sexta-feira, 29 de maio de 2009

T. S. Eliot (A Função Social Da Poesia)



É de tal modo provável que o título deste ensaio sugira coisas diferentes a diferentes pessoas que posso desculpar-me por explicar de início o que ele não significa, antes de tentar esclarecer o que significa. Quando aludimos à “função” de qualquer coisa, provavelmente estamos pensando naquilo que essa coisa deve produzir em vez daquilo que ela produz ou haja produzido. Trata-se de uma importante distinção, pois não pretendo falar sobre aquilo que julgo que a poesia deva produzir. Pessoas que nos disseram o que a poesia deve produzir, sobretudo se são poetas, têm habitualmente em mira a espécie particular de poesia que gostariam de escrever. É sempre possível, naturalmente, que a poesia possa desempenhar no futuro um papel distinto daquele desempenhado no passado: mas, ainda assim, vale a pena decidir primeiro qual a função por ela exercida no passado, seja numa ou noutra época, seja nesse ou naquele idioma, e de um ponto de vista universal. Poderia escrever facilmente sobre o que eu próprio faço com a poesia, ou o que gostaria de fazer, e então tentar persuadir alguém de que isso é exatamente o que todos os bons poetas têm tentado fazer, ou devem ter feito, no passado — só que não o lograram de todo, embora talvez não por sua culpa. Mas me parece provável que se a poesia — e refiro-me a toda grande poesia — não exerceu nenhuma função social no passado, não é provável que venha a fazê-lo no futuro.

Quando digo toda grande poesia, pretendo abster-me de outro meio através do qual possa ocupar-me do assunto. Alguém poderia estudar as diversas espécies de poesia, uma após outra, e discutir a função social de cada uma delas sucessivamente sem tangenciar a questão geral de qual é a função da poesia como poesia. Desejo distinguir entre as funções gerais e particulares, de modo que saibamos do que estamos falando. A poesia pode ter um deliberado e consciente propósito social. Em suas mais primitivas formas, esse propósito é amiúde absolutamente claro. Há, por exemplo, antigas runas e cantos, alguns dos quais revelam propósitos mágicos verdadeiramente práticos, destinados a esconjurar o mau-olhado, a curar certas doenças ou a obter as boas graças de algum demônio. A poesia era utilizada primitivamente em rituais religiosos e, quando entoamos um hino, estamos ainda utilizando-a com um determinado propósito social. As primitivas formas do gênero épico e a saga podem ter transmitido aquilo que sustentamos como história antes de se tornar apenas uma diversão comunitária, e antes do uso da linguagem escrita, uma forma de verso regular deve ter sido extremamente proveitosa à memória — e a memória dos primitivos bardos, dos contadores de histórias e dos sábios deve ter sido prodigiosa. Nas sociedades mais evoluídas, tal como a da Grécia antiga, as funções sociais reconhecidas da poesia são também bastante conspícuas. O drama grego se desenvolve a partir dos ritos religiosos, e permanece como cerimônia pública formal associada às tradicionais celebrações religiosas; a ode pindárica se desenvolve em relação com uma determinada ocasião social. Certamente, tais usos definidos da poesia deram a ela uma estrutura que tornou possível alcançar a perfeição em gêneros particulares.

Algumas dessas formas persistem na poesia mais recente, como é o caso dos hinos religiosos a que me referi. O significado da expressão didática, para poesia, passou por algumas transformações. Didático pode significar “transmissão de informação”, ou significar “administração de instrução moral’’, ou pode equivaler a algo que abrange ambas as coisas. As Geórgicas de Virgílio, por exemplo, são poesia belíssima e contêm considerável dose de informação sobre a boa agricultura. Mas pareceria impossível, nos dias de hoje, uma obra atualizada sobre a agricultura que pudesse também ser poesia refinada: de um lado, o próprio assunto tornou-se muito mais complexo e científico; de outro, pode ser mais facilmente desenvolvido em prosa. Nem poderíamos, como o fizeram os romanos, escrever tratados astronômicos e cosmológicos em verso. O poema, cujo objetivo ostensivo é transmitir informações, foi suplantado pela prosa. A poesia didática tornou-se aos poucos restrita à poesia de exortação moral, ou poesia que pretende persuadir o leitor a aceitar o ponto de vista do autor sobre alguma coisa. Por conseguinte, ela inclui em boa parte aquilo que se pode chamar de sátira, embora esta se confunda com o burlesco e a paródia, cujo propósito é, fundamentalmente, causar hilariedade. Alguns dos poemas de Dryden, no século XVII, são sátiras na medida em que têm em mira ridicularizar os objetos contra os quais apontam, e são também didáticos quando objetivam persuadir o leitor a aceitar determinado ponto de vista político ou religioso; e, ao cumprir esse desígnio, eles se utilizam do método alegórico, que apresenta a realidade como ficção: The hind and the panther, que se propõe a persuadir o leitor de que a razão estava do lado da Igreja de Roma, contra a Igreja da Inglaterra, é seu mais notável poema desse gênero. No século XIX, boa parte da poesia de Shelley inspirou-se num entusiasmo pelas reformas políticas e sociais.

Quanto à poesia dramática, que hoje tem uma função social peculiar, pois enquanto a maior parte da poesia atual é escrita para ser lida em solidão, ou em voz alta em pequenos grupos, o verso dramático tem em si a função de provocar uma impressão imediata e coletiva sobre um amplo número de pessoas reunidas para assistir a um episódio imaginário encenado num palco. A poesia dramática é diferente de qualquer outra, mas, como suas leis específicas são as do drama, sua função em geral se funde à do drama, e não me refiro aqui à função social específica do drama.

No que se refere à função particular da poesia filosófica, implicaria esta uma análise e uma explicação de certa amplitude. Penso que já mencionei bastantes gêneros de poesia para deixar claro que a função específica de cada um deles se relaciona com alguma outra função: a poesia dramática, com o drama; a poesia didática informativa, com a função de seu assunto; a poesia didática filosófica, ou religiosa, ou política, ou moral, com a função de tais temáticas. Podemos considerar a função de quaisquer desses gêneros poéticos e, ainda assim, deixar intocado o problema da função da poesia, pois todas essas coisas podem ser abordadas na prosa.

Mas, antes de prosseguir, quero descartar uma objeção que pode ser levantada. As pessoas suspeitam às vezes de qualquer poesia com um propósito particular, isto é, a poesia em que o poeta defende conceitos sociais, morais, políticos ou religiosos, assim como outras pessoas julgam amiúde que determinada poesia seja autêntica só porque exprime um ponto de vista que lhes apraz. Eu gostaria de dizer que a questão relativa ao fato de o poeta estar utilizando sua poesia para defender ou atacar determinada atitude social não interessa. O mau verso pode obter fama temporária quando o poeta reflete uma atitude popular do momento; mas a verdadeira poesia sobrevive não apenas à mudança da opinião pública como também a completa extinção do interesse pelas questões com as quais o poeta esteve apaixonadamente envolvido. Os poemas de Lucrécio não perderam sua grandeza, embora suas noções de física e de astronomia hajam caído em descrédito; os de Dryden também, embora as controvérsias do século XVII há muito já não nos digam mais respeito; da mesma forma, um grande poema do passado ainda nos agrada, mesmo que seu assunto seja um daqueles que deveríamos hoje abordar em prosa.

Mas se estamos à procura da função social essencial da poesia, precisamos olhar primeiro para suas funções mais óbvias, aquelas que precisam ser cumpridas, se é que algum poema o faz. O principal, suponho, é que possamos nos assegurar de que essa poesia nos dê prazer. Se alguém perguntar qual o gênero de prazer, só poderei responder: o gênero de prazer que a poesia proporciona; simplesmente porque qualquer outra resposta nos levaria a nos perdermos em divagações estéticas e na questão geral na natureza da arte.

Suponho que se deva concordar com o fato de que qualquer poeta, haja sido ele grande ou não, tem algo a nos proporcionar além do prazer, pois se for apenas isso, o próprio prazer pode não ser da mais alta espécie. Para além de qualquer intenção específica que a poesia possa ter, tal como foi por mim exemplificado nas várias espécies de poesia, há sempre comunicação de alguma nova experiência, ou uma nova compreensão do familiar, ou a expressão de algo que experimentamos e para o que não temos palavras — o que amplia nossa consciência ou apura nossa sensibilidade. Mas não é com esse beneficio individual extraído à poesia, nem tampouco com a qualidade do prazer individual, que este ensaio se relaciona. Todos compreendemos, creio eu, tanto a espécie de prazer que a poesia pode proporcionar, quanto a diferença que, para além do prazer, ela pode oferecer às nossas vidas. Caso não se obtenham esses dois resultados, simplesmente não há poesia. Podemos reconhecer isso, mas ao mesmo tempo fazer vista grossa para algo que isso faz por nós coletivamente, enquanto sociedade. E falo no mais amplo sentido, pois creio ser importante que cada povo deva ter sua própria poesia, não apenas por causa daqueles que gostam de poesia — tal pessoa poderia sempre aprender outras línguas e apreciar a poesia delas —, mas também porque isso estabelece de fato uma diferença para a sociedade como um todo, ou seja, para pessoas que não gostam de poesia. Incluo até mesmo aqueles que ignoram os nomes de seus próprios poetas nacionais. Eis o verdadeiro assunto deste ensaio.

Observa-se que a poesia difere de qualquer outra arte por ter um valor para o povo da mesma raça e língua do poeta, que não pode ter para nenhum outro. É verdade que até a música e a pintura têm um caráter local e racial; mas decerto as dificuldades de apreciação dessas artes, para um estrangeiro, são muito menores. É verdade, por outro lado, que os textos em prosa têm um significado em suas próprias línguas que se perde na tradução; mas todos sentimos que perdemos muito menos ao lermos uma novela traduzida do que um poema vertido de outro idioma; e na tradução de alguns gêneros de obra científica a perda pode ser virtualmente nula. O fato de que a poesia é muito mais local do que a prosa pode ser comprovado na história das línguas européias. Ao longo de toda a Idade Média e no curso dos cinco séculos seguintes, o latim permaneceu como a língua da filosofia, da teologia e da ciência. O impulso concernente ao uso literário das linguagens dos povos começa com a poesia. E isso parece absolutamente natural quando percebemos que a poesia tem a ver fundamentalmente com a expressão do sentimento e da emoção; e esse sentimento e emoção são particulares, ao passo que o pensamento é geral. É mais fácil pensar do que sentir numa língua estrangeira. Por isso, nenhuma arte é mais visceralmente nacional do que a poesia. Um povo pode ter sua língua trasladada para longe de si, abolida, e uma outra língua imposta nas escolas; mas a menos que alguém ensine esse povo a sentir numa nova língua, ninguém conseguirá erradicar o idioma antigo, e ele reaparecerá na poesia, que é o veículo do sentimento. Eu disse precisamente “sentir numa nova língua”, e pretendi dizer algo mais do que apenas “expressar seus sentimentos numa nova língua”. Um pensamento expresso numa língua diversa pode ser praticamente o mesmo pensamento, mas um sentimento ou uma emoção expressos numa língua diferente não são o mesmo sentimento nem a mesma emoção. Uma das razões para que aprendamos bem pelo menos uma língua estrangeira é que isso nos permite adquirir uma espécie de personalidade suplementar; uma das razões para não adquirirmos uma nova língua em lugar de nossa própria é que a maioria de nós não deseja tornar-se uma pessoa diferente. Uma língua superior raramente pode ser exterminada, a menos que se extermine o povo que a fala. Quando uma língua suplanta outra, isso acontece habitualmente porque essa língua tem vantagens que a recomendam — e que oferecem não uma mera diferença, mas um espectro mais amplo e refinado, não só para o pensamento, mas também para sentir — preferencialmente à língua mais primitiva.

A emoção e o sentimento são, portanto, melhor expressos na língua comum do povo, isto é, na língua comum a todas as classes: a estrutura, o ritmo, o som, o modo de falar de uma língua expressam a personalidade do povo que a utiliza. Quando afirmo que a poesia, mais do que a prosa, diga respeito à expressão da emoção e do sentimento, não pretendo dizer que a poesia necessite estar desprovida de conteúdo intelectual ou significado, ou que a grande poesia não contenha mais esse significado do que a poesia menor. Mas para levar adiante essa investigação eu teria que me afastar de meu propósito imediato. Admitirei como aceito o fato de que as pessoas encontram a expressão mais consciente de seus sentimentos mais profundos antes na poesia de sua própria língua do que em qualquer outra arte ou na poesia escrita em outros idiomas. Isso não significa, é claro, que a verdadeira poesia esteja restrita a sentimentos que cada um possa identificar e compreender; não devemos restringir poesia à poesia popular. Basta que, num povo homogêneo, os sentimentos dos mais refinados e complexos tenham algo em comum com os dos mais simples e grosseiros, algo que eles não tem em comum com as pessoas de seu próprio nível ao falar outra língua. E, quando se trata de uma civilização sadia, o grande poeta terá algo a dizer a seu compatriota em qualquer nível de educação.

Podemos dizer que a tarefa do poeta, como poeta, é apenas indireta com relação ao seu povo: sua tarefa direta é com sua língua, primeiro para preservá-la, segundo para distendê-la e aperfeiçoá-la. Ao exprimir o que outras pessoas sentem, também ele está modificando seu sentimento ao torná-lo mais consciente; ele está tornando as pessoas mais conscientes daquilo que já sentem, e por conseguinte, ensinando-lhes algo mais sobre si próprias. Mas o poeta não é apenas uma pessoa mais consciente do que as outras; é também individualmente distinto de outra pessoa, assim como de outros poetas, e pode fazer com que seus leitores partilhem conscientemente de novos sentimentos que ainda não haviam experimentado. Essa é a diferença entre o escritor que é apenas excêntrico ou louco e o autêntico poeta. Aquele primeiro pode ter sentimentos que são únicos, mas que não podem ser partilhados, e que por isso são inúteis; o último descobre novas variantes da sensibilidade das quais os outros podem se apropriar. E, ao expressá-las, desenvolve e enriquece a língua que fala.

Já disse absolutamente o bastante sobre as impalpáveis diferenças de sentimento entre um povo e outro, diferenças que se afirmam e se desenvolvem através de suas diferentes línguas. Mas as pessoas não sentem o mundo apenas diferentemente em diferentes lugares; elas o sentem distintamente em tempos distintos. Na verdade, nossa sensibilidade está constantemente se transformando, assim como o mundo que nos rodeia se transforma; o que sentimos não é o mesmo que sente o chinês ou o hindu, mas também não é o mesmo que sentiam nossos ancestrais vários séculos atrás. Não é o mesmo que nossos pais; e, finalmente, nós próprios já somos totalmente diferentes do que éramos há um ano. Isso é óbvio; mas o que não é tão óbvio é que esta constitui a razão pela qual não podemos nos dar o luxo de pararmos de escrever poesia. As pessoas mais educadas têm um certo orgulho dos grandes autores de sua língua, ainda que nunca os tenham lido, da mesma forma como se orgulham de qualquer outra qualidade que distinga seu país: alguns autores tornam-se amiúde celebrados o bastante para serem citados ocasionalmente em discursos políticos. Mas a maioria das pessoas não percebe que isso não é o bastante; que a menos que se continue a produzir grandes autores, e particularmente grandes poetas, sua língua apodrecerá, sua cultura se deteriorará e talvez venha a ser absorvida por outra mais poderosa.

Uma coisa é absolutamente certa: se não dispusermos de uma literatura viva, nos tornaremos cada vez mais alienados da literatura do passado; a menos que mantenhamos continuidade, nossa literatura do passado tornar-se-á mais e mais distante de nós até nos parecer tão estranha quanto a literatura de um povo estrangeiro. É que nossa língua está se transformando; nossa maneira de viver também muda, sob a pressão das transformações materiais de toda ordem em nosso meio; e a menos que disponhamos daqueles poucos homens que associam a uma excepcional sensibilidade um excepcional poder sobre as palavras, nossa própria capacidade, não apenas de nos expressar, mas até mesmo de sentir qualquer emoção, exceto as mais grosseiras, se degenerará.

Pouco importa que um poeta haja alcançado uma ampla repercussão em sua própria época. O que importa é que possa ter sempre existido, pelo menos, um pequeno interesse por ele em cada geração. Entretanto, o que acabo de dizer sugere que sua importância se relaciona à sua própria época, ou que os poetas mortos deixam de ter qualquer utilidade para nós, a menos que tenhamos também poetas vivos. Eu poderia até impor meu primeiro ponto de vista e dizer que se um poeta alcança um grande público muito rapidamente, isso constitui antes uma circunstância suspeita, pois nos leva a desconfiar de que ele não esteja realmente produzindo algo de novo, que esteja apenas proporcionando às pessoas aquilo a que estas já estão habituadas e, por conseguinte, o que já receberam dos poetas de gerações anteriores. Mas se couber a um poeta tal regalia, um pequeno público em sua época é importante. Haveria sempre ali uma vanguarda de pessoas, apreciadoras de poesia, que são independentes e estão algo adiante de seu tempo, ou prontas para assimilar mais rapidamente a novidade. Desenvolvimento da cultura não significa trazer todo mundo para compor a linha de frente, o que equivale apenas a fazer com que todos mantenham a marcha: significa a manutenção de uma tal élite. Com a massa principal e acomodada de leitores distante não mais do que cerca de uma geração para trás. As mudanças e os desdobramentos da sensibilidade que afloram de início em alguns começarão a insinuar-se gradualmente na língua, através de sua influência sobre outros, e mais facilmente sobre autores populares; e com o tempo tornam-se bem definidas, exigindo assim um novo avanço. Ademais, é através dos autores vivos que os mortos permanecem vivos. Um poeta como Shakespeare influenciou profundamente a língua inglesa, e não apenas pela influência que exerceu sobre seus sucessores imediatos. Pois os poetas de maior estatura têm aspectos que não se revelam de imediato; e ao exercerem uma influência direta sobre outros poetas séculos mais tarde, continuam a afetar a língua viva. Na verdade, se um poeta inglês aprende a usar palavras em nosso tempo, deve dedicar-se ao rigoroso estudo daqueles que melhor as utilizaram em sua época, daqueles que, em seus próprios dias, reinventaram a língua.

Até agora apenas sugeri o ponto extremo até o qual, creio eu, pode-se dizer que se estende a influência da poesia; e isso pode ser melhor expresso pela afirmação de que, no decurso do tempo, ela produz uma diferença na fala, na sensibilidade, nas vidas de todos os integrantes de uma sociedade, de todos os membros de uma comunidade, de todo o povo, independentemente de que leiam e apreciem poesia ou não, ou até mesmo, na verdade, de que saibam ou não os nomes de seus maiores poetas. A influência da poesia, na mais distante periferia, é naturalmente muito difusa, muito indireta e muito difícil de ser comprovada. É como acompanhar o trajeto de um pássaro ou de um avião num céu luminoso: se alguém os percebeu quando estavam muito próximos, e os manteve sob a vista quando se afastavam cada vez mais, poderá vê-los a uma grande distância, a uma distância na qual o olho de outra pessoa, de quem se tenta chamar a atenção para o fato, será incapaz de percebê-los. Assim, se rastrearmos a influência da poesia através dos leitores mais afetados por ela às pessoas que jamais leram nada, a encontraremos presente em toda parte. Pelo menos a encontraremos se a cultura nacional estiver viva e sadia, pois numa sociedade saudável há uma influência recíproca e uma interação continuas de uma parte sobre as outras. E isso é o que eu entendo como a função social da poesia em seu mais amplo sentido: é isso o que, proporcionalmente à sua existência e vigor, afeta a fala e a sensibilidade de toda a nação.

Ninguém deve imaginar que estou dizendo ser a língua que falamos exclusivamente determinada por nossos poetas. A estrutura da cultura é muito mais complexa do que isso. A rigor, é igualmente verdadeiro que a qualidade de nossa poesia depende do modo como o povo utiliza sua língua: pois um poeta deve tomar como matéria-prima sua própria língua, da maneira como de fato ela é falada à volta dele. Se a língua se aprimora, ele se beneficiará; se entra em declínio, deverá tirar daí o melhor proveito. Até certo ponto, a poesia pode preservar, e mesmo restaurar, a beleza de uma língua; ela pode e deve ajudá-la a se desenvolver, a tornar-se tão sutil e precisa nas mais adversas condições e para os cambiantes propósitos da vida moderna, quanto o foi numa época menos complexa. Mas a poesia, como qualquer outro elemento solitário nessa misteriosa personalidade social a que chamamos nossa ‘‘cultura’’, deve permanecer dependente de muitíssimas circunstâncias que escapam ao seu controle.

Isso me conduz a algumas reflexões posteriores de natureza mais geral. Minha ênfase nesse ponto tem sido sobre a função local e nacional da poesia, e isso deve ser explicado. Não desejo dar a impressão de que a função da poesia é distinguir entre um povo e outro, pois não creio que as culturas dos diversos povos da Europa possam florescer isoladas uma das outras. Não resta dúvida de que houve no passado altas civilizações que produziram grande arte, pensamento e literatura, e que se desenvolveram sozinhas. Não posso falar disso com segurança, pois algumas delas podem não ter sido tão isoladas quanto inicialmente parece. Mas na história da Europa não tem sido assim. Até mesmo a Grécia antiga deveu muito ao Egito, e algo às suas fronteiras asiáticas; e nas relações dos Estados gregos entre si, com seus diferentes dialetos e seus diferentes costumes, podemos encontrar uma influência recíproca e estímulos análogos aos que os países europeus exerciam uns sobre os outros. Mas a história da literatura européia não indica que qualquer literatura tenha sido independente das outras, revelando antes um movimento constante de dar e receber, e que cada uma delas, sucessivamente, vem sendo revitalizada por estímulos externos. Uma autarquia geral na cultura simplesmente não funcionará: a esperança de perpetuar a cultura de qualquer país repousa na comunicação com as demais. Mas se a separação de culturas dentro da unidade européia é um perigo, também o seria uma unificação que levasse à uniformidade. A variedade é tão essencial quanto a unidade. Por exemplo, há muito a ser dito, para certos propósitos limitados, de uma língua franca universal como o esperanto ou o inglês básico. Mas supondo que toda a comunicação entre as nações fosse conduzida por uma língua artificial, quão imperfeita ela seria! Ou antes, seria absolutamente adequada em alguns aspectos, e apresentaria uma completa falha de comunicação em outros. A poesia é uma constante advertência a tudo aquilo que só pode ser dito em uma língua, e que é intraduzível. A comunicação espiritual entre um povo e outro não pode ser levada adiante sem indivíduos que assumam o desafio de aprender pelo menos uma língua estrangeira tão bem quanto é possível aprender qualquer língua que não a sua própria, conseqüentemente, que estejam capacitados em maior ou menor grau, a sentir em outra língua tão bem quanto na sua. E a compreensão de outro povo por parte de qualquer pessoa necessita, dessa forma, ser complementada pela compreensão daqueles indivíduos dentre esse povo que se esforçaram para aprender a sua própria língua.

Pode ocorrer que o estudo da poesia de um outro povo seja particularmente instrutivo. Eu disse que há qualidades poéticas em cada língua que só podem ser entendidas por aqueles que dela são nativos. Mas há também um outro lado da questão. Descobri algumas vezes, ao tentar ler uma língua que não conhecia muito bem, que não conseguia compreender um texto em prosa senão na medida em que o digeria conforme os padrões do professor: ou seja, eu estava seguro quanto ao significado de cada palavra, dominava a gramática e a sintaxe, e podia então decifrar a passagem em inglês. Mas descobri também algumas vezes que um texto poético, que eu não conseguia traduzir, incluindo muitas palavras que não me eram familiares e orações que eu não conseguia interpretar, comunicava-me algo vívido e imediato, que era único, distinto de qualquer coisa em inglês — algo que eu não podia transcrever em palavras e, não obstante, sentia que compreendera. E ao aprender melhor aquela língua, descobri que essa impressão não era ilusória, ou algo que eu imaginasse existir na poesia, mas algo que estava de fato ali. De modo que, em poesia, vez por outra alguém pode penetrar em outro país, por assim dizer, antes que seu passaporte seja expedido ou que seu bilhete de viagem seja comprado.

Toda a questão do relacionamento entre países de línguas diferentes, mas que possuem afinidades culturais, no âmbito europeu, é por conseguinte aquela à qual somos conduzidos, talvez inesperadamente, pela investigação relativa à função social da poesia. É claro que não pretendo passar desse ponto para questões estritamente políticas; mas gostaria que aqueles que se ocupam das questões políticas pudessem mais amiúde cruzar a fronteira que conduz aos problemas que acabo de examinar pois são estes que conferem ao aspecto espiritual das questões o aspecto material de que se ocupa a política. Do lado em que me encontro na fronteira, uma dessas questões se relaciona com as coisas vivas que têm suas próprias leis de crescimento, as quais nem sempre razoáveis, mas que somente devem ser aceitas pela razão; coisas que não podem ser caprichosamente planejadas e postas em ordem da mesma forma que não podem ser disciplinados os ventos, as chuvas e as estações.

Finalmente, se eu estiver certo de que a poesia tem uma “função social” para o conjunto das pessoas da língua do poeta, estejam elas conscientes ou não de sua existência, conclui-se que interessa a cada povo da Europa que os demais devam continuar a ter sua poesia. Não posso ler a poesia norueguesa, mas, se fosse dito que não mais está sendo escrita qualquer poesia em língua norueguesa, eu sentiria um sobressalto que seria muito mais do que uma generosa simpatia. Eu o veria como um indício de doença que provavelmente estaria difundida por todo o continente, como o início de um declínio significando que os povos de toda parte houvessem deixado de estar aptos a expressar, e conseqüentemente a sentir, as emoções dos seres civilizados. Isso, é claro, poderia ocorrer. Muito já se falou em toda parte sobre o declínio da crença religiosa; não tanto quanto se observa relativamente ao declínio da sensibilidade religiosa. O problema da idade moderna não se resume apenas à incapacidade de acreditar em certas coisas em relação a Deus e ao homem em que nossos antepassados acreditavam, mas à incapacidade de sentir Deus e o homem como eles o fizeram. Uma crença na qual ninguém mais deposita sua fé constitui algo que, até certo ponto, alguém ainda pode entender; mas quando desaparece o sentimento religioso, as palavras com as quais os homens lutaram para expressá-lo perdem o sentido. É verdade que o sentimento religioso varia naturalmente de país para país, e de época para época, da mesma forma como ocorre com o sentimento poético; o sentimento varia, mesmo quando a crença e a doutrina não se modificam. Mas essa é uma condição da vida humana, e o que me deixa apreensivo é a morte. É igualmente possível que o sentimento pela poesia, e os sentimentos que constituem a matéria-prima da poesia, possam desaparecer em toda parte: o que talvez pudesse favorecer aquela unificação do mundo que alguns povos consideram em si desejável.

Fonte:
ELIOT, T. S. De poesia e poetas. São Paulo: Brasiliense, 1991.

A Obra Poética de T. S. Eliot

Noah Mitchel (Garotas Gregas)
The Love Song of J. Alfred Prufrock (1915)

Em 1915 Ezra Pound, editor da revista "Poetry", recomendou a Harriet Monroe, fundadora da revista, que ela publicasse "The Love Song of J. Alfred Prufrock". Embora Prufrock parecesse tratar-se de um homem na meia idade, Eliot escreveu a maior parte do poema quando tinha apenas 22 anos. Os seus hoje famosos primeiros versos, que comparam o céu ao entardecer com "a patient etherised upon a table" (algo como "um paciente anestesiado sobre a mesa.") foram considerados chocantes e ofensivos, ainda mais numa época na qual a poesia Georgiana imperava, com suas derivações românticas do século XIX. O poema retrata uma experiência consciente de um homem, Prufrock, sob a forma de um "stream of consciousness" (figura de linguagem típica do modernismo, que consiste em mostrar por escrito o monólogo interior de um personagem). Prufrock lamenta sua inércia física e intelectual, as oportunidades que perdeu ao longo de sua vida e a falta de um progresso espiritual, recorrente de amor carnal que não conseguira atingir.

Os estudiosos não sabem dizer se o narrador sai de sua casa ao longo da narração, pois as localidades descritas podem ser interpretadas tanto como experiências reais, lembranças, ou mesmo imagens simbólicas do subconsciente, como por exemplo no refrão "In the room woman come and go / talking about Miguel Angelo".

A estrutura do poema foi imensamente influenciada por Dante Alighieri. Há ainda referências a Hamlet de Shakespeare e outras tantas obras literárias: essa técnica de alusão e citação foi muito usada em toda poesia posteriormente escrita por Thomas Stearns Eliot.


The Waste Land (1922)

Em outubro de 1922, Thomas Eliot publicou "The Waste Land" no jornal "The Criterion". Composto durante um período turbulento na vida do autor - seu casamento estava acabando, pois tanto ele quanto sua esposa Vivienne sofriam de uma desordem neural - este poema é muitas vezes lido como uma alegoria à desilusão experimentada pela geração pós-guerra. Mesmo antes de "The Waste Land" ser publicado como livro (em dezembro de 1922) Eliot já havia se distanciado da visão desesperadora do poema: "No que diz respeito a "The Waste Land", esse poema ficará no passado, pois agora estou trabalhando com formas e estilos diferentes", escreveu ele para Richard Aldington no dia 15 de novembro de 1922. A despeito da obscuridade do poema - que tem sátiras e profecias; mudanças abruptas de narrador, localidade e tempo; além de invocar uma vasta e dissonante gama de culturas e obras literárias - ele acabou se tornando referencial da literatura moderna, sendo considerado o reflexo poético de um romance publicada no mesmo ano: Ulysses, de James Joyce.

Entre seus muito famosos versos estão "April is the cruellest month" (referência ao fato que abril é o mês de recomeçar a plantar, e não há colheitas na Europa), "I will show you fear in a handful of dust" e "Shantih shantih shantih", (Sânscrito que deve ser lido pausadamente e de forma onamatopeica. Algo como "Xantir... Xantir... Xantir...". Shantih significa "paz" e o sânscrito segue uma súplica pela paz).

A obra de Eliot foi muito apreciada pelos poetas da geração de trinta. Em certa ocasião W.H. Auden leu em voz alta todo o poema durante um encontro social. A publicação do esboço do poema em 1972 mostrava uma grande influência de Ezra Pound sobre a sua forma final. A parte IV, "Death by Water", fora reduzida de noventa e duas linhas para dez apenas, e com dez linhas foi publicado. Pound repreendeu Eliot por ter rasgado a maior parte do poema. Eliot o agradeceu por "incentivar-me a fazer as coisas do meu jeito".

The Hollow Men (1925)

Publicada em várias partes e com vários títulos diferentes, a versão final de "The Hollow Men" data de 3 de março de 1925. O poema faz referências a diversas obras do próprio Eliot e, embora tenha grande densidade literária, muitos críticos o consideram somente como um post scriptum de "The Waste Land".

Seu conteúdo é metafórico e de difícil interpretação, mas estudiosos dizem tratar-se de um poema que filosofa sobre os aspectos da mente humana num contexto ora social, ora religioso. Trata ainda dos medos humanos, considerando-os "more distant and more solemn/than a fading star" (mais distantes e solenes/que uma estrela cadente) e mostrando que mesmo nos sonhos é difícil visualizá-los sem temor. São estes medos "Eyes I dare not meet in dreams/In death's dream kingdom" (olhos que temo encontrar em sonhos/e no reino de sonho da morte). Esses olhos são muito similarmente descritos aos olhos de Beatriz, em "A Divina Comédia".

Há ainda uma passagem que mostra um ritual dançante, "Here we go around the prickly pear" (andamos em torno da pêra espinhenta) que tem relação com os rituais missais, sendo a pêra a representação de um altar, sem ter portanto, centro exato, mas sendo o centro em si. O poema tem ainda grande musicalidade, com várias repetições e rimas eventuais.

Four Quartets (1943)

O próprio Thomas Eliot considerava "Four Quartets" sua obra-prima, embora muitos críticos literários preferissem seus trabalhos anteriores.

"Four Quartets" é baseado nos conhecimentos de Eliot nas áreas de misticismo e filosofia. O poema consiste de quatro poemas longos, que foram publicados individualmente: "Burnt Norton" (1936), "East Coker" (1940), "The Dry Salvages" (1941) e "Little Gidding" (1942), cada um deles dividido em cinco partes. Embora seja difícil fazer comparações entre eles, nota-se que cada um tem uma descrição geográfica da localidade em seus títulos, todos especulam sobre a natureza do tempo, seja ela teológica, histórica ou física, e sobre a influência exercida pelo tempo nos humanos.

Além disso, cada um está associado a um elemento da antigüidade clássica: ar, terra, água e fogo, respectivamente. Eles se aproximam nas idéias, de forma variável porém intercalada. Os poemas não esgotam seu questionamento e nem obtêm respostas suficientes às perguntas feitas.

"Burnt Norton" (ar) questiona de que adianta considerar o que podia ter sido e não foi. Há nele a descrição de uma casa abandonada, e Eliot brinca com a idéia que todas essas possíveis realidades estão presentes simultaneamente, mas invisíveis para nós: todas as formas de atravessar o jardim se transformam numa vasta dança que não podemos ver, e crianças que não estão ali se escondem nos arbustos. Burnt Norton é uma casa de campo situada em Cotswold Hills, na cidade de Gloucestershire, Reino Unido.

"East Coker" (terra) continua a examinar o tempo e seu significado, mas agora focando também na natureza da linguagem e da poesia. Saído da escuridão, Eliot fortalece a sua idéia de solução: "I said to my soul, be still, and wait without hope" (algo como "Eu disse à minha alma: fique quieta, e espere sem esperança"). East Coker é uma pequena vila, no sul do Reino Unido.

"The Dry Salvages" (água) trata do elemento água via imagens de rios e mares. Nesse poema, os opostos parecem se aproximar de forma impossível, como no barroco: "...the past and future/Are conquered, and reconciled" (algo como "...o passado e o futuro/são conquistados e reconciliados"). The Dry Salvages são um grupo de rochas com um farol para navios em Cape Ann, Massachusetts, como explicado no prefácio do poema.

"Little Gidding" (fogo) é o mais antagonizado dos quartetos. As próprias experiências do autor como voluntário na equipe civil antiataque aéreo dão força ao poema, e ele se imagina encontrando com Dante no meio do bombardeio alemão. O cenário mostrado no começo dos quartetos ("Houses.../Are removed, destroyed" ou "Casas.../são removidas, destruídas.") haviam se tornado uma experiência cotidiana, o que cria uma série de imagens, entre elas a do amor: a força condutora de toda a experiência. O quarteto acaba então com uma frase de Julian of Norwich: "all shall be well and/All manner of things shall be well." ou "Tudo ficará bem e/todo tipo de coisa ficará bem". Little Gidding é uma igreja localizada em Huntingdonshire, Reino Unido.

Old Possum's Book of practical Cats (1939)

É composto por quinze poemas com a temática "Gatos". Cada um dos poemas conta a história em particular ou uma característica de um determinado gato. Eliot os escrevera ao longo da década de 1920 como presentes de aniversário para seus afilhados, herdeiros do dono da editora Faber & Faber. Os poemas são, no mais íntimo, metáforas com os testamentos da sociedade. Durante muito tempo os poema ficaram esquecidos dentro dos pertences dos afilhados, até que um deles já adulto, mexendo em velhos papéis, os encontrou e notou a grande possibilidade de publicá-los. Eliot, entretanto, ficou apreensivo com as críticas, pois considerava os poemas fracos e exclusivos para crianças. Uma semana antes da publicação mudou-se para uma vila no interior da Inglaterra, tamanho era o seu medo, mas, logo depois do lançamento em Londres, recebeu um telefonema do afilhado dizendo que o livro fizera o maior sucesso. Na década de 1970, já 10 anos após a morte de Eliot, o então jovem Andrew Lloyd Webber musicou aguns dos poemas e fez uma versão reduzida do musical Cats. A viúva de Eliot, Esme Valerie Eliot, após assistir essa prévia do musical, presenteou o jovem autor musical com rascunhos de um poema inacabado pelo falecido marido. Esse poema chamava-se Grizabella: The Glamour Cat, e foi determinante para a finalização do famoso musical, dando abertura para a composição Memory, gravada por mais de 170 artistas até hoje. Os quinze poemas que compõe o livro são:

The Naming of Cats;
The Old Gumbie Cat;
Growltiger's Last Stand;
The Rum Tum Tugger;
The Song of Jellicles;
Mungojerrie and Rumpleteazer;
Old Deuteronomy;
Of the Awefull Battle of the Pekes and Pollicles;
Mister Mistoffelees;
Macavity: The Mistery Cat;
Gus: The Theatre Cat;
Bustopher Jones: The Cat About Town;
Skimbleshanks: The Railway Cat;
The Ad-dressing of Cats;
Cat Morgan Introduces Himself.

Note o senso de humor no último poema, feito exclusivamente para finalizar o livro, na última estrofe:

"So if yo 'ave business with Faber - or Faber - I'll give yu this tip, and it's worth a lot more: You'll save youself time, and you'll spare yourself labour If jist you make friends with the Cat at the door. MORGAN."

Fontes:
Wikipedia

T. S. Eliot (26 Setembro 1888 – 4 Janeiro 1965)


[Minha poesia] não seria o que é se eu tivesse nascido na Inglaterra, e não seria o que é se eu tivesse permanecido nos Estados Unidos. É uma combinação de coisas. Mas, nas suas fontes, na sua força emocional, ela vem dos Estados Unidos.

Thomas Stearns Eliot (St. Louis, 26 de setembro de 1888 — Londres, 4 de janeiro de 1965) foi um poeta modernista, dramaturgo e crítico literário britânico-norte-americano. Em 1948, ganhou o Prémio Nobel de Literatura.

Nascido nos Estados Unidos, Thomas Stearns Eliot se sentia culturalmente ligado à Europa. Membro de uma família puritana de origem britânica, naturalizou-se inglês em 1927 e morou em Londres a partir dos 22 anos de idade. Os Eliot eram ligados às tradições da Igreja Unitária e membros da elite industrial e mercantil. Filho Henry Ware Eliot e Charlotte Chauncey Stearns,o poeta, ensaísta e dramaturgo recebeu o Prêmio Nobel em 1948.

Em 1906, aos 18 anos de idade, seguiu para Boston para estudar em Harvard, onde se dedicou a estudar literatura e filosofia. Editou a revista universitária "The Harvard Advocate", na qual publicou alguns trabaIhos. Após diplomar-se em letras clássicas, em 1909, foi a Paris, onde fez cursos de língua e literatura francesas, na Universidade Sorbonne. De volta a Harvard, voltou à filosofia e às letras, com ênfase na literatura sânscrita e na filologia indiana, o que o ocupou de 1911 a 1913.

Em 1915 o poeta publica seu primeiro poema mais conhecido, The Love Song of John Alfred Prufrock, na revista Poetry, da cidade de Chicago, depois aproveitado por Pound em sua obra Catholic Anthology. Neste mesmo ano, Eliot contrai matrimônio com a dama da sociedade londrina Vivienne Haigh-Wood. Lecionou no Highgate College, pequena escola para crianças nos arredores de Londres, mas depois o deixou para se tornar funcionário do Lloyds Bank Ltd., de Londres. Ele também atuou como editor-assistente do veículo Egoist, de 1917 a 1919, além de colaborar com outros impressos literários, entre eles The Athenaeum.

Em 1917, publicou "Prufrock and Other Observations" ("Prufrock e Outras Observações"), obra ao mesmo tempo satírica e pessimista. O poema "The Love Song of J. Alfred Prufrock" ("A canção de amor de J. Alfred Prufrock"), é o mais conhecido do volume de crítica à cultura de sua época.

Em seguida, começou a satirizar o passado da Europa com a coletânea "Poems" (1919; Poemas) e "The Waste Land" (1922; "A Terra Devastada").

Em 1920, um ano após a publicação de um pequeno estudo sobre Ezra Pound, ele reuniu, em "The Sacred Wood", alguns de seus melhores textos críticos da juventude. Seu trabalho como crítico começou com o ensaio "The Metaphysical Poets" (1921), sobre a poesia de John Donne e outros metafísicos.

Um de seus poemas mais famosos, The Waste Land, lançado em 1922, guardava vestígios da ascendência de Ezra Pound sobre a obra deste poeta, principalmente em seus esboços manuscritos. Esta publicação é considerada uma autêntica fonte de ensinamentos sobre a poética, e logo se torna um clássico, consagrando o autor nos meios literários, principalmente os de língua inglesa. Neste momento de sua existência, Eliot era descrito por seus companheiros como um verdadeiro britânico, no modo de agir, de se vestir, de pensar, fugindo do padrão inglês apenas no sotaque e na nacionalidade.

Sua formação religiosa se manifestou nos livros seguintes: "Ash Wednesday" (1930; "Quarta-feira de Cinzas") e, "Four Quartets" (1935-1943; "Quatro Quartetos"). O verso livre na obra de Eliot foi instrumento de uma renovação das estruturas formais.

Publicou também "Homage to John Dryden" (1924; Homenagem a John Dryden), e colaborações na revista "The Criterion" (1922-1939).

Na década de vinte, no pós-guerra, Eliot passa a freqüentar assiduamente a cidade de Paris, ao lado de vários outros artistas famosos desta época. O poeta Charles Baudelaire influencia definitivamente a obra de Eliot. Seu retrato da existência parisiense torna-se para o poeta norte-americano uma fonte de inspiração para sua própria reprodução da vida em Londres. Quando ele se torna membro da Igreja Anglicana, sua produção literária ganha contornos nitidamente religiosos e tradicionais, marcas que se refletem na tentativa de manter o inglês arcaico e certos valores cultivados na Europa.

Eliot se tornou editor em 1923, quando assumiu a diretoria da Faber & Faber, à frente da qual se manteve até a morte. Este cargo lhe propicia a oportunidade de agir como um incentivador de estudos no campo da estética, um mecenas da moderna literatura de língua inglesa.

Muito vinculadas à sua poesia, as obras para o teatro ganharam destaque com "The Rock" (1934; "O Rochedo") e "Murder in the Cathedral" (1935; "Assassinato na Catedral").

Ele ganha, em 1948, o Prêmio Nobel de Literatura.

Dez anos após se tornar viúvo, ele se casa novamente, em 1957, desta vez com Valerie Fletcher, sua secretária na Faber & Faber. Com o passar do tempo, ele se torna mais introspectivo, isolando-se gradualmente em Kensington, bairro de Londres onde residia.

No dia 4 de janeiro de 1965, morre o poeta T S Eliot, na cidade que adotou em sua juventude, Londres.

Carreira literária

T. S Eliot residia em Londres. Depois da guerra, nos anos vinte, ele passou muito tempo com outros grandes artistas na avenida Montparnasse, em Paris, onde foi fotografado por Man Ray. A poesia francesa exerceu grande influência na obra de Eliot, em particular o simbolista Charles Baudelaire, cujas imagens da vida em Paris serviram de modelo para a imagem de Londres pintada por Eliot. Ele começou então a estudar sânscrito e religiões orientais, chegando a ser aluno do renomado armênio G. I. Gurdjieff.

A obra de Eliot, após a sua conversão ao cristianismo pela Igreja Anglicana, é frequentemente religiosa em sua natureza e tenta preservar o inglês arcaico e alguns valores europeus que ele julgava serem importantes. Publicou o poema The Waste Land em 1922; em 1927 obteve a nacionalidade britânica.

Em 1928, Eliot resumiu suas crenças muito bem no prefácio de de seu livro "Para Lancelot Andrews": "O ponto de vista geral [dos assuntos do livro] pode ser descrito como classicista na literatura, monarquista na política e anglo-católico na religião." Essa fase inclui trabalhos poéticos como Ash Wednesday, The Journey of the Magi, e Four Quartets.

Fontes:
Infoescola
Uol Educação

Tércia Montenegro (Poema para um Gato)

Foto: José Feldman

Teus olhos de cobre -
Dois riscos de pupila -
Se fixam nos meus,
Tão menores.

Miram o mundo em transições
De luz e fundura, no ócio
Dos que têm a vida ganha
Em corpo de pluma.

Sob um focinho róseo, a boca
Se desenha em linhas oblíquas,
Num bocejo de serpente.

As orelhas se torcem ao menor ruído,
Baixam-se para o ataque
E relaxam em triângulos
No tempo longo de de descanso.

as patas, com a suave textura
De borracha, e as unhas
Violentas de renhuras, escondem
A dupla face de um caráter
Tranquilo mas astuto.

O silêncio da tua presença
E teu andar impressentido,
No aspecto de escultura,
Concentram a beleza da poesia
Em felina ternura.
------------



Fonte:
- Volante (Veículo Original Litero Alternativo Nascido Totalmente Emancipado). Periódico Bimestral. ano 1 - n.2, documental - Fortaleza,CE, março/abril 2009.

SIMPOESIA - II Simpósio de Poesia Contemporânea


Experiência literária de quatro dias que reunirá vozes das mais relevantes da poesia e da crítica literária internacional, além de uma feira de editoras independentes de poesia do Brasil e Argentina promovida pela revista Grumo. Um encontro que envolve a troca de idéias, a exposição da diversidade intelectual e o intercâmbio artístico e cultural entre diversas expressões da poesia contemporânea.

PROGRAMAÇÃO:

04 DE JUNHO

19:30h - Apresentação e abertura do evento

20h - Recital com Horácio Costa, Maria Esther Maciel, Micheliny Verunsck, Alfredo Fressia, Virna Teixeira

21h - Show: Polivox, com Rodrigo Garcia Lopes Local: Casa das Rosas

05 DE JUNHO
19:30h - Debate: Editoras Independentes de Poesia Com: Gustavo López, Virna Teixeira e Vanderley Mendonça. Mediação: Paloma Vidal

21h - Recital: Rodolfo Hasler, Rodrigo de Haro, Efrain Rodrigues Santana, Luís Serguilha, Victor Sosa. Após o recital haverá o lançamento da revista Grumo.

Local: Instituto Cervantes

06 DE JUNHO

COLÓQUIO – POETAS DE LÍNGUA INGLESA

14:30h - Debate: Brazilian poetry in translation. Com Steven Buttermann, Stefan Tobler, Flávia Rocha e Rodrigo Garcia Lopes. 16h - Palestra: Language poetry Professor William Alegrezza

17h - Palestra-Editing Contemporary Poetry – Litmus Press Experience Com E.Tracy Grinnell e Julian Brodanski

18h - Recital- Poetry reading Com William Allegrezza, Tracy Grinnell, Julian Brodanski e Stefan Tobler. Stefan Tobler lerá traduções para o inglês do poeta Antônio Moura. Os demais poetas serão traduzidos para o português por Virna Teixeira.

19h - Poesia: palavra impacto. Palestra com Frederico Barbosa

20h - Recital: Sérgio Medeiros, Carlos Augusto Lima, Marco Vasques, Silvia Iglesias, Tatiana Fraga, Marcelo Tápia.

21h - Show: grupo de jazz Patavinas

Local: Casa das Rosas

07 DE JUNHO

16h - Debate: Poesia, Sadomasoquismo e Diversidade Sexual. Com: Steven Buttermann, Antônio Vicente Pietroforte e Glauco Mattoso. Mediação: Contador Borges

17h30 - Debate-Poesia e Fronteiras geográficas Com Silvia Iglesias, Carlos Augusto Lima e Marco Vasques Mediação: Edson Cruz

19h - Recital: Edson Cruz, Contador Borges, Andréa Catrópa, Luis Roberto Guedes, Donny Correia, Antônio Vicente Pietroforte, Greta Benitez.

Local: Casa das Rosas

Convidados Internacionais: Alfredo Fressia (Uruguai) Efraín Rodríguez Santana (Cuba) Julian Brodanski (EUA) Luís Serguilha (Portugal) Gustavo López (Argentina) Rodolfo Hasler (Espanha) Silvia Iglesias (Argentina) Stefan Tobler (Inglaterra) Steven Butterman (EUA) Tracy Grinnell (EUA) Victor Sosa (México) William Alegrezza (EUA)

Convidados brasileiros: Andréa Catrópa Antônio Vicente Pietroforte Carlos Augusto Lima Contador Borges Donny Correia Edson Cruz Flávia Rocha Frederico Barbosa Glauco Mattoso Greta Benitez Horácio Costa Luís Roberto Guedes Marcelo Tápia Marco Vasques Maria Esther Maciel Micheliny Verunschk Paloma Vidal Sérgio Medeiros Rodrigo Garcia Lopes Rodrigo de Haro Tatiana Fraga Virna Teixeira

SITE DO EVENTO: www.simpoesia.wordpress.com

Casa das Rosas - Espaço Haroldo de Campos de Poesia e Literatura
Av. Paulista, 37 - Bela Vista
F: (11) 3285-6986 contato.cr@poiesis.org.br & www.casadasrosas-sp.org.br
Estacionamento conveniado Patropi: Al. Santos, 74

Instituto Cervantes
Av. Paulista, 2439 / 7º Bela Vista - São Paulo
01311-300 - SP Tel.: 55 11 3897 96 00 Fax.: 55 11 3064 22 03 informasao@cervantes.es

Fontes:
Luiz Alberto Machado. Varejo Sortido.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Trova X

1º Concurso de Trovas do Salim (Resultado Final)

Realização: UBT de Tremembé-SP

Sábado, dia 23 de maio, em Taubaté, no Restaurante Salim, no encerramento do I Concurso de Trovas e Poesias do Salim. Organização da UBT Tremembé, sob o comando de Luiz Antonio Cardoso, com presenças importantes dos membros da UBT Taubaté. O próprio Bispo Dom Antonio Afonso de Miranda, premiado, lá compareceu para declamar seu soneto. Houve música ao vivo. Muitas declamações.
------------------
Nível: Municipal
Tema: Imigrante
(Todos os premiados deste nível são da UBT de Tremembé-SP)

Vencedoras

1º Lugar
Salve gentil imigrante!
que em nossa terra chegou,
você foi elo importante
do progresso que ficou.
Alda Lopes

2º Lugar
O progresso no País
foi impelido bastante.
Ninguém nega que a raiz
foi a garra do imigrante.
Loris Turrini

3º Lugar
Está triste em terra estranha...
saudades no coração!
Este é o preço da façanha
na procura da emoção.
Lamarque Monteiro

4º Lugar
Vida e alma aventureira
vai, nosso imigrante amado,
buscar em terra estrangeira
a conquista do Eldorado.
Lamarque Monteiro

5º Lugar
Vindo de terra distante,
aqui se estabeleceu.
Conheceu povo vibrante,
Mas o seu, nunca esqueceu!
Cláudio De Morais

Menções Honrosas

Nosso Brasil fez sucesso
ao trazer nosso imigrante
assim se deu o progresso
desta nação tão brilhante.
Alda Lopes

Todo imigrante cultiva,
levado pela esperança,
voltar à terra nativa,
que pisou quando criança,
Cláudio De Morais

Longe da terra distante,
querido berço natal,
suspira o pobre imigrante
saudoso de seu pessoal.
Martinho Monteiro

Lembrando a terra distante,
sonhando mesmo acordado,
o coração do imigrante
bate até descompassado.
Martinho Monteiro

Menções Especiais

Alimento tem de sobra...
o fazendeiro garante.
Quem é o autor da grande obra?
Nosso querido imigrante.
Benedito Dimas Ferreira

Culinária no Brasil,
é o que há melhor no mundo.
Nas receitas, mais de mil,
o imigrante foi fecundo.
Loris Turrini

Meus quereres, imigrantes,
em teu coração fugaz,
hoje são vis retirantes
chorando um sonho... que jaz !!
Luiz Antonio Cardoso

Alto-mar... e o continente
na imensidão a sumir,
é imigrante em minha mente,
que teima em nunca partir.
Luiz Antonio Cardoso

Nível: Regional
Tema: Monteiro Lobato


Vencedoras

Lobato: sacis... pigmeus...
sua memória persiste!
- Quantas crianças, meu Deus,
havia num homem triste!
José Valdez De Castro Moura
(UBT de Pindamonhangaba-SP)

Lobato, enquanto costuras
contos com habilidade,
num sítio de travessuras,
comigo brinca a saudade...
Élbea Priscila De Sousa E Silva
(UBT de Caçapava-SP)

Bela leitura em família,
que recordo com carinho:
as travessuras de Emília...
Reinações de Narizinho!
Keisy Santos
(UBT de Tremembé-SP)


Por ser grande literato
versando o tema infantil,
ficou, Monteiro Lobato,
famoso em todo o Brasil.
Argemira F. Marcondes
(UBT de Taubaté-SP)

Menções Honrosas

Qual um mago foi Lobato,
que em suas obras previu:
Presidente negro, é fato
o petróleo, aqui surgiu!
Angélica Villela Santos
(UBT de Taubaté-SP)

Hoje, relendo Lobato,
chego a sentir a fragrância
de sonho e um pouco resgato
da minha perdida infância...
Élbea Priscila De Sousa E Silva
(UBT de Caçapava-SP)

Foi Lobato, o pioneiro,
e está mais do que provado,
que o petróleo brasileiro,
foi seu sonho e seu legado!
Enivaldo Borges Da Silva
(UBT de Pindamonhangaba-SP)

Emília, Cuca, Saci,
o sítio, o campo, e o regato
dos meus sonhos de guri...
- Isso é Monteiro Lobato!
João Paulo Ouverney
(UBT de Pindamonhangaba-SP)

Foi herói, foi escritor,
- dizer, com certeza, eu posso -
de quem, para um ditador,
gritou: - o petróleo é nosso!
João Paulo Ouverney
(UBT de Pindamonhangaba-SP)

Menções Especiais

Nosso Monteiro Lobato
foi cantado em verso e prosa,
sua obra foi de fato
bem profunda e preciosa.
Alfredo Barbieri
(UBT de Taubaté-SP)

Lobato encantou crianças,
no mundo do faz de conta,
ante a infância de esperanças,
em que o seu sonho desponta!
Enivaldo Borges Da Silva
(UBT de Pindamonhangaba-SP)

Um mundo de fantasia
e que encantou gerações,
Lobato trouxe alegria,
Narizinho e as reinações.
José Guarany Rodrigues
(UBT de Pindamonhangaba-SP)

Monteiro Lobato faz
muita criança feliz,
no Sítio que exala paz
para o mestre ou aprendiz.
Judite De Oliveira
(UBT de Taubaté-SP)

... E foi com tamanha audácia,
que provei sonho infantil:
bolos da Tia Nastácia...
os melhores do Brasil !
Keisy Santos
(UBT de Tremembé-SP)

LOBATO, ponta de lança,
desta nossa Pátria imensa,
é também toda esperança,
do Continente que pensa.
Lygia Fumagalli Ambrogi
(UBT de Taubaté-SP)

Com histórias envolventes
Lobato fez muito mais:
ao lançá-las, quais sementes,
criou jardins perenais.
Maurício Cavalheiro
(UBT de Pindamonhangaba-SP)

Comissões Julgadoras

Trovas - Municipal – “Imigrante”
- Ademar Macedo – UBT Natal-RN
- Dorothy Jansson Moretti – UBT Sorocaba-SP
- Gislaine Canales – UBT Balneário Camboriú-SC
- José Ouverney – UBT Pindamonhangaba-SP

Trovas - Regional – “Monteiro Lobato”
- Luiz Antonio Cardoso – UBT Tremembé-SP
- Cláudio de Morais – UBT Tremembé-SP
- Marina Bruna – UBT São Paulo-SP
- Vanda Queiroz – UBT Curitiba-PR
- Delcy Canales – UBT Porto Alegre-RS
- Renato Alves – UBT Rio de Janeiro-RJ
--------------
Fontes:
– Luiz Antonio Cardoso. UBT de Tremembé-SP

IV Encontro das Academias de Letras do Paraná e Premiação do IV Concurso Literário "Cidade de Maringá"


PROGRAMAÇÃO:

DIA 19 de junho de 2009 (sexta-feira)

- Manhã: recepção/chegada ao Bristol Metrópole Hotel.

- 12h00/12h30: almoço no restaurante do hotel, Piso “L”.

- 14h00 às 17h00, no salão Rio de Janeiro, Piso “L”:
IV ENCONTRO DAS ACADEMIAS DE LETRAS DO PARANÁ.

- 17h15: Lanche

- 19h30: Noite Cultural, no Auditório Hélio Moreira - Paço Municipal.
Programação:
- Lançamento da Coletânea 2009 da ALM.
- Apresentação da peça premiada.
- Show de lançamento do 2º CD Trovadores do Campo, da dupla Pedro Ornellas e Campos Sales, de São Paulo – SP.

- 22h00: Jantar no restaurante do hotel, Piso “L”, para os escritores premiados e participantes do Encontro das Academias.

Dia 20 de junho de 2009 (sábado)

- 07h00/08h00: Café da Manhã no restaurante do hotel, Piso “L”.

- 09h00: Oficina de Haicai, com a escritora Lena de Jesus Ponte (Rio de Janeiro – RJ),no salão Rio de Janeiro, Piso “L”.

- 12h00: almoço no restaurante do hotel, Piso “L”.

- Tarde Cultural.

14h30, no auditório da Biblioteca Municipal “Bento Munhoz da Rocha Netto”: Apresentação das crônicas premiadas.

A música erudita e seus poemas, com o pianista Júlio Enrique Gómez e a poetisa Roza de Oliveira.

16h00, no Teatro Reviver:
Espetáculo “O menino que ganhou uma boneca”, com a Cia. Teatral Tipos & Caras. Texto e direção de Majô Baptistoni. Duração: 40 minutos.

- Noite:

19h30: FESTA DE PREMIAÇÃO, nos salões Paris e Londres, “Cobertura”.
* Ao término da cerimônia de premiação, será servido o jantar, no local.

Dia 21 de junho de 2009 (domingo)

- 07h00/08h00: Café da Manhã no restaurante do hotel, Piso “L”.

- Passeio, de “jardineira”, pelos pontos turísticos de Maringá,
com saída em frente à Catedral.
09h00 às 10h30: 1ª turma
10h30 às 12h00: 2ª turma

- 12h30: almoço de despedida, no restaurante do hotel.

Fonte:
Academia de Letras de Maringá

Ailton Maciel (O Presente da Professora)



Durante muitos anos Dona Gracinha viveu no interior. Professora de muitas crianças pobres e algumas abastadas. Passados os anos, continuava a mesma, bondosa e sorridente, embora os cabelos brancos denunciassem os seus quase 60 anos. O seu epiderma, já metamorfoseado pelo tempo e pelas vicissitudes da vida, era prova de muitos anos de trabalho árduo e penoso. Porém não lhe faltavam sorrisos e gestos de amor para cada criança.

Já aposentada, ainda dava aulas, quase que sem remuneração, a filhos de operários. Sempre encontrava uma solução para todos os problemas. “Dona Gracinha, eu não tenho lápis, porque papai não...” Ela não deixava o menino prosseguir. Conhecia os problemas de cada um deles. A todos tratava sem distinção. A posição social, a cor, a conformação física, o traje, a dentadura, tudo o mais para ela passava a segundo plano. Por isso, os pais e as crianças adoravam Dona Gracinha. Simples e humanitária, gostava das crianças como se fossem seus filhos, que não os tinha. Encontrara, é certo, quando jovem, vários pretendentes, porém a todos deu uma resposta plausível e bem intencionada: muito jovem, tinha obrigações a cumprir. O tempo foi correndo, e ela nunca se dispusera para o matrimônio. Não que o renegasse. Não, ao contrario: achava o ato mais belo da vida. Mas havia a escola, as crianças pobres... E, casando, o marido poderia interpor-se entre ela e as crianças. Não, melhor não arriscar. E nunca se arrependeu do celibato. Embora solteira, tinha muitos filhos – seus alunos. Quando lecionava no interior deixara muitos rapazes e muitas moças, senhores comerciantes, senhoras casadas, que foram seus discípulos. Hoje, quando raras vezes se dispunha a fazer um breve passeio pelos lugares onde lecionara, muitas das vezes via homens chorarem de alegria e de tristeza, agradecendo-lhe os ensinamentos recebidos quando crianças. E a todos ela visitava. Era seu dever, achava. Porém chorava quando via pobres crianças raquíticas e barrigudas esquivarem-se do seu afeto. Mães que há trinta anos foram suas alunas hoje parecerem espectros humanos – mais velhas do que ela. Mulheres barrigudas, empalemadas e sifilíticas. Homens morrendo de inanição, trabalhando da madrugada ao pôr-do-sol, vergados ao peso do sofrimento, encabulados, tristes e semimortos. Crianças – suas amadas crianças – raquíticas, enfermas, bochechudas, morrendo, morrendo... morrendo, sim, lentamente, de fome e de doenças. Dona Gracinha chorava. Tinha ímpetos de pegar uma autoridade e levá-la a ver aquele inferno. Continha-se, entretanto, a velha professora. Era do amor, da calma e da paz; nunca do ódio e da violência. Ajudava-os, então, no que podia: dinheiro, amor, carinho ou conselho. Dona Gracinha: boa e piedosa. E regressava à capital, triste e pensativa.

Três de fevereiro: dia inesquecível para todos os alunos de Dona Gracinha – o dia de seu aniversário. Não se sabe quem divulgou a notícia nem tampouco como tomou conhecimento daquela data. O fato é que para ela aquele dia parecia mais triste do que os outros. Não gostava de manifestações públicas. Não gostava, repetia, era velha, esquecessem tal coisa. Sinceramente, não gostava. Os meninos sorriam e no dia três lá estavam a cantar "parabéns pra você” e a trazer-lhe humildes presentes: uma galinha, um pato, um sabonete, e outras coisinhas.

Chegando tal dia, os alunos já haviam preparado a humilde cerimônia de aniversário. Todos sentados, quando entrou D. Gracinha. Ergueram-se e começaram a entoar a canção propícia e invariável do “parabéns pra você”. Após isso, a professora proferiu pequeno discurso de agradecimento. Passaram, então, a colocar os presentes, um a um, sobre a mesinha: um bolo, um sabonete, uma pasta dentifrícia, uma escova.... Um dos garotos, o último a dirigir-se à mesinha, saiu a passo lento. Levava às mãos um embrulhinho fino e comprido. Como o papel fosse pouco, todos puderam ver facilmente o conteúdo: um pão. Todos, sem exceção, riram largamente. Dona Gracinha pediu silêncio: censurou a atitude dos meninos. E, sem conter os sentimentos, pôs-se a chorar. Os garotos se fizeram sérios e calados. “Este é o mais valoroso presente que recebi durante toda a minha vida, porque dado de coração. Crianças, nunca deveis zombar do próximo. Vejam: por causa de vocês ele esta chorando”. E, de novo, chorou ela. Os alunos baixaram a cabeça. Dona Gracinha foi até à carteira de Roberto e disse: “Meu filho, não chore. Eles não sabiam que iam ofender a mim e a você”. E deu um beijo no rosto do menino.

Setembro de 1968.

Fontes:
- Jornal de Poesia
- Imagem = http://aprendizagememacao.blogspot.com/

Ailton Maciel (Cinzas)



Que é feito do viver daqueles tempos?
Onde estão da casinha os habitantes?
A primavera, que arrebata as asas...
Levou-lhes os passarinhos e os amantes!...
Castro Alves

Aparece, ó visão de minha vida!
Vem decantar comigo o amor luzente...
Não vês, menina, a chaga dolorida
Que fervilha em meu peito penitente?...

O vem, ó vem, eu, louco, desespero!
Vem sentir desta vida os seus sabores...
Vem, açucena, eu todo dia espero
Os momentos ditosos dos amores!

Não te lembras, então, dos belos dias,
Que passamos felizes, lado a lado,
Só sentindo prazeres e alegrias
Sob o tempo, feliz, enluarado?!

Ainda recordo a nossa feliz vida:
Eu beijava a sorrir os teus cabelos.
Hoje o meu ser é chaga dolorida,
Hoje os sonhos são frios pesadelos!

Quão ditosos nos foram os momentos
Quando em tempo atrás juntos passamos...
Hoje restam visões e mil tormentos
Dos tempos auros em que nos amamos!

Hoje só restam cinzas... devaneios...
Recordações fatais pras nossas vidas:
Tu tens o corpo de carícias cheio,
E eu de chagas e fatais feridas!

Fortaleza, 7/10/64.
============================================
Ailton Maciel (1943 – 1974)
Ailton Alves Maciel nasceu em Baturité em 7 de março de 1943. Em vida nada publicou, embora tenha escrito inúmeros poemas, romances e contos. Sua obra mais importante desapareceu. Talvez no incêndio doméstico que quase o matou, em Brasília, onde foi viver (e morrer) no início dos anos 1970. Sua morte clínica se deu no dia 22 de outubro de 1974. Apenas quatro contos se salvaram: "Santa Caçada", "O Touro", "O Careca" e "O Presente da Professora", publicado na revista Literatura n.º 24, de 2003. Outros onze fragmentos encontrados podem ser de contos e romances.

Fontes:
http://literaturasemfronteiras.blogspot.com/
– Jornal de Poesia
– Imagem = http://leninhaluz.blogspot.com

Curitiba em Destaque


Dia 28/05 – 15h00min
Realização: Academia Feminina de Letras do Paraná

“Valores Culturais Paranaenses” – Vida e Obra de Ceres de Ferrante.
Local: Auditório Leonor Castellano
Rua Visconde de Rio Branco, n° 1717 - Centro - Curitiba/Paraná

Dia 28/05 – 18h00min
Realização: Academia Paranaense da Poesia
Oficina permanente de poesia –

“A Poesia de Emiliano Perneta”
Palestrante: Mamed Assim Zauith
Local: Biblioteca Pública do Paraná – 3 andar

Dia 28/05 – 19h00min
Realização: Academia Paranaense da Poesia.
Oficina permanente de poesia – “Tribuna Livre”
Local: Biblioteca Pública do Paraná – 3 andar

Dia 30/05 - 12h30min (último sábado)
Realização: Academia Paranaense da Poesia
Almoçando com Música e Poesia –
Local: no Ponto Gira Grill churrascaria. – Buffet livre – R$ 11,50 por pessoa –
Endereço: Rua Alfredo Bufren 219 – Praça Santos Andrade em frente à UFPR –

Obs.: O local deste evento além de não possuir escadas situa-se entre dois estacionamentos.

Dia 30/05 – 15h00min
Lançamento do livro Altdeutschen de Zélia Sell

Local: Clube Concórdia
Rua Carlos Cavalcanti, 815 – Centro.
Curitiba- Paraná.

Fonte:
Andréa Motta. in
http://simultaneidades.blogspot.com

Estação Cultura em Canoas/RS (Programação)

Clique sobre a imagem para ampliarFonte:
Neida Rocha.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Trova IX

Montagem sobre quadro de Aristeu Nogueira Soares

Ocimar Barbosa (A Lenda dos Namorados do Bosque)

Pindamonhangaba tem uma lenda das mais românticas que conta sobre um amor impossível. Trata-se da “Lenda dos Namorados do Bosque”. O fato, segundo historiadores já falecidos, caso do antigo arquivista da prefeitura municipal, “seo” Lacerda, teria acontecido na década de 20 do século que passou.

A morte de dois jovens abalou a sociedade e a comunidade de forma geral, mas o que houve nos bastidores é o que acabou criando a lenda, como uma versão valeparaibana para “Romeu e Julieta”.

A alta sociedade de Pindamonhangaba, remanescente dos áureos tempos do café, ainda vivia das aparências e de uma falsa opulência financeira. Sarais e encontros festivos nas casas mais abastadas falavam da vinda do Príncipe Regente antes do episódio da Independência, dos soldados da Guarda de Honra, da presença de D. Pedro II e das tradições familiares.

Preconceito, o inimigo do amor
Nas igrejas e outros templos religiosos, falava mais alto o renome e a posição social. Um lado da igreja era destinado aos descendentes da nobiliarquia e outro lado para os cidadãos comuns. Famílias tradicionais que ostentavam a distinção de títulos não permitiam que seus membros mantivessem contatos com gente de “menor expressão”.

Assim, em meio a esse cenário pincelado pelo preconceito sobranceiro - entre a pessoa de descendência fidalga e outra do da “plebe”-, surgiria um grande amor .

A jovem era linda, de família de berço nobre do século XIX e cercada de cuidados. Representante ideal da sociedade pindense, havia estudado nos melhores colégios do Rio de Janeiro; ele, um moço da classe média, porém, altivo e inteligente, havia cursado os principais colégios de Pindamonhangaba. Quando se conheceram, ele estudava medicina em São Paulo.

O amor impossível
Conheceram-se durante uma noite de domingo, na Praça Monsenhor Marcondes, naquele período onde o romantismo ainda fervilhava nos corações (não como hoje, onde baladas, drogas, bebidas e palavrões fazem parte do cotidiano da maioria dos casais de namorados). Gestos cavalheirescos ainda provocavam suspiros nas jovens moçoilas.

Foi amor à primeira vista. Apresentados por amigos, brilhou nos olhos a chama do amor verdadeiro onde ambos se sentiram almas-gêmeas, um do outro.

Sentiam-se como se já houvessem se conhecido em outras eras. Tudo era mágico, a atração totalmente recíproca. Imediatamente, estavam loucamente apaixonados.

Logo que soube dos encontros românticos, a família da moça passou a pressioná-la: “Ele não é do nosso nível. Você precisa terminar esse romance!”, diziam os pais, sem demonstrar o mínimo de respeito pelos sentimentos da moça.

Como os jovens apaixonados continuavam a se encontrar, a família proibiu a jovem de vê-lo. Pior! O amor ganhou ainda mais força. Com a proteção das amigas de ambos, o casal de namorados continuava a viver aquele amor cada vez mais impossível.

Ameaças e perseguições
A situação começava a ganhar contornos perigosos com ameaças de todos os lados. O rapaz passou a ser perseguido pelos jovens da elite. Algo terrível estava pra acontecer.

O jovem estudante de medicina já estava em seu 2º ano de estudo e, depois de dois anos, passaram a se encontrar apenas no período de férias, quando ele retornava para sua terra natal, Pindamonhangaba. Nesse período, voltavam as pressões familiares, ameaças e perseguições.

Ficava mais difícil os encontros secretos, enquanto isso, a paixão aumentava, era cada vez mais ardente. Precisavam fazer alguma coisa, pois já não poderiam viver, um sem o outro.

Eternizando o amor
Os jovens temiam, um pela vida do outro. Isso era a prova maior de um sentimento verdadeiro. Depois de conversarem muito, apesar de constantemente vigiados, resolveram colocar um fim àquela situação insuportável.

Em uma certa noite que ficou na história, os jovens desceram a ladeira do Bosque da Princesa. O jovem estudante de medicina trazia um pequeno frasco contendo veneno.

Sob a luz da lua e embaixo de um ipê todo florido, amaram-se, sendo vigiados desta vez, apenas pelas águas cúmplices e silenciosas que deslizavam pela curva do Rio Paraíba.

Depois, brindaram àquele grande amor e beberam da taça que continham a substância venenosa trazida pelo rapaz. Foi um adeus melancólico a duas jovens vidas, mas um “sim” ao encontro de duas almas afins.

No dia seguinte, um grupo de pescadores que passava pelo local encontrou os dois corpos abraçadinhos, cobertos pelas pétalas do ipê amarelo. O velho ipê cobriu com seu manto dourado o jovem casal e serviu assim, de testemunha para um enlace doloroso, porém eterno.

Dizem que o ipê, a partir daquele dia, foi secando, ficando triste...até que morreu de vez e foi retirado. Durante muitas décadas, era visto um pedaço de terra sem vida e sem qualquer vegetação, do lado esquerdo de quem olha para o rio.

Nos anos, 90, com a reforma do gramado do Bosque da princesa, o local ficou sem a referência da velha história: A Lenda dos Namorados do Bosque.

Fonte:
http://www.pindavale.com.br/historiasecausos/textos.asp?artigo=52

Ribeiro Couto (O bloco das mimosas borboletas)



Foi na véspera do carnaval que encontrei o senhor Brito. Ele esperava o bonde junto ao Hotel Avenida.

- Boa tarde, senhor Brito!

- Boa tarde!

E, como eu parasse para acender um charuto, o senhor Brito, aproximando-se, pediu com humildade:

- O seu fogo, faz favor?

Estava ali há dois minutos, com o cigarro apagado, à espera do bonde e de um conhecido para emprestar-lhe o fogo. O senhor Brito ouviu dizer, ou leu num almanaque, que o banqueiro Laffite obteve o seu primeiro emprego porque o futuro patrão o viu curvar-se para apanhar um simples alfinete. Então faz economias de caixas de fósforos, de cafés, de engraxate. Pode ser que algum capitalista se aperceba disto e o convide para um alto negócio.

Aliás, há uma outra razão para o senhor Brito agir desse modo: possui duas interessantes filhas, as duas com vinte anos e pouco, as duas caríssimas, as duas impondo uma importância social que está em absoluto desacordo com o modesto cargo que o senhor Jocelino de Brito e Sousa ocupa, silenciosamente, no Ministério da Fazenda.

Eram cinco e meia da tarde. Como a multidão nos acotovelasse, convidei o senhor Brito a tomar um aperitivo na Americana. O senhor Brito, aceso o seu cigarro, principiara a lamentar-se; e a conversa, ainda que fastidiosa, excitava a minha curiosidade.

O senhor Brito é dos homens mais notáveis da cidade. Eu é que sei. No entanto, ninguém lhe dá importância. Tem uma obesidade caída, um desânimo balofo, um desacoroçoado jeito de velho funcionário pobre que se desespera em casa com as meninas. As meninas querem vestido, precisam freqüentar a sociedade, consomem-lhe todo o ordenado. Ultimamente, deram para um furor de luxo que não tem medida. E o senhor Brito, triste, cogitativo, anda sempre assim, de fazer dó: os braços cheios de embrulhos, o paletó-saco poeirento, os cabelos grisalhos esvoaçando-lhe pelas orelhas, sob o chapéu de palha encardida.

- Senhor Brito, um vermute.

- Acho bom, doutor, acho bom.

Tem um pormenor impressionante no rosto: as sobrancelhas muito peludas, também grisalhas, como que enfarinhadas de cinza. São agressivas as suas sobrancelhas.

Na pessoa mansa do senhor Brito;esse ponto enérgico é único, isolado. Tirando as sobrancelhas, todo ele é doçura.

A pêndula do bar martelou seis horas. O senhor Brito, que ia engolir o vermute, teve uma indecisão, o cálice suspenso à boca.

Li nos seus olhos inquietos esta frase: "As meninas estão à minha espera" .

Exatamente. O senhor Brito bebeu o gole e disse:

- As meninas estão à minha espera.

Ah, a minha feroz alegria! O senhor Brito é assim: um homem que eu, há tempos, venho surpreendendo, desvendando. Tomando posse da sua individualidade sem resistência. Estou a ponto de "saber" todo o senhor Brito. Há ocasiões em que, encontrando-o, digo para mim mesmo: "Ele vai falar-me de um artigo tremendo que saiu hoje contra o presidente da República na Vanguarda". É delicioso: o senhor Brito depois de me apertar a mão põe-me a conversar sobre vagas coisas e, de repente, como se obedecesse ao meu comando, pergunta:

- Leu hoje a Vanguarda? Que artigo tremendo! Que horror!

*****

- Tome outro vermute, senhor Brito - sacudiu a cabeça que não. - As meninas devem estar impacientes.
- E como vão elas?

- Assim, assim. O senhor é que não quis mais aparecer? (Ele pergunta isso sem o menor interesse oculto. Sabe perfeitamente que não pretendo casar-me.)

- Muito serviço, não calcula.

- Mas aos domingos, doutor! Uma vez ou outra! Dá-nos sempre muita honra e principalmente muito prazer.

- Obrigadinho, obrigadinho. Hei de aparecer. O senhor sabe que aprecio muito as suas meninas.

- Elas são boazinhas, isso é verdade. Gostam de divertir-se, de dançar, de brincar. Não pensam na vida.

Não pensam na vida! Para os seus olhos de pai essas duas interessantes princesas de arrabalde não pensam na vida. E elas não pensam senão na vida! Tratam exclusivamente de suas preciosas pessoinhas, dos seus preciosos projetos de casamento, do seu precioso luxo que custa as lágrimas secretas do pai desconsolado.

- Faça o favor, beba outro.

Aceita. E expõe o seu caso de hoje, o caso que eu há vinte minutos estou esperando, como um caçador mau, de emboscada:

- Não avalia as dificuldades que passei de ontem para cá! Imagine que era necessário arranjar um conto de réis e eu não encontrava agiota nenhum que me quisesse emprestá-lo. Afinal, sempre convenci o Moraes, aquele da Rua da Misericórdia, que por sinal todos os meses já me rói metade do ordenado. Esta vida, meu caro doutor!

- Sei o que ela é, senhor Brito. Eu também tenho os meus apertos. O vermute o pertubou um pouco, predispondo-o para a confidência. Continuo insinuando a expansão, pelo meu ar atento, pelo meu todo solícito, pelas minhas frases curtas que deixam sempre uma ponta, para o senhor Brito emendá-la com o que tem no íntimo.

- As meninas morreriam de tristeza se eu não conseguisse nada. -Ah!

- O senhor sabe, são moças, querem divertir-se.

- É natural!

- O carnaval faz todo mundo perder a cabeça. O senhor compreende: qual é o pai que numa ocasião destas não fará um sacrifício?

- Justo!

Pedi mais dois vermutes ao garçom.

- Esses empréstimos abalam muito a bolsa de um homem, senhor Brito.

- Um horror. Nem fale.

- Mas obteve, então?

Toma um gole. Chupa os beiços, enxugando-os. E desabafando: - Ah, felizmente!

- Meus parabéns sinceros.

Sorriu, feliz. Seus olhos, debaixo das sobrancelhas crespas e peludas, cintilaram contentes. As filhas morreriam de tristeza se não tivesse arranjado! Tomou outro gole.

Tive uma sensação inefável de haver ganho a tarde.

- Senhor Brito, há de me dar licença...

- Pois não, pois não!

Paguei a despesa, levantei-me. Ele bebeu o resto do cálice e levantou-se também, sobraçando os embrulhos. Senti que ia dizer-me qualquer coisa ainda sobre as meninas, sobre o carnaval, sobre aqueles embrulhos, sobre o empréstimo...

- Elas estão ansiosas. Está vendo isto? São as fantasias que já haviam escolhido na cidade. E caixas de lança-perfume. E confete.

- E serpentinas.

- Tudo!

O senhor Brito, na sua ternura, ter-me-ia abraçado se não foram os embrulhos.

- Não sabe o que é ter duas filhas, dois anjos como eu tenho!

O bonde da Gávea parara para o assalto dos passageiros. O senhor Brito ia precipitar-se, mas uma idéia lhe fuzilou no cérebro:

- Não quer tomar parte do bloco das meninas?

Desta vez o senhor Brito me apanhara de surpresa. Não gostei. Aquilo me escapara.

- Ah, elas organizaram bloco este ano?

- Alugamos um autocaminhão. Elas se lembraram do senhor mas tinham perdido o telefone da sua pensão. E eu ia-me esquecendo, que cabeça! E o Bloco das Mimosas Borboletas. Então, vem?

O bonde partia, campainhando.

- Telefone para lá!

Falou isso correndo, querendo voltar a cabeça para mim e ao mesmo tempo preparar o pulo sobre o estribo. Pulou. Dependurado, com os embrulhos lhe atrapalhando os movimentos, era sublime o senhor Brito. E o bonde virou a esquina da Rua S. José, levando a bondade, a ventura, o êxtase daquele pai. O Moraes, da Rua da Misericórdia, estava na porta da Brahma, torcendo os bigodes.

*****

Devo tomar parte do Bloco das Mimosas Borboletas?

*****

Quarta-feira de Cinzas eu entrava tranqüilamente num café quando o senhor Brito surgiu, súbito. Quase nos abalroamos.

- Oh! senhor Brito! Vamos a um cafezinho?

Estendi-lhe o braço procurando envolvê-lo pelo ombro. Ele tentou esquivar-se, esboçando uma recusa frouxa. Insisti com veemência e ele entrou, afinal, sombrio.

Observei-lhe que o laço da gravata estava desfeito. Teve um gesto nervoso, apalpando o colarinho e o peito da camisa, como se aquilo lhe tivesse feito lembrar qualquer coisa desagradável ou dolorosa.

Tive receio de pensar o que ele iria dizer-me... Aquele desleixo na gravata era significativo. Eu sabia que era Lalá, a mais velha, quem lhe dava o nó. Todas as manhãs. Ele ia dizer... Não, o senhor Brito dessa vez não disse nada.

Então puxei conversa.

- Divertiu-se muito no carnaval?

Deu de ombros, molemente, num desânimo de vida. E, puxando um cigarro de palha do fundo do bolso do paletó, fez-me com os dedos trêmulos o gesto de pedir fósforos.

Minutos escoaram-se. Não tínhamos assunto. Era mais prático nos despedirmos. .

- Bem, senhor Brito, vou aos meus negócios.

Segurou-me pelo braço. Tive um choque. A revelação ia sair. Passaram se ainda uns momentos de silêncio. Perguntou-me, enfim:

- Por que não quis tomar parte no nosso bloco?

- Ora, senhor Brito, eu não sou carnavalesco. Acredite: não saí de casa os três dias.

- Pois lamentei, lamentei muito a sua ausência.

- Ora, por quê, senhor Brito?

- O senhor é um moço sério. Se o senhor tivesse vindo, olharia pelas minhas filhas.

Senti um susto e uma pérfida vontade de rir. Tive a impressão do ridículo e, ao mesmo tempo, de um vago drama palpitante. As sobrancelhas do senhor Brito, um instante fitas em mim, moviam-se agora, acompanhando um tique nervoso de piscar, indício de comoção.

- Muito agradecido pela confiança, senhor Brito. Porém, não sei se sou digno.

- Sei eu, sei eu.

Comecei a ficar impaciente.

- Que houve de extraordinário, senhor Brito?

- Imagine o senhor que ontem, último dia, como estivesse com os meus rins muito doloridos, não pude acompanhar as meninas ao carro. Sabe, os meus rins...

- Sei, senhor Brito.

- O bloco era grande, umas trinta pessoas. Enfim, havia o Gomes, da minha repartição. O Gomes com a senhora. Fiquei tranqüilo por esse lado e confiei-lhe as meninas. Sabe, os rapazes me pareciam distintos, mas nunca é bom confiar demais.

- Claro.

- Pois meu caro, não lhe conto nada; até esta hora as meninas ainda não voltaram.

- Oh, senhor Brito!

- O Gomes está abatido. Diz que não sabe como é que elas lhe escaparam das vistas.

No rosto tranqüilo do senhor Brito, os olhos, sempre doces, faiscaram de dor. As sobrancelhas tremeram-lhe.


- É verdade o que me diz?

- Des-gra-ça-da-men-te!

Caiu-lhe a cabeça sobre o peito, no desconsolo da calamidade. Não tendo o que dizer (e já um pouco arrependido de não haver tomado parte no bloco, mas por motivos inconfessáveis) reuni todas as minhas cóleras contra aquele Gomes:

- Porém, senhor Brito, esse sujeito, esse Gomes, é um patife!

O senhor Brito fez com a cabeça que não, que o Gomes não era um patife. E disse devagar, com tristeza:

- A mulher dele também até agora não chegou em casa. íamos pela" rua cheia de povo barulhento e feliz.

- Senhor Brito, cuidado com esse auto.

Atravessamos.

Eu tentava qualquer coisa em prol daquela dor:

- Sossegue. Elas dormiram com certeza em casa de amigas".

- Ninguém sabe delas.

- Paciência, senhor Brito, paciência. Talvez já estejam em casa, até.

Barafustamos por um telefone público. Esperamos um momento até que dona Candinha (irmã solteirona e velhusca do senhor Brito, que criara as meninas, sem mãe, desde cedo) atendeu do outro lado do fio.

- Elas já chegaram? - rompeu o senhor Brito, com a voz gritada e comovida, ansioso da resposta.

Largou o fone no gancho, sem ânimo.

- Vamos embora, doutor. Não apareceram! Não há notícias!

E fomos para o Jornal do Brasil. No balcão da gerência o senhor Brito redigiu com letra trêmula o anúncio: "Um conto de réis - Gratifica-se com um conto de réis a quem der notícias positivas sobre o paradeiro de duas moças que anteontem, vestidas à século XVIII, tomaram parte do Bloco das Mimosas Borboletas, da Gávea. Dirigir-se à Rua República de Andorra nº 7".

O empregado do jornal pegou o anúncio, leu-o, teve um sorriso discreto e fez a conta.

O senhor Brito pagou o anúncio e saímos.

Na rua teve uma idéia repentina:

- É verdade, onde vou buscar outro conto de réis?

E a sua doce pessoa crispou-se de angústia.

*****

Ao nos despedirmos, ele queixou-se de uma dor de cabeça. Parou um momento levando a mão à testa. E, súbito, amontoou-se na calçada. Eu não tivera tempo de ampará-lo. Então, com esforço, suspendi aquela massa pesada. Pessoas que passavam me ajudaram. Estava morto.

Seu cadáver foi no automóvel da Assistência Pública para casa, depois das formalidades legais.

Acompanhei-o.

Dona Candinha estava fazendo o jantar e veio ver quem batia, manca de reumatismo, limpando as mãos no avental. Espantou-se. Atrás dos óculos, os olhos se esbugalhavam, sem compreender. Até que, como que se lembrando, deu um grito:

- As meninas! - e ergueu os braços exclamativos.

- É o senhor Brito, dona Candinha - intervim com calma. – Está doente. Muito doente.

- O Jocelino! Pobre Jocelino! Que foi que aconteceu pro Jocelino? E pôs-se a limpar os olhos com o avental sujo.

*****

Entre as pessoas que velavam o cadáver, Gomes destacava-se pelo seu ar digno de homem ferido no seu amor-próprio. A mulher desaparecera definitivamente. Suspeitava-se de um estudante de Medicina, um certo Aristóteles, sergipano, um dos influentes do bloco.

Havia quem apertasse a mão de Gomes, com comoção, apresentando-lhe condolências. Dava a impressão de um parente. A fuga da mulher estabelecera entre ele e o defunto um laço confuso de família.

Gomes agradecia, com um lenço sempre encostado ao rosto.

*****

Pela madrugada entrou Cotinha, a filha mais moça.

Entrou pé ante pé. Ninguém lhe perguntou donde vinha nem por que vinha. Havia na sala apenas três ou quatro pessoas pobres da vizinhança, além de mim. Todas as demais - Gomes inclusive - se tinham retirado por volta de meia-noite. (Gomes explicou que estava abatido, precisava retirar-se, repousar.) Dona Candinha dormia lá dentro, numa cadeira de balanço da sala de jantar, venci da pelas agitações das últimas quarenta e oito horas.

Cotinha caminhou receosa para o meio da sala e atirou-se sobre o caixão. E chorou, chorou, sacudida, como que se esvaziando a repelões.

Quando acabou de chorar, veio para onde eu estava, toda encolhida como uma criminosa, de olhos inchados e vermelhos. Apertei-lhe a mão que me estendeu e ficamos em silêncio. Depois de uns minutos, como um sentimento surdo e talvez hostil nos impelisse a explicações, perguntei:

- E dona Lalá?

- Não sei. ( Deu de ombros, espichando o beiço num muxoxo contrariado.) Cada uma de nós foi para o seu lado.

Fiquei estarrecido.

- E a senhora do Gomes?

Disse que ignorava também o destino da outra. Formosíssimo! Eis o epílogo do Bloco das Mimosas Borboletas no carnaval de 1922 na muito leal cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro - pensei com os meus botões.

Depois Cotinha contou que soubera da morte do pai por acaso, porque passara de automóvel pela porta, "com um senhor"... E acrescentou tímida, rompendo o pudor:

- O senhor com quem eu estou.

Tive um baque. Era possível? Um cinismo lavado de lágrimas, assim, era possível?

- Mas dona Cotinha: que bicho mordeu as senhoras, desse modo, de repente? Ficaram doidas?

Sacudiu os ombros, pondo as duas mãos nos olhos, como uma criança e chorando de novo:

- É a vida... Que é que o senhor quer?

As outras pessoas da sala olhavam-nos, a cochichar entre si. Sem dúvida faziam mau juízo. Talvez pensassem até que era eu o comparsa de Cotinha.

Um cheiro de flores pisadas e cera errava, acre. Um sentimento pungente me dominava, abafando uma vaga, uma imprecisa sensação de sarcasmo. As oito velas ardiam silenciosas em torno do caixão do senhor Brito, que tinha um crucifixo de prata à cabeça. Eu não'conseguira ainda, até aquele instante, definir o meu estado de alma. Parecia-me, profanamente, que qualquer coisa de cômico se insinuava por tudo aquilo. Talvez, porém, fosse engano meu, ruindade minha, tendência cruel do meu temperamento. No fundo, eu estava zonzo com o que me rodeava: o senhor Brito, a filha que voltava, as pessoas pobres e imbecis da vizinhança, as oito velas, o cheiro de flores pisadas, a idéia do cavalheiro com quem Cotinha passeara de automóvel, a idéia de Lalá, a idéia de Aristóteles furtando a mulher do Gomes, a lembrança do anúncio que saíra de manhã no Jornal do Brasil, o ridículo do Bloco das Mimosas Borboletas - tudo aquilo ainda não recebera uma forma definitiva no meu espírito.

Cotinha merecia umas bofetadas?

O problema de saber se Cotinha merecia ou não umas bofetadas me invadiu, súbito. Fiquei a remoer essa inspiração, como se ela encerrasse um alto valor poético ou filosófico. Eram quatro da madrugada. Um pessoa levantou-se, em bico de pés. Outra pessoa levantou-se também.

Daí a um quarto de hora Cotinha e eu estávamos sós.

Ficamos nós dois, longo tempo, calados, olhando o senhor Brito. Por duas vezes Cotinha soluçou:

- Coitado do meu paizinho!

Por outras duas vezes suspirou:

- E Lalá que não sabe de nada! Que horror!

Claridades pálidas do dia nascente entraram vagarosas pelas janelas. Um torpor me tomou. Cotinha chorava agora encostada a mim.

O barulho do primeiro bonde, que vinha vindo longe, me ergueu na cadeira. Cotinha encostou a cabeça ao espaldar, fatigada, humilhada, amarrotada, sem valor e sem destino, como uma pobre coisa.

Para vencer o torpor, tomei a deliberação de sair, de andar. Fui olhar então, de perto, o meu defunto amigo; o meu campo de observações e de conquistas psicológicas, o meu infeliz Jocelino de Brito e Sousa. O rosto estava calmo, como a sorrir. As sobrancelhas peludas continuavam agressivas, enérgicas, na fisionomia doce, doce para todo o sempre. Aquela massa humana estava agora liberta de pensar no Moraes da Rua da Misericórdia.

- Dona Cotinha, até logo, à hora do enterro.

Ela veio até a porta da sala, que dava para uma área. Levantei a gola do paletó por causa do frio da madrugada.

Estendi a mão para Cotinha. Encarei-a com piedade e revolta: gordinha, morenota, um leve buço enegrecendo-lhe o lábio superior. E irresponsável, camaradinha, fácil, derrotada nas suas vaidades de princesa de arrabalde por aquele complicado drama de fuga e morte.

Olhando-me a fito, vi nos olhos dela recordação da vida já antiga: o lar do senhor Brito, os domingos de visita ou passeio com outras pessoas que freqüentavam a casa, os projetos ambiciosos de bons casamentos, o luxo, a comodidade quotidiana de uma situação de respeito e prazer. Agora, tudo acabado, para nunca mais!

Desabou a chorar sobre o meu ombro: que era muito infeliz, que ia sofrer muito, que não sabia como perdera a cabeça, que agora estava perdida, que queria morrer também...

Consolei-a como pude, segurando-a pelos pulsos. Dei-lhe o conselho de mandar procurar Lalá (ela devia suspeitar, pelo menos suspeitar onde estivesse a irmã) e despedi-me rápido.

A rua! A rua deserta, vazia, livre, para os meus passos e para o meu rumo! Corri por ali afora, corri para alcançar o bonde e para desentorpecer. E, enquanto corria, levava a sensação de fugir a uma coisa fascinante e ameaçadora, de que eu me libertava enfim... uma coisa suave e horrenda que não poderia mais acontecer na madrugada pura do arrabalde.

Fontes:
} SALES, Herberto (org.). Antologia escolar de contos Brasileiros. 2.ed. SP: Ediouro, 2005.
} Imagem = http://paginas-com-sentimentos.blogspot.com