entregá-las à viúva.

De fato, dª Ermelinda era viúva de um contínuo ou coisa parecida de uma
repartição pública. Viúva e com pouco mais de trinta anos, nada se falava da sua reputação.

Tinha uma filha e um filho que educava com grande desvelo e muito sacrifício. Era proprietária do pequeno chale onde morava, em cujo quintal havia laranjeiras e algumas outras árvores frutíferas. Fora o seu falecido marido que o adquirira com o produto de uma “sorte” na loteria; e, se ela, com a morte do esposo, o salvara das garras de escrivães, escreventes, meirinhos, solicitadores e advogados “mambembes”, devia-o à precaução do marido que comprara a casa, em nome dela.

Assim mesmo, tinha sido preciso a intervenção do seu compadre, o capitão Hermenegildo, a fim de remover os obstáculos que certos “águias” começavam a pôr, para impedir que ela entrasse em plena posse do imóvel e abocanhar-lhe afinal o seu chalezito humilde.

De volta, Cazu bateu à porta da viúva que trabalhava no interior, com cujo rendimento ela conseguia aumentar de muito o módico, senão irrisório montepio, de modo a conseguir fazer face às despesas mensais com ela e os filhos.

Percebendo a pobre viúva que era o Cazu, sem se levantar da máquina, gritou:

– Entre, “Seu” Cazu.

Estava só; os filhos ainda não tinham vindo do colégio. Cazu entrou. Após entregar as estampilhas, quis o rapaz retirar-se; mas foi obstado por Ermelinda nestes termos:

– Espere um pouco, “Seu” Cazu. Vamos tomar café.

Ele aceitou e, embora, ambos se serviram da infusão da “preciosa rubiácea”, como se diz no estilo “valorização”.

A viúva, tomando café, acompanhado com pão e manteiga, pôs-se a olhar o
companheiro com certo interesse. Ele notou e fez-se amável e galante, demorando em esvaziar a xícara. A viuvinha sorria interiormente de contentamento. Cazu pensou com os seus botões: “Está aí um bom partido: casa própria, montepio, renda das costuras; e além de tudo, há de lavar-me e consertar a roupa. Se calhou, fico livre das censuras da tia...

Essa vaga tensão ganhou mais corpo, quando a viúva, olhando-lhe a camisa, perguntou:

– “Seu “ Cazu, se eu lhe disser uma coisa, o senhor fica zangado?

– Ora, qual, dª Ermelinda?

– Bem. A sua camisa está rasgada no peito. O senhor traz “ela” amanhã, que eu conserto “ela”.

Cazu respondeu que era preciso lavá-la primeiro; mas a viúva prontificou-se em fazer isso também. O jogador dos pontapés, fingindo relutância no começo, aceitou afinal; e doido por isso estava ele, pois era uma “entrada”, para obter uma lavadeira em condições favoráveis.

Dito e feito: daí em diante, com jeito e manha, ele conseguiu que a viúva se fizesse a sua lavadeira bem em conta.

Cazu, após tal conquista, redobrou de atividade no football, abandonou os biscates e não dava um passo, para obter emprego. Que é que ele queria mais? Tinha tudo...

Na redondeza, passavam como noivos; mas não eram, nem mesmo namorados declarados. Havia entre ambos, unicamente um “namoro de caboclo”, com o que Cazu ganhou uma lavadeira, sem nenhuma exigência monetária e cultivava-o carinhosamente.

Um belo dia, após ano e pouco de tal namoro, houve um casamento na casa dos tios do diligente jogador de football. Ele, à vista da cerimônia e da festa, pensou: “Porque também eu não me caso? Porque eu não peço Ermelinda em casamento? Ela aceita, por certo; e eu...”

Matutou domingo, pois o casamento tinha sido no sábado; refletiu segunda e, na terça, cheio de coragem, chegou-se à Ermelinda e pediu-a em casamento.

– É grave isto, Cazu. Olhe que sou viúva e com dois filhos!

– Tratava “eles” bem; eu juro!

– Está bem. Sexta-feira, você vem cedo, para almoçar comigo e eu dou a
resposta.

Assim foi feito. Cazu chegou cedo e os dois estiveram a conversar; ela, com toda a naturalidade, e ele, cheio de ansiedade e apreensivo. Num dado momento, Ermelinda foi até à gaveta de um móvel e tirou de lá um papel.

– Cazu – disse ela, tendo o papel na mão – você vai à venda e à quitanda e compra o que está aqui nesta “nota”. É para o almoço.

Cazu agarrou trêmulo o papelucho e pôs-se a ler o seguinte:
1 quilo de feijão..................600 rs.
1/2 de farinha.....................200 ”
1/2 de bacalhau............. 1$200 ”
1/2 de batatas.................... 360 ”
Cebolas.............................. 200 ”
Alhos................................. 100 ”
Azeite................................ 300 ”
Sal..................................... 100 ”
Vinagre............................ 200 ”
__
 3$260 rs.
Quitanda:
Carvão............................ 200 rs.
Couve............................. 200 ”
Salsa............................... 100 ”
Cebolinha....................... 100 ”_
Tudo.......................... 3$860 rs.

Acabada a leitura, Cazu não se levantou logo da cadeira; e, com a lista na mão, a olhar de um lado a outro, parecia atordoado, estuporado.

– Anda Cazu, fez a viúva. Assim, demorando, o almoço fica tarde...

– É que...

– Que há?

– Não tenho dinheiro.

– Mas você não quer casar comigo? É mostrar atividade, meu filho! Dê os seus passos... Vá! Um chefe de família não se atrapalha... É agir!

João Cazu, tendo a lista de gêneros na mão, ergueu-se da cadeira, saiu e não mais voltou...

Fonte:
Lima Barreto. Contos.

quinta-feira, 26 de julho de 2018

Florilégio de Trovas n. 23 (lançamento)


Já saiu o número 23 da revista Florilégio de Trovas.

Em suas 68 páginas:
105 Trovadores de Ontem e de Hoje
 A. A. de Assis: Francisco, o poeta
Trovas do sergipano Julimar Andrade Vieira
Nei Garcez: Eclipse (em trovas)
Trovas Premiadas do I Concurso Nacional de Trovas da UBT/ES
Trovas Premiadas do XI Jogos Florais da UBT/Juiz de Fora
Aparício Fernandes: Plágios, Coincidências e “Homenagens” (Parte final)
Baú da Memória com foto de trovadores
15 Concursos de Trovas com Inscrições Abertas

Se ainda não possui, solicite a revista (em pdf), em florilegiodetrovas@vivaldi.net

Alphonsus de Guimaraens (Caldeirão Poético)


I

Mãos de finada, aquelas mãos de neve,
De tons marfíneos, de ossatura rica,
Pairando no ar, num gesto brando e leve,
Que parece ordenar, mas que suplica.

Erguem-se ao longe como se as eleve 
Alguém que ante os altares sacrifica:
Mãos que consagram, mãos que partem breve, 
Mas cuja sombra nos meus olhos fica...

Mãos de esperança para as almas loucas, 
Brumosas mãos que vêm brancas, distantes, 
Fechar ao mesmo tempo tantas bocas...

Sinto-as agora, ao luar, descendo juntas,
Grandes, magoadas, pálidas, tateantes,
Cerrando os olhos das visões defuntas...

II

Celeste... É assim, divina, que te chamas.
Belo nome tu tens, Dona Celeste...
Que outro terias entre humanas damas,
Tu que embora na terra do céu vieste?

Celeste... E como tu és do céu não amas: 
Forma imortal que o espírito reveste
De luz, não temes sol, não temes chamas, 
Porque és sol, porque és luar, sendo celeste.

Incoercível como a melancolia,
Andas em tudo: o sol no poente vasto
Pede-te a mágoa do findar do dia.

E a lua, em meio à noite constelada,
Pede-te o luar indefinido e casto
Da tua palidez de hóstia sagrada.

IV

Vagueiam suavemente os teus olhares
Pelo amplo céu franjado em linho:
Comprazem-te as visões crepusculares...
Tu és uma ave que perdeu o ninho.

Em que nichos doirados, em que altares 
Repoisas, anjo errante, de mansinho?
E penso, ao ver-te envolta em véus de luares, 
Que vês no azul o teu caixão de pinho.

És a essência de tudo quanto desce
Do solar das celestes maravilhas...
- Harpa dos crentes, cítola da prece...

Lua eterna que não tivesse fases,
Cintilas branca, imaculada brilhas,
E poeiras de astros nas sandálias trazes…

X

Hirta e branca... Repousa a sua áurea cabeça 
Numa almofada de cetim bordada em lírios. 
Ei-la morta afinal como quem adormeça
Aqui para sofrer Além novos martírios.

De mãos postas, num sonho ausente, a sombra espessa
Do seu corpo escurece a luz dos quatro círios:
Ela faz-me pensar numa ancestral Condessa
Da Idade Média, morta em sagrados delírios.

Os poentes sepulcrais do extremo desengano 
Vão enchendo de luto as paredes vazias, 
E velam para sempre o seu olhar humano.

Expira, ao longe, o vento, e o luar, longinquamente, 
Alveja, embalsamando as brancas agonias
Na sonolenta paz desta Câmara-ardente…

XIX

Hão de chorar por ela os cinamomos,
Murchando as flores ao tombar do dia.
Dos laranjais hão de cair os pomos,
Lembrando-se daquela que os colhia.

As estrelas dirão: - "Ai! nada somos, 
Pois ela se morreu, silente e fria... " 
E pondo os olhos nela como pomos,
Hão de chorar a irmã que lhes sorria.

A lua, que lhe foi mãe carinhosa,
Que a viu nascer e amar, há de envolvê-la
Entre lírios e pétalas de rosa.

Os meus sonhos de amor serão defuntos...
E os arcanjos dirão no azul ao vê-la,
Pensando em mim: - "Por que não vieram juntos?”

LXXV

Como se moço e não bem velho eu fosse
Uma nova ilusão veio animar-me.
Na minh'alma floriu um novo carme,
O meu ser para o céu alcandorou-se.

Ouvi gritos em mim como um alarme.
E o meu olhar, outrora suave e doce,
Nas ânsias de escalar o azul, tornou-se
Todo em raios que vinham desolar-me.

Vi-me no cimo eterno da montanha,
Tentando unir ao peito a luz dos círios
Que brilhavam na paz da noite estranha.

Acordei do áureo sonho em sobressalto:
Do céu tombei aos caos dos meus martírios, 
Sem saber para que subi tão alto…

Vinicius de Moraes (A Transfiguração pela Poesia)


Creio firmemente que o confinamento em si mesmo, imposto a toda uma legião de criaturas pela guerra, é dinamite se acumulando no subsolo das almas para as explosões da paz. No seio mesmo da tragédia sinto o fermento da meditação crescer. Não tenho dúvida de que poderosos artistas surgirão das ruínas ainda não reconstruídas do mundo para cantar e contar a beleza e reconstruí-lo livre. Pois na luta onde todos foram soldados - a minoria nos campos de batalha, a maioria nas solidões do próprio eu, lutando a favor da liberdade e contra ela, a favor da vida e contra ela - os sobreviventes, de corpo e espírito, e os que aguardaram em lágrimas a sua chegada imprevisível, hão de se estreitar num abraço tão apertado que nem a morte os poderá separar. E o pranto que chorarem juntos há de ser água para lavar dos corações o ódio e das inteligências o mal-entendido. 

Porque haverá nos olhos, na boca, nas mãos, nos pés de todos uma ânsia tão intensa de repouso e de poesia, que a paixão os conduzirá para os mesmos caminhos, os únicos que fazem a vida digna: os da ternura e do despojamento. Tenho que só a poesia poderá salvar o mundo da paz política que se anuncia - a poesia que é carne, a carne dos pobres humilhados, das mulheres que sofrem, das crianças com frio, a carne das auroras e dos poentes sobre o chão ainda aberto em crateras. 

Só a poesia pode salvar o mundo de amanhã. E como que é possível senti-la fervilhando em larvas numa terra prenhe de cadáveres. Em quantos jovens corações, neste momento mesmo, já não terá vibrado o pasmo da sua obscura presença? Em quantos rostos não se terá ela plantado, amarga, incerta esperança de sobrevivência? Em quantas duras almas já não terá filtrado a sua claridade indecisa? Que langor, que anseio de voltar, que desejo de fruir, de fecundar, de pertencer, já não terá ela arrancado de tantos corpos parados no antemomento do ataque, na hora da derrota, no instante preciso da morte? E a quantos seres martirizados de espera, de resignação, de revolta já não terão chegado as ondas do seu misterioso apelo? 

Sofre ainda o mundo de tirania e de opressão, da riqueza de alguns para a miséria de muitos, da arrogância de certos para a humilhação de quase todos. Sofre o mundo da transformação dos pés em borracha, das pernas em couro, do corpo em pano e da cabeça em aço. Sofre o mundo da transformação das mãos em instrumentos de castigo e em símbolos 

De força. Sofre o mundo da transformação da pá em fuzil, do arado em tanque de guerra, da imagem do semeador que semeia na do autômato com seu lança-chamas, de cuja sementeira brotam solidões. 

A esse mundo, só a poesia poderá salvar, e a humildade diante da sua voz. Parece tão vago, tão gratuito, e no entanto eu o sinto de maneira tão fatal! Não se trata de desencantá-la, porque creio na sua aparição espontânea, inevitável. Surgirá de vozes jovens fazendo ciranda em torno de um mundo caduco; de vozes de homens simples, operários, artistas, lavradores, marítimos, brancos e negros, cantando o seu labor de edificar, criar, plantar, navegar um novo mundo; de vozes de mães, esposas, amantes e filhas, procriando, lidando, fazendo amor, drama, perdão. E contra essas vozes não prevalecerão as vozes ásperas de mando dos senhores nem as vozes soberbas das elites. Porque a poesia ácida lhes terá corroído as roupas. E o povo então poderá cantar seus próprios cantos, porque os poetas serão em maior número e a poesia há de velar. 

* Primeira crônica de Vinicius, publicada em A Manhã, 1946.

Fonte:
Vinicius de Moraes. Para viver um grande amor.

quarta-feira, 18 de julho de 2018

Olivaldo Júnior (Todo trovador que se preze)

         18 de Julho: Dia do Trovador


  Hoje, dezoito de julho, é o Dia do Trovador. Essa data foi escolhida por ser o dia do nascimento de Luiz Otávio, “Príncipe dos Trovadores”, que, em 1966, fundou a União Brasileira de Trovadores (UBT), entidade que busca congregar os trovadores brasileiros e realizar Jogos Florais, como forma de aprimorar o talento desses poetas e divulgar a menor forma poética da Língua Portuguesa, ou seja, a trova, que, aliás, só é ‘mini’ em sua estrutura.

            Falando em trova, todo trovador que se preze deveria ter um cavalo selado à porta de casa, bem à moda dos trovadores medievais, que, de cidade em cidade, cantavam as boas novas da província anterior, tecendo, assim, sua colcha sonora, com muitas redondilhas e muita inspiração, sem abrir mão do poder de síntese, comum aos trovadores. Já pensou que bom seria ouvir um trovador e seu banjo, seu canto ancestral, um ‘buscador’ por excelência?

            Correspondo-me ainda hoje com alguns trovadores da UBT. Porque todo trovador que se preze tem sempre uma trova na manga, uma manga bem larga, de onde os sonhos emergem e ganham o mundo. Assim, nos quatro versos da trova, com sete sons poéticos cada um, em rimas alternadas, trovadores se aliançam e se fundem num só espírito criador, o de manter viva a chama que os nossos irmãos portugueses trouxeram no mastro das caravelas de então.

            Hoje, dezoito de julho, é o Dia do Trovador. O que esperar desse dia? Trova e poesia, talvez. No entanto, todo trovador que se preze pode esperar um lampejo de inspiração, seja do próximo, seja de si, para que a vida se mostre em cores. As mesmas com que Gislaine Canalles, que foi para o céu dos trovadores no último dia treze, viu reveladas em suas trovas e, de modo especial, em suas glosas. Assim, nesse dia, com “Gis” e Luiz, ‘trovemos’ todos!

Fonte: O autor

I Concurso de Trovas da UBT/ES (Trovas Premiadas)


Apoio: AILA – Academia Ibatibense de Letras e Artes - ES
            ALVV – Academia de Letras de Vila Velha - ES

VENCEDORES

TEMA TROPEIRO (Lírica/Filosófica)

1° LUGAR
Qual leito, sob os luzeiros,
durante a longa jornada,
Deus oferece aos tropeiros
o colo da madrugada.
Maurício Cavalheiro
Pindamonhangaba - SP

2° LUGAR
Ao romper os horizontes,
em seus muares cargueiros,
tropeiros teceram pontes
integrando os brasileiros!
Luzia Brisolla Fuim 
São Paulo - SP

3° LUGAR
Tropeiro, a saudade amarga
hoje transporta em vagões
a velha besta de carga,
companheira de emoções.
Daguima Verônica
Santa Juliana – MG

 4° LUGAR
Velho tropeiro de outrora,
levaste o rumo da vida
galopando, mundo afora,
entre o abraço e a despedida...!
Mara Melinni
Caicó - RN

5° LUGAR
Já fui tropeiro criança:
num tempo que longe vai,
eu cavalgava a esperança
na garupa de meu pai.
Arlindo Tadeu Hagen
Juiz de Fora – MG

MENÇÃO HONROSA

Grandes centros financeiros
brotaram de um arraial,
bem na rota dos tropeiros,
lá, no Brasil Colonial...
Glória Tabet Marson
São José dos Campos - SP

Tropeiros... Quantos tropeiros,
venceram mil desafios...
quais guardiões mensageiros,
rasgando os sertões bravios!
Professor Garcia
Caicó - RN

Nas veredas, pioneiro,
por abrir capões medonhos,
restou ao velho tropeiro 
tanger seu tropel de sonhos.
Marília C Silveira Oliveira
Porto Alegre - RS

MENÇÃO ESPECIAL

Tropa… sertão… lua bela…
um tropeiro e a montaria,
são partes de uma aquarela,
que Deus pintou com poesia.
Francisco Gabriel Ribeiro
Natal - RN

Saga nobre a do tropeiro
para as colonizações:
rasga o solo brasileiro
interligando os rincões.
Dulcidio de Barros Moreira Sobrinho
Juiz de Fora - MG

Meu destino traiçoeiro
castigou-me a vida inteira:
quis que eu nascesse tropeiro,
mas não me abriu a porteira.
Luiz Gonzaga da Silva
Natal - RN

TEMA: TROPA (Humorística)

VENCEDORES

1° LUGAR
– Tropa de choque! Socorro! –
grita o genro, em faniquito,
 ao chegar sogra, cachorro,
 papagaio e periquito!
Wanda  de Paula Mourthé
Belo Horizonte – MG

2° LUGAR
Nesta época aloprada,
não duvido que apareça
alguma tropa formada
só de mulas sem cabeça!...
A. A. de Assis
Maringá – PR

3° LUGAR
Sem a tropa e sem o guia,
foge o burro rabugento;
só podia ser a cria
de uma égua com jumento!
Glória Tabet Marson
São José dos Campos - SP

4° LUGAR
Se a linda sargento Guerra
se inclina e exercício faz,
não há força nesta Terra
que mantenha a tropa em paz...
João Paulo Ouverney
Pindamonhangaba - SP

5° LUGAR
Quando ela passa charmosa,
até a tropa troca o passo,
mas... a fama da dengosa
passo a passo... ganha espaço!
Carolina Ramos
Santos –SP

NOVOS TROVADORES 

TEMA TROPEIRO (Lírica/Filosófica)

1° LUGAR
Lá no passado ficou
a importância do tropeiro
que com garra trabalhou
pelo solo brasileiro.
Claudia Vanessa Bergamini
Londrina – PR

 2° LUGAR
Oh, tropeiro! Peregrino!
Eu resgato a tua história,
pois a rédea do destino
puxa o freio da memória.
José Almir Loures
Astolfo Dutra – MG

3° LUGAR
E o tropeiro vai silente
conduzindo à dura lida,
seu passado, seu presente,
pelo caminho da vida…
Paulo Maurício Gomes da Silva
Teresópolis – RJ

3°  LUGAR
Já quase doura paisagem
o pó da estrada ligeiro,
desperto com a passagem
silenciosa do tropeiro...
Paulo Maurício Gomes da Silva
Teresópolis – RJ

4°  LUGAR
Mal sabia o bom tropeiro,
que ao cumprir sua missão,
levando o '"pão" ao mineiro,
integrava o nosso chão.
Ariete Regina Fernandes Correia
Rio de Janeiro - RJ

5°  LUGAR
Hoje sou caminhoneiro,
mas a saudade não vai,
de quando eu era tropeiro
carreando com meu pai.
Genival Silva de Souza
Ibatiba - ES

Pedro Du Bois (Poemas Escolhidos) II


AFASTAMENTO

Posso escutar a sua voz
mas a conversa repete
chavões esmaecidos

posso ler as suas palavras
mas o texto repete
fórmulas amarelecidas

posso ver as suas feições
mas a face repete
esgares esquecidos

posso tomar a sua mão
mas o contato repete
gestos entorpecidos

sigo outros caminhos
diversos
   dispersos
        ásperos
            amadurecidos.

HUMANO

Espreita a caça
          sorrateiro
          aguarda o momento
                        para atacar

esquece

a caça espreita o caçador
           ligeira
           busca o momento
                     para escapar

esquece

quem de longe olha
aponta a arma
                 mira
                    atira
                    para todos os lados.

NADA VALEM

Nada valem as conquistas
          viagens de descobertas
          passado revisitado
          em cada caverna
          reaberta

nada valem as guerras
         rudes palavras
         presente reprimido
         em cada alarme
         disparado

nada valem as lágrimas
         derramadas pelos pais
         futuro encardido
         em cada situação
         desesperada.

QUANDO TERMINA

Onde o gosto
        desgosta

onde o ódio
         apaixona

onde a amizade
vai embora

o lugar vazio
espera preencherem as vagas
por todos os sozinhos imersos
em vidas mesquinhas
                  desgostosas
                            odiosas

solitárias.

QUEM NÃO FOI

Teve o tempo que quis
para fazer o que era preciso

pouco fez

teve o tempo que quis
para traçar o seu caminho

pouco traçou

teve o tempo que quis
para dizer a que veio

pouco disse

agora
   exige
     do outro
          o que deixou pelo caminho

- melhor sair de fininho
               e sumir no ar.

SEU OLHAR

Seu olhar expressa
sentimentos impressos
de longa duração

                 a piscadela marota
                 imprime rápida
                 mudança comportamental

(eu)
cúmplice confesso
do crime previsto
na última estação

                  seu olhar imprime
                  sedução e sexo
                  em visão espiritual.

SOL A SOL

Desencontrados caminhos
                           peregrinos
                   savanas compostas
                   selvas decompostas

areia poluída
         óleos de bronzear
         cremes protetores

desencontrados peregrinos
           apregoam produtos
           embalam preguiças.

Sol a sol.