quarta-feira, 11 de junho de 2008

Lima Barreto (Um Músico Extraordinário)

Quando andávamos juntos no colégio, Ezequiel era um franzino menino de quatorze ou quinze anos, triste, retraído, a quem os folguedos colegiais não atraíam. Não era visto nunca jogando "barra, carniça, quadrado, peteca", ou qualquer outro jogo dentre aqueles velhos brinquedos de internato que hoje não se usam mais. O seu grande prazer era a leitura e, dos livros, os que mais gostava eram os de Jules Verne. Quando todos nós líamos José de Alencar, Macedo, Aluísio e, sobretudo, o infame Alfredo Gallis, ele lia a Ilha Misteriosa, o Heitor Servadac, as Cinco Semanas em um Balão e, com mais afinco, as Vinte Mil Léguas Submarinas.

Dir-se-ia que a sua alma ansiava por estar só com ela mesma, mergulhada, como o Capitão Nemo do romance vernesco, no seio do mais misterioso dos elementos da nossa misteriosa Terra.

Nenhum colega o entendia, mas todos o estimavam, porque era bom, tímido e generoso. E porque ninguém o entendesse nem as suas leituras, ele vivia consigo mesmo; e, quando não estudava as lições de que dava boas contas, lia seu autor predileto.

Quem poderia pôr na cabeça daquelas crianças fúteis pela idade e cheias de anseios de carne para a puberdade exigente o sonho que o célebre autor francês instila nos cérebros dos meninos que se apaixonam por ele, e o bálsamo que os seus livros dão aos delicados que prematuramente adivinham a injustiça e a brutalidade da vida?

O que faz o encanto da meninice não é que essa idade seja melhor ou pior que as outras. O que a faz encantadora e boa é que, durante esse período da existência, nossa capacidade de sonho é maior e mais força temos em identificar os nossos sonhos com a nossa vida. Penso, hoje, que o meu colega Ezequiel tinha sempre no bolso um canivete, no pressuposto de, se viesse a cair em uma ilha deserta, possuir à mão aquele instrumento indispensável para o imediato arranjo de sua vida; e aquele meu outro colega Sanches andava sempre com uma nota de dez tostões, para, no caso de arranjar a "sua" namorada, ter logo em seu alcance o dinheiro com que lhe comprasse um ramilhete.
Era, porém, falar ao Ezequiel em Heitor Servadac, e logo ele se punha entusiasmado e contava toda a novela do mestre de Nantes. Quando acabava, tentava então outra; mas os colegas fugiam um a um, deixavam-no só com o seu Jules Verne, para irem fumar um cigarro às escondidas.

Então, ele procurava o mais afastado dos bancos do recreio, e deixava-se ficar lá, só, imaginando, talvez, futuras viagens que havia de fazer, para repassar as aventuras de Roberto Grant, de Hatteras, de Passepartout, de Keraban, de Miguel Strogoff, de Cesar Cascavel, de Philéas Fogg e mesmo daquele curioso doutor Lindenbrock, que entra pela cratera extinta de Sueffels, na desolada Islândia, e vem à superfície da Terra, num ascensor de lavas, que o Estrômboli vomita nas terras risonhas que o Mediterrâneo afaga...

Saímos do internato quase ao mesmo tempo e, durante algum, ainda nos vimos; mas, bem depressa, perdemo-nos de vista.

Passaram-se anos e eu já o havia de todo esquecido, quando, no ano passado, vim a encontrá-lo em circunstâncias bem singulares.

Foi em um domingo. Tomei um bonde da Jardim, aí, na avenida, para visitar um amigo e, com ele, jantar em família. Ia ler-me um poema; ele era engenheiro hidráulico.

Como todo o sujeito que é rico ou se supõe ou quer passar como tal, o meu amigo morava para as bandas de Botafogo.

Ia satisfeito, pois de há muito não me perdia por aquelas bandas da cidade e me aborrecia com a monotonia dos meus dias, vendo as mesmas paisagens e olhando sempre as mesmas fisionomias. Fugiria, assim, por algumas horas, à fadiga visual de contemplar as montanhas desnudadas que marginam à Central, da estação inicial até Cascadura. Morava eu nos subúrbios. Fui visitar, portanto, o meu amigo, naquele Botafogo catita, Meca das ambições dos nortistas, dos sulistas e dos... cariocas.

Sentei-me nos primeiros bancos; e já havia passado o Lírico e entrávamos na Rua Treze de Maio quando, no banco atrás do meu, se levantou uma altercação com o condutor, uma dessas vulgares altercações comuns nos nossos bondes.
— Ora, veja lá com quem fala! dizia um.
— Faça o favor de pagar a sua passagem, retorquia o recebedor.
— Tome cuidado, acudiu o outro. Olhe que não trata com nenhum cafajeste! Veja lá!
— Pague a passagem, senão o carro não segue.

E como eu me virasse por esse tempo a ver melhor tão patusco caso, dei com a fisionomia do disputador que me pareceu vagamente minha conhecida. Não tive de fazer esforços de memória. Como uma ducha, ele me interpelou desta forma:

— Vejas tu só, Mascarenhas, como são as cousas! Eu, um artista, uma celebridade, cujos serviços a este país são inestimáveis, vejo-me agora maltratado por esse brutamonte que exige de mim, desaforadamente, a paga de uma quantia ínfima, como se eu fosse da laia dos que pagam.

Àquela voz, de súbito, pois ainda não sabia bem quem me falava, reconheci o homem: era o Ezequiel Beiriz. Paguei-lhe a passagem, pois, não sendo celebridade, nem artista, podia perfeitamente e sem desdouro pagar quantias ínfimas; o veículo seguiu pacatamente o seu caminho, levando o meu espanto e a minha admiração pela transformação que se havia dado no temperamento do meu antigo colega de colégio. Pois era aquele parlapatão, o tímido Ezequiel?

Pois aquele presunçoso que não era da laia dos que pagam era o cismático Ezequiel do colégio, sempre a sonhar viagens maravilhosas, à Jules Verne? Que teria havido nele? Ele me pareceu inteiramente são, no momento e para sempre.

Travamos conversa e mesmo a procurei, para decifrar tão interessante enigma.
— Que diabo, Beiriz! Onde tens andado? Creio que há bem quinze anos que não nos vemos - não é? Onde andaste?
— Ora! Por esse mundo de Cristo. A última vez que nos encontramos... Quando foi mesmo?
— Quando eu ia embarcar para o interior do Estado do Rio, visitar a família.
— E verdade! Tens boa memória... Despedimo-nos no Largo do Paço... Ias para Muruí - não é isso?
— Exatamente.
— Eu, logo em seguida, parti para o Recife a estudar direito.
— Estiveste lá este tempo todo?
— Não. Voltei para aqui, logo de dois anos passados lá.
— Por quê?
— Aborrecia-me aquela "chorumela" de direito... Aquela vida solta de estudantes de província não me agradava... São vaidosos... A sociedade lhes dá muita importância, daí...
— Mas, que tinhas com isso? Fazias vida à parte...
— Qual! Não era bem isso o que eu sentia... Estava era aborrecidíssimo com a natureza daqueles estudos... Queria outros.. .
— E tentaste?
— Tentar! Eu não tento; eu os faço... Voltei para o Rio a fim de estudar pintura.
— Como não tentas, naturalmente...
— Não acabei. Enfadou-me logo tudo aquilo da Escola de Belas-Artes.
— Por quê?
— Ora! Deram-me uns bonecos de gesso para copiar...

Já viste que tolice? Copiar bonecos e pedaços de bonecos... Eu queria a cousa viva, a vida palpitante...

— E preciso ir às fontes, começar pelo começo, disse eu sentenciosamente.
— Qual! Isto é para toda gente... Eu vou de um salto; se erro, sou como o tigre diante do caçador - estou morto!
— De forma que...
— Foi o que me aconteceu com a pintura. Por causa dos tais bonecos, errei o salto e a abandonei. Fiz-me repórter, jornalista, dramaturgo, o diabo! Mas, em nenhuma dessas profissões dei-me bem... Todas elas me desgostavam... Nunca estava contente com o que fazia... Pensei, de mim para mim, que nenhuma delas era a da minha vocação e a do meu amor; e, como sou honesto intelectualmente, não tive nenhuma dor de coração em largá-las e ficar à-toa, vivendo ao deus-dará.
— Isto durante muito tempo?
— Algum. Conto-te o resto. Já me dispunha a experimentar o funcionalismo, quando, certo dia, descendo as escadas de uma secretaria, onde fui levar um pistolão, encontrei um parente afastado que as subia. Deu-me ele a notícia da morte do meu tio rico que me pagava colégio e, durante alguns anos, me dera pensão; mas, ultimamente, a tinha suspendido, devido, dizia ele, a eu não esquentar lugar, isto é, andar de escola em escola, de profissão em profissão.
— Era solteiro esse seu tio?
— Era, e, como já não tivesse mais pai (ele era irmão de meu pai), ficava sendo o seu único herdeiro, pois morreu sem testamento. Devido a isso e mais ulteriores ajustes com a Justiça, fiquei possuidor de cerca de duas centenas e meia de contos.
— Um nababo! Hein?
— De algum modo. Mas escuta. filho! Possuidor dessa fortuna, larguei-me para a Europa a viajar. Antes - é preciso que saibas - fundei aqui uma revista literária e artística - Vilhara - em que apresentei as minhas idéias budistas sobre a arte, apesar do que nela publiquei as cousas mais escatotógicas possíveis, poemetos ao suicídio, poemas em prosa à Venus Genitrix, junto com sonetos, cantos, glosas de cousas de livros de missa de meninas do colégio de Sion.
—Tudo isto de tua pena?
— Não. A minha teoria era uma e a da revista outra, mas publicava as cousas mais antagônicas a ela, porque eram dos amigos.
— Durou muito a tua revista?
— Seis números e custaram-me muito, pois até tricromias publiquei e hás de adivinhar que foram de quadros contrários ao meu ideal búdico. Imagina tu que até estampei uma reprodução dos "Horácios", do idiota do David!
— Foi para encher, certamente?
— Qual! A minha orientação nunca dominou a publicação... Bem! Vamos adiante. Embarquei quase como fugido deste país em que a estética transcendente da renúncia, do aniquilamento do desejo era tão singularmente traduzida em versos fesceninos e escatológicos e em quadros apologéticos da força da guerra. Fui-me embora!
— Para onde?
— Pretendia ficar em Lisboa, mas, em caminho, sobreveio uma tempestade;. e deu-me vontade, durante ela, de ir ao piano. Esperava que saísse o "bitu"; mas, qual não foi o meu espanto, quando de sob os meus dedos surgiu e ecoou todo o tremendo fenômeno meteorológico, toda a sua música terrível... Ah! Como me senti satisfeito! Tinha encontrado a minha vocação... Eu era músico! Poderia transportar, registrar no papel e reproduzi-los artisticamente, com os instrumentos adequados, todos os sons, até ali intraduzíveis pela arte, da Natureza. O bramido das grandes cachoeiras, o marulho soluçante das vagas, o ganido dos grandes ventos, o roncar divino do trovão, estalido do raio - todos esses ruídos, todos esses sons não seriam perdidos para a Arte; e, através do meu cérebro, seriam postos em música, idealizados transcendentalmente, a fim de mais fortemente, mais intimamente prender o homem à Natureza, sempre boa e sempre fecunda, vária e ondeante; mas...
—Tu sabias música?
— Não. Mas, continuei a viagem até Hamburgo, em cujo conservatória me matriculei. Não me dei bem nele, passei para o de Dresde, onde também não me dei bem. Procurei o de Munique, que não me agradou. Freqüentei o de Paris, o de Milão...
— De modo que deves estar muito profundo em música?

Calou-se meu amigo um pouco e logo respondeu:

— Não. Nada sei, porque não encontrei um conservatório que prestasse. Logo que o encontre, fica certo que serei um músico extraordinário. Adeus, vou saltar. Adeus! Estimei ver-te.
Saltou e tomou por uma rua transversal que não me pareceu ser a da sua residência

Fonte:
http://www.biblio.com.br

Asterix (de Albert Uderzo e René Goscinny)

Asterix (em francês: Astérix) é um personagem de histórias em quadrinhos criada em 1959 na França por Albert Uderzo e René Goscinny. Após o falecimento de Goscinny, Uderzo deu continuidade ao trabalho, com a colaboração de Sylvie, filha de Uderzo.

As histórias de Asterix foram traduzidas para mais de 100 idiomas, sendo populares ao redor da Europa, Canadá, Austrália, Nova Zelândia, América do Sul, África e Ásia. Porém não são muito conhecidas nos Estados Unidos e Japão.

Até aos dias de hoje foram lançados 33 álbuns com o personagem, um dos quais é uma compilação de histórias curtas. Asterix também inspirou 11 adaptações para o cinema (8 animações e 3 com atores), jogos, brinquedos e um parque temático.

História
Estamos no ano 50 antes de Cristo. Toda a Gália foi ocupada pelos romanos... Toda? Não! Uma aldeia povoada por irredutíveis gauleses ainda resiste ao invasor. E a vida não é nada fácil para as guarnições de legionários romanos nos campos fortificados de Babaorum, Aquarium, Laudanum e Petibonum...

Este é o prólogo de todas as edições dos livros de Asterix, o gaulês.

O personagem reside, com seus amigos, em uma pequena aldeia na Armórica ao norte da antiga Gália, resistindo ao domínio romano. Para enfrentar as legiões, contam com a ajuda de uma poção mágica, que lhes dá força sobre-humana, preparada pelo druida Panoramix. A exceção é Obelix, que caiu dentro de um caldeirão com a poção quando ainda era bebê, e por isso adquiriu permanentemente a superforça.

Personagens
• Asterix, o herói Gaulês e melhor amigo de Obelix. O seu nome provém da palavra asterisque (asterisco).
• Obelix, o distribuidor de menires e amigo de Asterix, possui força sobre-humana permanente porque caiu dentro do caldeirão de poção quando era bebê. Adora seu cachorrinho Ideiafix. Só pensa em duas coisas: comer javali e bater nos romanos. Seu nome provém do francês Obelisque obelisco e está relacionado a seu trabalho com menires.
• Panoramix, o velho druida que aconselha Asterix, Obelix e o chefe Abracourcix, é o único a saber preparar a poção mágica. O seu nome provém da palavra panoramique (panorâmico).
• Matasetix ou Abracourcix (no original, Abraracourcix), o chefe da aldeia. O seu nome provém do original francês à bras raccourcis (braço partido), em português evoca "abra um curso".
• Cacofonix ou Chatotorix, (no original, Assurancetourix), o bardo. Péssimo cantor, mas bom companheiro. O seu nome provém do francês assurance tous risques (seguro contra todos os riscos).
• Ideiafix (no original, Idéfix), o cão de Obelix. O seu nome provém do francês ideé fixe (idéia fixa).
• Decanonix ou Veteranix ((no original, Agecanonix), o ancião da aldeia, também conhecido como Geriatrix em algumas versões. O seu nome provém do francês age canonique (idade canônica).
• Éautomatix ou Automatix (no original, Cétautomatix), o ferreiro que sempre critica a qualidade dos peixes vendidos por Ordenalfabetix. O seu nome provém do francês c'est automatique (é automático).
• Ordemalfabetix ou Ordenalfabetix (no original, Ordralfabetix), o peixeiro que sempre está brigando com Automatix por causa de suas críticas. O seu nome provém do francês ordre alfabetix (ordem alfabética).
• Júlio César, o majestoso e inteligente imperador romano, inimigo dos gauleses.
• Boapinta ou Naftalina, (no original, Bonemine) é a mulher de Abracurcix, sempre arrependida de ter casado com este. Seu nome, no original (Bonemine), vem do francês bonne mine, significando "estar em forma", "estar bem", "disposta”.

Humor
O humor de Asterix é tipicamente francês, com trocadilhos, caricaturas e estereótipos.

Estereótipos e alusões
Asterix e Obelix encontram muitas alusões ao século XX em suas jornadas. Os godos são militaristas, lembrando os alemães dos séculos XIX e XX; os bretões são fleumáticos, educados, falam ao contrário (numa tradução direta do inglês, como "Eu peço seu o perdão?"), tomam cerveja quente e água quente com leite (até Asterix trazer o chá) e conduzem do lado esquerdo da estrada; a Hispânia é um local cheio de pessoas de sangue quente e turistas; e os lusitanos são baixinhos e educados (Uderzo disse que todo os portugueses que ele conhecera eram assim). Há também humor com franceses: os normandos comem tudo com creme, e os corsos são preguiçosos e têm queijos nauseabundos.

Existem muitas caricaturas, como o burocrata de Obelix e Companhia baseado em Jacques Chirac. Alguns personagens que servem de alusão ao local visitado: a Cleópatra é inspirada em Elizabeth Taylor, ao visitar a Bretanha encontram-se quatro bardos famosos lembrando os Beatles, encontram na Bélgica Dupond e Dupont de Tintin, e na Hispânia Dom Quixote e Sancho Pança. Nos livros mais recentes aumentam as paródias, com o espião Zerozerosix, baseado em Sean Connery, o escravo Spartakis, baseado em Kirk Douglas, e um alienígena inspirado em Mickey Mouse.

Linguagem
Uma das bases do humor são os trocadilhos, a começar pelos protagonistas, batizados com os símbolos para notas de rodapé: asterisco (*) e obelisco (†). Para aumentar os trocadilhos, todos os povos têm terminações comuns de nomes: os gauleses terminam em -ix (em possível citação a Vercingetorix) e as gaulesas em -a (Naftalina, Iellousubmarina), os romanos em -us (Acendealus, Apagalus, General Motus), normandos em -af (Batiscaf, Telegraf), bretões em -ax e -os (Relax, Godseivezekingos), egípcios em -is (Pedibis, Quadradetenis), gregos em -os e -as(Okeibos, Plexiglas), vikings em -sen (Kerosen, Franksen), godos em -ic (Clodoric, Eletric), e hispânicos nomes compostos (Conchampiñon & Champignon, Lindonjonsón & Nixón).

Línguas estrangeiras tem representação diferente:
Iberos: Igual ao espanhol, inversão e exclamações ('¡') e interrogações ('¿')
Godo: escrita gótica (gauleses não entendem)
Viking: Ø e Å no lugar de O e A (gauleses não entendem)
Índios americanos: Pictogramas (gauleses não entendem)
Egípcios: hieróglifos com notas de rodapé (gauleses não entendem)
Grego: letras retas, esculpidas

Piadas recorrentes
• O bordão de Obelix é "Esses [nome do povo] são uns loucos", sendo "romanos" o povo mais freqüente.
• O péssimo canto de Chatotorix (que em livros tardios enerva os deuses e leva à chuva), geralmente impedido por Automatix.
• Automatix reclamar dos peixes de Ordenalfabetix, iniciando uma briga entre toda a aldeia.
• Obelix requisitar poção mágica apesar desta ter efeito permanente nele (em A Galera de Obelix, ele acaba por tomá-la com graves consequências).
• Legionários reclamarem após serem espancados ou fazendo trabalhos tediosos ("alistem-se, diziam eles").
• A gula de Obelix.
• Um grupo de piratas (paródia de Barbe Rouge, uma história contemporânea) que ao se encontrar com Asterix e Obelix, geralmente têm seu navio afundado (às vezes, eles até sacrificam o seu próprio barco para evitar a surra dos gauleses).
• Chatotorix ser amarrado na hora do banquete para que não possa canta

Revisionismo

Algumas piadas provém de fatos históricos:
após atravessar o canal da Mancha Obelix sugere um túnel sob esse mesmo canal, e um bretão responde que já planejam construir;
Obelix derruba o nariz da Esfinge;
Asterix diz à Cleópatra para apelar aos gauleses para, por exemplo, eles construírem um canal entre o Mediterrâneo e o Mar Vermelho;
Os gregos impedem substâncias que dão força extra nas Olimpíadas;
Asterix introduz o chá na Inglaterra;
Os menires de Obelix viram as rochas de Carnac;
Muitas vezes a aparição de Brutus alude á sua participação na morte de César

Cinema
Algumas histórias de Asterix foram transformadas em filmes de animação e filmes com actores.

Animação
Asterix, o Gaulês - 1967
Asterix e Cleópatra - 1968
Os 12 Trabalhos de Asterix - 1976
Asterix e a Surpresa de César - 1985
Asterix Entre os Bretões - 1986
A Grande Luta - 1989
Asterix Conquista a América - 1995
Asterix e Obelix e Os vikings - 2006

Filmes
Asterix e Obelix contra César (1999) - De Claude Zidi. Com Gérard Depardieu (Obelix) e Christian Clavier (Asterix)
Asterix e Obelix: Missão Cleópatra (2002) - De Alain Chabat. Com Gérard Depardieu (Obelix), e Christian Clavier (Asterix).
Asterix nos Jogos Olímpicos (2008), com Gérard Depardieu (Obelix) e Clovis Cornillac (Asterix)

Livros
- Asterix o Gaulês (1961)
O centurião romano Caius Bonus, após descobrir sobre a poção mágica sequestra Panoramix para descobrir como fazê-la.
- A Foice de Ouro (1962)
Panoramix quebra sua foice, e Asterix e Obelix vão comprar outra em Lutécia.
- Asterix e os Godos (1963)
Panoramix é sequestrado pelos godos, e Asterix e Obelix vão à Germânia resgatá-lo.
- Asterix Gladiador (1964)
Chatotorix é sequestrado pelos romanos como presente para César, e Asterix e Obelix vão a Roma. Para conseguir resgatá-lo, entram para a escola de gladiadores.
- A Volta à Gália (1965)
Após um romano começar a isolar a aldeia com uma paliçada, Asterix propõe a ele desistir após um banquete com comidas pegas ao redor da Gália (num trajeto parecido com o Tour de France).
- Asterix e Cleópatra (1965)
O arquiteto egípcio Numerobis é incumbido pela rainha Cleópatra de construir um palácio para Júlio César em três meses, para que Cleópatra ganhe uma aposta feita com o imperador romano. Por sorte, seu pai conheceu Panoramix e vai pedir ajuda ao druída e a Asterix e Obelix.
- O Combate dos Chefes (1966)
Um chefe de aldeia simpático aos romanos propõe um duelo a Abracurcix, valendo a aldeia. No meio-tempo, Panoramix é atingido por um menir e enlouquece.
- Asterix e os Bretões (1966)
Após conquistar quase toda a Gália, César decide invadir a Bretanha (atual Reino Unido). Apenas uma aldeia resiste, e Cinemapax, um contraparente de Asterix, resolve ir à Gália para pedir a ajuda de seu primo e da poção de Panoramix.
- Asterix e os Normandos (1967)
Abracurcix recebe seu sobrinho covarde, Calhambix, com a missão de torná-lo um homem. No meio-tempo, normandos vêm á Gália em busca do "campeão do medo".
- Asterix Legionário (1967)
Obelix se apaixona por Falbalá - e ao descobrir que o noivo desta, Tragicomix fora alistado à força e mandado para a África, Asterix e Obelix entram na legião romana para resgatá-lo.
- O Escudo Arverno (1968)
Abracurcix é enviado para uma estância hidroterápica por estar doente, Asterix e Obelix vão para Gergóvia, e César busca o escudo de Vercingetorix.
- Asterix nos Jogos Olímpicos (1968)
Asterix descobre que os romanos e os gregos participam, de quatro em quatro anos, de uma competição chamada jogos olímpicos. Como a Gália está ocupada pelo Império Romano, Asterix pode participar dos jogos, como representante da Gália. Mas há um problema: ele não pode usar a poção de Panoramix...
- Asterix e o Caldeirão (1969)
Um gaulês deixa um caldeirão cheio de serstécios na aldeia por segurança - e após o dinheiro sumir, Asterix e Obelix buscam recuperá-los.
- Asterix na Hispânia (1969)
O filho do chefe da última aldeia resistente à ocupação na Hispânia é sequestrado e levado para a Gália - e Asterix e Obelix resolvem levá-lo de volta.
- A Cizânia (1970)
César decide conquistar a aldeia acabando com a união dos gauleses - para isso, usa um romano especializado em discórdia, Tulius Detritus.
- Asterix entre os Helvécios (1970)
Um questor romano é envenenado pelo governador da Gália, e apela á Panoramix - porém a poção antídoto exige uma flor montanhosa, que Asterix e Obelix vão buscar na Helvécia.
- O Domínio dos Deuses (1971)
Para conquistar a aldeia César começa a construir um grande hotel, o Domínio dos Deuses, na floresta que a circunda.
- Os Louros de César (1972)
Um bêbado Abracurcix promete ao cunhado um guisado temperado com a coroa de louros de César, e Asterix e Obelix acabam em Roma tentando conquistá-la.
- O Adivinho (1972)
Enquanto Panoramix está ausente, um adivinho começa a se aproveitar da credulidade dos gauleses.
- Asterix na Córsega (1973)
Após descobrirem um líder corso seqüestrado, Asterix e Obelix resolvem acompanhá-lo de volta para casa.
- O presente de César (1974)
César dá a um legionário por seaposentar, as terras da aldeia, e este legionário repassa-as a um taverneiro, que vai reclamar seu terreno.
- A Grande Travessia (1975)
Asterix e Obelix vão pescar - e acabam por chegar à América do Norte.
- Obelix e Companhia (1976)
Para desunir a aldeia, um assessor de César começa a comprar os menires de Obelix, estimulando a concorrência na aldeia.
- Asterix entre os Belgas (1979)
Abracourcix não se conforma com o fato de César achar os belgas o povo mais bravo da Gália e vai à Bélgica tirar satisfações.
- O Grande Fosso (1980) - (O primeiro álbum realizado sem a contribuição de Goscinny)
Asterix e Obelix se envolvem com uma aldeia separada por um fosso, as rivalidades de seus dois chefes e as artimanhas de um gaulês traidor que quer se casar com a filha de um dos chefes.
- A Odisséia de Asterix (1981)
Asterix e Obelix viajam até a Galiléia conseguir petróleo para o druida acompanhados por um druida espião Zerozerosix (feito à imagem de Sean Connery, ator de 007).
- O Filho de Asterix (1983)
Um bebê é deixado na porta da casa de Asterix, que se vê obrigado a encontrar seus verdadeiros pais - ninguém menos que César e Cleópatra.
- As 1001 Horas de Asterix (1987)
Asterix e Obelix vão à Índia com Chatotorix para que o bardo use sua voz para fazer chover e livrar a princesa Jade de ser executada.
- A Rosa e o Gládio (1991)
Os guerreiros se envolvem com a galanteria gaulesa, a liberação feminina e uma nova e diferente legião de legionário(a)s.
- A galera de Obelix (1994)
Escravos roubam a galera de César e a escondem na aldeia gaulesa; Obelix se transforma em granito ao beber a poção mágica e Asterix e o druida vão com os escravos atrás de uma possível cura.
- Asterix e Latraviata (2001)
Os romanos usam uma atriz idêntica à bela Falbala para que ela recupere o gládio e o elmo de Pompeu, dados de presente a Asterix e Obelix por seus pais.
- Asterix: O dia em que o céu caiu (2005-França)
Os gauleses recebem a visita de estranhos seres espaciais que querem confiscar a poção mágica (referências a Walt Disney, aos mangás e ao Schwarzenegger).
- Asterix e a volta às aulas / Asterix e o Regresso dos Gauleses - (2007-Brasil) - (2003-França / Portugal)
Coleção de histórias curtas publicadas na revista Pilote.

Além disso há álbuns dos filmes:
- Asterix e os índios
Semelhante ao álbum "A grande travessia"
- A Surpresa de César
Semelhante aos álbuns "Asterix Legionário" e "Asterix Gladiador"
- Os 12 Trabalhos de Asterix
- Asterix: O golpe do menir
- Asterix e os Vikings

E "Como Obelix caiu no caldeirão do druida quando ele era pequeno".

Parque Asterix
O parque temático foi inaugurado em 1989 em Paris. Conta com diversas atrações, como brinquedos e shows, além de pessoas fantasiadas como os personagens das histórias. Apesar do apelo de herói nacional, sofre com a concorrência da vizinha Eurodisney.

Fonte:
http://pt.wikipedia.org

Figueiredo Pimentel (Histórias da Avozinha – Parte I)

O AVÔ E O NETINHO

Bastante velho já, fatigado por uma longa existência de trabalhos e canseiras, exausto de forças e doente de velhice – porque a velhice é, também, uma doenç a – estava tio Benedito, o bom e estimado velhote tio Benedito: oitenta anos pesavam-lhe às costas, como um grande fardo que ele a custo carregasse.

Na sua mocidade, e mesmo durante parte da velhice, ninguém trabalhara mais que ele, honesto sempre, mourejando, dia e noite, para sustento de sua família.

Não podendo fazer serviço algum, alquebrado pela idade, veio morar em casa de Augusto, seu filho mais moço, já com um filhinho de três para quatro anos, o pequenino e interessante Luís, vivo e esperto como poucos.

Velho e enfermo, qual estava, tio Benedito como que volvera à primeira infância; e, por isso, eram precisos inúmeros cuidados com ele, que mal se sustinha sozinho, trêmulo, muito trêmulo, quase sem poder andar.

Quando se sentava à mesa, para o almoço e para o jantar, derramava sopa na toalha, quebrava pratos e copos, com as mãos fracas, como uma criança arteira e estouvada.

Augusto, e sua mulher, Henriqueta, aturavam-no com dificuldade, zangados, contrariados, aborrecidos principalmente com o prejuízo diário que o pai lhes dava.

Afinal, não podendo mais suportar o velho, resolveram comprar uma cuia; e às horas das refeições sentavam-no no chão, perto da mesa dando-lhes a comida naquela tosca vasilha.

Quando Luisinho, o pequenino, viu que o avô não se sentava mais à mesa, ficou triste, mas não disse palavra. Estranhou aquilo porque a sua almazinha desabrochava formosamente para o bem; e se não manifestou a sua impressão, foi por supor que assim se fazia sempre com os velhinhos, que não se sentavam à mesa, nem comiam em pratos, como os outros.

O pequeno Luís era o único que verdadeiramente estimava o ancião, próximos entre si aquela primavera e aquele inverno, aquela criança e aquele velho, ambos na infância, ambos no crepúsculo da vida.

Dias depois, Augusto e Henriqueta viram o filho entretido a brincar com alguns pedaços de tábuas, um martelo e pregos, como não tinha por costume fazer.

A mãe, estranhando aquilo, perguntou: – Que estás fazendo aí, Luisinho? – Estou fazendo um prato, para dar de comer a papai e mamãe, quando eu for grande, e eles já estiverem velhinhos como vovô, respondeu ingenuamente a criança.

Henriqueta e Augusto entreolharam-se confusos, vexados e arrependidos da sua ingratidão, e de novo trouxeram o pai para se sentar à mesa, em sua companhia.

Desde então, trataram-no com todo o respeito, o desvelo e a consideração que os filhos devem aos pais.

O SOLDADO E O DIABO

Contam que, em outros tempos, há milhares e milhares de anos, quando nada existia do que hoje existe, viveu em certa cidade um rico fidalgo, o barão de Macário, tão poderoso e opulento, quão orgulhoso e mau.

Uma tarde, achava- se ele no seu escritório, contemplando avaramente a grande fortuna que acumulara, roubando aos pobres, às viúvas e aos órfãos, emprestando dinheiro a juros elevados, quando, de súbito, se sentiu tocado por um raio de bondade, até então jamais experimentado pelo seu coração empedernido.

Lembrou- se que já estava velho; e que, com aquela idade, nunca fizera o menor benefício a pessoa alguma, sem ter dado jamais uma única esmola sequer. Arrependeu- se, então, do seu passado.

Nessa mesma tarde, Augusto, um infeliz sapateiro, seu vizinho, que vivia na maior pobreza, carregado de filhos, veio bater à porta, suplicando que lhe emprestasse cem mil-réis, para se ver livre de uma penhora, e poder comprar o material que precisava para os trabalhos de sua profissão.

– Em vez de cem- mil réis, dar- te-ei um conto de réis, Augusto; disse o barão, com a condição, porém, que, se eu morrer primeiro, você irá vigiar meu túmulo, nas três primeiras noites depois do meu enterro.

O sapateiro prometeu, acossado como estava pela necessidade, e o fidalgo deu- lhe o conto de réis.

*** Dois meses depois, o barão de Macário morreu; e Augusto, lembrando-se de sua promessa, como era homem de promessa, foi cumpri-la.

Duas noites passou ele em claro, no cemitério da cidade, cheio de medo, mas sem que ocorresse novidade alguma.

Na terceira e última, dirigia -se para ir velar junto no túmulo, quand o avistou um soldado encostado a um mausoléu.

– Eh! camarada! bradou. Que fazes aí? Não tens medo de estar no cemitério? – Eu não tenho medo de coisa alguma, respondeu o militar. Vim para aqui, porque não tenho onde pousar esta noite.

Puseram- se ambos a conversar, enquanto o sapateiro contava ao soldado por que motivo ali se achava.

Passou- se o tempo, sem que eles o sentissem, quando o relógio da torre da igreja bateu compassadamente as doze badaladas fúnebres da hora terrível da meia-noite!...

Então, nesse momento, próximo deles surgiu de súbito, sem que soubessem de onde vinha, um homem vestido de vermelho, com os olhos chispando fogo, e cheirando fortemente a enxofre.

Era o diabo, que lhes ordenou: – Retirem-se daqui, rapazes! a alma deste homem, que foi um grande usurário na terra, pertence-me, e eu vim buscá-la.

– Senhor vestido de vermelho, disse o soldado, o senhor não é meu superior, nem mesmo um oficial. Não posso, pois, obedecer- lhe; e, assim, digo -lhe que se retire daqui, pois aqui chegamos primeiro.

O diabo, vendo aquele militar destemido, não quis puxar barulho, e lembrou-se de comprá-lo, perguntando-lhe quanto queria para se ir embora.

– Aceito o negócio que me propõe, sr. Satanás. Basta que me dê o dinheiro em ouro, que uma das minhas botas puder conter.

O diabo saiu, e foi pedir emprestado a um judeu seu amigo, que morava naquela mesma cidade.

Enquanto não vinha, o soldado puxando o rifle, cortou a sola do pé direito, e colocou-a por cima de um túmulo aberto.

Quando Satanás chegou, vergado ao peso de um saco de ouro, esvaziou- a, peça por peça, dentro da bota. O dinheiro caía todo na sepultura.

– Olé! disse o capataz do Inferno, esta bota parece-me mágica! – Vá buscar mais ... mandou o soldado.

Mais de dez sacos foram assim trazidos pelo diabo. As moedas escorregavam pelo cano da bota, e iam cair no túmulo, de modo que a bota jamais se enchia. Satanás, desesperado, ia trazendo saco por saco. Na ocasião em que carregava o décimo saco, cheio de moedas de ouro, eis que amanheceu de repente. O galo cantou; o sol rompeu; e o sino da igreja bateu alegremente, chamando para a missa.

Satanás deu um berro e desapareceu...

Estava salva a alma do barão de Macário...

O soldado e o sapateiro Augusto repartiram entre si a grande fortuna que o diabo deixara na cova; e foram viver ricos e felizes, empregando uma boa parte do dinheiro em dar esmolas aos pobres.

Fonte:
PIMENTEL, Figueiredo. Histórias da Avozinha. Rio de Janeiro, 1896.
http://www.colegiosaofrancisco.com.br/alfa/literatura-infantil-classicos-infantis/historias-da-avozinha.php

Vania Dohme (A História como Veículo de Comunicação)

Contar histórias é uma forma de comunicação. Mesmo sem se dar conta as pessoas usam este artifício no dia a dia. É comum, querendo dar mais ênfase ou veracidade a uma afirmação, o interlocutor usar de uma história acontecida com ele, com amigos ou até, uma que “ouviu falar”. Isto dá uma impressão que a outra pessoa irá entender melhor aquilo que se esta querendo transmitir.

Partindo deste ponto as histórias podem ser usadas com as mais diversas intenções, e uma delas é como uma forma de comunicação entre pais e filhos. Principalmente porque os pais tem sempre muitas coisas que gostariam de falar para seus filhos e, as vezes, não sabem como faze-lo. Isto porque pode haver uma certa insegurança em saber se a criança poderá entender ou não aquilo que se deseja falar e também, porque há uma presunção, na maioria das vezes acertada, de que ela não terá muita paciência para ouvir. Pudera há tantas outras coisas interessantes para fazer!

As crianças poderão não entender o conteúdo daquilo que se deseja transmitir: As histórias irão colocar os elementos desejados dentro de um contexto simples e adequado ao entendimento da criança. Os elementos chaves que se deseja comunicar não estarão soltos, exigindo um pensamento abstrato para dar-lhes sentido, eles já estarão encadeados dentro da história. Compreender a história irá significar compreender situações, razões e resultados, que em última análise são os elementos que se deseja transmitir.

A impaciência ou incapacidade de se concentrar por um período mais longo: A história tem a propriedade de interessar a criança e com isso mantê-la atenta.

Qualidade da mensagem

Partindo do ponto de que as histórias são bons veículos de informação, resta a pergunta: mas que tipo de informação?

Pode-se transmitir bem, mas isto não será necessariamente bom ou construtivo para a criança. Isto leva à reflexão: o que se deseja transmitir?

Assim, quando os pais se depararem com uma história com potencial para ser contada para seus filhos, deverão discernir no seu conteúdo a que tipo de conclusões ela levará, quais sentimentos despertará, se ela poderá incentivar ou inibir determinada conduta.

Se não houver esta preocupação inicial corre-se o risco de estar comunicando, até comunicando bem, algo indesejado, que não está de acordo com as crenças e valores de quem a está narrando.

Deve-se tomar cuidado de analisar a história não só pelo seu roteiro principal, mas também pelos acontecimentos periféricos, secundários. Uma história poderá estar valorizando a coragem de determinado príncipe, que luta pela salvação de seu povo. Mas se na intimidade este príncipe for arrogante e mandão com seu fiel escudeiro, a história estará valorizando a coragem, mas também comprometendo a cortesia que um cavaleiro deve ter. Estes detalhes poderão passar despercebidos, mas o trato com empregados está mais próximos das crianças do que a luta pela liberdade de um povo.

As histórias de fadas

Dentre as diversas categorias que as histórias podem se dividir, as histórias de fadas aparecem como as preferidas para as crianças, porém, curiosamente muitas delas apresentam uma dose de violência que gera uma certa perplexidade: porque histórias tão violentas são milenarmente utilizadas com crianças?

Em Rapunzel o príncipe vaga cego por muitos anos, Bela Adormecida é condenada a morte simplesmente porque seus pais deixaram de convidar uma das fadas e, em Branca de Neve, sua madrasta, por não tolerar a sua beleza, manda mata-la. A sina de Branca de Neve só é atenuada porque o caçador que deveria mata-la penalizado, mata um cervo em seu lugar e coloca o coração ensangüentado do animal em um baú para entrega-lo à rainha como prova de ter cumprido a sua missão. Como se matar um animal fosse coisa boa, principalmente em uma época em que lutamos para despertar a consciência ecológica em nossas crianças e o amor aos animais. Será que isso é coisa de criança?

O conceituado psicanalista inglês Bruno Betellhein em seu livro: “A Psicanálise dos Contos de Fadas” traz contribuições importantes para se entender o efeito que os contos de fadas causam nas crianças. Como é sabido, as crianças tem uma forma diferente dos adultos de entender e refletir. As crianças pequenas não conseguem desenvolver um raciocínio de causa e efeito. Seu entendimento é baseado muito mais na emoção do que na razão. Assim, querer persuadir uma criança baseando-se em argumentos racionais, comum aos adultos, terá grandes possibilidades de fracassar.

Os medos que os adultos sentem, da violência, instabilidade financeiro, de perder a saúde são percebidos pela criança e, embora ela não consiga entender, também tem medo, e o pior é absolutamente incapaz de fazer algo para vence-lo ou de encontrar argumentos para diminuí-lo.

As histórias, entre outros efeitos, irão aparecer como um bálsamo para esta situação. Na história de chapeuzinho vermelho, por exemplo, o lobo funciona como um símbolo do perigo, de alguém com quem se precisa ter cuidado. E o que acontece: ele engole chapeuzinho, e em algumas versões a vovó também, o que significa que os temores se concretizaram. Porém, quando aparece o caçador, ele abre a barriga do lobo e de lá sai chapeuzinho vermelho intacta e feliz. Isto irá mostrar para a criança que mesmo que os terríveis males aconteçam, as coisas podem acabar bem, isto lhe dá esperança e, conseqüentemente, segurança.

As fábulas

Atribui-se à Ésopo e, posteriormente, à Fedro, a idéia de usar as fábulas para transmitir situações de relacionamento dos seres humanos, encerrando lições e ditames de comportamento de uma forma velada, protegida pelo fato dos protagonistas serem animais. Isso fica mais claro quando sabemos que ambos eram escravos alforriados, nesta situação é fácil imaginar que eles usariam esta liberdade para transmitir mensagens aos demais escravos usando os animais como proteção. Foi graças a La Fontaine que as fábulas chegaram até nós, e este não usou as fábulas com outro objetivo, plebeu freqüentador da corte e vivendo em uma época de grande injustiça social na França, as fábulas apareciam como um meio de falar verdades de forma alertadora e segura.

As fábulas encerram padrões de comportamento, evidenciam valores e geralmente apontam para soluções justas. E, da mesma forma que foram usadas a séculos atrás, elas podem ser usadas modernamente pelos pais para falar sobre estes padrões de comportamentos com seus filhos. Usando-as os pais poderão falar sobre verdade, lealdade, altruísmo, despojamento, bondade e tantos outros valores, no momento exato que seus filhos precisam ouvir, quando perceberem que fatos ou os próprios sentimentos de seus filhos estão necessitando de um modelo de comportamento.

Então ter um repertório de histórias, de seus diversos tipos: de fadas, fábulas, lendas, mitos, para serem “retiradas do baú” na hora necessária, se torna uma importante ferramenta para ser usada na educação. E o que é importante, as histórias não propiciam uma educação condicionante, ao contrário, elas são um convite para o pensar, para a investigação e para se chegar às suas próprias conclusões.

As histórias de fadas são mais adequadas às crianças pequenas, já as fabulas, as lendas e mitos, são mais adequadas às crianças com mais de sete ou oito anos. Mas isso não quer dizer que as crianças não irão gostar mais de histórias de fadas quando ficarem mais velhas ou, ao contrário, as pequenas não apreciam as fabulas. Esta adequação está relacionada ao entendimento e ao aproveitamento que ela terá ao ouvir a história. Ou seja, liberta de medos e com resposta a algumas de suas indagações sobre a vida, a menina e o rapazinho irão ouvir as histórias de fadas de outra maneira, se encantando com a magia, vibrando com a aventura. Já a pequenina, poderá não entender as razões que levaram a raposa da fábula “A raposa e as uvas” a agir dessa forma, mas gostará de ver o fantoche, dará risadas quando a sua mãe fizer a voz mais grossa para imitá-la.

O desenvolvimento que todas as histórias propiciam

Cada história tem uma mensagem específica, típica ao seu roteiro e que motivou a sua escolha de acordo com a mensagem educacional desejada pelo seu narrador.

De forma genérica as histórias contribuem com diversos aspectos da formação de crianças e jovens. Estes aspectos podem variar de intensidade de uma história para outra, porém, pode-se dizer que de maneira geral todas as histórias propiciam o desenvolvimento:

Atenção e raciocínio: Todos sabem que as histórias têm o poder mágico de prender a atenção das crianças (e a experiência mostra que a dos adultos também). Isso por si só já é um exercício, mas as histórias provocam muito mais do que isso. A crianças acompanham os fatos e fazem conjecturas, como será que o herói se saíra dessa situação? Será que o ratinho, por gostar somente de queijo, rejeitará o chocolate? A princesa encontrará o príncipe e será feliz novamente? Ao tomarem conhecimento do desfecho do enredo irão compará-lo com as suposições que fizeram, isto fará com que elas exercitem a relação de causa e efeito, que faz parte do seu amadurecimento.

A narrativa exercitará também a memória, pois as maldades feitas pela rainha má serão relembradas, no final da história, quando esta for castigada. Alguns personagens que aparecem apenas no início da história, podem ter um papel decisivo no seu final. A criança por estar interessada no enredo gravará elementos e detalhes que sabe que lhe trará satisfação em outra parte da história. Isto também pode acontecer quando a mesma história é contada diversas vezes, a cada nova narrativa a criança saboreará melhor estes elementos. E as crianças tem uma predileção por ouvir a mesma história muitas vezes, isto porque ela quer ter certeza de que o mal foi derrotado e que tudo acaba bem no final. Senso crítico: Sem dúvida pensando na formação do cidadão de amanhã, umas das maiores preocupações dos pais é formar um homem e uma mulher crítico, que tenha capacidade de analisar o que está a sua volta, avaliar o que está de acordo com os seus princípios e o que não está, e tomar decisões de acordo com as suas próprias convicções.

Isso nem sempre é fácil perante uma sociedade massificante onde as informações se cruzam em velocidade vertiginosa e nem sempre com objetivos explícitos.

As ingênuas histórias podem ser um motivo para os pais discutirem com seus filhos comportamentos, posicionamentos. Não de forma impositiva, mas sim convidativa ao pensar. Os pais poderão perceber, encantados, que a forma de seus filhos verem os fatos vão amadurecendo a medida que eles crescem.

As crianças pequenas ficaram encantadas quando Cinderela apaixona-se imediatamente pelo príncipe. Mas as mais velhas poderão ser questionadas se somente o fato de ser bonito, rico e poderoso é suficiente para alguém se apaixonar.

E será que o Patinho Feio não seria mais feliz continuando feio, mas filho de sua mãe pata e irmão dos patinhos, do que se transformar em um cisne belo, porém, sozinho?

O que importa é que as histórias vão trazer o contexto, onde os pais com habilidade poderão fundamentar uma discussão que busque produzir a reflexão e o exercício do senso crítico.

Imaginação: As histórias conduzem o ouvinte às mais diversas paragens e, não há limite. Uma boa narrativa pode levar ao fundo domar, acima das nuvens, a países distantes, ao futuro e ao passado.

A descrição detalhada, fará com que o ouvinte sinta o cheiro das flores, visualize a grama verdinha e se encante com o cavalo alado que dorme sossegadamente. Porém, a este detalhamento não deve ser exagerado, a fim de permitir que o ouvinte coloque a sua “própria” cor do céu, enfeite o campo com árvores. A narrativa é um convite para que a imaginação se desencadeie e complemente o cenário.

Criatividade: Nos dias de hoje sabe-se que a criatividade é diretamente proporcional à quantidade de referência que uma pessoa possui. As histórias são capazes de dar estas referências às crianças. E o que é importante é que estas referências não são apenas aquelas apresentadas a elas, prontas, de forma conceitual ou visual. Mas são também resultantes de seu próprio raciocínio e de sua imaginação.

Nesta linha de raciocínio podemos afirmar que por proporcionar referências as histórias incentiva a criatividade.

Mas, podemos ir além disso. As histórias fornecem um contexto com o qual podemos trabalhar de diversas maneiras fazendo com que as crianças sejam convidadas a criarem. Após ouvir uma história podemos pedir que ela faça um desenho da cena que mais gostou, ou a modele em argila. Um grupo de crianças poderá representa-la ou, mesmo, ser convidado a fazer a sua continuação. Será necessário criar o roteiro, fazer o cenário, o figurino. Situações que ficariam difíceis de serem pedidas aleatoriamente, mas que ganham sentido dentro de uma história que acabou de ser contada.

Afetividade: As crianças adoram ouvir histórias e querem que seus pais contem sempre mais, que contem a mesma história outras vezes. Isto se dá pelo prazer que ela tem de ouvir histórias, mas também pela situação de aconchego que ela representa.

Neste momento seu pai, ou sua mãe, é só dela e lhe dedica a mais completa atenção. Ela poderá estar no seu colo ou os dois estão largados em uma montanha de almofadas, e para ela esta situação poderá se perdurar infinitamente...

Estes momentos de cumplicidade, aumentam o companheirismo e favorece a afetividade. Isto faz com que as relações melhorem, melhorando as relações o diálogo é favorecido. Mais diálogo mais compreensão, mais confiança, mais conhecimento das peculiaridades das crianças e, em contrapartida, mais abertura para um ouvir o outro.
Transmissão de valores: As histórias são excelentes veículos para a transmissão de valores, porque dão contexto a fatos abstratos, difíceis de serem transmitidos isoladamente.
Como falar com crianças, perante a constante valorização da esperteza, que mentir não é a melhor solução? E que não é porque o mentiroso é talentoso e está seguro que está garantido que o ouvinte está sendo convencido? Como transmitir um conceito que a mentira deixa mais vulnerável o mentiroso do que aquele que pretensamente se deseja enganar?

É difícil, mas a história de Pinochio magistralmente cumpre este papel de forma simples: O boneco de madeira mentia e o seu nariz crescia, ficando assim formidavelmente vulnerável!

As histórias, conforme já foi colocado, são um verdadeiro celeiro de fatos que enaltecem os valores éticos, o que precisa é que aquele que irá contá-las esteja aberto para este fator. É preciso que ele acredite realmente na veracidade das afirmações que a história encerra dentro de sua fantasia.

Para que isto aconteça cada um deve escolher as histórias que realmente lhes são verdadeiras, que batem com os seus valores pessoas, que estejam de acordo com aquilo que ele deseja transmitir. Somente dessa forma ele poderá transmitir o que deseja de forma convincente.

É importante, também, entender os artifícios que a história usa para transmitir a sua mensagem, pois eles deverão ser narrados de forma fiel, a fim de proporcionar a compreensão desejada.

Quando se narra a história dos Saltimbancos, que valoriza a união, a formação de equipe. Se o narrador não deixar muito claro que o burrico não tinha forças para puxar a carroça, o cachorro não assustava mais ninguém, a galinha não dava mais ovos e a gatinha não servia mais para caçar gatos. Como justificar a súbita coragem que a união de todos fez nascer, fazendo com que o grupo conseguisse espantar perigosos ladrões. Assim a história deve ser escolhida tendo em vista a faixa etária da criança, o seu nível de compreensão, o momento adequado de aborda-la e, principalmente, estar de acordo com os valores que os pais acreditam como algo significativo para a formação de seus filhos.

Porém a escolha adequada não finaliza a questão, há que passa-la de forma clara, com graça, humor, causando suspense, emoção. Deve-se usar a voz adequada, fazer gestos, usar a expressão facial e a corporal.
Pode-se usar de recurso auxiliares que irão encantar as crianças:
fantoches, sombras, marionetes. E pode-se fazer uma série de atividades que irão potencializar os objetivos educacionais pretendidos e sobretudo propiciar saudáveis e felizes momentos de convivência entre os pais e seus filhos. Mas isto já é outra história...
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Sobre a Autora
Vania D'angelo Dohme é professora universitária, ludoeducadora, mestre em educação, pesquisadora do lúdico na educação, doutoranda em comunicação e semiótica, e membro fundadora do Centro Cultural de Voluntariado de São Paulo. Com uma experiëncia de mais de 30 anos, realizando trabalhos voluntários com crianças em movimentos educacionais (movimento escoteiro), fundou a Editora Informal, na qual desenvolve capacitação de adultos e professores, através de oficinas, palestras e produção de material escrito.

É autora dos seguintes livros: 32 idéias que auxiliam o aprendizado ; Técnicas de Contar Histórias ; Ensinando a criança a amar a natureza ; Jogando - O valor educacional dos jogos ; Jogando - Coordenação de jogos ; Técnicas de contar histórias - Para os pais contarem para seus filhos ; Atividades lúdicas na educação (Editora Vozes) ; Voluntariado- Equipes produtivas (Editora Mackenzie)
E os títulos infantis: A queda da fadinha no lixão ; A queda da fadinha no lixão- Atividades ; Jaca, o jacaré que virou bolsa
O Telefone de contato de Vania Dohme e da Editora Informal é: (11) 6977-6305 ou 6950-7481. Ou pelo site: www.editorainformal.com.br

Fonte:
http://www.qdivertido.com.br

O Saci-Pererê

A Lenda do Saci data do fim do século XVIII. Durante a escravidão, as amas-secas e os caboclos-velhos assustavam as crianças com os relatos das travessuras dele. Seu nome no Brasil é de origem Tupi Guarani. Em muitas regiões do Brasil, o Saci é considerado um ser brincalhão enquanto que em outros lugares ele é visto como um ser maligno.

É uma criança, um negrinho de uma perna só que fuma um cachimbo e usa na cabeça uma carapuça vermelha, que lhe dá poderes mágicos, como o de desaparecer e aparecer onde quiser. Existem 3 tipos de Sacis: O Pererê, que é pretinho, O Trique, moreno e brincalhão e o Saçurá, que tem olhos vermelhos.

Ele também se transforma numa ave chamada Mati-taperê, ou Sem-fim, ou Peitica como é conhecida no Nordeste, cujo canto melancólico, ecoa em todas as direções, não permitindo sua localização.

A superstição popular faz dessa ave uma espécie de demônio, que pratica malefícios pelas estradas, enganando os viajantes com os timbres dispersos do seu canto, e fazendo-os perder o rumo.

Ele adora fazer pequenas travessuras, como esconder brinquedos, soltar animais dos currais, derramar sal nas cozinhas, fazer tranças nas crinas dos cavalos, etc. Diz a crença popular que dentro de todo redemoinho de vento existe um Saci. Dizem que Ele não atravessa córregos nem riachos. Diz a lenda que, se alguém jogar dentro do redemoinho um rosário de mato bento ou uma peneira, pode capturá-lo, e caso consega sua carapuça, pode realizar um desejo.

Alguém perseguido por ele, deve jogar em seu caminho cordas ou barbantes com nós. Ele então irá parar para desatá-los, e só depois continua a perseguição, o que dá tempo para que a pessoa fuja. Aqui, percebe-se a influência da lenda da Bruxa Européia, que é obrigada a contar os fios de um feixe de fibras, antes de entrar nas casas.

Do Amazonas ao Rio Grande do sul, o mito sofre variações. No Rio Grande ele é um menino de uma perna só, que adora atormentar os viajantes noturnos, fazendo-os perder o caminho. Em São Paulo é um negrinho que usá um boné vermelho e freqüenta os brejos, assustando os cavaleiros. Se o reconhece o chama pelo nome, e então foge dando uma espetacular gargalhada.

Fonte:
http://sitededicas.uol.com.br

Ana Lúcia Merege (Contar Histórias: Uma Arte Imortal)

Nos últimos anos, a arte de contar histórias vem sendo retomada não apenas por terapeutas e educadores, mas por pessoas de todas as formações, de várias camadas da sociedade, que se reúnem para partilhar sabedoria, afeto e energia através das narrativas. Para fazê-lo, não há regras: o melhor é usar o coração e a intuição, além da experiência que só se adquire através do tempo. No entanto, uma discussão acerca do que significa contar histórias e do que é necessário para isso pode nos levar a alguns pontos interessantes.

Em primeiro lugar, é preciso saber que contar histórias é uma arte popular. Uma aproximação excessivamente acadêmica e/ou sofisticada pode esvaziar o conteúdo emocional da narrativa, deixando o público pouco à vontade. Da mesma forma, deve-se ter em mente que, embora o ato de contar histórias possa se inserir numa proposta terapêutica ou num projeto pedagógico, não se pode agir de forma mecânica, apenas para cumprir um dever ou para ensinar o que quer que seja, de regras gramaticais a valores doutrinários. As histórias devem ser contadas por e com prazer. Se não, nem vale a pena começar.

O background cultural do narrador e a sua familiaridade com as histórias também são importantes. Ao narrar um conto maravilhoso, por exemplo, é muito mais importante conhecer e ser capaz de visualizar o cenário em que ele se desenvolve do que saber as palavras exatas. Saber de onde vem a versão que se está narrando é bom, mas melhor ainda é saber trabalhar, criativamente, com os elementos fornecidos pela narrativa, e ser capaz de levar o público a se identificar e se interessar por ela.

A escolha do repertório é fundamental para um contador de histórias. Segundo SAWYER, mesmo os contadores mais experientes encontram dificuldades com alguns textos e mais facilidade com outros, sugerindo que se trabalhe com três tipos básicos de material: literatura popular (onde se incluem os contos de fadas), contos literários e trechos de livros (SAWYER, 1990, p. 153). Para ela, a literatura popular é a mais fácil de trabalhar, pois tem uma linguagem universal e uma estrutura narrativa simples. A opinião é partilhada por RIBEIRO, segundo o qual “por mais que os requintes e lançamentos literários sofram um constante aperfeiçoamento (...) a literatura infanto-juvenil continuará tendo a sua faceta mais atraente na literatura de tradição oral e mais propriamente nos contos de fadas (RIBEIRO, 2002, p. 14-15). Mesmo para um público de adultos (ou misto) essas histórias jamais perdem o seu encanto, sendo no entanto aconselhável que o narrador a estude previamente, conhecendo-a bem, a fim de ser capaz de transmitir todas as nuances contidas em cada trecho e em cada elemento da narrativa.

A propósito desse assunto, é preciso esclarecer que existem diferenças entre contar, ler e representar histórias, embora todas elas envolvam uma preparação e uma performance mais ou menos elaborada. A forma como se vai trabalhar depende de nossos gostos, de nosso estilo, de nosso objetivo... e, antes de tudo, de nossa sensibilidade. De qualquer forma, o narrador se beneficiará do domínio de algumas técnicas de voz e expressão corporal, bem como – mais uma vez – do conhecimento profundo da história e dos personagens. A sutileza é sempre preferível ao exagero. Como diz BUSATTO, “o Lobo Mau não precisa falar grosso para demonstrar sua ferocidade (...). O que podemos carregar do teatro é justamente a intenção que carrega um ritmo preciso” (BUSATTO, 2003, p. 76).

A partir daí tudo se torna uma questão de tempo, de paciência, de experimentação e, por que não dizer, de ousadia por parte do narrador, que irá acertar e errar muitas vezes ao longo de sua trajetória. No entanto, se for essa a sua vocação, ele irá persistir... uma vez que, para o verdadeiro contador de histórias, o ato de narrar é parte inseparável da vida.

Contar histórias não é um ato apenas intelectual, mas espiritual e afetivo. Por isso, as melhores histórias são as que contamos espontaneamente, a partir do que carregamos em nossa bagagem de cultura e de experiência de vida. Independente de qualquer sentido, contar histórias pressupõe antes de tudo a vontade de falar do que se sabe, de doar sabedoria e conhecimento, de passar adiante aquilo que se aprendeu. Mais simplesmente ainda: contar histórias é aumentar o círculo. E, mesmo na falta de uma fogueira ou das lareiras de nossas avós, podemos fazê-lo aqui e agora, partilhando nossas histórias, lançando fios invisíveis que nos unem numa só rede.

Fonte
http://www.qdivertido.com.br

Contos Populares (A Menina dos Brincos de Ouro)

Nota: Conto popular na Bahia e Maranhão. Trazido pelos escravos africanos. No original africano os personagens eram animais.

Uma Mãe, que era muito má (severa e rude) para os filhos, deu de presente a sua filhinha um par de brincos de de ouro.

Quando a menina ia à fonte buscar água e tomar banho, costumava tirar os brincos e botá-los em cima de uma pedra.

Um dia ela foi à fonte, tomou banho, encheu o pote e voltou para casa, esquecendo-se dos brincos.

Chegando em casa, deu por falta deles e com medo da mãe brigar com ela e castigá-la correu à fonte para buscar os brincos.

Chegando lá, encontrou um velho muito feio que a agarrou, botou-a nas costas e levou consigo.

O velho pegou a menina, meteu ela dentro de um surrão (um saco de couro), coseu o surrão e disse à menina que ia sair com ela de porta em porta para ganhar a vida e que, quando ele ordenasse, ela cantasse dentro do surrão senão ele bateria com o bordão (vara).

Em todo lugar que chegava, botava o surrão no chão e dizia:

Canta, canta meu surrão,
Senão te meto este bordão.

E o surrão cantava:

Neste surrão me meteram,
Neste surrão hei de morrer,
Por causa de uns brincos de ouro
Que na fonte eu deixei.

Todo mundo ficava admirado e dava dinheiro ao velho.

Quando foi um dia, ele chegou à casa da mãe da menina que reconheceu logo a voz da filha. Então convidaram Ele para comer e beber e, como já era tarde, insistiram muito com ele para dormir.

De noite, já bêbado, ele ferrou num sono muito pesado.

As moças foram, abriram o surrão e tiraram a menina que já estava muito fraca, quase para morrer. Em lugar da menina, encheram o surrão de excrementos.

No dia seguinte, o velho acordou, pegou no surrão, botou às costas e foi-se embora. Adiante em uma casa, perguntou se queriam ouvir um surrão cantar. Botou o surrão no chão e disse:

Canta,canta meu surrão,
Senão te meto este bordão.
Nada. O surrão calado. Repetiu ainda. Nada.

Então o velho meteu o cacete no surrão que se arrebentou todo e lhe mostrou a peça que as moças tinham pregado.
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Fonte:
http://sitededicas.uol.com.br

Contos Populares (Os Compadres Corcundas)

Conto de origem européia, levemente adaptado pelos brasileiros.

Era uma vez, dois compadres corcundas, um Rico outro Pobre. O povo do lugar vivia zombando da corcunda Pobre e não reparava no Rico. A situação do Pobre andava preta, e ele era caçador.

Certo dia, sem conseguir caçar nada, já tardinha, sem querer voltar para casa, resolveu dormir ali mesmo no mato.

Quando já ia pegando no sono ouviu uma cantiga ao longe, como se muita gente cantasse ao mesmo tempo.

Saiu andando, andando, no rumo da cantiga que não parava. Depois de muito andar, chegou numa clareira iluminada pelo luar, e viu uma roda de gente esquisita, vestida de diamantes que brilhavam com a lua. Velhos, rapazes, meninos, todos cantavam e dançavam de mãos dadas, o mesmo verso, sem mudar:

Segunda, Terça-feira,
Vai, vem!
Segunda, Terça-feira,
Vai, vem!

Tremendo de medo, escondeu-se numa moita e ficou assistindo aquela cantoria que era sempre a mesma, durante horas.

Depois ficou mais calmo e foi se animando, e como era metido a improvisador, entrou no meio da cantoria entoando:

Segunda, Terça-feira,
Vai, vem!
E quarta e quinta-feira,
Meu, bem!

Calou-se tudo imediatamente e aquele povo espalhou-se procurando quem havia falado. Pegaram o corcunda e o levaram para o meio da roda. Um velhão então perguntou com voz delicada:

- Foi você quem cantou o verso novo da cantiga?

- Fui eu, sim Senhor!

- Quer vender o verso? - perguntou então o Velhão.

- Quero sim, senhor. Não vendo não, mas dou de presente porque gostei demais do baile animado.

O Velho achou graça e todo aquele povo esquisito riu também.

- Pois bem - disse o Velhão - uma mão lava a outra. Em troca do verso eu te tiro essa corcunda e esse povo te dá um Bisaco novo!

Passou a mão nas costas do caçador e a corcunda sumiu. Lhe deram um Bisaco novo e disseram que só o abrisse quando o sol nascesse.

O Caçador meteu-se na estrada e foi embora. Assim que o sol nasceu abriu o bisaco e o encontrou cheio de pedras preciosas e moedas de ouro.

No outro dia comprou uma casa com todos os móveis, comprou uma roupa nova e foi à missa porque era domingo. Lá na igreja encontrou o compadre rico, também corcunda. Este quase caiu de costas, assombrado com a mudança. Mais espantado ficou quando o compadre, antes pobre e agora rico, contou tudo que aconteceu ao compadre rico.

Então cheio de ganância, o rico resolveu arranjar ainda mais dinheiro e livrar-se da corcunda nas costas.

Esperou uns dias e depois largou-se no mato. Tanto fez que ouviu a cantoria e foi na direção da toada. Achou o povo esquisito dançando numa roda e cantando:

Segunda, Terça-feira,
Vai, vem!
Quarta e quinta-feira,
Meu, bem!

O Rico não se conteve. Abriu o par de queixos e foi logo berrando:

Sexta, Sábado e Domingo,
Também!

Calou-se tudo novamente. O povo esquisito voou para cima do atrevido e o levaram para o meio da roda onde estava o velhão. Esse gritou, furioso:

Quem mandou se meter onde não é chamado seu corcunda besta? Você não sabe que gente encantada não quer saber de Sexta-feira, dia em que morreu o filho do alto; sábado, dia em que morreu o filho do pecado, e domingo, dia em que ressuscitou quem nunca morre? Não sabia? Pois fique sabendo! E para que não se esqueça da lição, leve a corcunda que deixaram aqui e suma-se da minha vista senão acabo com seu couro!

O Velhão passou a mão no peito do corcunda e deixou ali a corcunda do compadre pobre. Depois deram uma carreira no homem, que ele não sabe como chegou em casa.

E assim viveu o resto da sua vida, rico, mas com duas corcundas, uma na frente e outra atrás, para não ser ambicioso.

Fonte:
http://sitededicas.uol.com.br/

terça-feira, 10 de junho de 2008

Roda Mundo 2008 (Antologia Internacional)

O que é o Roda Mundo e como ele surgiu?
O Roda Mundo é uma Antologia Internacional que tem um caráter globalizado por contar com a participação de autores dos cinco continentes, numa integração da comunidade lusófona e também espanhola. A obra reúne crônicas, contos, poemas, ensaios e textos em português, inglês, italiano e espanhol, montando assim um panorama dos diferentes estilos, tendências, culturas e maneiras de enxergar o mundo, por meio da palavra impressa.

O livro é publicado em sistema de cooperativa, reunindo escritores brasileiros e também de diversos países. Experientes ou não, participam pessoas de diferentes áreas e também pessoas que querem publicar os seus primeiros textos em um livro.

Idealizado pelo escritor Douglas Lara, o Roda Mundo teve início em 2004, reuniu 43 autores de 12 países de quatro continentes. Por ter ganho a simpatia do público, a atenção da imprensa e o respeito de outros escritores, tem se perpetuado em suas edições seguintes. Um dos autores do Roda Mundo 2005 foi o goiano Luiz de Aquino, que faz parte da equipe de articulistas e que colabora regularmente com o Diário da Manhã. Para Aquino, participar do livro "é como participar de uma festa. É um jeito de juntar gente", define. Para ele, a importância da coletânea está na grande diversidade de autores, gêneros e estilos-acentuados ainda mais pela diferença de formação cultural de cada um dos participantes.

Nesse caminho de sucesso, a participação em Roda Mundo 2006 foi um recorde: 50 escritores (50 estilos e 50 histórias) fazem parte da Antologia Internacional. Entre algumas curiosidades do livro estão: o autor mais novo tem apenas 11 anos de idade e a mais velha passa dos 70 anos.

Neste ano de 2008, o Roda Mundo continua trilhando o seu caminho reunindo textos de várias autorias e assuntos, trazendo para o seu público um belíssimo livro para ser apreciado por pessoas distintas. Ele está saindo do forno e será lançado no dia 24 de julho durante a Semana do Escritor de Sorocaba. No mesmo dia também será lançado, o seu “filho”, o Rodamundinho 2008, antologia infanto-juvenil idealizada por Douglas Lara que reúne textos de jovens de sete a 15 anos.

A Semana do Escritor de Sorocaba deste ano tem início no dia 22 e segue até 27 julho na Fundec – Fundação de Desenvolvimento Cultural de Sorocaba que fica na Rua Brigadeiro Tobias, 73 Centro – Sorocaba/SP. Os interessados podem participar gratuitamente e prestigiar os autores e os seus livros que estarão expostos durante toda a Semana.

Quem quiser participar das Antologias e/ou da Semana do Escritor pode entrar em contato com o escritor Douglas Lara pelo e-mail: douglara@uol.com.br

Fonte:
http://recantodasletras.uol.com.br/cartas/999305
Colaboração de Douglas Lara

Calendário de Concursos de Trovas e Jogos Florais 2008

06,07 e 08 de Junho: Jogos Florais de Nova Friburgo
20, 21 e 22 de junho: Jogos Florais de Curitiba
22 de junho: IV Concurso de Maranguape
05 de julho: Concurso de Pindaminhangaba
12 e 13/07 – Concursos da UBT São Paulo
03 de setembro – Concurso Rosacruz – Londrina
12, 13 e 14/09 – JF de Bandeirantes
27 de setembro: III Jogos Florais de Cambucí
11 de outubro: XVI Concurso de Taubaté
11 de outubro: Concurso Vicentino de Taubaté
08 de novembro: Jogos Florais de Cantagalo
07, 08 e 09 de novembro: III Jogos Florais de Camburiu
15 e 16/11 - Concurso de Belo Horizonte
29 e 30 de novembro: Jogos Florais de Niterói
13 e 14 de dezembro: XXI Jogos Florais de Pouso Alegre

Fonte:
Calêndula Literária. Boletim Informativo da UBT Porto Alegre. n.360. junho 2008.

Comemoração do Dia do Trovador em Porto Alegre


Milton Hatoum (Machado para o Jovem Leitor)

O texto inaugural desta coluna na EntreLivros intitula-se “A parasita azul e um professor cassado”. Nessa crônica, escrevi: “Dois acasos foram decisivos na minha juventude: o primeiro me conduziu à obra de Machado de Assis; o segundo, a uma biblioteca vasta e sombria, escondida numa sala subterrânea”.

Mais de dois anos depois, volto aos contos de Machado para dialogar com os professores.

Uma das questões sobre o ensino de literatura brasileira para jovens estudantes (da primeira à terceira série) diz respeito aos critérios da seleção bibliográfica. Infelizmente, prevalece a idéia de que os alunos não têm condições de ler textos complexos. Um texto complexo não é necessariamente pesado, chato, algo que se lê com extrema dificuldade. Para um jovem do nosso tempo, não deve ser fácil nem prazeroso ler um romance de Coelho Neto ou A bagaceira, de José Américo de Almeida. Esses, sim, são textos pesados, que carregam na ênfase e no vocabulário precioso. Confesso que, na minha juventude, penei para ler esses autores. E quando li dois romances extraordinários de prosadores nordestinos – O quinze, de Rachel de Queiroz, e Vidas secas, de Graciliano Ramos – o romance de José Américo tornou-se, por contraste, ainda mais enfadonho.

Mesmo Os sertões e O Ateneu – livros fundamentais da nossa literatura – são difíceis de ser assimilados por um jovem do ensino médio.

Passei por essa provação como se fosse uma penitência. De fato, minha leitura de trechos da obra-prima de Euclides da Cunha foi conseqüência de uma punição coletiva, um castigo imposto por um professor que não descobriu o culpado de uma infração grave, cometida no colégio onde eu estudava. Nessa mesma época, ganhei as obras completas de Machado de Assis e li o conto “A parasita azul”. Depois li os outros contos do volume Histórias da meia-noite. Gostava desse título, que me remetia a histórias de suspense, horror e mistério. Havia algum mistério e suspense nos contos, mas não da maneira que eu esperava. Lembro que os li com prazer, e me perguntei por que um dos professores de português nos obrigava a ler Coelho Neto e José de Alencar e não Machado de Assis. Por que Iracema e não Dom Casmurro? E, nesse caso, por que não ler ambos?

II
Havia – como ainda há – imposições curriculares, mas penso que isso é um equívoco, pois o leitor jovem e inexperiente pode odiar para sempre a literatura brasileira, pode pensar que só existem textos ásperos, cuja leitura é sinônimo de suplício. É inadmissível que tantos jovens desperdicem a oportunidade de ler “A causa secreta”, “O enfermeiro”, “Missa do galo”, “O espelho”, “Uns braços”, “Um homem célebre”, “Terpsícore”, “A cartomante”, “Evolução” e outros contos do Bruxo, um verdadeiro mestre da narrativa breve, que se situa no mesmo patamar de excelência de seus contemporâneos europeus.

É muito provável que esses contos sejam lidos e comentados sem enfado. Porque uma leitura enfadonha e arrastada é, para o leitor jovem – e talvez para todo leitor –, um ato de flagelação do espírito. Claro que há textos intricados e nada tediosos, que são imprescindíveis para quem gosta de literatura. Quem não se deleita com a leitura dos romances Grande sertão: veredas e O século das luzes? São livros para quem já passou por uma experiência de leitura e não se sente inibido diante de obras cuja linguagem enfatiza um notável trabalho de estilização. Mas um iniciante certamente encontrará dificuldade para ler esses romances.

Nos contos de Machado ocorre algo diferente. Com um estilo muito elaborado, mas pouco ou quase nada rebuscado, o narrador machadiano explora em poucas páginas a complexidade das relações humanas. Sua linguagem é densa sem ser retórica, e os contos são exemplos perfeitos de complexidade concentrada num texto conciso e exato.

Um exemplo é “A causa secreta”, publicado em 1885 na Gazeta de Notícias e incluído em Várias histórias (1895). Eis aí uma aula sobre o conto enquanto gênero literário. Logo no primeiro parágrafo, depois de apresentar as três principais personagens numa cena que poderia ser filmada, o narrador escreve: “Tempo é de contar essa história sem rebuço”. Ou seja, é tempo de ir diretamente ao miolo da questão. E a questão é, na verdade, um feixe de questões machadianas: o adultério, as relações sociais, a violência, a loucura, o amor, a dor moral. Em menos de 15 páginas, o narrador constrói uma das personagens mais terríveis da nossa literatura: um homem (Fortunato) que se ocupava “nas horas vagas em envenenar e rasgar gatos e cães”.

Fortunato revela o lado mais obscuro e violento do ser humano. Já é clássica a cena em que ele mutila e queima um rato “com um sorriso único” no rosto, “uma serenidade radiosa da fisionomia” ou “um vasto prazer, quieto e profundo”. No fim, a dor física dos animais é substituída pela dor moral de Garcia, quando este tentar beijar pela segunda vez Maria Luísa, já morta. Fortunato, o esposo e agora viúvo, “saboreou tranqüilo essa explosão de dor moral, que foi longa, muito longa, deliciosamente longa”.

III
Os professores que comentam esse conto em sala de aula sabem que os estudantes se interessam pelo texto. A leitura no cabresto é inconseqüente, pois o maior estímulo para um jovem reside no prazer da leitura. Há, sem dúvida, outros grandes autores cuja obra é estimulante. Os contos de Insônia e Laços de família são apenas dois exemplos, entre muitos da literatura brasileira. Mas os de Machado não podem ser esquecidos, porque estão no centro da nossa modernidade e irradiam uma das visões mais críticas e inteligentes sobre o ser humano e a sociedade brasileira.
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Sobre o Autor
Milton Hatoum é escritor, autor de Relato de um certo Oriente, Dois irmãos e Cinzas do Norte, com o qual conquistou os prêmios Jabuti, como o livro do ano na categoria ficção, e Portugal Telecom, em primeiro lugar
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Fonte:
Revista Entrelivros - edição 30 - Outubro 2007
http://www2.uol.com.br/entrelivros/

Gislaine Canales (1938)

Gislaine Canales nasceu em Herval/RS/BR, em 20/04/38. Divorciada. Quatro filhos. Sete netos. Bacharel em Pedagogia e Licenciada em Didática, Poetisa, Trovadora. Glosadora, Pescadora, com o nº de registro 0300862-21. Possui trovas classificadas em inúmeros concursos. Pertence a várias Instituições Literárias do Brasil e Exterior. Membro benemérito do Centro Cultural, Literário e Artístico da Gazeta de Felgueras/Portugal. The International Academy of Letters of England.

Tem trovas vertidas para o italiano pelo Prof. Antônio Boscatto e enviadas para o Centro Cultural de Veneto/Itália.

Possui também poesias traduzidas para o Espanhol, pelas poetisas: Carmen Patiño Fernandez, da Espanha; Sofia Ríccio, do Uruguai, Maria Elena, do México e Lisete Johnson Oliveira, do Brasil. Participa de 28 Antologias Poéticas e dos Dicionários de Poetas: Directory of International Writters / EUA, Publication on International Poety University of Colorado / 1987, Dicionário de Poetas Contemporâneos / 1991.

Publicou: "GlosandoTrovas" / 1987. Em preparo: "Glosando Trovas II" e "Tênis de Sextilhas".

Convidada a fazer parte do quadro efetivo de poetas do Rincón Poético do Site Espanhol: Poemasromancesyamor.

Livros Virtuais: "Glosas Virtuais de Trovas" – (31 Volumes) – Com Glosas de Trovas de inúmeros Trovadores do Brasil e Exterior, "Glosando Lourivaldo Perez Baçan ", "Glosando Delcy Canalles", "Glosando Joamir Medeiros", "Glosando A A de Assis" e Glosas das Trovas Classificadas no I Concurso Nacional / Internacional de Trovas de Balneário Camboriú / Santa Catarina / Brasil.

Fonte:
http://www.gislainecanales.com/

Gislaine Canales (Trovas)

Novo tempo, nova história,
nova era, novo amor!
Antiga, só a memória
que, aos poucos, perde o valor!

Cada livro é uma vitória
na memória de um País,
pois nos diz de sua glória
e é, da história, a geratriz!

Um mundo melhor...queria,
para deixar aos meus netos,
onde imperasse a alegria
numa transfusão de afetos!

É de ternura o momento
em que o Sol sorri do espaço,
se faz vida e sentimento
e lança ao mar seu abraço!

O mar é o mais doce amante
pois não cansa de beijar,
num lirismo alucinante,
toda a praia que encontrar!

Me envolve com mil abraços,
com mil beijos de afeição,
esse mar, de doces braços
com seus lábios de paixão!

Sou feliz ao relembrar
que realizei meu desejo...
Como foi bom te beijar!
Como foi bom o teu beijo!

Sou tão triste e tão sozinha,
que o eco do meu lamento,
desta saudade tão minha,
escuto na voz do vento!

Eu prossigo o meu caminho,
procurando um grande amor,
que me envolva com carinho
e me aqueça com calor!

Meus lábios apaixonados
bebem o orvalho dos teus,
desses teus lábios molhados,
que sonham com os lábios meus!

Sendo a vida embriagante
devemos vivê-la bem.
"Há sempre um mágico instante,"
há sempre um mágico alguém!

Vem amor, vamos embora,
de mãos dadas pelo mundo,
"vamos viver vida afora,"
esse nosso amor profundo!

Nosso romance de amor
começou bem diferente...
Foi nosso Computador
que aproximou mais a gente!

Nunca mais fiquei sozinha,
pois na Internet eu namoro,
e essa solidão que eu tinha
não mora mais onde eu moro!

"Teu beijo pela Internet"
traz amor, traz alegria,
é sempre a melhor manchete
acarinhando o meu dia!

Meu interior é risonho,
e posso a todos dizer
"que trago um mundo de sonho"
no meu modo de viver!

Vou vivendo meus agoras,
entre sonhos e utopias,
vou transformando em auroras
"as minhas noites vazias."

Tudo é tão encantador,
nosso amor é tão bonito,
"que, em cada noite de amor"
ultrapasso o infinito!

"Tua idade não importa,"
se feliz quiseres ser,
pois ao amor, não comporta
ter idade pra nascer!

Canto as estrelas nos versos,
com minha alma apaixonada...
Vou acendendo Universos...
"Criando luzes...do nada!"

Quero cantar pelo espaço
e, nas estrelas, rever
todas as trovas que eu faço.
Trova é prece em meu viver!

Sinto as mãos da solidão
num carinho de verdade,
trazendo ao meu coração,
das tuas mãos, a saudade!

A mistura de mil cores
e toda a luz do universo,
mais o perfume das flores,
desejo pôr no meu verso!

O sol dourado se espraia
tão lindo.com seu calor,
por toda a areia da praia
em doces beijos de amor!

A minha vida é uma Trova,
trova de ilusão perdida,
pois a vida é grande prova,
que prova a Trova da vida!

Eu quero poder cantar
meus versos aos quatro cantos,
talvez possa transformar
em risos, todos os prantos.

Sozinhas nas madrugadas,
donas do mundo e da lua,
nossas mãos entrelaçadas
seguem juntas pela rua!

É contrastante a ironia,
nesta verdade contida:
lindo o entardecer do dia,
triste o entardecer da vida!

Vivemos juntos, mas sós,
nossa solidão somada,
fez de ti, de mim, de nós,
a soma triste do nada!

A saudade da saudade,
varreu, de mim, a alegria,
levando a felicidade
que eu pensava que existia!

As eternas madrugadas
me encontram sempre a chorar.
A vida, cheia de nadas,
não me deixa mais sonhar!

Meu verso é meu companheiro
no cenário da ilusão
e o universo, imenso, inteiro,
se torna pequeno, então!

O prazo que nós tivemos
para o nosso amor viver,
foi pouco. Nos esquecemos
antes do prazo vencer!

Hoje estou triste, alquebrada,
sem amor, sem alegria,
mas prossigo a caminhada...
Amanhã é um novo dia!

Não lembro de ti, passado,
pois, consegui te esquecer,
agora, só tenho ao lado
os sonhos que vou viver!

A vida é renovação,
(é amor, é sonho e alegria),
é feita só de emoção,
recomeça a cada dia!

Quando existe amor sincero
é forte a emoção que traz,
e ele mostrará, austero,
a grande força da paz!

"Somos os dois um só mundo",
somos um só, na verdade,
e esse nosso amor profundo,
é mais que amor, é amizade!

Em meu coração alterno
as estações...todo o dia,
tornando, assim, meu inverno,
lindo verão de poesia!

"Enganam-se os ditadores"
que pensam poder tirar
do mundo, nós, trovadores
e o nosso jeito de amar!

A minha vida é um romance,
pois sonhando sou feliz...
Eu deixo que o vento trance
os sonhos que eu sempre quis!

Eu tenho um sonho bonito:
Caminhar por sobre as águas
e ao chegar ao infinito,
esquecer todas as mágoas!

Realizando utopias
meu coração quer amar,
no crepúsculo dos dias
da minha vida a findar!

A noite recebe a tarde
num momento de magia...
No pôr-do-sol, o céu arde
e tudo vira poesia!

O amor é pura magia
e a ternura da emoção
traduz-se nessa alegria
plantada no coração!

Era noite e a escuridão
pensou que raiava o dia,
ao sentir com emoção
a luz da tua poesia!

Nosso romance virtual
é tão doce e verdadeiro
que se torna o mais real
romance, do mundo inteiro!

Numa oração, com carinho,
eu peço a SAN VALENTIN:
Coloque no meu caminho
um amor real pra mim!

Que a paz mundial, que sonhamos,
não seja mera utopia...
Para alcançá-la, vivamos
com muito amor cada dia!

Lutemos pela conquista
da paz mundial no universo,
numa guerra pacifista,
usando as armas do verso!

A paz mundial é utopia
dizem uns...Não é verdade,
se buscarmos na Poesia
as armas da Humanidade!

Gislaine Canales (Glosas)

Glosando José Westphalen Correa

SONHO SER CRIANÇA

MOTE:
AO SENTIR A ALMA PERDIDA
NA PROCURA DA ESPERANÇA,
HÁ MOMENTOS NESSA VIDA
EM QUE SONHO SER CRIANÇA!
===========================
AO SENTIR A ALMA PERDIDA
no desencanto dos anos,
sinto que ela está ferida,
por sentimentos humanos.

Eu sigo, então, à procura,
NA PROCURA DA ESPERANÇA,
sempre a fugir da amargura,
sempre a buscar mais confiança!

E nesta estrada comprida
cheia de encanto e beleza
HÁ MOMENTOS NESTA VIDA,
em que sinto dor, tristeza.

Entre as horas - nostalgia,
saudade e desesperança,
uma, existe, de alegria:
EM QUE SONHO SER CRIANÇA!
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx

Glosando Lacy José Raymundi

ARMAZÉNS DA LEMBRANÇA

MOTE:
MINHA MEMÓRIA PROCURA,
NOS ARMAZÉNS DA LEMBRANÇA,
OS FARDOS DE TRAVESSURA,
DOS BONS TEMPOS DE CRIANÇA!...
==============================
MINHA MEMÓRIA PROCURA,
numa viagem gostosa,
os momentos de brandura
de minha infância ditosa!

Perambula pelos cantos,
NOS ARMAZÉNS DA LEMBRANÇA,
e ouve até os acalantos
num doce tom de esperança!

Em nossa idade madura,
é muito bom recordar
OS FARDOS DE TRAVESSURA,
do tempo do velho lar!

Recordando essa alegria,
o riso vem, sem tardança,
e eu revivo a euforia
DOS BONS TEMPOS DE CRIANÇA!...
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx

Glosando Edmar Japiassú Maia

MEU DEPOIS...

MOTE:
PERDIDO E ENTREGUE AO DESGOSTO,
SE ANTIGOS TRAÇOS PERSIGO,
ENCONTRO O TEMPO EM MEU ROSTO,
NUM DESENCONTRO COMIGO!...

=================================
PERDIDO E ENTREGUE AO DESGOSTO,
nesta amarga solidão,
não vejo a vida com gosto,
nem vibro mais de emoção!

Se recordo a juventude,
SE ANTIGOS TRAÇOS PERSIGO,
o espelho me desilude,
não tenho nele um amigo!

É hora do meu sol posto
e é o fim da minha estrada...
ENCONTRO O TEMPO EM MEU ROSTO,
só vejo sulcos, mais nada!

O meu depois, já chegou...
Aceitar-me, eu não consigo,
por isso, lutando, eu vou
NUM DESENCONTRO COMIGO!...
Fonte:
CANALES, Gislaine. Glosas Virtuais de Trovas VIII.2003.
Biblioteca Virtual "Cá Estamos Nós". Portal CEN
http://www.portalcen.org

segunda-feira, 9 de junho de 2008

4ª Semana do Escritor recebe inscrições


Estão abertas as inscrições para autores que desejam divulgar suas obras durante a 4ª Semana do Escritor de Sorocaba, que será realizada de 22 a 27 de julho na Fundação de Desenvolvimento Cultural de Sorocaba - Fundec. (As inscrições vão até o dia 18 de julho).

Organizado pelo escritor Douglas Lara, a Semana do Escritor é uma oportunidade para autores, principalmente os iniciantes, divulgarem o seu trabalho. Também é uma forma de dar visibilidade às obras locais, já que Sorocaba e região contam com grande número de autores sendo a maioria desconhecidos pela população de sua própria cidade. A administração do evento fica com a conhecida owner da confraria de poetas e escritores: Teia dos Amigos, Sonia Maria Grando Orsiolli (teiadosamigos@uol.com.br)

A participação será de R$ 50,00 (lançamentos R$ 100,00) por título, sendo que o escritor interessado deve disponibilizar para o evento 10 exemplares do livro, que poderá ser vendido pela metade do preço de livraria. Coletâneas contribuem com R$ 200,00, nos casos de 10 ou mais participantes. O escritor que ainda não fez o lançamento de sua obra poderá fazer durante o evento.

A semana literária reunirá dezenas de autores independentes, editoras e livrarias, com sessões de autógrafos, lançamentos e palestras.

Como acontece em todos os anos, haverá no dia 24 o lançamento da coletânea Roda Mundo 2008 junto a uma grande surpresa que será o lançamento da primeira antologia infanto-juvenil o Rodamundinho 2008.

A Semana do Escritor conta com patrocínio do Gabinete de Leitura Sorocabano e Editora Ottoni
.
Autores interessados em divulgar suas obras podem entrar em contato com escritor Douglas Lara pelo telefone (15) 3227-2305 ou pelo e-mail douglara@uol.com.br

A Semana do Escritor de Sorocaba será realizada de terça-feira a sábado, das 14h às 22h, e no domingo, das 10h às 18h com entrada gratuita. A Fundec fica na Rua Brigadeiro Tobias, 73 Sorocaba/SP. Telefone: (15) 3233-2220.

Evento patrocinado pelo:
Gabinete de Leitura Sorocabano e Editora Ottoni

Apoio Institucional:
Fundação de Desenvolvimento Cultural de Sorocaba - Fundec

Cintian Moraes - jornalista
Telefones: (15) 8119-2476 ou pelo e-mail: cintian.moraes@yahoo.com.br

As mais bellas lendas do continente americano

Publicado na Folha da Manhã, domingo, 25 de dezembro de 1938
Neste texto foi mantida a grafia original

Como surgiu a "Monja Blanca", a flôr nacional da Guatemala

Realizou-se no anno passado, na Guatemala, um original concurso literario, promovido pelo governo dequella republica. O thema desse concurso era a "Monja Blanca", a formosa orchidea dos Andes, que é a flor nacional da Guatemala. O trabalho que publicamos a seguir, "Avatar", foi um dos premiados nesse concurso e é de autoria da poetiza guatemalense Angelina Acuna. Traduziu-o especialmente para o Supplemento da "Folha da Manhã" o sr. J. R. Marcondes Machado, detentor da Cadeira da Guatemala na Academia de Letras Americanas da Faculdade de Philosophia, Sciencias e Letras da Universidade de São Paulo.

Oh, Xmucané! Clamava a donzella - Oh, Xpiyacoe! Vós que fizestes homens de "tzité", mulheres de "zibak"; vós que fizestes seres perfeitos com a polpa branca do milho moido...! Que farei eu, pobre de mim, para realizar este milagre?

E ao pé dos "galayos" erguidos em ameaça de precipicios, a terna princeza Ismaleg fazia rosarios de angustia, com as contas escorregadiças de suas lagrimas. Em vão percorrera as selvagens ribeiras do Chixoy, as intricadas ramargens de Havitz e de Joyabaj; os montes e os rios escondiam-lhe os thesouros com aggressivo egoismo.

Entretanto, na longinqua Zamaneb, a poderosa cidade, gemia prisioneiro, num dos nove castelos encantados, coroados de almeias de lendas fantasticas e macabras, o amado de sua alma!... Creou uma rede fatal sobre sua vida a ousadia de amal-a... A ella! A princeza mimada do Ahau do Rabinal!... quando só podia offerecer-lhe as gemmas preciosas dum amor incommensuravel, encastoadas no estojo delirante de seu coração! Ia consummar-se o sacrificio impio, que, ao castigar com a morte o atrevimento do jovem "quecchi", abriria num transbordamento de cálidos rubis, a urna que encerra o seu milagroso thesouro, quando a princeza se abateu, qual avezinha de azas quebradas, aos pés do cacique, implorando, com grito de angustia, o perdão da victima.

O gemido lastimoso furou, como uma flecha diamantina, o coração granitico do Ahau, e fez de reconditos lugares a clara serpentina dum frio de ternura:

- Vaite de minhas vistas! Gritou á filha. Perdoarei a vida deste vassallo perfido, porém não voltarás a vel-o enquanto não me trouxeres seu resgate...

O olhar supplice de Izmaleg como uma interrogante imploração, descerrou o cenhudo perfil do indignado senhor:

- Antes que a lua redonda alumie a collina do Xucaneb - ordenou-lhe - has de trazer-me algo que possa substituir, ante os deuses, a offerenda do coração do teu amante... Ha de ter, como um coração, a belleza que agrada aos deuses: deve encerrar a essencia vital do grande amor que diz sentir por ti; deve ter vida e o merito que implica o sacrificio, emblema da redempção!...

Desde esse instante, Izmaleg se poz a vagar em busca do milagre;. entretanto, no mais fundo subterraneo do castello de Zamaneb, enlutavam-se de noites dolorosas, os dias de seu amante... e uma meia lua amarellada, como dourada foice, cegava molhos de estrellas nas fulgidas eras da noite!...

- Oh Xmucané! Oh, Xpiyacoc! Vós fizestes seres perfeitos com a polpa branca do milho moido" que farei eu, pobre de mim? - chamava Izmaleg. A lua levantar-se-á de prompto sobre a christa do Xucaneb, redonda... redonda...

Enquanto assim implorava, ao pé do abrupto penhasco, esgotadas as forças e as lagrimas na busca angustiosa, aconteceu que o Pastor luminoso que cuida das ovelhas-estrellas nos redis estellares, deixou cahir entre as mãos morenas de Izmaleg, a alvura explendorosa duns myrificos flocos. Sem lhe dar tempo de sahir de seu assombro, a voz da cascata que se despenha em franjas, falou em claro murmurio:

- Levanta-te donzella, aqui esta a minha espuma; é a neve fundida que venho arrastando de altissimos cumes, jámais tocada por planta alguma! Que mais queres?

O gozo ineffavel urdiu dextresas inauditas nas ageis mãos que se puzeram a modelar fantasiosamente flocos sidereos e espumas impeccaveis; e, num ensalmo de maravilha, feerico milagre, abriu-se em candida corolla de alvura prodigiosa, uma exotica flôr!... A que deuses não agradaria sua explendida belleza? Porém - ah! - era uma flor sem vida... de niveas pétalas mortas, que nenhum alento vital exhalavam!...

O coração de Izmaleg alçou de novo o queixumoso arrulo; e, pesando na fatidica sorte do amado, que talvez nunca mais visse, rodaram-lhe as lagrimas, em um debulho de chrystallinas ternuras, sobre o calice de neve, que tremia em suas mãos; as pétalas estremeceram-se, então, sob a chuva milagrosa., Oh!, poder do amor...

"Ha de ter vida... e o merito que cria o sacrificio emblema de redempção...!" A phrase implacavel volteava-se como fatal mariposa de impossiveis, sobre a flor que parecia desfazer-se em diaphanas deliquescencias de neve, apagar-se como reflexos de estrellas moribundas...

- A vida... a vida...! oh, Xpiyacoc! Onde acharei a vida? Oh Xmucané! Só falta à lua uma restea de luz, uma resteazinha que lhe ha de pregar em sua borda o Oleiro Celeste com greda de luzeiros, e assomará amanhã sobre o Xucaneb, redonda... redonda...

Como se o lamento de Izmaleg tivesse a magia de um sortilegio, a montanha abriu em seu flanco o portico de uma gruta fantastica e, numa labareda prateada, surgiu a barba luminosa do bruxo do monte.

- Que me pódes dar em troca do milagre? - perguntou a Izmaleg.

Com grandiosa renuncia, disse:

- Se te bastasse a vida... dar-te-ia!

A voz prophetica do feiticeiro fez tremer a montanha, quando clamou:

- Farei o milagre: tua flor terá a vida... e o merito que te exigem! Vae a Zamaneb, e amanhã, antes que a lua avive sua bandeja redonda, cheia de luz, sobre o Xucaneb, deixarás a flor nas mãos do Ahau...

Na noite de azues mysterios sonhavam os astros; e, como prenuncio da lua vinha um halo luminoso subindo a testada do Xucaneb, quando Izmaleg chegou, desfallecida, á cidade dos nove castellos encantados da lenda. Cheia de fé na magia do bruxo, á espera do milagre que já presentira, prostrou sua fadiga e suas roupagens aos pés do cacique inplacavel! Vestida sómente do manto negro de sua cabelleira, alçou no reconcavo de suas mãos o thesouro, e disse tremendo:

- Senhor... eis o resgate. Não ha outra igual sobre a terra! É tão bella e tão pura! Tem a essencia do amor atormentado que verteram minhas lagrimas em sua corola...

- Mas isto é uma flor artificial!... interrompeu zangado o cacique. Isto não tem vida!... Não viste ainda como palpita o coração das victimas nas mãos do sacrificador?... Fala! Que me respondes?...

Porém Izmaleg, prostrada para sempre sob o sudario negro de seus cabellos, não poderia mais responder com seus labios á cruel interrogação. A flor, com uma suave estremecimento, como ultimo alento de um coração, começou a palpitar entre as mãos tremulas do aterrado Ahau do Rabinal, enquanto um effluvio vital, saturando as petalas como doce selva, parecia exclamar:

- Assombra-te e treme, alma cruel, ante o mais prodigioso e tremendo dos milagres! Sou a vida de Izmaleg; sou o supremo sacrificio de sua alma pura, que clamava pela redempção do captivo!

Sobre Xucaneb, a lua tambem contemplava, pasmada, aquella scena.

Desde então vive na solidão dos cumes a mystica orchidea ("Lycaste Skineri Alba") "Monja Blanca". Nos altares tropicaes de Tezulutan é o calice sagrado em que se communga pela redempção dos captivos... Coração impolluto em que palpita um alento de abnegação e sacrificio, a alma da raça aborigene; flor sensivel, predestinada, como Izmaleg que lhe deu a alma branca e pura, como o Evangelho da Paz com que o doce frei Bartholomeu conquistou as agrestes serranias de Zamaneb; flor emblematica que ama os cumes dos Andes, aonde não chegam as exhalações do pantano, que talvez manchariam a sua immaculada nobreza...

Que eloquente symbolo sobre o pendão da minha Patria, sob o iris esplendido do Quetzal!

Fontes:
http://almanaque.folha.uol.com.br/
http://www.buriedmirror.com/ (imagem)