sexta-feira, 4 de julho de 2008

3a. Edição do Prêmio VivaLeitura

As inscrições para a 3a edição do Prêmio VivaLeitura terminam no próximo dia 8 de julho. Podem participar do concurso projetos de escolas e bibliotecas públicas, privadas e comunitárias, ONGs, pessoas físicas, universidades, faculdades e instituições sociais. O vencedor de cada categoria receberá um prêmio de R$ 30 mil. Uma menção honrosa será atribuída a projetos de empresas públicas e privadas. O Prêmio VivaLeitura integra o Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL) e tem o objetivo de estimular, fomentar e reconhecer boas práticas de leitura. Iniciativa dos Ministérios da Cultura (MinC) e da Educação (MEC), em conjunto com a Organização dos Estados Ibero-americanos para Educação, a Ciência e a Cultura (OEI), o prêmio é patrocinado pela Fundação Santillana. As inscrições são gratuitas.

fonte:
Divulgação por Douglas Lara

Autores Atuais Reescrevem Machado de Assis

No centenário da morte de Machado de Assis, com organização do premiado contista, doutor em Letras pela Unicamp e professor universitário Rinaldo de Fernandes, a Geração Editorial lança a antologia Capitu mandou flores: contos para Machado de Assis nos cem anos de sua morte, que, além de incluir os dez melhores contos de Machado, traz um conjunto de narrativas recriando esses dez melhores contos e passagens/situações do romance Dom Casmurro. São autores renomados, emergentes e jovens promessas da literatura brasileira atual que reescrevem Machado de Assis na antologia: Lygia Fagundes Telles, Moacyr Scliar, Hélio Pólvora, Cecília Prada, Nelson de Oliveira, André Sant’Anna, Fernando Bonassi, Glauco Mattoso, Ivana Arruda Leite, Andréa del Fuego, Marcelo Coelho, Deonísio da Silva, Daniel Piza, Godofredo de Oliveira Neto, Bernardo Ajzenberg, João Anzanello Carrascoza, Antonio Carlos Secchin, Leila Guenther, Marilia Arnaud, Rinaldo de Fernandes, Raimundo Carrero, Mário Chamie, Aleilton Fonseca, Tércia Montenegro, Maria Valéria Rezende, Maria Alzira Brum Lemos, W. J. Solha, Amador Ribeiro Neto, Carlos Gildemar Pontes, Nilto Maciel, Aldo Lopes de Araújo, Suênio Campos de Lucena, Carlos Ribeiro, Ronaldo Cagiano e Sérgio Fantini.

Diz Rinaldo de Fernandes, no texto de apresentação da antologia: “O conto ‘Missa do Galo’, de Machado de Assis, é aqui recriado por quatro escritores. Osman Lins, na década de 70, já havia preparado um livro propondo o mesmo a cinco autores: Antonio Callado, Autran Dourado, Julieta de Godoy Ladeira, Lygia Fagundes Telles e Nélida Pinõn. O próprio Osman Lins, com uma narrativa inédita, integrou o livro, intitulado Missa do Galo – variações sobre o mesmo tema. Retomei o projeto do autor de Avalovara e o ampliei. Agora não apenas ‘Missa do Galo’ é refeito, mas ainda nove outros contos de Machado. O conjunto dos dez contos aqui reescritos: ‘Missa do Galo’, ‘A Cartomante’, ‘O Espelho’, ‘Noite de Almirante’, ‘A causa secreta’, ‘Pai contra mãe’, ‘O Alienista’, ‘Uns braços’, ‘O Enfermeiro’ e ‘Teoria do medalhão’. Foram, na ordem em que estão, escolhidos como os melhores do Bruxo por dezessete escritores brasileiros, em enquete que realizei”. Diz ainda Rinaldo: “Para ampliar ainda mais o projeto em que me baseei, aqui são reescritos também trechos/situações do Dom Casmurro (um resumo do romance foi feito pela professora de literatura brasileira Sônia Maria van Dijck Lima). Há ainda alguns ensaios, fechando o livro, que investigam aspectos importantes da ficção, da poesia e do teatro machadianos.” Ensaios imperdíveis, de autores importantes, como Silviano Santiago, Luiz Costa Lima, Pedro Lyra, Regina Zilberman e André Luís Gomes.

Enquanto, no presente, para prestar homenagem aos cem anos de morte do autor, alguns lançamentos acumulam-se buscando cobrir as tantas facetas da produção de Machado, este Capitu mandou flores consegue abarcar várias delas de uma só vez: traz narrativas insuperáveis do célebre escritor, as recriações dessas narrativas e ainda ensaios bastante esclarecedores de aspectos fundamentais da obra do autor de Brás Cubas.

Com certeza, este livro ficará entre as obras mais importantes da literatura brasileira contemporânea. Um exercício de reescritura de Machado de Assis até aqui nunca proposto em nossas letras, abrangendo tantos autores e textos de qualidade. Pode-se afirmar sem medo: um livro ímpar, para ser lido por gerações. Um livro imperdível!
www.geracaoeditorial.com.br

RUA MAJOR QUEDINHO, 111 – 20º. ANDAR - 01050-030 – CENTRO – SÃO PAULO – SP - BRASIL
55 11 3256-4444 – FAX 3257-6373 – EMAIL GERACAO@TERRA.COM.BR

Fonte:
Colaboração do escritor Nilto Maciel

Regine Limaverde (Teu Cheiro - O Tamanho do Amor - Palavra - Ao Mar Tu Pertencias)

Teu Cheiro

Teu cheiro - meu mundo
Tua boca - o universo.
Teu beijo - minha vida.
Teu amor - o meu verso

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O Tamanho do Amor

O amor cabe
numa mão.
O amor cabe
num grito.
O amor cabe
numa palavra.
O amor é o céu
e cabe no infinito.
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Palavra

A palavra - faca de dois gumes.
Desassossega, alivia.
Pode ser faca, matar.
Pode ser remédio, curar.

A palavra sai e é punhal e alívio.

Na busca da palavra me perco,
me encontro, me enervo, me embalo.

Na busca da palavra canto-música
Te invoco- suspiro.

Pela palavra choro,
Pela palavra rio.
És a palavra e ao
invocar tua imagem,
sorrio. Sou rio.
===================
Ao mar tu pertencias

Ao poeta Fernando Mendes Vianna (que partiu há pouco) 30/10/2006

Ao mar tu pertencias,
estranho marinheiro
da poesia.
Embarcavas no seco e molhado,
eras um mágico encantado,
o sol e a madrugada,
um final de estrada.
Eras a poesia bem dita,
a palavra bendita.

Partiste e deixaste
o vazio.
Eras da poesia, o fio.
Hoje, a noite apagou o dia
e, embora há muito
não te encontrasse
te sabia ao alcance da mão.
Fiquei mais pobre no meu coração.
Se me visses, dirias
que não sou eu.

Voltaste para as plagas de
onde vieste..
Agora teus versos serão cantados
na terra dos encantados.
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Sobre a autora
Poeta e contista, mestre em tecnologia de alimentos e doutora em microbiologia do pescado. Autora de 14 livros, sendo 13 de literatura e um de microbiologia. Detentora do Prêmio do Estado do Ceará (Poesias) em 1983, Prêmio Osmundo Pontes (poesias) em 1997, Prêmio Gente de Bem Fica para Sempre (poesias) em 2002 e Medalha Labomar 40 anos (mérito científico).
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Fontes:
Academia de Letras e Artes do Nordeste (ALANE). Revista Urupema. Ano II. v.2. n.1 Fortaleza, CE. p.39-40.
Soares Feitosa - Jornal de Poesia. Fortaleza, CE. Disponível em http://www.secrel.com.br/jpoesia/poesia.html

Ariano Suassuna (O Santo e a Porca)

Eudoro Vicente manda uma carta a Eurico dizendo que lhe pedirá o seu bem mais precioso. Na casa do comerciante, moram a filha Margarida, a irmã de Eurico, Benona, a empregada Caroba e, já há algum tempo, Dodó, filho do rico fazendeiro Eudoro. Dodó vive disfarçado, finge-se de torto, deformado e sovina. Assim conquistou Eurico, que lhe atribuiu a função de de guardião da filha, quem Dodó namora às escondidas.

O desenrolar dos fatos se desencadeira com a carta enviada por Pinhão, empregado de Eudoro e noive de Caroba, empregada de Euricão. Eudoro informa que fará uma visita para pedir esse bem tão precioso a Eurico, que fica apreensivo, pois pensa que lhe pedirá dinheiro emprestado. Eurico insiste em de dizer pobre, repetindo as frases: "Ai a crise, ai a carestia".

Na sala da casa de Eurico, onde as cenas se desenrolam, há uma estátua de Santo Antônio, de quem Eurico é devoto, e uma antiga porca de madeira, a quem ele dedica especial atenção e que logo o público saberá que esconde maços de dinheiro.

Caroba, muito esperta, percebe que Eudoro pedirá margarida em casamento, é assim que ela entende o bem mais precioso de Eurico que o fazendeiro, pai de Dodó, quer saber. Então ela arma um circo para alcançar alguns objetivos: ganhar algum dinheiro, pois quer casar com Pinhão, casar Dodó e Margarida além de Eudoro e Benona, que já tinham sido noivos há muitos anos. Eudoro, viúvo, querias Margarida, mocinha; Benona, solteirona, queria Eudoro, fazendeiro; Margarida queria Dodó, pois o amava; Caroba e Pinhão se queriam; Euricão queria a porca, ou será que queria a proteção de Santo Antônio para a porca?

Caroba negocia uma comissão com Eurico para ajudá-lo a tirar vinte contos de Eudoro Vicente, antes que este peça dinheiro a Eurico. Acertam-se. Aí Caroba convence Benona que Eudoro virá pedi-la em casamento e se dispõe a ajudá-la. São então tramas de Caroba: fazer Eurico pedir vinte contos a Eudoro para o casamento (na realidade, para um jantar); convencer Benona de que Eudoro viria pedi-la em casamento; fazer Eudoro acreditar que pede Margarida; fazer Eurico crer que Eudoro pede Benona; armar um encontro entre Eudoro e Margarida na penumbra; ficar no lugar de Margarida, com o vestido dela.

Conseqüências das armações de Caroba: Dodó sente ciúme de Margarida, pois pensa que ela irá encontrar-se com Eudoro; Pinhão sente ciúme de Caroba quando sabe que ela irá em lugar de Margarida; Euricão desconfia que querem roubar sua porca recheada, pois ouve falarem em devorar porca e pensa ser a sua, quando é a do jantar que se encomendou para receber Eudoro; Pinhão desconfia de Eurico e o observa, porque este age estranhamente.

Na hora do encontro entre Margarida e Eudoro, Caroba tranca Margarida no quarto, manda Benona permanecer também no seu e vai, vestida de Margarida, receber Eudoro. Dodó vê Caroba e pensa ver Margarida, pois está com o vestido dela. Para não ter que se explicar, Caroba o empurra e tranca no quarto com Margarida. Caroba então veste roupa de Benona e esta a de Margarida. Caroba então recebe Eudoro vestida de Benona. Ele é enganado: pensa estar conversando com a antiga noiva, que se insinua a ele, na penumbra não percebe que é Caroba. Ela o leva ao quarto de Benona e o tranca com a ex-noiva, por quem agora já está novamente interessado.

Pinhão ao sair do esconderijo onde estivera observando a cena, vê Caroba e pensa ser Benona e tenta seduzí-la. Ela reage e bate em Pinhão e o manda esperar por Caroba, que tira as roupas de Benona e diz que acompanhou toda a cena, bate outra vez em Pinhão, mas na confusão começam a se beijar. Aí destrancam as portas dos quartos de Margarida e Dodó, Benona e Eudoro, e entram em outro.

Dodó e Margarida saem do quarto e pensam ter sido surpreendidos por Eurico, que entra em casa dizendo estar perdido.Na verdade Eurico havia saído para enterrar sua porca recheada dentro do cemitério. A conversa entre Eurico e Dodó é engraçada, pois ambos se enganam: Dodó fala de Margarida, enquanto Eurico fala da porca que desapareceu. Eurico pensa que o rapaz lhe roubou a porca, já que este o traiu. No desespero, Eurico finalmente revela que a porca estava cheia de dinheiro guardado há tantos anos.

Com os gritos da discussão, Pinhão e Caroba saem do quarto. Depois Eudoro e Benona do seu. A cena é divertida: são três casais que de repente estão juntos e felizes ante Euricão lamentando a perda da porca. Graças a Caroba os casais se entendem sem Euricão nem Eudoro perceberem o engano de que foram vitimas. Margarida desconfiou de Pinhão e afirmou que ele pegara a porca. Eurico lhe salta no pescoço e Pinhão acaba contando, mas exige vinte contos para dizer onde escondeu a porca, os vinte contos que Eurico conseguiu emprestados de Eudoro com a ajuda de Caroba. Com o vale do dinheiro na mão, mostra a porca que estava na casa mesmo.

Então, Eudoro faz Eurico perceber que aquele dinheiro era velho e havia perdido o valor. Eurico se desespera. Tentam dissuadi-lo da importância do dinheiro, mas ele manda todos embora e fica só, com a porca e o Santo, tentando entender o que aconteceu, qual o sentido de tudo que houvera.

Características da Obra de Sussuna:

Quando começamos a estudar a produção dos autos de Ariano Suassuna, não podemos dissociar esta análise das produções do escritor Gil Vicente. Ambos possuem semelhanças concretas, principalmente, com relação à:

1. construção das personagens - cada personagem representa uma classe social - que é criticada - e, por vezes, possui um nome que o identifica a função que exerce na comunidade onde vive, ou apelidos cômicos, como acontece com João Grilo, Chico, a mulher do padeiro, todos do Auto da Compadecida; Gil Vicente identifica seus personagens como mercadores, padres, pobres, etc., sempre numa alusão às classes da hierarquização social da Era Humanista ( marca o fim da Idade Média );

2. religiosidade - ambos os autores reforçam a manipulação que o clero exerce sobre o povo mais simples, compactuando com os interesses econômicos representados por coronéis, bispos (Ariano Suassuna) e por nobres, ricos (Gil Vicente); as figuras de diabos, anjos, Jesus e Nossa Senhora estarão presentes nas obras dos escritores, com a devida evolução de linguagem no caso dos textos de Suassuna - dentre essas a figura que rouba a cena é a do diabo pela sua força expressiva e sua posição de juiz das almas já que enumera as falcatruas dos outros personagens (efetuando, inclusive, uma rememoração da história que está sendo contada).

3. crítica social - os períodos históricos em que os autos são escritos apresentam características semelhantes: grande desnivelamento social, fome, desmandos de poderosos e, em se tratando das obras de Suassuna, há o agravante dos fatores naturais que tornam a vida do sertanejo muito difícil.

4. ironia - é a grande marca que identifica os autores e é o grande recurso utilizado para elaborar a crítica. Em Gil Vicente, há obras cuja ironia crítica serviu de modelo para as gerações seguintes, como em Auto da Lusitânia (e os personagens "Todo o mundo" e "Ninguém"). E em Ariano Suassuna, o mesmo será comprovado no reconhecido Auto da compadecida, mas também em O santo e a porca e em Farsa da boa preguiça.

Comparação com Plauto

Na apresentação de sua peça O Santo e a Porca (1957), Ariano Suassuna a sub-intitula de uma "Imitação Nordestina de Plauto", referindo-se à Aululária, do autor latino.

A palavra imitação, usada por Suassuna, nos remete ao conceito aristotélico de mímesis, cujo significado não representa apenas uma repetição à semelhança de algo, uma cópia, mas a representação de uma realidade, mais precisamente de uma revelação da essência dessa realidade.

Essa essência está representada, nessas duas obras, pela avareza humana.

Neste trabalho, pretendemos uma abordagem desse tema, sob o aspecto de como o objeto depositário da avareza foi tratado pelos dois autores: a panela, em Aululária; a porca, na comédia de Suassuna.

Optamos pelo enfoque simbólico dessa proposta, visto que a obra de Suassuna, que se declara uma imitação da de Plauto, mantém uma distância de mais de dois milênios da original e está contextualizada, tanto geográfica como culturalmente, numa distância não menor do que a temporal.

Nesse paralelo, destacamos a trajetória dos dois objetos que constituem o eixo norteador de toda a ação das duas peças.

Na comédia do autor latino (Plauto Titus Maccus - 250?-184? a.C.), de influência grega e estilo tipicamente romano, o velho avarento Euclião descobre na lareira de sua casa uma panela cheia de moedas de ouro deixada por seu avô. O casamento de sua filha com um velho rico é o motivo que origina toda a ação da peça. Os recursos utilizados por Plauto dão à comédia um ritmo ágil e hilariante, cheio de ambigüidades e desencontros. "O diálogo, como em todas as suas peças, lembra a fala rápida da comédia musical americana (e na verdade era representada com acompanhamento musical)" (GASSNER, 1974, p.112).

Ariano Suassuna retoma o tema e situa-o no Nordeste. Seu protagonista chama-se Euricão Árabe.

Na contracapa do livro de Suassuna (1984), Manuel Bandeira comenta as duas obras:

Plauto é o mais linearmente clássico, na sua pintura de um caráter de avarento; Suassuna é o mais complicado, não só pela maior abundância de incidentes na efabulação, como pela evidente intenção de moralidade filosófica; (...) e os elementos nordestinos da porca e seu protetor, o Santo (Santo Antônio) são os grandes achados de Suassuna, e o que confere o timbre de originalidade na volta ao velho tema.

Na seqüência das duas narrativas, tanto a panela quanto a porca acompanham todo o ciclo de transformação interior dos respectivos protagonistas, o que nos induz a uma interpretação simbólica desse trajeto.

Tomamos como símbolos, na Aululária ou O Vaso de Ouro, o Deus Lar, a lareira, o templo da Fidelidade, o bosque de Silvano e o objeto representativo da avareza, a panela (vaso). Em O Santo e a Porca, temos como correspondentes o Santo Antônio, a sala, o porão, o cemitério e o objeto da avareza, a porca de madeira.

Considerando os costumes e as crenças inerentes às duas épocas retratadas pelos autores, cabe primeiramente um destaque à parte mística e mítica das duas peças.

Para os romanos, os Lares eram deuses domésticos, protetores de cada família e de cada casa, cultuados no lararium, uma espécie de oratório. Tinham um templo, no Campo de Marte, onde eram feitos os sacrifícios e as oferendas. Interessante destacar que, quando se tratava de sacrifício público, a vítima ofertada era o porco (SPALDING,1982).

Euclião, até o momento da perda de sua panela com o tesouro, invoca o deus Hércules, identificado com o deus grego Héracles, símbolo da força combativa. Os romanos também o tinham como divindade protetora dos bens materiais e dos bons lucros nos negócios.

Após a perda de seu tesouro, Euclião invoca Júpiter, que simboliza tanto a expansão material como o enriquecimento vital.

Santo Antônio, por sua vez, é um santo de grande devoção popular nos países de origem latina. No Nordeste, esse santo é grandemente festejado durante as chamadas festas juninas. É tido, também, como "santo casamenteiro".

Euricão Árabe, o velho avarento de O Santo e a Porca, invoca o santo, questiona-o, do início ao fim de sua aventura. Embora, em alguns momentos, oscile entre o santo e a porca, mantém-se fiel ao santo de sua devoção. Esta oscilação poderia representar o movimento entre espiritualidade e materialidade inerentes ao ser humano.

Euclião, no entanto, é a imagem da personificação da avareza. Apela para o deus ou divindade que melhor atender à necessidade de determinado momento.

Nesse contexto de crenças e costumes, a avareza das duas personagens está representada em dois objetos: a panela (vaso) com o ouro de Euclião, escondida na lareira, e a "porca de madeira, velha e feia (...) com pacotes de dinheiro" (SUASSUNA, 1984, p.13), depositada na sala de Euricão sob a imagem de Santo Antônio.

A lareira expressa o simbolismo da vida em comum, do centro da casa. Seu calor e sua luz aproximam as pessoas, é o centro da vida. Assim como a sala, tem o significado de "um santuário, no qual se pede a proteção de Deus, celebra-se o seu culto e guardam-se as imagens sagradas" (CHEVALIER, GHEERBRANT, 1994, p.536).

A panela e a porca de madeira eram guardadas, respectivamente, nesses dois ambientes domésticos - lareira e sala -; portanto, equivalentes.

O vaso com as moedas de ouro (a panela de Euclião) representa "um reservatório de vida (...), o segredo da vida espiritual, o símbolo de uma força secreta". Se o vaso for "aberto em cima, indica uma receptividade às influências celestes" (CHEVALIER, GHEERBRANT, 1994, p.932).

Por sua vez, a moeda traz uma imagem ambivalente: a de valor e a de alteração da verdade.

A porca, juntamente com o porco, são considerados símbolos universais. Este representa a impureza, a voracidade, as tendências obscuras, enquanto que a porca, divinizada desde os egípcios, simboliza a abundância e o princípio feminino de reprodução, de criação da vida.

Todo o sentido da vida de Euclião e da de Euricão, simbolizado na panela guardada na lareira e na porca de madeira guardada na sala ao pé do santo, foi ameaçado por um acontecimento inesperado: o casamento das filhas. É o início do processo de vivência da perda:

Euricão: Ai minha porquinha adorada! (...) querem levar meu sangue, minha carne meu pão de cada dia, a segurança de minha velhice, a tranqüilidade de minhas noites, a depositária de meu amor! (SUASSUNA, 1984, p.33-34)

Diante da ameaça, Euclião esconde seu tesouro no templo da Fidelidade, e Euricão, numa grande cova ("socavão"), no porão de sua casa.

No plano simbólico, o templo e a cova sintetizam o lugar dos segredos, a busca ao desconhecido. Para os romanos, em particular, o templo era de grande importância. Lá, eles veneravam seus deuses, acorriam para pedir graças e proteção, em troca de sacrifícios e oferendas Era, pois, o reflexo do mundo divino e de seus mistérios.

Impulsionados pela ameaça da perda de seus bens, cultivados durante toda a vida, Euclião e Euricão buscam novo esconderijo para seus tesouros. O primeiro esconde-o no bosque de Silvano; o segundo, no cemitério da igreja.

Silvano, para os romanos, era um deus campestre de significação ambígua: protegia a agricultura e presidia às florestas (silva, "floresta") e, ao mesmo tempo, era uma "espécie de bicho-papão" que causava medo às crianças.

Além de simbolizar o inconsciente, a floresta carrega o significado do vínculo que as árvores mantêm entre a terra (raízes) e o céu (copa).

Euricão esconde sua porca no cemitério da igreja, num socavão entre o túmulo de sua mulher e o muro. O socavão evoca o simbolismo da abertura para o desconhecido, no sentido do imanente ao transcendente; o túmulo, associado à morte, é o lugar da metamorfose, do renascimento, ou das trevas; o muro, também de significado ambíguo, simboliza a separação e a defesa.

Podemos sintetizar essa etapa da trajetória dos avarentos como de conflito existencial diante da perda, em direção a uma nova visão de mundo e renovação de valores.

Euclião agradece aos deuses, despede-se alegremente de sua panela e a dá de presente aos noivos.

Euricão, diante da constatação da realidade (seu dinheiro não tinha mais nenhum valor), sente-se traído pela vida. Melancolicamente, reconhece: "Um golpe do acaso abriu meus olhos (...). Que quer dizer isso, Santo Antônio? Será que só você tem a resposta?" (SUASSUNA, 1984, p.82).

Na comparação simbólica das duas comédias, vimos que os elementos representativos da avareza (a panela e a porca) podem ser associados às etapas marcantes da narrativa.

O primeiro momento (a panela e a porca; o Deus Lar e Santo Antônio) podemos caracterizar como o do potencial latente e inerente à natureza humana: o material e o espiritual. O poder de acumulação e a visão desses valores são representados, em Euclião e Euricão, pela avareza.

O segundo momento, podemos caracterizar como o do conflito e do início da transformação desses valores (o templo da Fidelidade e o porão): a busca ao desconhecido, ou seja, um momento de interiorização e reflexão das personagens, sobre os valores até então tidos como sólidos e permanentes.

O terceiro momento, finalmente, seria o da constatação da perda. E, aqui, haveria duas possibilidades de escolha: a da evolução ou a da involução, simbolizada pela ambigüidade do "bosque de Silvano" e a do "cemitério da igreja".

A escolha de Euclião e de Euricão foi a da transformação no sentido evolutivo e de discernimento de que os bens materiais são um meio e não um fim. Diríamos que foi uma escolha do caminho ascendente entre a terra e o céu, entre o transitório e o permanente.

A avareza dos protagonistas nos remete, em contrapartida, a duas outras personagens, também idosas (Megadoro, na Aululária, e Eudoro, em O Santo e a Porca), que não apresentam tal característica, sendo, portanto, opostas a Euclião e Euricão.

Concluindo, lembramos as palavras de Cícero sobre os defeitos comumente atribuídos à velhice. Diz o orador latino que: são defeitos dos costumes, não da velhice. (...) Não compreendo o que a avareza do ancião quer para si mesmo. Há algo de mais absurdo que aumentar as provisões de viagem à medida que menos caminho resta? (CÍCERO, 1980, p.81).

Fontes:
Resumo adaptado do Site http://osantoeaporca.vilabol.uol.com.br/
http://www.algosobre.com.br
http://i.s8.com.br (imagem)

Dias Gomes (O Pagador de Promessas)

1. Aspectos estruturais

Trata-se de um texto escrito para teatro, ou seja, para ser levado ao palco, ser encenado. A peça é dividida em três atos, sendo que os dois primeiros ainda são subdivididos em dois quadros cada um. Após a apresentação dos personagens, o primeiro ato mostra a chegada do protagonista Zé do Burro e sua mulher Rosa, vindos do interior, a uma igreja de Salvador e termina com a negativa do padre em permitir o cumprimento da promessa feita. O segundo ato traz o aparecimento de diversos novos personagens, todos envolvidos na questão do cumprimento ou não da promessa e vai até uma nova negativa do padre, o que ocasiona, desta vez, explosão colérica em Zé do Burro. O terceiro ato é onde as ações recrudescem, as incompreensões vão ao limite e se verifica o dramático desfecho.

2. Enredo

Primeiro ato. Primeiro quadro.

A ação da peça tem início nas primeiras horas da manhã [4 e meia], numa praça, em frente a uma igreja, em Salvador. O personagem denominado Zé do Burro carrega uma cruz e se aloja na frente da igreja. A seu lado Rosa, sua mulher, apresentada como tendo 'sangue quente' e insatisfação sexual. Zé espera a igreja abrir para cumprir sua promessa, feita a Santa Bárbara. Aparecem no lugar, algum tempo depois, Marli e Bonitão: ela prostituta; ele, gigolô. Há uma clara relação de exploração e dependência entre eles. Encontrando Zé, Bonitão dirige-se a ele e percebe ser alguém ingênuo. Rosa, por sua vez, conversando com o gigolô, queixa-se de Zé, contando que ele, na sua promessa, dividiu suas terras com lavradores pobres. Percebendo a ingenuidade, Bonitão propõe-se a providenciar um local para Rosa descansar. Zé não só aceita, como incentiva. Saem os dois, Bonitão e Rosa, de cena.

Primeiro ato. Segundo quadro.

Aos poucos, começa o movimento ao redor da praça. Aparecem a Beata, o sacristão e o Padre Olavo, titular da igreja. Zé explica a promessa: Nicolau foi ferido com a queda de uma árvore; estando para morrer, Zé fez a promessa. O burro - Nicolau é um burro! - salva-se. Ingenuamente, Zé revela ter usado as rezas de Preto Zeferino e feito a promessa num terreiro de candomblé, a Iansã, equivalente afro de Santa Bárbara. O padre fica escandalizado. Estabelece-se o conflito. O sincretismo Iansã-Santa Bárbara, natural para Zé do burro, é um grandioso pecado para o padre. A situação agrava-se com a revelação da divisão de terras. Impasse. O padre manda fechar a igreja e proíbe o cumprimento da promessa. Zé do burro fica atônico.

Segundo ato. Primeiro quadro.

Duas horas mais tarde, já a movimentação no lugar é intensa. O Galego, dono do bar, abriu seu estabelecimento. Surgem Minha Tia, vendedora de acarajés, carurus e outras comidas típicas, Dedé Cospe-Rima, poeta popular, ao estilo repentista e o Guarda. Zé do burro quer cumprir a promessa. O Guarda tenta intervir. Rosa reaparece com 'ar culpado'. Chega o Repórter. Seguindo a linha do oportunismo sensacionalista, o repórter quer tirar vantagens da história de Zé do Burro. Quer torná-lo um mártir, para virar notícia. Enquanto isso descobre-se que Rosa transou com Bonitão. Marli faz um pequeno escândalo, denunciando a história Rosa-Bonitão.

Segundo ato. Segundo quadro.

Três da tarde, Dedé oferece poemas para Zé, a fim de derrotar o Padre. Aparecem, em momentos subseqüentes, o capoeirista Mestre Coca e o policial, o Secreta, chamado por Bonitão, ficando ambos, por enquanto, nas cercanias. Zé começa a perder a paciência e arma uma gritaria. O padre reage. Chega o Monsenhor, autoridade da igreja, propondo a Zé uma solução: ele, Monsenhor, na qualidade de representante da Igreja, pode liberar Zé da promessa, dando-a por cumprida. Zé não aceita, dizendo que promessa foi feita à Santa e só ela poderia liberá-lo. Segue o impasse. Zé explode novamente e avança com a cruz sobre a Igreja. O padre fecha a porta. Zé, já desesperado, bate com a cruz na porta. O drama é total.

Terceiro ato.

Entardecer. Muita gente na praça e nos arredores da Igreja. Há uma roda de capoeira. O Galego, oportunista, oferece comida grátis a Zé, pois a história está trazendo movimento ao seu bar. O Secreta, no bar, avisa que a polícia prenderá Zé, ameaçando os capoeiristas, caso eles interfiram. Marli volta. Ofende Rosa, ofende Zé. O protagonista parece mudar de atitude. Resolve ir embora 'à noite'. Rosa quer ir embora já. Conta que Bonitão avisou a polícia. Retorna o repórter, que tenta montar um verdadeiro circo em torno do Zé, com o objetivo de vender o jornal. Chega Bonitão e convida Rosa para ir com ele. Zé pede a ela para ficar. Rosa hesita, a princípio, mas, em seguida, vai com Bonitão. Mestre Coca avisa Zé sobre a chegada da polícia. Zé está perplexo: 'Santa Bárbara me abandonou'. Da igreja saem o Sacristão, o Guarda, o Padre e o Delegado. Tensão da cena acentua-se. Zé ainda tenta, ingênua e inutilmente, explicar alguma coisa. Ao ser cercado, puxa uma faca. As autoridades reagem. Os capoeiristas também. Briga e confusão. De repente, um tiro espalha gente para todos os lados. Zé é mortalmente ferido. Mestre Coca olha para os companheiros, que entendem a mensagem. Os capoeiristas tomam o corpo do Zé colocam-no sobre a cruz e, ignorando padre e polícia entram na igreja, carregando a cruz.

3. Comentário

A peça de Dias Gomes tem nítidos propósitos de evidenciar certas questões socio-culturais da vida brasileira, em detrimento do aprofundamento psicológico de seus personagens. Assim, ganha força no drama a visão crítica quanto:

a] à intolerância da Igreja católica, personificada no autoritarismo do Padre Olavo, e na insensibilidade do Monsenhor convocado a resolver o problema;

b] à incapacidade das autoridades que representam o Estado - no episódio, a polícia - de lidar com questões multiculturais, transformando um caso de diferença cultural em um caso policial;

c] à voracidade inescrupulosa da imprensa, simbolizada no Repórter, um perfeito mau-caráter, completamente desinteressado no drama do protagonista, mas muito interessado na repercussão que a história pode ter;

d] ao grande fosso que separa, ainda, o Brasil urbano do Brasil rural: Zé do Burro não consegue compreender por que lhe tentam impedir de cumprir sua promessa; os padres, a polícia, a imprensa não conseguem compreender quem é Zé do Burro, sua origem ingênua, com outros códigos culturais, outras posturas. Além disso, a peça mostra as variadas facetas populares: o gigolô esperto, a vendedora de quitutes, o poeta improvisador, os capoeiristas. O final simbólico aponta em duas direções. Em primeiro lugar a morte do Zé do Burro mostra-se com fim inevitável para o choque cultural violento que se opera na peça: ninguém, entre as autoridades da cidade grande, é capaz de assimilar o sincretismo religioso tão característico de grandes camadas sociais no Brasil, especialmente no interior nordestino. Em segundo lugar, a entrada dos capoeiristas na igreja, carregando a cruz com o corpo, sinaliza para rechaçar a inutilidade daquela morte: os populares compreenderam o gesto de Zé do Burro.

Fontes:
http://www.algosobre.com.br
http://nadiatimm.com (imagem)

Moacyr Scliar (O Centauro no Jardim)

I- Autor:

Moacyr Jayme Scliar nasceu em Porto Alegre no ano de 1937. Médico, romancista, contista e cronista, publicou também ensaios. Iniciou com alguns livros de contos. Posteriormente, publicou romances e novelas, quase todos tratando dos judeus imigrados do Leste europeu a partir das guerras mundiais. Enfoca as dificuldades de ambientação e perda gradativa das raízes e tradições do judaísmo à medida que as gerações vão se sucedendo.Também apresenta características de textos fantásticos, de um certo realismo mágico. O cenário escolhido é invariavelmente a cidade de Porto Alegre, mais precisamente o bairro do Bom Fim, tipicamente judeu até hoje. Suas últimas obras, entretanto, já se dedicam aos temas sociais do presente. Nos últimos anos, vem se destacando como cronista; seus textos são publicados nas páginas de cultura do jornal Zero Hora aos domingos, e já possui livros de crônicas publicados.

II- Espaço:

A história ocorre num restaurante tunisiano, em São Paulo [SP], com lembranças de Quatro Irmãos [RS], Porto Alegre [RS] e Marrocos.

III- Tempo:

O livro conta os primeiros trinta e oito anos da vida de Guedali Tratskovsky, de 1935 até 1973.

IV- Personagens:

Guedali Tratskovsky: É o personagem do romance, filho de imigrantes judeus russos. Nasce centauro, vindo a crescer escondido e protegido de todos os que não faziam parte de sua família. Por causa desse isolamento, acaba criando o hábito da leitura, tornando-se extremamente culto e inteligente. Tem características físicas e psicológicas ora de humano e ora de cavalo.

Tita: Centaura de nascimento, é a companheira de Guedali. Foi criada num universo exclusivamente feminino. Como cresce isolada do mundo exterior e não tem acesso a livros, é uma pessoa agressiva, ignorante.

Leão Tratskovsky: imigrante judeu russo, veio para o Brasil por causa das condições adversas da Rússia. Cultivava as terras da regiâo por uma questão de necessidade e com forma de homenagear o Barão Hirsch, um homem que o ajudou a viajar até o Brasil.

V- Resumo:

O livro começa no restaurante tunisiano “Jardim das Delícias”, onde Guedali relembra seu passado na comemoração de seu 38º aniversário. Seu pensamento remete a uma fazenda em Quatro Irmãos [RS] em 1935. Ali nasce Guedali, filho caçula dentre os quatros de um casal russo. O nascimento causa espanto na família fazendo com que sua mãe fique vários dias de cama. No mesmo dia de seu nascimento decidem que vão proteger o centauro e procurar tratá-lo com o máximo de normalidade possível.

Guedali galopa muito no campo e, numa dessas vezes, encontra um índio chamado Peri. Solitário, vibra com a conquista do que imaginava ser seu primeiro amigo, mas nunca mais o vê. Também é descoberto por Pedro Bento, filho dos fazendeiros da fazenda vizinha. O pai, quando descobre, decide se mudar para a capital, vendo que seria muito difícil proteger Guedali dos outros no campo.

Em Porto Alegre, Guedali se vê mais preso ainda, e se limita a ler livros e observar uma garota por um telescópio. Essa situação o deixa indignado e, já com vinte e um anos, resolve sair de casa.

Vai, então para um circo, onde faz um número como se estivesse mais um irmão dentro da sua “fantasia” de centauro. Ao envolver-se com a domadora, ela acaba por descobrir que ele é um centauro e Guedali foge dali.

Nessa fuga, encontra Tita, outra centaura, que fugia de Zeca Fagundes, seu pai. Este a perseguia pois descobrira somente naquele dia. Guedali o mata e tem uma relação sexual com Tita. Vivem então na casa de Tita com Cetinha, viúva de Zeca Fagundes, quase uma mãe para eles. Tudo vai bem até Tita começar a se deprimir por causa de sua natureza, quando decidem ir ao Marrocos, onde poderiam tentar uma cirurgia para resolver seus problemas. Em Marrocos a cirurgia corre tudo bem e eles começam a caminhar sobre as duas patas traseiras, encobertas por botas e calças.

Na volta para o Brasil, passam algum tempo, na casa dos pais de Guedali, decidindo viver em São Paulo. Mudam-se para lá em 1960, quando Guedali e Tita compram uma casa, ele abre uma firma de importação,e levam uma vida quase normal. Têm gêmeos, enriquecem e fazem várias amizades. Nessa fase da vida, Guedali e Tita já não mostram o mesmo envolvimento sentimental dos velhos tempos, e Guedali se envolve com Fernanda, mulher de seu melhor amigo, Paulo, mas ninguém descobre. Decidem ir viver com amigos num condomínio horizontal, onde, num primeiro momento, Guedali se sente muito mal, pois o motorista do condomínio era Pedro Bento, mas este promete guardar segredo para não perder o emprego. Com o tempo o casco de Guedali racha e cai, dando origem aos pés.

Um dia, Guedali flagra Tita transando com um outro centauro. Arma-se uma confusão com a chegada dos amigos do casal, o centauro, assustado, corre e á assassinado por guardas do condomínio.

Abalado, Guedali decide ir para o Marrocos, onde pede para o velho médico marroquino reverter a operação realizada há anos atrás. O médico, com relutância, concorda. Como tinha de fazer exames e esperar o cavalo ser tratado para doar suas patas, Guedali dica no Marrocos. Nesse meio tempo, conhece a maior relíquia do médico marroquino: uma esfinge chamada Lolah. Esta se apaixona por Guedali que, para satisfazer seu instinto animal, se relaciona com ela todos os dias.

Passando o tempo, Guedali decide não mais se transformar em centauro. Quando se dirige ao médico para contar sua decisão, o médico aplica-lhe uma anestesia para prepará-lo para a operação. Por sorte, Guedali havia deixado a jaula de Lolah aberta e ela, ao notar a sua ausência tenta salvá-lo e é assassinada pelo assistente do médico. A operação é cancelada e Guedali volta para o Brasil.

Sem notificar Tita, retorna à fazenda onde nasceu e começa a construir uma vida bucólica com a ajuda de um índio que imagina ser Peri. Com o passar do tempo ele sente muita falta de sua mulher e também sente vontade de voltar a ser um centauro. Peri diz que é mágico e que é capaz de fazê-lo voltar à sua forma natural. Quando esse faz a mágica, que não dá certo, Tita aparece na fazenda para a alegria de Guedali. Depois de um tempo no campo, decidem voltar a São Paulo, convencidos por seus amigos.

Em setembro de 1973, Guedali reúne seus amigos para a comemoração de seu aniversário no restaurante tunisiano. Observa Tita confidenciando com uma moça. Tita está contando a história de suas vidas com uma leve distorção: como se nunca tivessem sido centauro.

MORAL: A figura do centauro remete para a questão básica que autor discute: o simbolismo do homem judeu na sua dúplice característica quer racial quer religiosa.

Fonte:
http://www.algosobre.com.br/

Robert Drummond (Hilda Furacão)

Desde que foi lançada a campanha a favor da Cidade das Camélias, a Zona Boêmia é um promontório da alegria. sugere os últimos dias de Pompéia. Tudo lá é encantado. A rua principal, a Guaicurus, conhece noites inesquecíveis. E nunca se viu tanto dinheiro. O vendedor de churrasquinhos triplicou as vendas. No restaurante Bagdá, especialista em comida árabe, é preciso disputar um lugar. As mulheres dos hotéis de primeira, segunda , terceira e quarta categorias jamais foram tão solicitadas. E na noite da última quinta feira, a polícia foi chamada para conter os ânimos dos que disputavam um lugar na fila que vai dar num território mágico: o quarto 304, no terceiro andar do Maravilhoso Hotel onde Hilda Furacão é uma fada sexual. (Roberto Drummond )

O romance Hilda Furacão [1991] tem uma proposta narrativa interessante, bem ao gosto pós-moderno. Várias ações transcorrem no texto conferindo uma dinâmica que prende o leitor à narrativa, perseguindo um desfecho que nos é insistentemente prometido.

A história central focaliza a personagem que dá nome ao romance, Hilda Furacão. Entretanto, o lugar de protagonista é disputado pelo narrador que conta a sua história e ao contá-la, conta várias outras histórias, que se entrelaçam formando um tecido de conflitos que vamos conhecendo e com os quais muitas vezes nos identificamos.

Os capítulos se sucedem ao modelo dos folhetins, criando um suspense que buscamos desvendar com a leitura do próximo, sucessivamente. Essa técnica permite que, a cada capítulo, as personagens se revezem e ganhem um destaque na trama. Isto é tão evidente que a obra já foi encaminhada para o teatro pela direção de Marcelo Andrade e ainda ganhou projeção nacional ao se tornar uma grandiosa mini-série homônima, na Rede Globo.

O cenário principal da obra é a capital mineira do final dos anos 50 e início dos anos 60 [lembramos que o autor reside em Belo Horizonte e hoje representa um dos grandes nomes do jornalismo mineiro], mas há que se falar no cenário secundário que é a pacata cidade de Santana dos Ferros.

Personagens
Roberto é o alter- ego biográfico do jornalista Roberto Drummond. Jovem comunista e idealista que ama a bela M. Aramel, o belo 'nunca houve homem mais belo que Aramel' jovem que almeja o estrelato hollywodiano por sua aparência de galã. Acaba por tornar-se um cafetão a serviço do poderoso Antônio Luciano. Após um desencontro amoroso humilhante vai para os EUA e torna-se gângster

Frei Malthus o pivô do grande romance julgado pela comunidade como 'o santo' este personagem se apaixonará pela bela Hilda Furacão. O mito da Cinderela é passado ao leitor quando do acidente que deixa o sapato de Hilda sob a posse do frei que tentará fugir do pecado martirizando-se e comendo o seu favorito doce de jabuticaba.

As tias Ciana e Çãozinha são as representantes [ há vários flashes de Santana dos Ferros interior mineiro] do conservadorismo e liberalismo. São as tias que Roberto trava correspondência constantemente.

Gabriela A primeira amada de Aramel, que fora contratado pelo traumatizado, gordo e tímido jornalista Emecê para representá-lo no encontro marcado. Antônio Luciano representante do poder econômico e político. Sua diversão era deflorar virgens e Aramel era o encarregado de receptá-las.

Cenário / tempo / espaço
Alguns dizem que o romance é bairrista, e não é a verdade , pois o que se apura dessa obra é uma grande homenagem à cidade de Belo Horizonte e tudo que faz dela um grande cenário natural para representar o microcosmo político e social do macrocosmo que era o regime militar em seu tempo cultural e estético. •

Estrutura Narrativa

É muito presente nos textos de Roberto Drummond um constante diálogo com o leitor. A esse diálogo entre textos do mesmo autor damos o nome de intratextualidade. Outros diálogos intertextuais aparecem ao longo da narrativa, mesclando ditos populares e modinhas ao discurso narrativo. Outro aspecto intertextual que se observa é a construção da intriga entre Hilda Furacão e Frei Malthus desencadeada a partir do sapato que a moça perde e do qual o rapaz se apossa, tal 'L qual acontece no conto da Gata borralheira ou Cinderela., Logo na abertura do romance, e nos capítulos que se seguem, Roberto narrador deixa claro que, por toda o texto, vai estar dialogando com o leitor, fazendo- nos presentes no tempo da enunciação -presente da narrativa. Essa é uma técnica bastante usada por nossos escritores, em especial por Machado de Assis. e confere uma dinâmica interessante ao relato, tornando-nos quase cúmplices do escritor.

Resumo

Como já dito anteriormente o romance é muito desfragmentado, pois possui constantes mudanças de enfoques. Para facilitar o nosso trabalho proporemos que se faça duas leituras: uma primeira que almeja desvendar o mistério da garota do maiô dourado [ a Hilda que desfilava sua beleza pelo Minas Tênis e depois tornou-se prostituta]; uma segunda que mistura ficção e realidade histórica brasileira [ditadura militar e censura]; o mais brilhante é que tudo começa e termina no dia 1° de abril que simboliza o dia da mentira eis então a grande proposta ficcional do autor. Roberto começa narrando em 1° pessoa a sua própria condição jovem de comunista e idealista. pretendo ser um grande jornalista e irritadiço por compararem seu sobrenome com o grande poeta Carlos Drummond de Andrade. Pelo que o narrador fala de si e da cidade observamos que o tempo precede os anos de 64 [época do golpe militar]. Nesse interím, o narrador trava correspondência com as tias de Santana dos Ferros Tia Ciana e Çãozinha, que são as interlocutoras do relato. A grande trama da obra verifica-se no encontro entre o santo Frei Malthus e a bela Hilda no qual aquele, ao tentar expurgar o mal da zona boêmia acaba enredado pela paixão que estabelece-se entre ele e Hilda. Roberto é o jornalista que relatará ao leitor como estão acontecendo os fatos na zona boêmia [lembre-se que Malthus, Aramel e Roberto são os três mosqueteiros amigos de infância e desta forma Roberto terá maior possibilidade de levantar dados para o leitor].

Após o desaparecimento do seu sapato, Hilda lança um concurso para que o devolvam então inicia-se um conto de cinderela às avessas pois Malthus acabará por reconhecer o seu amor pela bela. Contudo o final é triste pois ambos desencontram-se quando da fuga para viverem um grande amor Malthus será preso no primeiro dia de vigência do golpe militar de 64.

Fonte:
http://www.algosobre.com.br/

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Douglas Lara na Ordem Nacional dos Escritores do Brasil (ONE)















No dia 24 de julho, durante a semana do escritor, o organizador Douglas Lara será aceito como sócio permanente da Ordem Nacional dos Escritores do Brasil - ONE.

A ONE foi fundada em 18 de maio de 1982, é uma sociedade civil com fins culturais e científicos, sem objetivos ou finalidades lucrativas, sediada na cidade e município de São Paulo e que abrange todo o espaço da LUSOFONIA. Tem cerca de quinhentos membros, na maioria brasileiros, em sua instituição cultural.

Os principais objetivos da Ordem são: promover, estimular, incentivar as atividades literárias e congregar, aconselhar e auxiliar os autores, seus associados em quaisquer obras e ou produções artístico-literárias, técnicas e científicas, bem como defender a atuação do escritor lusófono na livre manifestação de seu pensamento e em defesa de seus trabalhos e direitos.

Na impossibilidade da presença do Presidente da ONE, José Verdasca, a honra da entrega do colar ao escritor Douglas Lara, será delegada ao diretor-coordenador do Núcleo de Lisboa (Portugal), Joaquim Evónio que estará presente durante a 4ª Semana do Escritor de Sorocaba.
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Em meu nome, da delegacia ubiratanense da União Brasileira dos Trovadores e Associação dos Literatos de Ubiratã, gostariamos de parabeniza-lo por esta glória obtida, resumindo a luta de Douglas Lara, nas palavras do trovador Eduardo Simões Brites (Rio de Janeiro):

A natureza, perfeita,
ao dar-me dois braços sãos,
dá-me a glória da colheita
do que plantei com as mãos.
Com certeza, merece fazer parte das paginas da história de nossa cultura, e inspiração para os que estão presentes e aos que ainda estarão por vir.
José Feldman (3/6/08)

Cees Nooteboom (Paraíso Perdido)

Poucos escritores viajam como o holandês Cees Nooteboom (a pronúncia é "seis nôtebôm"), nome recorrente entre os candidatos ao Prêmio Nobel e um dos principais convidados da Festa Literária Internacional de Parati (Flip), que vai de 2 a 6 de julho.

Cees Nooteboom, uma das atrações da Flip, lança livro com protagonista brasileira Alma

Como Paul Theroux e Bruce Chatwin, ele transforma suas aventuras em literatura. Como Melville ou Joseph Conrad, foi marinheiro para conhecer o mundo. E como Peter Handke ou Robert Walser, usa suas jornadas como inspiração filosófica.

Seu último romance, "Paraíso Perdido", que agora chega às livrarias, tem uma curiosidade. A personagem central (Alma) é uma brasileira, moradora dos Jardins, fã de Maria Bethânia, que inicia sua jornada espiritual para superar o trauma que sofre em São Paulo: um estupro na favela de Paraisópolis, depois que seu carro enguiçou.

Ela e a amiga Almut, descendentes de alemães, partem para realizar um sonho: conhecer a Austrália, onde Alma vira amante de um aborígene e tem um encontro efêmero com um crítico literário holandês (alter ego de Nooteboom). E é o crítico que encerra o livro, em Berlim, depois de ter reencontrado Alma em uma clínica na Áustria, por acaso.

Inspirado no poema épico de John Milton, Nooteboom também empresta do imaginário de Rilke a figura dos anjos, que povoam seu livro. É exatamente fantasiada de anjo, em uma intervenção teatral na Austrália, que Alma aparece para o holandês, como uma revelação.

Isso é o livro. Nooteboom, por outro lado, é terreno e cuidadoso ao comentar suas influências. Falando à Folha de Amsterdã, por telefone, evita citar os contemporâneos e diz que leu muito Borges, Proust, Ovídio e Homero. "Ninguém escreve sem ter ao menos cem escritores em suas mãos".

Anjos

A figura do anjo tem uma inspiração real. Veio do "Angel Project", que assistiu na cidade australiana de Perth, ao participar de um festival literário. "Isso realmente aconteceu. Você precisava percorrer a cidade e encontrar anjos. Acompanhei, em 2000, então foi fácil descrever. Usavam jovens e atores".

O tema também tem, claro, um fundo religioso. "Tive uma educação católica. Anjos sempre estavam presentes", diz. "Nós adoramos a idéia de anjos. Eles são uma necessidade para que exista amor".

A visão de São Paulo também é concreta, resultado de várias viagens, a última pouco antes de escrever o livro, publicado em 2004. "Fiquei passeando de ônibus, para sentir a cidade, que é enorme".

Nooteboom conhece o Brasil desde o final dos anos 60. Já esteve em Manaus, Brasília e no Rio. "Não posso dizer que 'conheço' o país. Mas, como falo espanhol, consigo entender textos em português". ("Eu naum fálo portugueishh", emenda.)

"Me perguntam como alguém com a minha idade pode se colocar no papel das jovens. Mas é ficção, eu achei perfeitamente plausível que duas jovens brasileiras, com uma certa educação, estivessem interessadas no imaginário dos aborígenes. Estive na Austrália várias vezes. Para mim não é difícil imaginar duas garotas em um país muito distante. E a idéia da perda de inocência em diferentes perspectivas me atraía. A Austrália é um exemplo disso, onde uma civilização de 40 mil anos também perdeu a inocência", afirma.

Viagem

E como relatos de viagem se transformam em literatura? "No meu caso foi simples. Eu sempre viajei, desde os meus 17 anos. Isso aparece nos meus livros sem soar artificial, incluindo "Paraíso Perdido". Minha vida tem a ver com viagem".

O interesse pela aventura já o levou a todo o mundo, começando pelo Suriname, nos anos 60, como marinheiro. A paixão pela Espanha virou livro ("Caminhos para Santiago"). E as jornadas por Berlim inspiraram uma de suas principais obras, "Dia de Finados", que trata da ausência.

Já "Tumbas de Poetas y Pensadores" (ed. Siruela, 264 págs., 42, R$ 107 mais frete), publicado na Espanha, traz textos dele e fotos da mulher, a fotógrafa Simone Sassen, abordando os túmulos pelo mundo de escritores famosos, como Thomas Mann, James Joyce e Pablo Neruda. No Rio, os dois registraram os túmulos de Machado de Assis (que ele conhece) e de Carlos Drummond de Andrade (que conhece muito).

As respostas de Nooteboom explicam muito da sua obra. Híbrida, é ao mesmo tempo sofisticada, prosaica, fluente, lírica e repleta de referências.

Ele trabalha atualmente em dois livros. Um de contos, outro com relatos de viagem que inclui suas mais recentes aventuras: no sul da Argentina, na Índia e no remoto arquipélago norueguês de Svalbard, próximo ao pólo norte. E, claro, talvez Paraty, para onde segue em julho, antes de seguir para Salvador ("a parte mais africana do Brasil").

Fonte:
MARCOS STRECKER da Folha de S.Paulo. In Folha On Line
http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u404954.shtml
Foto por Gustavo Cuevas/Efe

Baú de Literatos I


Ana Maria Machado (Rio de Janeiro, 1941)
Ganhadora do Prêmio Hans Christian Andersen (2001), considerado o Nobel da literatura infanto-juvenil, a jornalista e escritora Ana Maria Machado é autora de mais de 100 títulos, alguns deles publicados em 17 países, somando mais de 18 milhões de exemplares vendidos. Formada em Letras, lecionou na UFRJ e PUC. Durante a ditadura militar, exilou-se em Paris, onde cursou pós-graduação com Roland Barthes. Trabalhou na revista Elle, em Paris, na BBC de Londres e em vários jornais e revistas brasileiros. Em 1979, fundou no Rio de Janeiro a Malasartes, primeira livraria brasileira dedicada exclusivamente a crianças e adolescentes. Também notabilizou-se pela sua produção de literatura para adultos, com o premiado A audácia dessa mulher (1999) e Texturas — sobre leituras e escritos (2001). Desde 2003, Ana Maria Machado ocupa a cadeira 1 da Academia Brasileira de Letras
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Alessandro Baricco (Turim, Itália, 1958)
Um dos mais importantes escritores italianos contemporâneos. Formado em filosofia e música, escreveu peças teatrais, ensaios e romances como Oceano mar (1993), City (1999), Sem sangue (2002) e Esta história (2005). Baricco tem carreira próspera no cinema: A lenda do pianista do mar (1998), de Giuseppe Tornatore, é baseado em seu monólogo Novecentos (1994), e o romance Seda (1996) virou filme homônimo, dirigido por François Girard. Este ano estréia como diretor com o filme Lezione 21, do qual também assina o roteiro. A formação em música estimulou ainda uma parceria com a dupla francesa Air, experiência que resultou no disco City Reading (2003).
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Cees Nooteboom (Haia, Holanda, 1933)
Escritor contemporâneo de maior destaque nos Países Baixos. Ensaísta, poeta e expoente da literatura de viagem, tem cinco obras publicadas no Brasil – os romances Rituais (1980), A seguinte história (1991) e Dia de finados (1998), além do livro de viagens Caminhos para Santiago (1992) e de seu romance mais recente, Paraíso perdido (2004). Comparado a Jorge Luis Borges e J. M. Coetzee, cotado com freqüência para o Prêmio Nobel, Nooteboom tece uma prosa rica em experimentos lingüísticos, mas não abre mão do relato de vivências extremas nem da exploração da interioridade dos personagens.
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Chimamanda Ngozi Adichie (Abba, Nigéria, 1977)
Nome de proa da literatura africana. Aos dezenove anos Adichie mudou-se para os Estados Unidos, onde foi bolsista na Universidade de Princeton. Purple Hibiscus (2003) e Half of a Yellow Sun (2006), pelo qual venceu o Orange Prize de 2007, têm como tema a guerra em Biafra, que entre 1967 e 1970 matou mais de 1 milhão de pessoas. Crítica da forma como a imprensa costuma tratar a África, Chimamanda mostra que a insistência na imagem do africano despossuído e carente esconde uma parcela expressiva e atuante da população, cuja voz merece ser ouvida com mais freqüência.
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Cíntia Moscovich (Porto Alegre, RS, 1958)
Em Por que sou gorda, mamãe? (2006), Cíntia Moscovich propõe uma espécie de Carta ao pai, de Franz Kafka, porém menos ressentida e triste que a do escritor tcheco. Acerto de contas da personagem central com a mãe e com o próprio corpo, o romance traz melancolia e humor em doses equivalentes. É dessa forma que a escritora – também jornalista, professora e tradutora – parece lidar com os temas que aborda em seus livros, entre eles o judaísmo e a condição feminina. Cíntia é autora da reunião de contos Arquitetura do arco-íris (2004, Prêmio Jabuti e finalista do Prêmio Portugal Telecom) e dos romances Duas iguais (1998) e Mais ou menos normal (2008), entre outros.
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David Sedaris (Binghamton, Estados Unidos, 1956)
Iniciou a carreira em 1995 em programas humorísticos de rádio e logo passou a escrever para revistas como Esquire e New Yorker. A voz peculiar, as narrativas auto-irônicas e formalmente impecáveis garantiram o sucesso do comediante. Grande parte de sua obra se compõe de contos autobiográficos, em que a infância no interior dos Estados Unidos, a vida familiar e o homossexualismo são tratados com sarcasmo e lirismo. Seus principais livros são Pelado (1997), Eu falar bonito um dia (2000) e De veludo cotelê e jeans (2004), que lhe valeu o título de humorista do ano pela Time Magazine. When You Are Engulfed on Flames (2008) é sua mais recente publicação. De veludo cotelê e jeans (2004), que lhe valeu o título de humorista do ano pela Time Magazine, e Eu falar bonito um dia (2000), lançado no Brasil neste ano.
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Fernando Vallejo (Medellin, Colômbia, 1942)
Apesar de ter nascido na Colômbia, foi no México, país onde vive até hoje, que Fernando Vallejo desenvolveu sua carreira cinematográfica e literária, após ter seu primeiro filme censurado pelo governo militar. A difícil experiência na Colômbia, porém, marcaria para sempre sua obra, caracterizada por um forte componente autobiográfico.
Temas como violência, drogas e política dividem espaço com filosofia, gramática e biologia. A virgem dos sicários (1994), seu livro mais famoso, trata das conseqüências do narcotráfico para a realidade social colombiana. Em 2003, o romance O despenhadeiro (2001), recentemente publicado no Brasil, recebeu o Prêmio Rómulo Gallegos, um dos mais prestigiados da literatura em língua espanhola.
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Humberto Werneck (Belo Horizonte, MG, 1945)
Jornalista e escritor. Ao longo de trinta anos de carreira, passou por alguns dos principais veículos da imprensa nacional e celebrizou-se pela qualidade da prosa jornalística e pela apuração minuciosa. Entre suas obras destacam-se O desatino da rapaziada (1992), retrato da geração de jornalistas e escritores mineiros da qual fizeram parte Otto Lara Resende, Paulo Mendes Campos e Fernando Sabino, e O santo sujo (2008), recém-lançada biografia do músico e boêmio modernista Jaime Ovalle. Werneck também assina a organização de Minérios domados (1993), reunião da poesia de Helio Pellegrino, a seleção de crônicas Boa companhia (2005) e a reportagem biográfica incluída em Tantas palavras (2006), songbook de Chico Buarque.
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Martín Kohan (Buenos Aires, Argentina, 1967)
Escritor, crítico literário e professor de Teoria literária nas universidades de Buenos Aires e da Patagônia. Autor de dois livros de contos, três de
ensaio e sete romances, entre eles Los cautivos (2000), Duas vezes junho (2002), Segundos afuera (2005), Museo de la revolución (2006) e Ciencias morais (2007), vencedor do prêmio Herralde e lançado no Brasil neste ano. Em seus romances, Kohan enfoca as formas diluídas e indiretas do controle social: a partir do dia-a-dia de um colégio portenho ou da Copa de 1978, constrói um quadro de muitos matizes sobre a ditadura argentina e seu significado para a história recente do país.
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Richard Price (Nova York, EUA, 1949)
Escritor e roteirista. The Wanderers (1974), seu primeiro romance, baseado na infância no Bronx, foi adaptado e dirigido por Philip Kaufman, de A insustentável leveza do ser (1988). Desde então, escreveu roteiros para filmes como O preço da coragem (1996) e a série televisiva A escuta (2004). Teve parceria bem-sucedida com o diretor Martin Scorsese em duas ocasiões: no longa A cor do dinheiro (1986) e no videoclipe Bad (1995), de Michael Jackson, dos quais assinou o roteiro. Um de seus romances mais conhecidos é Clockers (1992), que virou filme do diretor Spike Lee e foi indicado ao Oscar. Seu último livro é o aclamado Lush Life (2008).
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Pierre Bayard (Paris, França, 1954)
Escritor e professor de literatura francesa. No recente Como falar dos livros que não lemos? (2007), gerou polêmica ao questionar a importância da literatura e discutir em que medida é fundamental ler as obras ditas obrigatórias. Para Bayard, o verdadeiro letrado não é quem leu de tudo, mas quem reconhece o valor de determinada obra para a cultura que o cerca. Como falar dos livros que não lemos? confirma a verve iconoclasta de Bayard, presente também em obras anteriores, como Comment améliorer les oeuvres ratées (2000) e Enquête sur Hamlet (2002).
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Tom Stoppard (Zlín, República Tcheca, 1937)
O dramaturgo inglês Tom Stoppard consagrou de tal forma seu estilo que se tornou adjetivo: stoppardian é o termo usado para classificar autores e peças que utilizam a via do humor para dialogar com conceitos filosóficos. Em 1966 estreou nos teatros com Rosencrantz e Guildenstern estão mortos, em que a saga de Hamlet é recontada a partir da perspectiva de personagens secundários na trama original. Autor de mais de vinte peças e roteiros de cinema, é famoso pela criação de diálogos cheios de ironia e sarcasmo, potencializados pelo uso de duplos sentidos, trocadilhos e múltiplos pontos de vista.

Fonte:
http://www.flip.org.br

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Beatrix Potter (1866 - 1943)


Helen Beatrix Potter (* 28 de julho de 1866 em Kensington, Londres; † 22 de dezembro de 1943, Near Sawrey, Cumbria) era uma autora e ilustratora inglesa, conhecida principalmente pelos seus livros infantis, que contavam as histórias de personagens animais tais como o coelho Peter Rabbit. Foi uma escritora, ilustradora, micologista e conservacionista da Inglaterra.

Ela nasceu no dia 28 de Julho de 1866 em Londres, em Kensington Square, numa família da alta burguesia ligada ao comércio de algodão. Era uma garota atenta a todos os detalhes e observava principalmente os animais. Nos verões, quando a família ia passar as férias no campo, ora na Escócia ora em diversas propriedades de Lake District, na Grã-Bretanha, ela tinha a oportunidade de apreciar a natureza de perto. Começou a desenhar com apenas nove anos.

Hellen Beatrix Potter, filha de uma família de burgueses "novos ricos". O pai de Beatrix, Rupert William Potter (1832-1914), embora fosse advogado, seguia o comportamento dos cavalheiros abastados de sua época, raramente exercendo, passava seus dias em clubes dos cavalheiros . Sua mãe, Helen Potter Leech (1839-1932), filha de um comerciante do algodão, embora gostasse de pintura , dedicava seu tempo cultivando novas relações sociais. A família foi suportada por rendas herdadas de ambos os pais.

Cada verão, Rupert Potter alugava uma casa no campo; primeiramente a casa em Perthshire, Scotland de Dalguise para os onze verões de 1871 a 1881, então mais tarde um no distrito inglês do lago. Em 1882 a família encontrada com o vicar local, Canon Hardwicke Rawnsley, que foi preocupado profundamente sobre os efeitos da indústria e do tourism no distrito do lago. Encontraria mais tarde a confiança nacional em 1895, para ajudar proteger o campo. Beatrix Potter tinha caído imediatamente no amor com as montanhas ásperas e os lagos escuros, e com Rawnsley, aprendido da importância de tentar conservar a região, algo que era permanecer com ela para o descanso de sua vida.

A adolescente: Beatrix Potter fora criada em reclusão, sob rígida disciplina na Era Vitoriana, tendo mesmo escasso contato com seus pais. Junto com o irmão, recebera educação em casa, através de uma tutora. Quando chegou a idade de ir para a escola, apenas ele foi mandado; Beatrix continuou trancada em casa, onde aprendeu a desenhar e compor música sob os auspícios da instrução particular. Na ausência de amigos, apegou-se a animais de estimação: coelhos, um cachorro, passarinhos. Entre os 15 e os 30 anos, manteve um diário particular escrito em código, completamente decifrado após sua morte. Gostava de escrever cartas para crianças valendo-se de animaizinhos para contar histórias e, por sugestão de um editor, acabaria transformando uma delas, The Tale of Peter Rabbit, em livro.

Beatrix Potter passou por várias editoras para publicar um livro seu. Beatrix teve aproximadamente setenta tentativas e sessenta e nove delas falharam. Sua felicidade veio logo que uma editora aceitou publicar sua obra. Beatrix foi uma mulher solteira por muito tempo. Sua mãe a incentivava de forma quase que a pressionando de se casar. Helen também discordava que a filha pudesse se sustentar apenas escrevendo livros e ilustrando.

O sucesso de vendas é estrondoso, torna-se autora de livros infantis cheios de coelhos, ratinhos, esquilos e ela acaba se mudando para Hill Top, uma casa em Lake District, local por cuja proteção ecológica lutaria na fase final da vida.

Curiosidade
Muitas fontes afirmam que J. K. Rowling deu o sobrenome do seu personagem principal, Harry Potter, porque gostava da autora Beatrix. Porém, até hoje, a autora de Harry Potter nunca confirmou nada.

Seu livro mais conhecido, The Tale of Peter Rabbit , nasce em uma carta escrita em 1893 para uma criança que estava doente:
"Meu querido Noel, não sei o que escrever para você, de maneira que vou lhe contar a história de quatro coelhinhos..."

Na primeira edição de Peter Rabbit, 1902, paga pela autora, as ilustrações eram em preto e branco. Mas logo vieram edições coloridas. Os livros adocicados de Beatrix, eram pequeninos, desenhados de maneira que as crianças pudessem carregá-los confortavelmente. Até hoje são sucesso garantido.

Cinema
Miss Potter

Muito antes do adolescente bruxo, o sobrenome Potter já era sinônimo de fantasia. Com a série de 23 livros infantis de seus bichos falantes, a começar pelo famoso coelho Peter Rabbit, a escritora Beatrix Potter (1866-1943) se tornou uma das autores mais bem-sucedidas da história da literatura. Tão exitosa que o filme que a biografa, Miss Potter (2006), sofre com a falta de conflitos.

Se drama é a equação que separa o que um personagem deseja daquilo que ele de fato conquista, o novo filme de Chris Noonan - que não assinava uma película desde Babe - O porquinho atrapalhado, de 1995 - é absolutamente antidramático. Não há choque possível quando uma cinebiografia vertical (que toma um único intervalo de tempo para definir a vida inteira do biografado) decide enfocar só a curva ascendente da carreira de uma figura como Beatrix Potter.

Há flashbacks da infância, registros da aristocracia inglesa que definiram a personalidade instrospectiva de Beatrix, mas o filme é concentrado no início e no rápido ápice da vida literária da escritora, interpretada por Renée Zellweger. Beatrix já desenhava os animais - e conversava com eles - desde pequena, mas foi só quando conheceu Norman Warne (Ewan McGregor) que ela pôde transformar os esboços em livros. Caçula de dois irmãos editores, Norman queria mostrar seu valor. Pegou Peter Rabbit como um desafio editorial e fez dos animais um sucesso.

E os sucessos se sobrepõem. Possíveis "vilões", personagens contrários à empreitada de Beatrix, como a sua mãe ou os outros irmãos de Norman, são rapidamente sobrepujados pela força incontestável de Peter Rabbit. São vilões entre aspas, e são apenas possíveis, porque o filme não se esforça em construi-los como tais.

O foco principal de Noonan não é alimentar conflito, mas embelezar ainda mais a arte de Beatrix. A mescla de filmagem tradicional com animação, que dá vida aos bichos da escritora, é o tipo de fofura que se esperaria do diretor de Babe. A cerimônia com que Noonan movimenta a câmera lateralmente em cenas de interiores, sugerindo uma solenidade tremenda para momentos banais, só busca a mitificação da personagem.

No meio do caminho, acontecem trombadas amorosas - a boa química de McGregor e Zellweger, casal de Abaixo o amor, não seria menosprezada -, mas nada que constitua drama de verdade, mesmo porque amor de perdição não é o moto do filme. A idéia é mesmo pintar um retrato de intocabilidade de Beatrix Potter. Acontece que sem falhas não tem conflito, sem conflito não há redenção e, sem redenção, onde entra a moral da história?

Fontes:
http://www.angela-lago.com.br/1Potter.html
http://www.omelete.com.br/cine/100005268.aspx
http://www.sobrecarga.com.br/node/view/1337

Notícias Rápidas

Presença de Laé de Souza na 4a. Semana do Escritor de Sorocaba
O escritor Laé de Souza estará presente na 4ª Semana do Escritor de Sorocaba no dia 24 de julho, quinta-feira, a partir das 19h30. Neste dia, cada convidado receberá como cortesia um exemplar do livro “Nos Bastidores do Cotidiano” e durante a realização do evento será distribuída a revista do “Projetos de Leitura” para o público conhecer melhor o seu importante trabalho de fomento à leitura, em execução há dez anos. Laé de Souza é autor dos livros Espiando o Mundo pela Fechadura, Acredite se Quiser!, Acontece..., Coisas de Homem & Coisas de Mulher e Nos Bastidores do Cotidiano (impressão regular e em braile). Interessados em conversar com o escritor poderão aproveitar esta oportunidade.
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Lançamento da Revista Nova Águia
Na próxima sexta-feira, dia 4 de Julho, pelas 21 horas, teremos no Moinho de Maré do Cais Velho, em Alhos Vedros, o lançamento da Revista Nova Águia. A organização do evento está a cargo da Escola Aberta Agostinho da Silva (CACAV) e de alguns elementos do MIL (Movimento Internacional Lusófono) local. Estão confirmadas as presenças do Prof. Paulo Borges e de Renato Epifânio, ambos membros da direcção da Revista.
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Lançamento do Livro Uma Flor chamada Margarida
Convite para o lançamento do livro ’’Uma flor chamada Margarida’’ do escritor Samuel C. da Costa, o evento será realizado no dia 05 de julho, às 19:00 h, no Espaço Cultural Angeloni, Rua Brusque nº358, centro Itajaí/SC.
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Venda do Livro A Baleia que Aprendeu a Voar
O livro A baleia que aprendeu a voar, do escritor Renato de Oliveira Leme, nascido em Itapetininga, (e radicado em Sorocaba desde 1991) está à venda no Gpaci (Grupo de Pesquisa e Assistência ao Câncer Infantil). A renda será revertida para a entidade. A obra, uma história de ficção para adultos, tem como cenário o ambiente rural e promete fazer o leitor embarcar numa reflexão sobre as possibilidades de planejamento da vida, suas metas e sonhos.
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Fundação Cultural de Balneário Camboriú realiza Feira Literária
A Fundação Cultural de Balneário Camboriú (FCBC) realiza de 06 a 13 de julho, a Feira Literária, na Praça Higino Pio, das 10h às 22h. O evento é gratuito, destinado a toda a comunidade e visitantes, e objetiva incentivar a leitura como instrumento de comunicação, informação, conhecimento e lazer.

Além disso, pretende democratizar o acesso ao livro nas suas mais diversas linguagens, bem como, a aproximação de escritores, poetas, livrarias e editoras, oferecendo ao público local e visitante, um espaço educativo a ser firmado no calendário de eventos educacionais e culturais de Santa Catarina. Trata-se de uma ação educativa e cultural de popularização do livro e do incentivo ao hábito da leitura prazerosa.

Aliada às editoras e livrarias que são convidadas a participar da Feira Literária, são propostas outras atividades paralelas como: sessões de autógrafos, contação de histórias, declamações, atividades recreativas ligadas às artes plásticas, música, dança e teatro, fomentando a literatura como fonte de prazer.

Através da Feira Literária, a FCBC busca fortalecer ainda, a Biblioteca Pública Municipal e a Biblioteca Volante “Viajando com a Leitura”, ambas ações que oferecem um acervo bibliográfico para consulta, pesquisa e empréstimo.

Fundação Cultural de Balneário Camboriú
Rua 2412 , 111 - Centro
Balneário Camboriú - SC
88 330 - 440
Fone/Fax: (47) 3366-5325
E-mail: fcbc@camboriu.sc.gov.br

Fontes:
ACS - Prefeitura de Balneário Camboriú
http://www.balneariovirtual.com.br/portal/noticias_ver.php?id=826
Douglas Lara
http://www.sorocaba.com.br/acontece

terça-feira, 1 de julho de 2008

Eça de Queiroz (Memórias de uma Forca)

Foi por um modo sobrenatural que eu tive conhecimento deste papel, onde uma pobre forca apodrecida e negra dizia alguma coisa da sua história. Esta forca intentava escrever as suas trágicas Memórias. Deviam ser profundos documentos sobre a vida. Árvore, ninguém sabia tão bem o mistério da natureza; forca, ninguém conhecia melhor o homem. Nenhum tão espontâneo e verdadeiro como o homem que se torce na ponta de uma corda - a não ser aquele que lhe carrega sobre os ombros! Infelizmente, a pobre forca apodreceu e morreu.

Entre os apontamentos que deixou, os menos completos são estes que copio - resumo das suas dores, vaga aparência de gritos instintivos. Pudesse ela ter escrito a sua vida complexa, cheia de sangue e de melancolia! É tempo de sabermos, enfim, qual é a opinião que a vasta natureza, montes, árvores e águas, fazem do homem imperceptível. Talvez este sentimento me leve ainda algum dia a publicar papéis que guardo avaramente, e que são as Memórias de um Átomo e os Apontamentos de Viagem de Uma Raiz de Cipreste.

Diz assim o fragmento que eu copio - e que é simplesmente o prólogo das Memórias:

- Sou duma antiga família de carvalhos, raça austera e forte - que já na Antiguidade deixava cair, dos seus ramos, pensamentos para Platão. Era uma família hospitaleira e histórica: dela tinham saído navios para a derrota tenebrosa das índias, contos de lanças para os alucinados das Cruzadas, e vigas para os tetos simples e perfumados que abrigaram Savonarola, Espinosa e Lutero. Meu pai, esquecido das altas tradições sonoras e da sua heráldica vegetal, teve uma vida inerte, material e profana. Não respeitava as nobres morais antigas, nem a ideal tradição religiosa, nem os deveres da história. Era uma árvore materialista. Tinha sido pervertida pelos enciclopedistas da vegetação. Não tinha fé, nem alma, nem Deus! Tinha a religião do Sol, da seiva e da água. Era o grande libertino da floresta pensativa. No Verão, enquanto sentia a fermentação violenta das seivas, cantava movendo-se ao sol, acolhia os grandes concertos de pássaros boêmios, cuspia a chuva sobre o povo curvado e humilde das ervas e das plantas e, de noite, enlaçado pelas heras lascivas, ressonava sob o silêncio sideral. Quando vinha o Inverno, com a passividade animal dum mendigo, erguia, para a impassível ironia do azul, os seus braços magros e suplicantes!

- Por isso nós os seus filhos, não fomos felizes na vida vegetal. Um dos meus irmãos foi levado para ser tablado de palhaços: ramo contemplativo e romântico ia, todas as noites, ser pisado pela chufa, pelo escárnio, pela farsa e pela fome! O outro ramo, cheio de vida, de sol, de poeira, áspero solitário da vida, lutador dos ventos e das neves, forte e trabalhador, foi arrancado dentre nós, para ir ser tábua de esquife! - Eu, o mais lastimável, vim a ser forca!

- Desde pequeno fui triste e compassivo. Tinha grandes intimidades na floresta. Eu só queria o bem, o riso, a dilatação salutar das fibras e das almas. O orvalho de que a noite me banhava, atirava-o a umas pobres violetas, que viviam por debaixo de nós, doces raparigas lutuosas, melancolias condensadas e vivas da grande alma silenciosa da vegetação. Agasalhava todos os pássaros na véspera dos temporais. Era eu quem asilava a chuva. Ela vinha, com os cabelos esguedelhados, perseguida, mordida, retalhada pelo vento! Eu abria-lhe as ramagens e as folhas, e escondia-a ali, ao calor da seiva. O vento passava, confundido e imbecil. Então a pobre chuva, que o via longe, assobiando lascivo, deixava-se escorregar silenciosamente pelo tronco, gota por gota, para o vento a não perceber; e ia, de rastos, por entre a erva, acolher-se à vasta mãe Água! Tive por esse tempo uma amizade com um rouxinol, que vinha conversar comigo durante as longas horas consteladas do silêncio. O pobre rouxinol tinha uma pena de amor! Tinha vivido num país distante, onde os noivados têm mais moles preguiças: lá se enamorara: comigo chorava em suspiros líricos. E tão mística pena era que me disseram que o triste, de dor e de desesperança, se deixara cair na água! Pobre rouxinol! Ninguém tão amante, tão viúvo e tão casto!

- Eu queria proteger todos os que vivem. E quando as raparigas do campo vinham para junto de mim chorar, eu erguia sempre as minhas ramagens, como dedos, para apontar à pobre alma aflita de lágrimas todos os caminhos do Céu!

- Nunca mais! Nunca mais, verde mocidade distante!

- Enfim, eu tinha de entrar na vida da realidade. Um dia, um daqueles homens metálicos que fazem o tráfico da vegetação, veio arrancar-me à árvore. Não sabia eu o que me queriam. Deitaram-me sobre um carro e, ao cair da noite, os bois começaram a caminhar, enquanto ao lado um homem cantava no silêncio da noite. Eu ia ferido e desfalecido. Via as estrelas com os seus olhares lancinantes e frios. Sentia-me separar da grande floresta. Ouvia o rumor gemente, indefinido e arrastado das árvores. Eram vozes amigas que me chamavam!

- Por cima de mim voavam aves imensas. Eu sentia-me desfalecer, num torpor vegetal, como se estivesse sendo dissipado na passividade das coisas. Adormeci. Ao amanhecer, íamos entrando numa cidade. As janelas olhavam-me com olhos ensangüentados e cheios dum sol irado. Eu só conhecia as cidades pelas histórias que delas contavam as andorinhas, nos serões sonoros da espessura. Mas como ia deitado e amarrado com cordas, apenas via os fumos e um ar opaco. Ouvia o rumor áspero e desafinado, onde havia soluços, risos, bocejos, e mais o surdo roçar da lama, e o tinido sombrio dos metais. Eu sentia enfim o cheiro mortal do homem! Fui arremessado para um pátio infecto, onde não havia o azul e o ar. Comecei então a compreender que uma grande imundície cobre a alma do homem, porque ele se esconde tanto das vistas do Sol!

- Uns homens vieram, que me deram desprezivelmente com os pés. Eu estava num estado de torpor e de materialidade, que nem sentia as saudades da pátria vegetal. Ao outro dia, um homem veio para mim e deu-me golpes de machado. Não senti mais nada. Quando voltei a mim, ia outra vez amarrado no carro, e pela noite um homem aguilhoava os bois, cantando. Senti lentamente renascer a consciência e a vitalidade. Parecia-me que eu estava transformado numa outra vida orgânica. Não sentia a magnética fermentação da seiva, a energia vital dos filamentos e a superfície viva das cascas. Em redor do carro iam outros homens, a pé. Sob a brancura silenciosa e compassiva da Lua, tive uma saudade infinita dos campos, do cheiro dos fenos, das aves, de toda a grande alma vivificadora de Deus, que se move entre a ramagem. Eu sentia que ia para uma vida real, de serviço e de trabalho. Mas qual? Tinha ouvido falar das árvores, que vão ser lenha, aquecem e criam, e, tomando entre a convivência do homem a nostalgia de Deus, lutam com os seus braços de chamas para se desprender da terra: essas dissipam-se na augusta transfiguração do fumo, vão ser nuvens, ter a intimidade das estrelas e do azul, viver na serenidade branca e altiva dos imortais, e sentir os passos de Deus!

- Eu tinha ouvido falar das que vão ser vigas da casa do homem: essas, felizes e privilegiadas, sentem na penumbra amorosa a doce força dos beijos e dos risos; são amadas, vestidas, lavadas; encostam-se a elas os corpos dolorosos dos Cristos, são os pedestais da paixão humana, têm a alegria imensa e orgulhosa dos que protegem; e risos das crianças, ais namorados, confidências, suspiros, elegias da voz, tudo o que lhes faz lembrar as murmurações da água, o estremecimento das folhas, as cantigas dos ventos - toda essa graça escorre sobre elas, que já gozaram a luz da matéria, como uma imensa e bondosa luz da alma.

- Eu tinha ouvido falar também das árvores de bom destino, que vão ser mastro de navio, sentir o cheiro da maresia e ouvir as legendas do temporal, viajar, lutar, viver, levadas pelas águas, através do infinito, entre surpresas radiosas - como almas arrancadas do corpo que fazem pela primeira vez a viagem do Céu!

- Que iria eu ser?... - Chegamos. Tive então a visão real do meu destino. Eu ia ser forca!

- Fiquei inerte, dissolvida na aflição. Ergueram-me. Deixaram-me só, tenebrosa, num campo. Tinha, enfim, entrado na realidade pungente da vida. O meu destino era matar. Os homens, cujas mãos andam sempre cheias de cadeias, de cordas e de pregos, tinham vindo aos carvalhos austeros buscar um cúmplice! Eu ia ser a eterna companheira das agonias. Presos a mim, iam balouçar-se os cadáveres, como outrora as verdes ramagens orvalhadas!

- Eu ia dar esses negros frutos: os mortos!

- O meu orvalho seria de sangue. Ia escutar para sempre, eu a companheira dos pássaros, doces tenores errantes, as agonias soluçantes, os gemidos de sufocação! As almas ao partir, rasgar-se-iam nos meus pregos. Eu, a árvore do silêncio e do mistério religioso, eu, cheia de augusta alegria orvalhada e dos salmos sonoros da vida, eu, que Deus conhecia por boa consoladora, havia de mostrar-me às nuvens, ao vento, aos meus antigos camaradas puros e justos, eu, a árvore viva dos montes, de intimidade com a podridão, de camaradagem com o carrasco, sustentando alegremente um cadáver pelo pescoço, para os corvos o esfarraparem!

- E isto ia ser! Fiquei hirta e impassível como nas nossas florestas os lobos, quando se sentem morrer.

- Era a aflição. Eu via ao longe a cidade coberta de névoa.

- Veio o sol. Em roda de mim começou a juntar-se o povo. Depois, através dum desfalecimento, senti o ruído de músicas tristes, o rumor pesado dos batalhões, e os cantos dolentes dos padres. Entre dois círios, vinha um homem lívido. Então, confusamente, como nas aparências inconscientes do sonho, senti um estremecimento, uma grande vibração elétrica, depois a melodia monstruosa e arrastada do canto católico dos mortos!

- Voltou-me a consciência.

- Estava só. O povo dispersava-se e descia para os povoados. Ninguém! A voz dos padres descia lentamente, como a última água duma maré. Era o fim da tarde. Vi. Vi livremente. Vi! Dependurado de mim, hirto, esguio, com a cabeça caída e deslocada, estava o enforcado! Arrepiei-me!

- Eu sentia o frio e a lenta ascensão da podridão. Ia ficar ali, de noite, só, naquele descampado sinistro, tendo nos braços aquele cadáver! Ninguém!

- O sol ia-se, o sol puro. Onde estava a alma daquele cadáver? Tinha passado já? Tinha-se dissipado na luz, nos vapores, nas vibrações? Eu sentia os passos tristes da noite, que vinha. O vento empurrava o cadáver, a corda rangia.

- Eu tremia, numa febre vegetal, dilacerante e silenciosa. Não podia ficar ali só. O vento levar-me-ia, atirando-me, aos pedaços, para a antiga pátria das folhas. Não. O vento era brando: quase somente a respiração da sombra! Tinha vindo então o tempo em que a grande natureza, a natureza religiosa, era abandonada às feras humanas? Os carvalhos já não eram, pois, uma alma? Podiam, com justiça, vir o machado e as cordas buscar os ramos criados pela seiva, pela água e pelo sol, trabalho suado da natureza, forma resplandecente da intenção de Deus, e levá-los para as impiedades, para os tablados da forca onde apodrecem as almas, para os esquifes onde apodrecem os corpos? E as ramagens puras, que foram testemunhas das religiões, já não serviam senão para executar as penalidades humanas? Serviam só para sustentar as cordas, onde os saltimbancos bailam, e os condenados se torcem? Não podia ser.

- Pesava sobre a natureza uma fatalidade infame. As almas dos mortos, que sabem o segredo e compreendem a vegetação, achariam grotesco que as árvores, depois de terem sido colocadas por Deus na floresta com os braços estendidos, para abençoar a terra e a água, fossem arrastadas para as cidades, e obrigadas, pelo homem, a estender o braço da forca para abençoar os carrascos!

- E depois de sustentarem os ramos de verdura que são os fios misteriosos, mergulhados no azul, por onde Deus prende a terra - fossem sustentar as cordas da forca, que são as fitas infames, por onde o homem se prende à podridão! Não! Se as raízes dos ciprestes contassem isto em casa dos mortos - faziam estalar de riso a sepultura!

- Assim falava eu na solidão. A noite vinha lenta e fatal. O cadáver balouçava-se ao vento. Comecei a sentir palpitações de asas. Voavam sombras por cima de mim. Eram os corvos. Pousaram. Eu sentia o roçar das suas penas imundas; afiavam os bicos no meu corpo; penduravam-se, ruidosos, cravando-me as garras.

- Um pousou no cadáver e pôs-se a roer-lhe a face! Solucei dentro de mim. Pedi a Deus que me apodrecesse subitamente. Era uma árvore das florestas a quem os ventos falavam! Servia agora para afiar os bicos dos corvos, e para que os homens dependurassem de mim os cadáveres, como vestidos velhos de carne, esfarrapados! Oh! Meu Deus! - soluçava eu ainda - eu não quero ser relíquia de tortura: eu alimentava, não quero aniquilar: era a amiga do semeador, não quero ser a aliada do coveiro! Eu não posso e não sei ser a Justiça. A vegetação tem uma augusta ignorância: a ignorância do sol, do orvalho e dos astros. Os bons, os angélicos, os maus são os mesmos corpos invioláveis, para a grande natureza sublime e compassiva. Ó meu Deus, liberta-me deste mal humano tão aguçado e tão grande, que se traspassa a si, atravessa de lado a lado a natureza, e ainda te vai ferir, a ti, no Céu! Oh! Deus, o céu azul, todas as manhãs, me dava os orvalhos, o calor fecundo, a beleza imaterial e fluida da brancura, a transfiguração pela luz, toda a bondade, toda a graça, toda a saúde: - não queiras que, em compensação, eu lhe mostre, amanhã, ao seu primeiro olhar, este cadáver esfarrapado!

- Mas Deus dormia, entre os seus paraísos de luz. Vivi três anos nestas angústias.

- Enforquei um homem - um pensador, um político, filho do Bem e da Verdade, alma formosa cheia das formas do ideal, combatente da Luz. Foi vencido, foi enforcado.

- Enforquei um homem que tinha amado uma mulher e tinha fugido com ela. O seu crime era o amor, que Platão chama mistério, e Jesus chamou lei. O código puniu a fatalidade magnética da atração das almas, e corrigiu Deus com a forca!

- Enforquei também um ladrão. Este homem era também operário. Tinha mulher, filhos, irmãos e mãe. No Inverno não teve trabalho, nem lume, nem pão. Tomado dum desespero nervoso, roubou. Foi enforcado ao Sol-posto. Os corvos não vieram. O corpo foi para a terra limpo, puro e são. Era um pobre corpo que tinha sucumbido por eu o apertar de mais, como a alma tinha sucumbido por Deus a alargar e a encher.

- Enforquei vinte. Os corvos conheciam-me. A natureza via a minha dor íntima; não me desprezou; o Sol alumiava-me com glorificação, as nuvens vinham arrastar por mim a sua mole nudez, o vento falava-me e contava a vida da floresta, que eu tinha deixado, a vegetação saudava-me com meigas inclinações da folhagem: Deus mandava-me o orvalho, frescura que prometia o perdão natural.

- Envelheci. Vieram as rugas escuras. A grande vegetação, que me sentia esfriar, mandou-me os seus vestidos de hera. Os corvos não voltaram: não voltaram os carrascos. Sentia em mim a antiga serenidade da natureza divina. As eflorescências, que tinham fugido de mim, deixando-me só no solo áspero, começaram a voltar, a nascer, em roda de mim, como amigas verdes e esperançosas. A natureza parecia consolar-me. Eu sentia chegar a podridão. Um dia de névoas e de ventos, deixei-me cair tristemente no chão, entre a relva e a umidade, e pus-me silenciosamente a morrer.

- Os musgos e as relvas cobriam-me, e eu comecei a sentir-me dissolver na matéria enorme, com uma doçura inefável.

- O corpo esfria-me: eu tenho a consciência da minha transformação lenta de podridão em terra. Vou, vou. Ó terra, adeus! Eu derramo-me já pelas raízes. Os átomos fogem para toda a vasta natureza, para a luz, para a verdura. Mal ouço o rumor humano. Ó antiga Cíbele, eu vou escorrer na circulação material do teu corpo! Vejo ainda indistintamente a aparência humana, como uma confusão de idéias, de desejos, de desalentos, entre os quais passam, diafanamente, bailando, cadáveres! Mal te vejo, ó mal humano! No meio da vasta felicidade difusa do azul, tu és, apenas, como um fio de sangue! As eflorescências, como vidas esfomeadas, começam a pastar-me! Não é verdade que ainda lá em baixo, no poente, os abutres fazem o inventário do corpo humano? Ó matéria, absorve-me! Adeus! Para nunca mais, terra infame e augusta! Eu vejo já os astros correrem como lágrimas pela face do céu. Quem chora assim? Eu sinto-me desfeita na vida formidável da terra! Ó mundo escuro, de lama e de ouro, que és um astro no infinito - adeus! adeus! - deixo-te herdeiro da minha corda podre!-

(Gazeta de Portugal, 23 de Dezembro de 1867)

Fonte:
http://www.gargantadaserpente.com