segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Poemas Vencedores do 4º. Concurso Literário Cidade de Maringá - 2008



Poemas Livres

Antônio Rosalvo R. Accioly (Nova Friburgo – RJ)
POR CIMA DOS OMBROS DA TARDE

Pelos ombros da tarde
o sol espia.
Seu olho de luz penetra no silêncio do paiol.
Entre o murmúrio do córrego,
e o murmúrio do beija-flor,
ouve-se o troar-troando do velho cocão
das rodas do carro de boi.
Pai e filho debulham o corpo do milho.
O avô varre o terreiro,
da sua boca voam duas borboletas amarelas,
e ele diz: “Minhas unhas tem o pretume do chão da terra.”

Das encostas das vertentes
o vento do sul sopra,
e o seu sopro invade as asas das andorinhas.

“O vento sul é frio.” Diz a avó,
ajeitando um pau de candeia na boca do fogão.
A água do café ferve,
e ela oferece um gole ao avô – que bebe –
espiando pelos seus olhos velhos
o contorno branco das nuvens que povoam o céu.

No coração da macega,
a jaracuçu brejeira desdobra seu corpo de cobra,
e escorre silenciosa pela moita do napiê.

“Tiê-tiê!” Grita o tiê.
“Qui é! Qui é!”
Responde o gavião pinhé.

Pelos ombros da tarde,
a luz sangra seu último sol,
e o bacurau abre seus olhos de estrelas.
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Danieli Aparecida dos Santos Benatti (Maringá/PR)
LAVRA (DOR)

Das mãos calejadas
Do suor do seu rosto
O alimento dos meninos

Dos olhos brilhantes
Das costas arqueadas
O peso do mundo

Na face aflita
Na boca, nos dentes
Os sonhos caídos

Nos ombros pesados,
No sorriso apertado
A árdua vida

Da terra se fez homem
Da pedra se fez firme
Dos caminhos se fez justo

Com suas unhas
Percorre as entranhas da terra

Com seus braços
Devasta os caminhos do mundo

Com seus olhos
Alarga o sol no horizonte

Com seu corpo
Recebe a benção da chuva

O sol renasce em seus olhos
A água brota de sua fronte
A semente nasce em seu peito.
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Emerson Mário Destefani (Maringá/PR)
ÊXODO

Como levar aquilo que não existe mais?

Os verdejantes cafezais abotoados de rosetas brancas
As perobas fantasmas
As onças extintas
O alarido dos últimos pássaros que habitavam as brenhas
Como levar a textura rubra da argila?

No caminhão colocou duas velhas camas,
uma mala de sacos, suas ferramentas,
uma prateleira de tábuas,
cadeiras alquebradas e um fogão carvoento
Diluídas em meio aos utensílios
colocou suas exíguas esperanças,
sua família, o cão e a mula,
sua raiva, seu desencanto

Antes de partir
Sufocou um soluço
Pela dureza da constituição de homem rude
Forjado na terra
Filho do chão, grão de solo

Como levar o que não existe mais?
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Maurício Pindamonhangaba Cavalheiro (Pindamonhangaba/SP)
CASA DE ROÇA


Bate pilão
da reminiscência...

Ontem
na casa de pau-a-pique
pelas rendas das paredes
de argila
o sol mandava os seus raios
dizimarem pesadelos.

A brisa
vinha compor melodias
e arrefecer o calor.

Os orifícios
da casa de pau-a-pique
tinham remendos de estrelas
que a noite cerzia
enquanto mamãe cantava
canções de ninar.

Hoje
(prosperidade?)
debruço-me na janela
do arranha-céu
espiando a noturnidade
poluída...
Não consigo dormir.

Onde está o meu lençol de estrelas?
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Vilmar Ferreira Rangel (Campos dos Goytacazes/RJ)
SERTÃO

A tarde se espreguiça nas varandas,
dissolve sombras no alpendre,
prenunciando o crepúsculo
no tênue recorte dos montes.
Percepções baldias anunciam
que a noite já espreita
e se emoldura na canção dos grilos.
O lume dos vaga-lumes
ponteia por entre brumas.
Presença anfíbia,
batráquios em vigília
embalam bucólicas lembranças.

Daqui avisto
o luxuoso arranjo dos laranjais,
a comportada calha dos eitos,
e, sinuosa, a linha das estrias
onde os pés fazem trilha.
Daqui ouço o galope
de lépidos corcéis,
asas frementes alvoroçando o espaço,
e sons que dançam alvíssaras
no caprichoso desacerto do riacho.

Aqui adormeço,
saciado pelo cromatismo
que inunda o poente,
até que a lua se apague
e se renda à luz nascente
para a colheita da aurora.
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Fonte:
Academia de Letras de Maringá

Paulo Monteiro (A Trova no Espiríto Santo – Parte VII)

Pintura de Lucy Aguirre
CARLOS JOSÉ CARDOSO

Fluminense, Carlos José Cardoso é bancário e reside há pouco tempo em terras capixabas. Cursou Contabilidade e Filosofia, que não chegou a concluir. Nasceu em 2 de abril de 1953.

Coração, amante louco,
E que carrega em seu cerne,
De toda verdade um pouco
Que Deus, amando, concerne.

Traze-me, vento da noite,
Toda a paz que a alma precisa.
Afasta de mim o açoite
Dando-me amor por divisa.

Nem tudo na vida tende
Àquilo que nós queremos;
A vida de Deus depende,
A sorte, nós a fazemos.

Vento que passa em meu rosto
Lembra teu beijo, querida,
Traz ao meu corpo o desgosto,
Dando-me em ti nova vida.

CLÉRIO JOSÉ BORGES

Clério José Borges de Sant`Ana é capixaba de Vila Velha, onde nasceu em 15 do setembro de 1950. É funcionário público estadual e professor. Está concluindo cursos de Direito e Pedagogia. Poeta e jornalista. É a figura máxima do trovismo capixaba, nos dias de hoje, por seu dinamismo. Organizou algumas coletâneas com outros trovadores.

Que mimo, estás a meu lado
Tão próxima, tão fagueira,
Enquanto eu embaraçado
Fico mudo a noite inteira.

São luzes de certo os sonhos
cheios de graça infinita
a iluminar-nos risonhos
na escuridão da desdita.

O belo luar prateado
e as estrelas cintilantes
formam conjunto encantado
na FOLIA dos amantes.

ELMO ELTON

Elmo Elton dos Santos Zamprogno é natural de Vitória, cidade em que vejo à luz em 15 de fevereiro de 1925. Poeta e ensaísta, é autor de diversas obras. Durante vários anos residiu no Rio do Janeiro. Recentemente retornou ao Espírito Santo e foi eleito Rei dos Trovadores Capixabas.

Conheço bem teu valor,
trilhamos igual caminho:
- Sei que te chamam de flor,
mas, nessa flor, quanto espinho!

Minha filha, não te iludas
com os beijos que te vão dar,
que os descendentes de Judas
estão em todo lugar.

Este pranto, sentimento,
deixa eu chorá-lo, tristonho,
que ele alivia, óleo bento,
a cicatriz do meu Sonho.

Anda a caçar pirilampos,
e, se consegue prendê-los,
desses insetos faz grampos
para enfeitar os cabelos.

Bate este sino, às novenas,
chamando o povo à oração:
- meu coração bate, apenas,
chamando por Conceição!

ELVIRO DE FREITAS

O médico Elviro Athayde de Freitas, nascido em Vitória no dia 21 de março de 1914, é exímio sonetista e autor de um grande número de trovas, verdadeiramente antológicas. Entre outras entidades culturais, pertence à Academia Cachoeirense de Letras.

Pede-nos, Nosso Senhor,
Que amemos os inimigos.
E eu pergunto se, a rigor,
Amamos nossos amigos...

A quem, dos moços, deplora
O tino, um lembrete eu dou:
Todos nós somos, agora,
O que um menino traçou.

Dentro da frase singela,
Uma profunda lição:
É melhor acender vela
Que xingar a escuridão.

Se nos víssemos assim
Como os outros vêem a gente
Este mundo tão ruim
Seria tão diferente...

Falam com tanta insistência
Em amor, em amizade
E, com a mesma freqüência,
Haverá sinceridade?

EVANDRO MOREIRA

Na histórica cidade de Cachoeiro de Itapemirim, o poeta Evandro Moreira nasceu. Advogado, jornalista e cronista, pertence a muitas entidades culturais do país e do exterior. É funcionário do Banco do Brasil. Sua data do nascimento: 27 de novembro de 1939. Publicou diversos livros, em prosa e verso. É um dos maiores divulgadores da literatura em terras capixabas.

Se beijo desse sapinho,
como tanto se apregoa,
sua boca, meu anjinho,
era beira de lagoa.

Quis brincar o meu destino
com meus sonhos de ilusão:
- Deu-me um rosto do menino
e de um velho o coração.

Pretendo ser nesta lida
humilde como a candeia
que, esquecendo a própria vida,
ilumina a vida alheia.

Quando sofro ingratidão,
em lamentos não demoro,
porque tenho um coração
que descanta o mal que choro.

Para quem sonha é mais leve
suportar a realidade.
O encanto de um sonho breve
disfarça a rude verdade.

Perdi-me na curva infinda
deste mundo de meu Deus,
por partir sem ter ainda
toda a luz dos olhos teus.

A saudade mais dorida
somente a pode explicar
quem espera, toda vida,
a quem não pode voltar.

As margens do rio são
sinuosas como o veio...
por isso é que minha mão
tem a forma de teu selo.

Não maldigas todo o mundo
por uma pena sofrida.
- O sofrimento profundo nos
faz entender a vida.

Por ironia ou maldade,
por outras coisas sutis,
quem busca felicidade,
é quase sempre infeliz.

Fontes:
http://www.usinadeletras.com.br

Machado de Assis (O Califa de Platina)



O califa Schacabac era muito estimado de seus súditos, não só pelas virtudes que o adornavam, como pelos talentos que faziam dele um dos varões mais capazes de Platina. Os benefícios de seu califado, aliás curto, eram já grandes. Ele iniciara e fundara a política de conciliação entre as facções do Estado, animava as artes e as letras, protegia a indústria e o comércio. Se havia alguma rebelião, tratava de vencer os rebeldes; em seguida perdoava-lhes. Finalmente, era moço, crente, empreendedor e patriota.

Uma noite, porém, estando a dormir, apareceu-lhe em sonhos um anão amarelo, que, depois de o encarar silenciosamente alguns minutos, proferiu estas palavras singulares:

— Comendador dos crentes, teu califado tem sido um modelo de príncipes; falta-lhe, porém, originalidade; é preciso que faças alguma coisa original. Dou-te um ano e um dia para cumprir este preceito: se o não cumprires, voltarei e irás comigo a um abismo, que há no centro da Tartária, no qual morrerás de fome, sede, desespero e solidão.

O califa acordou sobressaltado, esfregou os olhos e reparou que era apenas um sonho. Contudo, não pôde dormir mais; levantou-se e foi ao terraço contemplar as últimas estrelas e os primeiros raios da aurora. Ao almoço, serviram-lhe peras de Damasco. Tirou uma e quando ia a trincá-la, a pêra saltou-lhe das mãos e saiu de dentro o mesmo anão amarelo, que lhe repetiu as mesmas palavras da noite. Imagina-se o terror com que Schacabac as ouviu. Quis falar, mas o anão desaparecera. O eunuco que lhe servira a pêra estava ainda diante dele, com o prato nas mãos.

— Viste alguma coisa? perguntou o califa, desconfiado e pálido.

— Vi que Vossa Grandeza comeu uma pêra, muito tranqüilo, e, ao que parece, com muito prazer.

O califa respirou; depois recolheu-se ao mais secreto de seus aposentos, onde não falou a ninguém durante três semanas. O eunuco levava-lhe a comida, com exclusão das peras. Não lhe aproveitou a exclusão, porque no fim de três semanas, apetecendo-lhe comer tâmaras, viu sair de dentro de uma o mesmo anão amarelo, que lhe repetiu as mesmíssimas palavras de intimação e ameaça. Schacabac não se pôde ter; mandou chamar o vizir.

— Vizir, disse o califa, logo que este acudiu ao chamado, quero que convoques para esta noite os oficiais do meu conselho, a fim de lhes propor alguma coisa de grande importância e não menor segredo.

O vizir obedeceu prontamente à ordem do califa. Naquela mesma noite, reuniram-se os oficiais, o vizir e o chefe dos eunucos; todos estavam curiosos de saber o motivo da reunião; o vizir, porém, mais curioso ainda que os outros, simulava tranqüilamente achar-se na posse do segredo.

Schacabac mandou vir caramelos, cerejas, e vinhos do Levante; os oficiais do conselho refrescaram as goelas, avivaram o intelecto, sentaram-se comodamente nos sofás e cravaram os olhos no califa, que depois de alguns minutos de reflexão, falou nestes termos:

— Sabeis que tenho feito alguma coisa durante o meu curto califado; contudo, ainda não fiz nada que verdadeiramente se possa dizer original. Foi o que me observou um anão amarelo, que me apareceu há três semanas e ainda hoje de manhã. O anão ameaçou-me com a mais afrontosa das mortes, em um abismo da Tartária, se no fim de um ano e um dia, eu não tiver feito alguma coisa positivamente original. Tenho cogitado dia e noite, e confesso que ainda não achei coisa que merecesse essa qualificação. Por isso vos convoquei; espero de vossas luzes o concurso necessário à minha salvação e à glória da nossa pátria.

O conselho ficou boquiaberto, ao passo que o vizir, a mais e mais espantado, não movia um único músculo do rosto. Cada oficial do conselho fincou a cabeça nas mãos, a ver se descobria uma idéia original. Schacabac interrogava o silêncio de todos, e sobre todos, o do vizir, cujos olhos, fitos no magnífico tapete da Pérsia que forrava o chão da sala, parecia ter perdido a vida própria, tal era a grande concentração dos pensamentos.

Ao cabo de meia hora, um dos oficiais, Muley-Ramadan, encomendando-se a Allah, falou nestes termos:

— Comendador dos crentes, se quereis uma idéia extremamente original, mandai cortar o nariz a todos os vossos súditos, adultos ou menores, e ordenai que a mesma operação seja feita a todos os que nascerem de hoje em diante.

O chefe dos eunucos e diversos oficiais protestaram logo contra semelhante idéia, que lhes pareceu excessivamente original. Schacabac, sem a rejeitar de todo, objetou que o nariz era um órgão interessante e útil ao Estado, porquanto fazia florescer a indústria dos lenços e ministrava anualmente alguns defluxos à medicina.

— Que razão poderia levar-me a privar o meu povo desse natural ornamento? concluiu o califa.

— Saiba Vossa Grandeza, respondeu Muley-Ramadan, que, fundado na predição de um sábio astrólogo de meu conhecimento, tenho por certo que, daqui a um século, há de ser descoberta uma erva fatal ao gênero humano. Essa erva, que se chamará tabaco, será usada de duas formas — em rolo ou em pó. O pó servirá para entupir o nariz dos homens e prejudicar a saúde pública. Desde que os vossos súditos não tenham nariz serão preservados de tão pernicioso costume...

Esta razão foi triunfalmente combatida pelo vizir e todo o conselho, a tal ponto que o califa, aliás inclinado a ela, deixou-a inteiramente de mão. Então o chefe dos eunucos, depois de pedir licença a Schacabac para exprimir um voto, que lhe parecia muito mais original que o primeiro, propôs que dali em diante o pagamento dos impostos passasse a ser voluntário, clandestino e anônimo. Desde que assim for, concluiu ele, estou certo de que o erário regurgitará de sequins; o contribuinte crescerá cem côvados ante a própria consciência; algum haverá que, levado de legítimo excesso, pague duas e três vezes a mesma taxa; e afinado deste modo o sentimento cívico, melhorarão, e muito, os costumes públicos.

A maioria do conselho concordou em que a idéia era prodigiosamente original, mas o califa achou-a prematura, e aventou a conveniência de a estudar e pôr em execução nas proximidades da vinda do Anticristo. Cada um dos oficiais propôs a sua idéia, que foi julgada original, mas não tanto que merecesse ser aceita de preferência a todas. Um propôs a invenção da clarineta, outro a proscrição dos legumes, até que o vizir falou nestes termos:

— Seja-me dado, comendador dos crentes, propor uma idéia que vos salvará dos abismos da Tartária. É esta: mandai trancar as portas de Platina a todas as caravanas que vierem de Brazilina; que nenhum camelo, se ali recebeu mercadoria ou somente bebeu água, que nenhum camelo, digo eu, possa penetrar as portas da nossa cidade.

Espantado com a proposta, o califa ponderou ao vizir:

— Mas que motivo... sim, é preciso que haja um motivo... para...

— Nenhum, tornou o vizir, e nisto consiste a primeira originalidade da minha idéia. Digo a primeira, porque há outra maior. Peço-vos, e ao conselho, que acompanheis atentamente o meu raciocínio...

Todos ficaram atentos.

— Logo que a notícia de semelhante medida chegar a Brazilina, haverá grande reboliço e estupefação. Os mercadores ficarão pesarosos com o ato, porque são os que mais perdem. Nenhuma caravana, nem ainda as que vêm de Meca, quererá mais parar naquela cidade maldita, a qual (permita-me o conselho uma figura de retórica) ficará bloqueada pelo vácuo. Que acontece? Condenados os mercadores a não mercar para cá, serão obrigados a fechar as portas, ao menos aos domingos. Ora, como há em Brazilina uma classe caixeiral, que suspira pelo fechamento das portas aos domingos, para ir fazer suas orações nas mesquitas, acontecerá isto: o fechamento das portas de cá produzirá o fechamento das portas de lá, e Vossa Grandeza terá assim a glória de inaugurar o calembour nas relações internacionais.

Apenas o vizir concluiu este discurso, todo o conselho reconheceu, unânime, que a idéia era a mais profundamente original de quantas tinham sido propostas. Houve abraços, expansões. O chefe dos eunucos disse poeticamente que a idéia do vizir era “. O califa manifestou o seu entusiasmo ao vizir, dando-lhe de presente uma cimitarra, uma bolsa com cinco mil sequins e a patente de coronel da guarda nacional.

No dia seguinte, todos os cádis leram ao povo o decreto que mandava fechar as portas da cidade às caravanas de Brazilina. A notícia excitou a curiosidade pública e causou certa estranheza, mas o vizir tivera o cuidado de espalhar pela boca pequena a anedota do anão amarelo, e a opinião pública aceitou a medida como um sinal visível da proteção de Allah.

Daí em diante, por espaço de alguns meses, um dos recreios da cidade era subir às muralhas a ver chegar as caravanas. Se estas vinham de Damasco, de Jerusalém, do Cairo ou de Bagdá, abriam-se-lhe as portas, e elas entravam sem a mínima objeção; mas se alguma confessava que tocara em Brazilina, o oficial das portas dizia-lhe que passasse de largo. A caravana voltava no meio dos apupos da multidão.

Entretanto o califa indagava todos os dias do vizir se constava que em Brazilina se houvesse procedido ao fechamento das portas aos domingos; ao que o vizir invariavelmemte respondia que não, mas que a medida não tardaria a ser proclamada como conseqüência rigorosa da idéia que havia proposto. Nessa esperança, iam voando as semanas e os meses.

— Vizir, disse um dia Schacabac, quer-me parecer que estamos enganados.

— Descanse Vossa Grandeza, retorquiu friamente o vizir; o fato vai consumar-se; assim o exige a ciência.

Pela sua parte, o povo cansou de apupar as caravanas e começou a notar que a idéia do vizir era simplesmente amoladora. Não vinham da Brazilina as mercadorias do costume, nem o povo mandava para lá as suas cerejas, os seus vinagres e os seus colchões. Ninguém ganhava com o decreto. Começou-se a murmurar contra ele. Um boticário (ainda não havia farmacêutico) arengou ao povo, dizendo que a idéia do vizir era simplesmente vã; que jamais o trocadilho das portas fechadas chegaria a ter a mínima sombra de realidade científica. Os doutores eclesiásticos não acharam no Corão um só versículo que pudesse justificar tais induções e esperanças. Lavrava a descrença e descontentamento; começava a soprar uma aragem de revolução.

O vizir não teve só de lutar contra o povo, mas também contra o califa, cuja boa fé começou a desconfiar do acerto do decreto. Três dias antes de chegar o prazo fatal, o califa intimou o vizir a dar-lhe notícia do resultado que prometera ou a substituí-lo por uma idéia verdadeiramente original.

Nesse apertado lance, o vizir chegou a desconfiar de si, e a persuadir-se que aventara aquela idéia, levado do único desejo de desbancar os outros oficiais. Disso mesmo o advertiu Abracadabro, varão exímio na geomancia, a quem consultou sobre o que lhe cumpria fazer.

Esperar, disse Abracadabro, depois de traçar algumas linhas no chão; esperar até o último dia do prazo fatal marcado ao califa. O que há de acontecer nesse dia, não o pode descortinar a ciência, porque há muita coisa que a ciência ignora. Mas faze isso. No último dia do prazo, à noite, tu e o califa deveis recolher-vos ao mais secreto aposento, onde vos serão servidos três figos de Alexandria. O resto lá saberás; e podes ficar certo de que será coisa boa.

Deu-se pressa o vizir em contar ao califa as palavras de Abracadabro, e, fiados na geomancia, aguardaram o dia último. Veio este, e depois dele a noite. Sós os dois, no mais secreto aposento de Schacabac, mandaram vir três figos de Alexandria. Cada um dos dois tirou o seu e abriu-o; o do califa deu um pulo, subiu ao teto e caiu logo no chão, sob a forma do famoso anão amarelo. Vizir e califa tentaram fugir, correndo às portas; mas o anão os deteve com gesto amigo.

— Não é preciso fugir, disse ele; não venho buscar-te; venho somente declarar, que achei verdadeiramente original a idéia do fechamento das portas. Certo é que não deu de si tudo o que o vizir esperava; mas nem por isso perdeu de originalidade. Allah seja convosco.

Livre da ameaça, o califa mandou logo que todas as portas se abrissem às caravanas de Brazilina. O povo aquietou-se; o comércio votou mensagens de agradecimento. E porque o califa e o vizir eram homens instruídos, práticos e dotados de boas intenções, e apenas tinham cedido ao medo, sentiram-se contentes com repor as coisas no antigo pé, e não se encontravam nunca sem dizer ao outro, esfregando as mãos :

— Aquele anão amarelo!

Fontes:
Publicado originalmente em O Cruzeiro 1878
– ASSIS, Machado de Assis. Páginas recolhidas

Manoel de Barros (Nos Primórdios)



Era só água e sol de primeiro este recanto. Meninos cangavam sapos. Brincavam de primo com prima. Tordo ensinava o brinquedo "primo com prima não faz mal: finca finca". Não havia instrumento musical. Os homens tocavam gado. As coisas ainda inominadas. Como no começo dos tempos.

Logo se fez a piranha. Em seguida os domingos e feriados. Depois os cuiabanos e os beira-corgos. Por fim o cavalo e o anta batizado.

Nem precisaram dizer crescei e multiplicai. Pois já se faziam filhos e piadas com muita animosidade.

Conhecimentos vinham por infusão pelo faro dos bugres pelos mascates.

O homem havia sido posto ali nos inícios para campear e hortar. Porém só pensava em lombo de cavalo. De forma que só campeava e não hortava.

Daí que campear se fez de preferência por ser atividade livre e andeja. Enquanto que hortar prendia o ente no cabo da enxada. O que não era bom.

No começo contudo enxada teve seu lugar. Prestava para o peão encostar-se nela a fim de prover seu cigarrinho de palha. Depois, com o desaparecimento do cigarro de palha, constatou-se a inutilidade das enxadas.

— O homem tinha mais o que não fazer!

Foi muito soberano mesmo no começo dos tempos este cortado. Burro não entrava em seus pastos. Só porque burro não pega perto.* Porém já hoje há quem trate os burros como cavalo. O que é uma distinção.
––––––––––––––––––––––-

Nota: Burro não pega perto é expressão pantaneira. Nas lides de campear o pantaneiro usa o cavalo, que é veloz e alcança a rês desgarrada rapidamente. O cavalo pega perto. Mas o burro, não sendo veloz, alcança longe a rês desgarrada. Por isso se diz que o burro não pega perto.

Fonte:
BARROS, Manoel de. Livro das Pré-Coisas. RJ: Record, 1985.

Manoel de Barros (Livro sobre Nada)


Livro sobre Nada, de Manoel de Barros, é um livro de poesia e prosa, de poesia em prosa, de "pensamentos" e fragmentos. Um livro diferente, sem um gênero definido.

Na abertura de sua obra, diz o poeta:

[...]o nada de meu livro é nada mesmo. É coisa nenhuma por escrito: um alarme para o silêncio, um abridor de amanhecer, pessoa apropriada para pedras, o parafuso de veludo, etc etc. O que eu queria era fazer brinquedos com as palavras. Fazer coisas desúteis. O nada mesmo. Tudo que use o abandono por dentro e por fora.

Com essas palavras, o autor quebra as expectativas em relação ao niilismo e reduz o nada à palavra "nada", materializando-a para, em seguida, desmaterializá-la: a palavra incapaz de ocupar o lugar de uma imagem. O antesmente verbal: a despalavra mesmo, segundo o desejo e a esperança do poeta.

É quando lembramos que o território em decurso de investigação assenta-se na poesia, organização muito especial de signos que se estabelece, particularmente, em função da subversão dos elementos componentes da ordem lingüística. Nesta direção, o poeta trilha a senda da transgressão verbal, dos deslimites do discurso.

Logo no primeiro poema deste livro ouvimos o eu lírico dizer: As coisas tinham para nós uma desutilidade poética. / Nos fundos do quintal era muito riquíssimo o nosso dessaber. E não só isto. Antes mesmo de iniciar seu livro, o próprio autor anuncia em seu "Pretexto": "(...)O que eu queria era fazer brinquedos com as palavras. Fazer coisas desúteis(...)" A “desutilidade” , o “dessaber” , o “desúteis” são uma freqüente na obra de Manoel de Barros.

O texto é pouco mas denso, uma grande metáfora, na verdade, para falar apenas de uma das muitas figuras de linguagem usadas pelo autor. Figuras com as quais consegue boas visões poéticas. Mas também emprega muitas palavras não usuais. Isso não facilita a compreensão, que já é difícil, porque Livro sobre Nada não é um livro comum, o autor avisa, no início, que queria um livro que se sustentasse só pelo estilo. Talvez tenha conseguido este objetivo.

Por outro lado, o fato de usar palavras desconhecidas de grande parte dos leitores é um laboratório no mínimo interessante, pois além de forçar o leitor a ampliar o seu vocabulário, embora não vá usar aquelas palavras nem na sua fala nem na sua escrita, os significados das figuras construídas são originais e singulares, beirando o incompreensível. E realmente resultam num estilo próprio, cumprindo outro objetivo do autor, qual seja o de "fazer brinquedos com as palavras". Para isso, ele inventa palavras, também, deixando a poesia ou a prosa mais incomum, ou, como ele mesmo diz, "coisa nenhuma por escrito" ou "um abridor de amanhecer".

O Pretexto de Livro sobre Nada nos conduz, na esfera da produção de sentido e em continuidade aos efeitos provocados pelo título da obra, ao próprio non sense, à seara do paradoxo, a um silêncio, portanto. Ora, este silêncio se evidencia (e se diferencia) na medida em que sucedemos à leitura dos capítulos "Arte de infantilizar formigas", "Desejar ser", "O livro sobre nada" e "Os Outros: o melhor de mim sou Eles".

O poema "A arte de infantilizar formigas" tem um alto grau do jogo de palavras instaurado para criar uma realidade própria:

Depois de ter entrado para rã, para árvore, para pedra
- meu avô começou a dar germínios
Queria ter filhos com uma árvore.
Sonhava de pegar um casal de lobisomem para ir
vender na cidade.
Meu avô ampliava a solidão.
No fim da tarde, nossa mãe aparecia nos fundos do
quintal : Meus filhos, o dia já envelheceu, entrem pra
dentro.
Um lagarto atravessou meu olho e entrou para o mato.
Se diz que o lagarto entrou nas folhas, que folhou.
Aí a nossa mãe deu entidade pessoal ao dia.
Ela deu ser ao dia,
e Ele envelheceu como um homem envelhece.
Talvez fosse a maneira
Que a mãe encontrou para aumentar
as pessoas daquele lugar
que era lacuna de gente.

É notório no discurso a forte carga emotiva que o "avô" possui em relação à natureza, pois são incorporados aos elementos da mãe terra como a rã (animal), a árvore (vegetal) e a pedra (mineral), havendo uma nítida integração com esses seres. Desta forma, o avô passa "a dar germínios", mostrando a idéia de fertilidade. Tal idéia sobre fertilidade é expressa através da anunciação de seus extravagantes desejos como notamos nos versos nº 3, 4 e 5.

Queria ter filhos com uma árvore. / Sonhava de pegar um casal de lobisomem para ir / vender na cidade.

Nota-se que além da união mística do avô com a árvore ("queria ter filhos com uma árvore"), é empregado o verbo "sonhar" ("sonhava") que pode ser visto como uma seqüência de eventos psíquicos ocorridos durante o sono, ou como um desejo e aspiração. Essa é uma forma de mostrar os devaneios que perpassavam a mente do avô, quando contemplava a imensurável natureza presente em sua vida.

Quando o avô menciona que "sonhava de pegar um casal de lobisomem", nos dá uma idéia alógica, pois a expressão "lobisomem" origina-se do latim lupus homo, homem lobo, gênero masculino. Já o termo "casal" nos remete à idéia da união entre o macho e a fêmea. De fato, o eu lírico desconstrói a lenda, a fim de que haja procriação.

Na seqüência, quando é dita a finalidade desta ação, "para ir / vender a cidade", nota-se embutida a noção de comércio que remete a toda e qualquer cidade. Dessa forma, o poema estabelece uma forte oposição entre o primitivo ("lobisomem") e o não primitivo ("cidade") que o avô deseja romper.

No verso nº 6, "Meu avô ampliava a solidão", o avô surge isoladamente, em liberdade, fato em que explica todos os delírios marcados pelo eu lírico. Dessa forma, o avô apesar de ser um membro da família, apresenta-se distinto de um personagem do cotidiano. O avô parece se isolar da família pelas suas capacidades e qualidades, as quais ele quer estender aos outros, por isso quer ter filhos com uma árvore, vender um casal de lobisomem: afinal, cultivar a inútil poesia.

No que apresenta o verso nº 7, tem-se outra indicação temporal "no fim da tarde" que remete a uma rotina, conforme expressa o verbo aparecer, núcleo ("aparecia"), núcleo da oração. É interessante ressaltar o aparecimento de "nossa mãe" que, ao contrário de "meu avô", apresenta-se antecedida pelo pronome possessivo em primeira pessoa do plural. Daí pode-se inferir que o "avô" materializa a liberdade do eu lírico, já a "mãe", os limites.

No tocante aos versos nº 8 e 9: "Meus filhos, o dia já envelheceu, entrem para dentro", observa-se um processo de personificação do dia (prosopopéia) que dá vida ao dia, além do pleonasmos vicioso "entrem para dentro", típico da linguagem coloquial. Nota-se a expressividade do eu lírico por ser fiel em relação à linguagem da mãe, refletindo grande autenticidade dessa situação cotidiana.

Nos versos seguintes temos: Um lagarto atravessou meu olho e entrou para o mato / Se diz que o lagarto entrou nas folhas, que folhou. Primeiro, quando se diz "atravessou o olho" é uma metáfora feita a percepção intelectual do eu lírico (a imaginação poética). E o mato, por sua vez, representa o terreno inculto (a escrita poética). Enfim, nota-se no verso nº 11 a ambigüidade no vocábulo "folha", pois tanto pode se referir a uma parte das plantas, como ao papel que serve para à escrita.

Sendo assim, o primeiro capítulo "Arte de infantilizar formigas" dá início à lista de “inconexos”, apresenta passagens da infância do autor. A relação com o universo infantil é essencial nesta parte do livro e vai insinuar vários fatores, entre eles, a valorização da pequenez, da simplicidade, das insignificâncias (o nada?). Manoel dignifica “coisinhas sem santidade” como os “urinóis enferrujados” apregoados pelo avô (que era, aliás, “o próprio indizível pessoal”), bem como garças, rolinhas, rãs, lagartos, trastes, formigas, violetas e outras “coisas imprestáveis”.

Aqui, o escritor se vale bastante do prefixo negativante "des" para caracterizar o paroxismo da ilogicidade (em cuja base, sabemos, está o seu nada-tudo) como podem atestar os dois primeiros versos do livro, após o "Pretexto":

As coisas tinham para nós uma desutilidade poética.
Nos fundos do quintal era muito riquíssimo o nosso dessaber.

Segue promovendo mais sobressaltos por meio da confecção de “brinquedos com palavras”. Para tanto, “o truque era só virar bocó” (primeira menção linear aos loucos, os esquizos tão distantes dos ditames da representação, este tema é central na última parte do livro). Como, talvez, passatempo lingüístico, observe-se o trecho que faz referência ao capítulo: “Para infantilizar formigas é só pingar um pouquinho de água no coração delas”. Aqui, cabe propor que estas formigas sejam mesmo os signos verbais, que precisariam ser infantilizados (eis o ponto de máximo da relação com o universo infantil: a criança é incapaz de entender as palavras como representações do mundo, daí sua facilidade em delas fazer “brinquedos”) mediante uma imagem (“pingar um pouquinho de água no coração”) que se pode traduzir de diversas formas, mas que invariavelmente verterá numa impossibilidade. Trata-se de uma operação metalingüística em que o poeta nos faz chegar à própria arte que tece, uma "Arte de infantilizar formigas".

Esta consciência do signo poético e de todo o seu potencial irrompe, transborda pelos significantes de "Desejar Ser". Na epígrafe do capítulo, Barros invoca Vieira em suas "Paixões Humanas":

O maior apetite do homem é desejar ser. Se os olhos vêem com amor o que não é, tem ser.

Em suma, o homem só será (homem), possibilidade inscrita na esfera do desejo e do alimento, isto é, daquilo que vai movimentar a condição humana, quando ele for capaz de enxergar não o que é, mas justamente o que não é. E, para tanto, seu olhar não pode ser qualquer um, mas um olhar com amor. Se lembrarmos que a poesia é exatamente quando e até onde ela consegue não ser, fundamento que marca o signo poético e o traveste de profunda humanidade, temos que considerar que o homem é poesia, ou que a poesia é propriamente humana, segundo a bela epígrafe.

Na medida em que esta parte da obra é metalingüística, isto é, a poesia fala, dá e apresenta a própria trama poética (conforme um duplo de linguagem), temos o homem falando de sua precisa humanidade, na proporção em que a tece e a demonstra na malha dos versos.

O primeiro poema se constitui de um único verso, e diz:

Com pedaços de mim eu monto um ser atônito.

O que indica, entre outras leituras, uma possível experimentação da perplexidade, do espanto, daquilo capaz de nos deixar atônitos.

É uma advertência, uma informação que devemos levar até o fim deste tópico. Vejamos o sexto cântico:

Carrego meus primórdios num andor.
Minha voz tem um vício de fontes.
Eu queria avançar para o começo.
Chegar ao criançamento das palavras.
Lá onde elas ainda urinam na perna.
Antes mesmo que sejam modeladas pelas mãos.
Quando a criança garatuja o verbo para falar o que não tem.
Pegar no estame do som.
Ser a voz de um lagarto escurecido.
Abrir um descortínio para o arcano.

O primeiro verso faz referência aos primórdios, em segura associação à era adâmica, da não-representação. Pouco depois, o poeta insinua algo como uma morte, caminho para um fim que, antes, seria (re)nascimento, uma vez que deseja “avançar para o começo”, os primódios que há pouco mencionara. Por este retorno às origens, o reencontro com o universo infantil ou mesmo dos homens primitivos é fato asseverado em todos os versos seguintes. É quando tornar-se-á factível, “Pegar no estame do som” e “Ser a voz de um lagarto escurecido”, choques semânticos que novamente nos jogam, conforme alertou, na perplexidade, no paradoxo. Contudo, todas estas impossibilidades são efetivamente afirmadas pela substância poética, desde que tornemos àquela morte primeira, "Quando a criança garatuja o verbo para falar o que / não tem.", estação em que podemos abrir uma fresta para o mistério, fenda que nos desvela o que não se representa.

Tomemos agora um trecho do canto oito:

... Pertenço de fazer imagens.
Opero por semelhanças.
Retiro semelhanças de pessoas com árvores
de pessoas com rãs
de pessoas com pedras
etc etc.
Retiro semelhanças de árvores comigo.
...

O poeta nos confia sua arte e apresenta um dos meios de que se vale para “operar” com as palavras. E o faz através de suas imagens, no passo em que, entre elas, estabelece relações de semelhanças, de similaridades. O processo do autor não é, portanto, lógico ou simbólico, mas, analógico, de iconização do signo verbal.

Passemos, por último, ao canto catorze, poema central da obra:

O que não sei fazer desmancho em frases
Eu fiz o nada aparecer
(Represente que o homem é um poço escuro
Aqui de cima não se vê nada
Mas quando se chega ao fundo do poço já se pode ver
o nada)
Perder o nada é um empobrecimento.

Eis a menção direta ao nada, o nada de que trata o livro e sobre o qual, paradoxalmente, ele está arquitetado. Antes de tudo, o poeta avisa: o que não sabe fazer, ele faz pela frase, “desmanchando” o ato em frase, possibilitando pois o impossível. E o nada pode aparecer.

Nos versos seguintes, lacrados dentro de parênteses, o rumo para este nada: o homem como um poço escuro. De cima, na sua superfície, não se vê nada (observe a relevância desta negativa que afirma e confirma o nada, que o coloca como matéria de algo, de alguma coisa). No entanto, se o homem quiser ver o nada, terá de chegar ao fundo do poço, sendo que o poço é ele mesmo. Ao atingir o fundo, o âmago deste poço, isto é, de si próprio (linguagem), revelar-se-á o nada ao homem. Produz-se aí uma imagem especular, espelho que metaforiza a própria representação conforme as seguintes polarizações: cima do poço / fundo do poço, superfície do homem / âmago do homem, nada se vê / vê-se o nada, afirmação da representação / negação da representação.

Tudo isto é corroborado pelo termo que, ironicamente, abre a terceira estrofe.

O nada, visível como nunca, é a utopia do não, coberta e velada pela palavra cotidiana, pelo verbo da superfície, de onde pouco ou nada se vê e que, óbvio, comprova a representação. Portanto, pela via simétrica, sob o véu, o nada do homem, sua diferença, seu não-ser, sua humanidade. Entre as duas pontas, percorrendo e fertilizando este espaço de tensão, vertendo e invertendo teses e antíteses, retesando e desequilibrando a linha dos paradoxos, está a poesia de Manoel de Barros.

Mergulhemos agora na porção que nomeia o livro. Trata-se de uma série de aforismos em que estão expostos versos aparentemente ilógicos, paradoxais:

Tudo que não invento é falso.
Tem mais presença em mim o que me falta.
Meu avesso é mais visível que um poste.

Ao mesmo tempo, o autor tece considerações sobre seu fazer poético que parecem denotar firme consciência do solo lingüístico, como em

As palavras me escondem sem cuidado.

Neste último caso, por detrás da máscara vocabular, está o ser, mas também o poeta (o nada?), de modo que, neste simples verso, tem-se a presença do drama humano, o confronto em foco: o simbólico versus o icônico, o terceiro versus o primeiro. Mais:

Uma palavra abriu o roupão para mim. Ela deseja que eu a seja.
A terapia literária consiste em desarrumar a linguagem a ponto que ela expresse nossos mais fundos desejos.

Em ambas as linhas, a alusão às frinchas na representação, à eucaristia utópica homem-real, ora, este item do livro leva, ao cabo de sua leitura, a um verdadeiro paradoxo dos sentidos.

O que sustenta a encantação de um verso (além do ritmo) é o ilogismo.

Neste ponto, a ponte sobre a qual melhor transita o nada de Manoel refere-se à clara tensão que se instala entre a tradição da palavra e a palavra sem tradição, entre o simbólico e o icônico, entre o absoluto da linguagem e o absurdo da poesia, entre o ser e o nada. O silogismo aristotélico e representacional, a lógica que costumeiramente alicerça a linguagem, é questionado em prol de uma impossibilidade tornada possível, de uma negação, a poesia, seu ilogismo, sua analógica.

Livro sobre nada, é também um livro sobre as virtudes.

O melhor porém é que mais ainda do que antes, Manoel de Barros aloja no seu livro várias máscaras, alguns alter-egos e personagens: seu pai, sua irmã Bugrinha, o avô insondavelmente teatral, e povoa o seu mundo com eles.

Na última parte do livro, "Os Outros: o melhor de mim sou Eles", a atenção está voltada para a alteridade, a partir da identificação do poeta com os artistas e, especialmente, com os loucos, andores humanos da contra-representação, muitas vezes estereotipados e expurgados pelo corpo social.

Assim, nesta última seção, o poeta como que se dissolve em alguns desses alter- egos: um pintor boliviano, Rômulo Quiroga, em cuja pintura em sacos de aniagem ele viu "latejar a cor psíquica e as formas incorporantes de Picasso", e lhe ensinou que é preciso eliminar da natureza "as naturalidades"; Mário, um tipo do Pantanal que lia o seu futuro nas entranhas dos animais; o artista plástico Arthur Bispo do Rosário, cuja obra, "ardente de restos", tem semelhança assombrosa com o melhor da poesia do próprio Barros, que estampou num livro: "Aceita-se entulho para o poema".

São interessantíssimos os casos em primeira pessoa, como o do filósofo de beco Bola-Sete, que afirmava querer “fazer uma biografia do orvalho”, ou o do louco andarilho que dizia: “Andando devagar eu atraso o final do dia”. Inusitado outrar-se: o autor se traveste de louco para criar sua poesia, descolada, óbvio, do signo tradicional.

Como se agora estivesse afiançado o absurdo poético, mas tão somente por tratar-se de um discurso da loucura, em nova operação metalingüística.

No poema intitulado "A. B. do R.", surge um famoso personagem:

Artur Bispo do Rosário se proclamava Jesus. Sua obra era ardente de restos: estandartes podres, lençóis encar-didos, botões cariados, objetos mumificados, fardões da Academia, Miss Brasil, suspensórios de doutores – coisas apropriadas ao abandono. Descobri entre seus objetos um buquê de pedras com flor. Esse Artur Bispo do Rosário acreditava em nada e em Deus.

Arthur Bispo do Rosário se proclamava Jesus”: ele não precisava ser ou muito menos desejar ser; ele simplesmente era. Dispensava, portanto, quaisquer intermebelecida diários, mediadores ou equivalentes. Além do mais, valorizava insignificâncias.

Mas é no instante em que o poeta lhe descobre “um buquê de pedras com flor”, que não pairam mais dúvidas: “Artur Bispo do Rosário acreditava em nada e em Deus”. Se, numa primeira leitura, tomamos os dois vocábulos (“nada” e “Deus”) como semanticamente opostos, numa visão mais aplicada podemos inquirir se nada e Deus não estão, pelo contrário, muito próximos, são, bem dizer, sinônimos. Afinal, nos meandros da mente extasiada de Bispo do Rosário e de seus desconcertantes discursos, fulgura o encontro com o nada, ou melhor, com Deus. Os loucos, poetas.

Livro sobre Nada é uma obra instigante, a começar pelo título. O autor demonstra, observa-se na leitura, segurança e orientação com respeito ao solo que pisa, o da linguagem, da palavra como negação da representação, como contradiscurso.

A partir desta geografia positiva, o poeta busca fazer o signo verbal encarnar, paradoxalmente, o nada. Esta peleja desliza e transparece ao longo dos capítulos e de seus diferentes leit-motifs, na proporção em que o autor discorre sobre a infância e suas insignificâncias, o fazer poético e sua transfiguração, os aforismos enquanto produção do sem-sentido, os loucos e sua insensatez.

Neste decurso, o nada de Manoel gradativamente assume e se traveste de caminhos temáticos próprios e específicos (a infância, a utopia, o paradoxo, a loucura).

Indo adiante, seria interessante encontrar elementos para situar Livro sobre Nada como moderno. Isto feito, e na medida em que se esclarecem os meios semióticos pelos quais o autor o fez, estaria Livro sobre Nada promovido a uma reduzida lista de obras que, ao lidarem tão conscientemente com a linguagem, solicitam para si a realização de uma impossibilidade, de uma utopia que, em última instância, diz respeito à própria condição de nossa humanidade.

Na obra de Manoel de Barros percebe-se com freqüência, que não há uma obra pronta, um poema “feito”. O poeta parece muito mais estar experimentando as coisas. Essa experiência aparece quase como uma atividade lúdica. Desta forma, o poeta inicia Livro sobre Nada com o poema que tem alguns versos que dizem assim: As coisas tinham para nós uma desutilidade poética. / Nos fundos do quintal era muito riquíssimo o nosso dessaber. / A gente inventou um truque pra fabricar brinquedos com palavras. / O truque era só virar bocó. / Como dizer: Eu pendurei um bentevi no sol... / O que disse Bugrinha: Por dentro de nossa casa passava um rio inventado. A essa “brincadeira” se junta a desconstrução, ou quem sabe é a própria desconstrução que é habitada de “brincadeira”. Tudo tem, então, nos poemas de Manoel de Barros, a seriedade e, ao mesmo tempo, a ingenuidade e gratuidade de criança brincando. Em outro poema deste livro, percebemos essa relação quando lemos: Prefiro as máquinas que servem para não funcionar: quando cheias de areia de formiga e musgo, elas podem um dia milagrar de flores. / (Os objetos sem função têm muito apego pelo abandono.) / Também as latrinas desprezadas que servem para ter grilos dentro – elas podem um dia milagrar violetas./. Nestes versos, a relação do eu-lírico com o mundo parece uma relação de criança remexendo o “imprestável” para impulsionar o “faz de conta”, a imaginação, ou para “habitar o inabitável”. E como em brincadeira de criança tudo dá a impressão de improviso, experimentação. Há também que se lembrar que assim como a criança constrói algo, uma brincadeira, um castelo de areia, para logo depois desfazê-lo ou esquecê-lo sem a menor culpa, a desconstrução em Manoel de Barros não tem “compromissos”. Por isso, talvez, o poeta está a todo momento retomando o tema da desconstrução, como se estivesse, como a criança em suas brincadeiras, construindo e desconstruindo (experimentando), o real. Em uma de suas entrevistas o poeta, ao ser questionado sobre as funções da poesia no mundo atual e se ela realmente seria necessária, declara: (...) Além disso a poesia tem a função de pregar a prática da infância entre os homens. A prática do desnecessário e da cambalhota, desenvolvendo em cada um de nós o senso do lúdico. Se a poesia desaparece do mundo, os homens se transformariam em monstros, máquinas, robôs.

O “condão de adivinhar” versus a linguagem informativa

A ciência pode classificar e nomear os órgãos de um
sabiá
Mas não pode medir seus encantos.
A ciência não pode calcular quantos cavalos de força
Existem
Nos encantos de um sabiá.
Quem acumula muita informação perde o condão de adivinhar: divinare.
Os sabiás divinam.

No penúltimo verso deste poema, o eu-lírico diz: “Quem acumula muita informação perde o condão de advinhar: divinare”. Neste verso percebe-se uma outra nuança da poesia de Manoel de Barros, ou seja, a oposição entre a linguagem informativa e a que poderíamos chamar criadora, “advinhativa” (“Quando a criança garatuja o verbo para falar o que não tem”). O eu-lírico neste poema se refere, então, à linguagem informativa como aquela que não consegue extrapolar o âmbito estritamente objetivo da realidade, como é o caso da linguagem científica. Na verdade, essa outra nuança vem confirmar ainda mais o tema da desconstrução, pois a linguagem científica (a linguagem informativa) é aquela que prescinde da desconstrução, já que se alimenta da visão objetiva do real. Para “ironizar” essa oposição o poeta “brinca”, por exemplo, com o vocábulo sabiá que “sugere” sabia(o). O verbo adivinhar é outro vocábulo que, também, ganha sentido muito especial neste poema, quando é comparado a “divino”, ao sagrado, que é o âmbito da poesia, deixando, com isso, a linguagem da ciência num plano inferior, de “reles mortal”.

Ao fazer tal oposição é preciso notar que o poeta não está apenas mostrando uma diferença, mas construindo uma identidade. No entanto, para construir essa identidade o eu-lírico se vale, paradoxalmente, de uma desconstrução. Neste poema, a desconstrução se dá através da desmistificação da ciência como “a linguagem”, o discurso supremo. A ciência é desmascarada como “técnica” impotente de ato maior, que é o de divinare. Assim, o eu-lírico parece comparar a poesia à “magia” e a ciência à técnica: ”Quem acumula muita informação perde o condão de adivinhar: divinare”. Perder o “condão de adivinhar” (perder “a varinha mágica” que transforma o real) é perder o mistério da magia, disso que não se explica através da informação, da notícia, do dado objetivo, porque pertence a uma outra dimensão, à dimensão dos que “divinam”,como os “sabiás”.

Também é bastante curioso observar como o eu-lírico desconstrói, na própria forma de construir o poema, o discurso científico. Primeiro ele afirma para depois negar. Assim temos: A ciência pode classificar e nomear os órgãos de um sabiá (afirmação) / mas não pode medir seus encantos / A ciência não pode calcular quantos cavalos de força existem / nos encantos de um sabiá (negação). Ou seja, há uma desconstrução expressa a partir do conteúdo que também é refletida na forma deste poema, o que acentua ainda mais o caráter não “retilíneo” do discurso poético em questão. Em “As lições de R.Q.”, outro poema de Livro sobre Nada, temos os seguintes versos que expressam muito bem esse caráter “não retilíneo”: “Aprendi com Rômulo Quiroga (um pintor boliviano): / A expressão reta não sonha”. Esse caráter “não retilíneo” também é expresso em outro verso do mesmo poema, em que o eu-lírico sugere um movimento de aproximação das coisas, da natureza, que é sempre um movimento de retomada, “circundante”, de experimentação, exaustiva e gradativa, e não objetivamente, como o faz o discurso científico: ”O olho vê, a lembrança revê, e a imaginação transvê. / É preciso transver o mundo. / Isto seja: / Deus deu a forma. Os artistas desformam. É preciso desformar o mundo: Tirar da natureza as naturalidades”.

Este Livro sobre Nada é um livro para ler com cuidado: ele é todo uma linguagem codificada e tanto podemos achá-lo instigante, "com pedaços de mim eu monto um ser atônito" ou "Pensar que a gente cessa é íngreme - minha alegria fica sem voz", ou podemos detestá-lo, "abria um por um de canivete os sapos para ler nas entranhas deles o seu futuro". Difícil é ficar indiferente.

Inútil, nada, coisa, bichos. Essas são algumas das palavras-chave de uma obra que tenta reconstruir o mundo. Alguns poetas passam, em suas obras, uma determinada visão de mundo; outros não se contentam com isso e vão além: tentam reconstruir o mundo. Manoel de Barros é um deles. Carlos Drummond de Andrade, em uma fase de sua produção "coisificou" o mundo industrial em plena Guerra Fria; Manoel de Barros faz exercícios poéticos no sentido de "descoisificar" o mundo, buscando uma nova forma de organizá-lo, que respeite a leitura daqueles que só têm "entidade coisal". A seguir, está transcrito os três primeiros poemas do Livro sobre nada. Observa-se neles a força expressiva dos prefixos que indicam ação contrária (tentativa de mudar a ordem das coisas?) e a grande antítese formada por aqueles que só têm "entidade coisal "X o "senhor doutor".

I. ...As coisas tinham para nós uma desutilidade poética. Nos fundos do quintal era riquíssimo o nosso dessabor. A gente inventou um truque para fabricar brinquedos com palavras...

II. o pai morava no fim de um lugar. Aqui é lacuna de gente - ele falou: Só quase que tem bicho andorinha e árvore. Quem aperta o botão do amanhecer é o arãquã. Um dia apareceu por lá um doutro formado: cheio de suspensórios e ademanes. Na beira dos brejos gaviões-caranguejeiros comiam caranguejos. E era mesma distância entre as rãs e a relva. A gente brincava com terra. O doutor apareceu. Disse: Precisam de tomar anquilostomina. Perto de nós sempre havia uma espera de rolinhas. O doutor espantou as rolinhas.

Observa-se que o poeta assume a postura de uma criança, o olhar intangível do infante percebe o mundo muito grandiosamente quando surge o doutor formado que por ter sido educado e se tornado adulto perdeu a percepção do mundo real (sensacional). Tanto isto é claro quando as andorinhas são espantadas por ele. Extremamente humanista e por que não dizer, ecológica é a visão do autor sobre o mundo que o cerceia.

Fonte:
Análise literária de Alessandro Sales, Mestrando em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). in
http://www.passeiweb.com

domingo, 1 de novembro de 2009

Dinair Leite (Confraria dos Poetas Encantados)

Extinguiu-se a flor do lume
Do poeta expira o canto
Qual menino vaga-lume,
chega ao céu e vira encanto

O poeta pousa a lira
e se apaga sua tocha
A sua arte aqui expira,
porém no céu desabrocha

Quando o poeta atravessa
para o outro lado da vida
Chega ao céu leve e com pressa
de prosseguir sua lida

A nuvem azul-hortência
que se abriu para o poeta
deixou passar em cadência,
trovas da lira seleta

O poeta se despede
da trova, poesia amada
Com devoção ele cede
sua obra, imortalizada

Foi o poeta! Se chora...
Quedou da rosa o perfume
que invadiu belo anjo que ora
pro poeta e acende lume!

No último canto o queixume,
por ele que foi embora
Na terra a flor, e o perfume
o anjo recolhe agora

Na terra ele virou flor,
plantada por triste ausência
Deixou versos, deu amor
e a Jesus deu sua essência

No morno sopro do vento,
passarinho em revoada,
para viver novo evento,
cantar a Deus em toada

Murchou rosa, chorou trova
e o poeta emudeceu...
Despertou em vida nova,
onde a rosa reviveu

O poeta emudeceu,
dormiu sua inspiração
Mas no céu apareceu
de lira e rosa na mão

A dor o meu peito invade,
ao ver tudo assim deserto
Mas lembro a sua saudade
de ouvir estrelas de perto

Na vida vibra seu verso...
O poeta compõe, canta!
Planta amor no universo
e jamais morre, se encanta
==============
Rápidas sobre Dinair Leite
Delegada em Paranavaí/PR, do Movimento Poético Nacional, colaboradora da página cultural no Jornal de Poesia (do MPN), e Revista Bali (do Kleber Leite - Itaocara/RJ).
No início de outubro o SESC promoveu a 28ª edição da Feira de Livros do SESC 2009 - Literatura e Jornalismo, na qual Dinair participou com a exposição de Livros Raros e Antigos, de seu acervo. Convidada a compor a homenagem Euclidiana, declamou as 10 trovas premiadas no concurso Cantagalo (Euclides da Cunha), o que estimulou muitos alunos presentes a se interessarem pela feliz arte da trova!

Para saber mais sobre Dinair
http://singrandohorizontes.blogspot.com/2009/09/dinair-leite-assume-delegacia-de.html
–––––––––––-
Contatos com Dinair, dinairleite@hotmail.com

Fontes:
A Autora
Fotomontagem = José Feldman

Mesmo com avanço da internet, livros continuarão tendo espaço



Convidados a discutir o papel da internet na atualidade, uma das conclusões a que chegaram os participantes da Mesa Literária Jornalista, em Paranavaí, foi de que mesmo com o avanço da internet, os livros continuarão a ter seu espaço na preferência do leitor.

A 28ª edição da Feira de Livros do SESC 2009 tem entre seus parceiros o Diário do Noroeste, já que o tema central do evento, que se encerra hoje, é Literatura e Jornalismo, sendo Euclides da Cunha o escritor homenageado.

Ao discutir a expectativa da literatura e do jornalismo com o advento da internet, os participantes da discussão lembraram de todo o simbolismo contido no livro e a preocupação com a qualidade e veracidade da informação passada por pessoas sem nenhum compromisso ético ou profissional.

A mesa literária foi mediada pelo jornalista Benedito Praxedes Junior, do Diário do Noroeste. O advogado, escritor e presidente da Academia de Letras de Paranavaí, Renato Frata fez um histórico sobre os primórdios da escrita até chegar ao livro impresso. Frata lançou inúmeros questionamentos sobre o futuro, mas foi enfático em afirmar que o livro deve continuar atraindo a atenção das pessoas.

Para a jornalista e vice-presidente da Academia de Letras de Paranavaí, Cristina Leite, que falou sobre o conteúdo dos blogs, é preciso que o leitor fique atento à qualificação do autor das informações disponibilizadas em sites e blogs. Ela defendeu a formação acadêmica em jornalismo, destacando os ensinamentos relacionados à ética profissional como essenciais para quem trata de um assunto tão importante como a informação.

Já o jornalista e blogueiro David Arioch, representante da geração habituada com a internet, falou das diversas técnicas utilizadas hoje para a disseminação da informação na internet, mas criticou a forma repetitiva e sem enfoques diferentes da grande maioria das notícias dos sites noticiosos. Ele concorda que muito material disponibilizado na internet não tem qualquer compromisso com a qualidade da informação, mas lembra da vantagem de profissionais da área poderem exercer suas carreiras sem depender de empresas.

Após a mesa literária, o grupo GT Artes Cênicas apresentou textos de partes do romance “Os Sertões”, de Euclides da Cunha.

A escritora Dinair Leite fez a leitura de trovas selecionadas sobre o escritor.

O evento contou com a participação da escritora paranavaiense Cleuza Cyrino Penha, tenente-coronel Geraldo Moliani, comandante do 8º Batalhão da Polícia Militar, do secretário de Comunicação Social de Paranavaí, Jorge Roberto Pereira da Silva. A professora Sandra Ferreira levou uma de suas turmas de Educação de Jovens e Adultos (EJA) para participar da discussão.

Fonte:
http://www.diariodonoroeste.com.br/

sábado, 31 de outubro de 2009

Trovas Brincantes


Tique-taque, tique-taque...
é o tempo que vai passando.
Quase tenho um piripaque,
ao ver a idade avançando!
A.M.A. Sardenberg – RJ

Quem hoje não tem e-mail
perde contato e dinheiro...
Sem e-mail a gente é meio,
não consegue ser inteiro.
Antônio da Serra – PR

Do seu posto, à sentinela,
sobre o teto do galpão,
galo duro de panela
abre a goela, canta em vão...
Ari Santos de Campos – SC

Coincidência que me arrasa,
que me assusta e me espezinha:
– Meu marido chega em casa
quando chega o da vizinha!...
Clenir Neves Ribeiro – RJ

Arruaça e bebedeira
preferiu aos seus estudos:
hoje é peso na algibeira
dos amigos de canudos!
Eliana Palma – PR

Serei, se não morrer antes,
uma idosa serelepe;
entre jovens fascinantes,
sem ser de ninguém estepe.
Mifori – SP

– Acaso tu tem morim?
– Tenho sim... ma-qui-cô-qué?
– Uai, uai... assim, assim...
de caqué-cô qui tivé...
Osvaldo Reis – PR

Não foi possível contê-lo...
sai disparado o rojão!
Ele é quem tem pesadelo
quando ela come feijão!
Renata Paccola – SP
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Trovas extraídas da Revista virtual mensal – Coordenador: A. A. de Assis Ano 10 – n. 119 – novembro de 2009

Paulo Monteiro (A Trova no Espiríto Santo – Parte VI)

Monte H, em Piúma (ES). Tela da
Escola Municipal de Educação Fundamental
Álvaro de Castro Mattos
ÁBNER DE FREITAS COUTINHO

Ábner de Freitas Coutinho, que também usa o pseudônimo de Percy Guido, é advogado e economista. Natural do Santo Antônio, Estado do Mato Grosso, onde nasceu no dia 15 de dezembro de 1926. Reside há mais de duas décadas no Espírito Santo. É professor e integra diversas instituições culturais.
Caravelas portuguesas,
mensageiras da História
foram, levando incertezas,
voltaram cheias de glórias...

Se poupança a gente encara,
logo descobre a verdade:
nossa metade mais cara
é nossa cara metade..

Meu pai, figura esquecida,
eterno semblante mudo,
o que fiz em minha vida
só a ti eu devo tudo...

Se pensar no seu irmão,
um instante, por favor,
sentirá no coração,
renascer fraterno amor!
ALBERTO ISAÍAS RAMIRES

Alberto Isaías Ramires é capixaba de Vila Velha, onde nasceu em 8 de setembro de 1924. Um dos mais representativos trovadores do Espírito Santo. Há vários anos residente no Rio de Janeiro. Militar (Capitão Rh do Exército). Autor de diversas obras e membro de várias instituições culturais do país. Ganhador de vários concursos literários.
Quando eu morrer, por favor
coloquem na minha cova
um epitáfio de amor
escrito em forma de trova!

Da vida, pelos caminhos,
uma coisa aprendi bem:
a roseira dá espinhos,
mas nos dá rosas, também...

Por nascer pobre, o Divino
num gesto compensador,
despertou, em meu destino,
a lira de trovador...

Não entendes meu desgosto,
mas aprende esta lição:
nem sempre pomos no rosto
as mágoas do coração.

Via-a rezando, contrita,
com os olhos fitos no céu.
Quanto pecado escondido
debaixo de um fino véu!...

Falar mal da vida alheia
é coisa que não convém;
quem tem telhado de vidro
não fustiga o de ninguém...

Lá se foi a meninice,
meu barquinho do papel,
minha ingênua peraltice,
meu doce Papai Noel...
ALYDIO C. DA SILVA

Alydio de Carvalho e Silva pertence a diversas entidades culturais do país. É natural de Santa Cruz, Espírito Santo, onde nasceu em 11 de abril de 1917. Industriário aposentado, reside há quase 30 anos, fora de seu estado natal. Além de poeta é romancista. Autor de centenas de trovas e outros poemas. Tem vários livros inéditos e participou de diversas antologias.
Vi num jornal estampado
o perigo que há no beijo.
Antes ser contaminado
do que morrer de desejo.

Quando passei pela estrada
e ouvi teu canto distante,
senti que a mágoa passada
reviveu naquele instante.

Carnaval, fraternidade
transitória e resumida,
onde se esconde a verdade
dos sofrimentos da vida.

Se passas muito apressada,
fugindo à minha atenção,
eu sinto a tua pisada
esmagar meu coração.

É doce morrer no mar...
Cayme receita a dose.
Só Cristo pra transformar
tanta salmoura em glicose.
AMAURY DE AZEVEDO

Também usando o pseudônimo de Yruama, Amaury de Azevedo, capixaba de Alegre, onde veio à luz em 1º de agosto de 1935, é comerciante e reside em Campos, no Rio de Janeiro. Mesmo afastado de sua terra natal, há mais de 27 anos, Amaury continua mantendo intercâmbio com poetas do Espírito Santo.
O capixaba não nega
O que lhe pedem com jeito.
Também não foge do pega,
Estufando logo o peito.

Quando toda a Cristandade
Vê passar mais um Natal,
Surgem novas esperanças
De uma paz universal.
ANDRADE SUCUPIRA

José de Andrade Sucupira é sergipano de Pacatuba. Há mais de 35 anos reside no Espírito Santo, onde militou na imprensa e foi funcionário público. Hoje está aposentado e reside em Vila Velha. Desde os anos 30 faz trovas, divulgando-as pelas páginas dos vários jornais em que trabalhou. É um dos Príncipes da Trova Capixaba, escolhidos pelo CTC. Nasceu em 22 de junho de 1909.
Meu espelho mostra a cara
sem vergonha, encarquilhada,
no corpo setenta anos,
muita canseira, mais nada.

Pela tapera da vida
O homem nasce lutando.
Luta, luta, lida, lida
e morre... sempre esperando.

No Brasil, coisa mais feia,
e coisa que mais consome...
Poucos de barriga cheia
e a maioria com fome.

Esses seus olhos traquinos
e vivos, vivos de mais,
têm nossos céus nordestinos
no verde dos coqueirais.

Sempre amar. Eis a verdade
do berço de qualquer vida.
Se o amor não tem idade...
Venha aos meus braços, querida!

Saudade... doce ternura,
espinho que se bendiz,
flor que fere com doçura
e deixa a gente feliz.
ANSELMO GONÇALVES

Pertencendo a diversas entidades culturais e por sua prática em favor da trova, Anselmo Gonçalves, capixaba de Vitória, onde nasceu em 21 de abril de 1929, é um dos mais atuantes trovadores do Espírito Santo. É funcionário público estadual e colabora na imprensa de sua terra natal.
Meu coração bate, insiste,
vai sacudindo, batendo.
A tudo ele bem resiste,
mas continua doendo.

Vela branca passa ao largo
Lá fora, longe, no mar.
Sua vida, sem embargo,
morre distante do lar.

Uma vida! Nosso amor
degringolou de repente.
Caiu da planta uma flor
resta a lembrança somente!

Toda tua indiferença
não consegue me vencer.
Sou todo amor e sou crença,
sou vida, e sou bem-querer!
ANTONIO TAVARES SUCUPIRA

Nascido em Vitória, no dia 12 de outubro do 1956, Antonio Tavares Sucupira é filho do trovador Andrade Sucupira. É, no campo profissional, engenheiro civil, formado pela Universidade Federal do Espírito Santo.
Saudades dela? Talvez?
Se se pudesse voltar
Eu nasceria outra vez
Com a mesma mãe para amar.

E um certo amigo dizia
À sua cara-metade:
Já fui preso, que ironia!
Por querer a liberdade.

Seria o mundo feliz
E só haveria glória
Se todo o povo da terra
Nascesse aqui em Vitória.
ASSUMPÇÃO BOTTI

Manoel Assumpção Botti nasceu em Vitória no dia 15 de agosto do 1916. É advogado. Autor de muitos poemas e trovas.
Que não me empolgue a subida,
Que a humildade viva em mim,
Que eu suba sempre na vida
Sem me esquecer de onde vim.

Se pintor eu pintaria
A vida com duas cores:
Um pingo azul de alegria
Num fundo roxo de dores.

Quantos contrastes abriga
Minha existência bizarra:
Obrigado a ser formiga,
Eu que nasci pra ser cigarra.

Os meus tristes olhos baços
Do que sou dão a medida:
Um coração em pedaços
Num corpo quase sem vida.
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Andréia Donadon Leal (A Bibliotecária)



Os livros estavam devidamente enfileirados nas estantes. Poucos centímetros de distância um do outro. Nenhum torto, fora de foco. As orelhas desamassadas, passadas com chapa de ferro morno. O cuidado era devidamente dado para cada um, sem discriminação. O cheiro da sala, papel. O lugar pouco iluminado, embora o requeresse. Na mesa, ao fundo, uma figura vergada e escondida na pilha de livros para carimbar. Idade avançada. Cabelos cor de prata. Rugas rasgavam ponta a ponta o rosto descorado. Uma vida inteira de cultura, diversão, viagens, um pouco de tudo mostrado pelas palavras imprensas nas páginas dos livros.

Clarice estava pouco a aposentar. A preocupação acometia seus últimos dias com a idéia. Quem iria cuidar deles? Os sonhos lhe roubavam o sono; os olhos mais fundos. Os livros, sua vida, arremessados no lixão da cidade. Livros velhos? Antigos e restaurados; relíquias. Nas manhãs a cabeça queria explodir e quase Clarice perdera a hora de trabalhar. A biblioteca da escola não funcionava sem ela. Não abriam. Ninguém sabia mexer com carinho nos livros. Não encontravam a essência da pesquisa. Também só ela dera conta até hoje de livro por livro. As capas que fazia para os que estragavam tiravam exclamações de incredulidade. Ficavam perplexos. Era muito especial. Qualquer pesquisa Clarice dava conta. Ia sempre além, explicava com precisão todos os detalhes. Sabia um pouco de tudo. Com a sacola pesada de livros restaurados entrava diariamente na biblioteca cruzando a mão direita no rosto, rezava pai-nosso e ave-maria. Uma vida dedicada somente ao trabalho e nada mais.

Clarice morava três quarteirões da escola. Casa modesta, herdada. A outra única coisa que fizera foi cuidar de sua mãe – morta havia uma década. Cuidado devido de filha exemplar, solteirona e única. Dividia parte de suas horas ora com a mãe, ora com os livros. Dona Gertrudes morrera numa manhã cinzenta de sexta-feira treze. Clarice tinha pavor destes dias, mesmo sabendo que era lenda. O sossego, a paz e o sorriso meigo que sempre faziam parte do seu perfil ficavam tensos. Mas ninguém percebia. A bibliotecária, pessoa muito estimada, querida por todos. Falavam que nem pecado tinha. Nunca arrumara um namoro. Era santa. Diziam que quando a boa dona donzela morresse iria direto para o céu. Em quase trinta anos, Clarice nunca dera uma má resposta, uma palavra feia, nenhum olhar meio torto. Mas o sonho mexia com sua rotina. Seria aviso de morte repentina? Os dias estavam findando para ela? Livros no lixão da cidade! No livro de sonhos consistia informação de algo novo na vida.

Para Clarice, novo seria o fim. Deus dar cabo na vida atribulada e solitária. Ponto final. Tudo investido em quatro paredes infestadas de livros. Histórias, informações, um mundo, o segredo da vida impressos nas páginas. A sensação, a mesma de ter vivido com emoção detalhes, aventuras, desventuras... As paixões atingiam um mundo desconhecido para ela. Não abria estas páginas. As mãos iam vez ou outra em contramão com a cabeça. Rezava vários padre-nossos e pedia logo perdão. Mesmo com os livros não recomendados, tinha obrigação de conservá-los. Não discriminava nenhum. Apenas deixava-os de lado. Um outro gosto que não combinava com uma vida afastada dos desejos e maldades da carne. Mundo desconhecido. Um fim de expediente como outro qualquer. Um dia cinzento. Frio. Clarice limpou o último livro. Fechara com cuidado as janelas pesadas de madeira. Antes de sair, mais uma olhada. Uma olhada demorada, apaixonada, precisa. Os livros estavam cada um no seu lugar. Limpos, conservados. Devidamente enfileirados. Alguns estavam sobre a mesa. Estragados, mal conservados. Daria um jeito.

Clarice dirigiu-se à mesa. Pensou em juntá-los e levá-los para casa. Antes de dormir teria tempo para arrumar uns três. Pela primeira vez o cansaço venceu. Estava ficando mesmo velha. Tinha que aposentar. Uma dor de cabeça, corpo ruim. Com a idade, a gripe costumava visitá-la mais vezes no ano. E este frio piorava tudo. Em casa tomaria um chá quente. O resfriado iria embora.

Ainda com os olhos sobre a mesa de livros, Clarice pensava. Não viu quando um rapaz chegou e ficou olhando para ela. Alheia ao tempo e tudo. Voltou quando escutou um pigarro. Pela primeira vez, corou. Será que o rapaz pensaria que estava esclerosada? Falava sozinha? De vez em quando fazia isto. Costume de vida solitária. Ela, só na sua companhia. Mas, daí? Nunca importava. Não ligava. Ajeitou a postura, prontificou-se. O rapaz, viajante. Hoje iria demorar. O mal estar ficaria para depois. Certamente ele mostraria catálogos e mais catálogos de livros. Compra de livros.

Esquecera por completo.

O rapaz da editora sentou. Com os olhos puxados e enigmáticos abriu os catálogos. Mãos grandes e unhas bem aparadas. As mãos do rapaz. Clarice imaginou como seria o toque delas. Chegou a esbarrar sua mão. Desconfiou estar com febre. O danado do resfriado desestruturou tudo. O rapaz falava. Voz macia. Dentes brancos. Lábios bem desenhados. Clarice não escutava. Olhava para o rosto dele. Enfeitiçada. Como seria beijar aqueles lábios? O viajante perguntou algo, não respondeu. Não o ouvira. As mãos dele falavam. Tudo que queria era sentir o toque macio das mãos no rosto pálido. Aquelas mãos esquentariam a pele até torná-la corada, sadia. Uma vontade quase incontrolável.

Clarice pensou aterrorizada ter pedido ao viajante para acariciar-lhe o rosto. Um toque apenas, por favor. Fechou os olhos. Sentiu o calor das mãos do rapaz. Aquecida. Estava mesmo carente. Esqueceu de oferecer um chá para o viajante. A bibliotecária educada, contida, estava ficando lerda. Velha. O rapaz novamente perguntou. Voz grave, hálito cheiroso. Cheiro de menta. Um sorriso separou seus lábios. Clarice despertou dos pensamentos. Pediu desculpas. A explicação, pouco convincente, o cansaço, a gripe prestes a sair do corpo. O viajante sorriu. Os olhos também sorriram. Separou catálogos. Entregou um a um. Roçou as mãos. Olhou profundamente para ela. Chegou próximo. Mais alto que parecia. Mais bonito. Muito próximo. Clarice chegou a pensar que o viajante iria beijá-la. Fechou os olhos imaginando a cena. Nunca sentira um roçar de lábios e o gosto de uma boca que não fosse a sua.

Delicadamente as mãos do viajante passaram pelo rosto dela. Uma fração de segundos. Uma vida inteira, só. Um dia, um desejo. Toque como imaginara: suave, quente, delicado, gostoso... Uma última olhada apaixonada nos livros e com a chave passou a tranca na porta da biblioteca.
–––––––––––––––––––-
Obs: Este conto foi escrito em um parágrafo. Contudo, para não tornar a leitura cansativa em uma tela do computador, tomei a liberdade de parti-lo em alguns parágrafos. O texto permanece o mesmo, sem ser alterada a sequência.

Fonte:
Jornal Aldrava Cultural. http://www.jornalaldrava.com.br/

Alunos do Colégio Almeida Junior (Itú/SP) lançam livro Leituras



Os alunos do colégio colaboraram com textos, poesias e desenhos

Para a alegria de alunos, professores, direção e pais, será lançada no dia 4 de novembro a terceira edição do livro “Leituras”, uma coletânea de textos dos alunos do Colégio Almeida Júnior.

Desde a primeira edição, a repercussão deste livro tem sido realmente muito boa. É uma satisfação imensa e uma grande alegria para todos nós do colégio”, disse a diretora do “Almeida”, Rita Pascale. O lançamento do livro ocorrerá através de uma parceria com a Livraria Nobel, a partir das 18 horas, no espaço de eventos do Plaza Shopping Itu.

Além do lançamento do livro, na mesma noite será aberta a exposição “Aprender é um convite”, com diversas obras dos alunos do Colégio Almeida feitas na disciplina de Artes. Esta exposição poderá ser vista também durante toda a quinta-feira no Plaza Shopping.

O livro “Leituras”, na verdade, nasceu como uma consequência de um projeto inédito nas escolas da cidade de Itu, que foi a criação da Academia Júnior de Letras, que chegou a reunir 35 “acadêmicos”, todos alunos do Colégio Almeida Júnior.

Estes alunos tinham produções excelentes, textos realmente muito bons. Resolvemos juntar em um livro esses textos aos de outros alunos que não faziam parte da academia, mas que também escreviam muito bem, e o resultado foi espetacular”, ressalta Rita.

São textos das mais diversas modalidades literárias, desde crônicas, narrativas, dissertações, a poesias e contos, além de desenhos, no caso das crianças do Ensino Infantil. “Elas expressam seus pensamentos por meio dos desenhos que também estão no livro”, salienta. Esta terceira edição do livro possui textos de 2008 e 2009, já que o “Leituras” é lançado a cada dois anos. O livro foi editado pela Ottoni Editora.

Fonte:
Douglas Lara. http://www.sorocaba.com.br/acontece

Jean-Pierre Bayard (História das Lendas) Parte II



CAPÍTULO II

DIVULGAÇÃO DOS CONTOS

1 — Teoria das Migrações

Gaston Paris estudou, depois de Benfey, a migração do contos orientais na literatura da Idade Média. — Cosquin, o inglês Clouston, o alemão Landeau, estabeleceram paralelos entre as novelas de Bocácio e as fontes orientais.

Buscaram, para cada conto, a estrada percorrida: foi a teoria dos motivos errantes ou a teoria das migrações. Max Müller aponta sempre a Índia como fonte comum e o russo Stassov (1868) diz a mesma coisa e foi por isso criticado pela sua falta de patriotismo.

É preciso analisar com atenção as semelhanças, as condições históricas, a fim de reconhecer o tema pois se o conto toma de empréstimo o seu motivo ele adquire, de formo mais ou menos rápida, um caráter nacional. Os russos Vesselovski e Vsevolod Miller determinaram as trajetórias dos motivos emprestados e reconheceram uma influência turco-mongólica.

Joseph Bedier (Fabliaux), conforme a escola antropológica, manifestou dúvidas sobre o método de Benfey; julgou-se que as aproximações fossem vãs e a busca limitou-se ao que ligava essa obra à poesia nacional. O russo Oldenburg, zombando das dificuldades, provou serem os fabliaux oriundos da antiga Índia. O tcheco Polivka e o alemão Bolte forneceram também uma relação dos possíveis paralelos existentes entre cem contos de Grimm (Remarques sur les contes enfantins et familiaux de Grimm - Observações sobre os contos infantis e familiares de Grimm).

Com efeito, é curioso notar que as aventuras de Ulisses se assemelham às de Sindbad, o marujo e que o prólogo de Mil e uma noites relata a história de uma jovem chinesa, conto budista, traduzido para o chinês no século III (tradução Chavannes, conto n.o 109). Miss R. Coxe, numa monografia, conta quatrocentos variantes de Pele de burro e Gata Borralheira. Além das dos autores já citados, notemos as variantes erguidas por René Basset, Dähnhardt, Adolphe Pictet, Buslaiev e Afanassiev.

2. — A influência da Índia

Quando o conto primitivo, ou assim suposto, se libertou de todos os elementos transitórios e permanentes, sua variante foi discernida na literatura hindu, que penetrou na China antes do budismo. A maioria dos contos são encontrados no Extremo Oriente, dois séculos antes da nossa era. A influência budista, as invasões mongólicas contribuíram para a divulgação dos contos hindus que formam a base das coleções folclóricas.

3. — Migração dos Contos e dos povos

A migração dos contos nos é desconhecida e podemos quanto muito construir teorias mais ou menos plausíveis conforme nossa imaginação.

Além da influência budista e das invasões mongólicas, em conseqüência das conquistas árabes, toda a costa barbaresca e a Pérsia sofreram a influência asiática. Eis porque Mil e uma noites têm influência pérsica cuja cultura provinha da Índia. E preciso pesquisar a marcha do conto em relação à marcha do indivíduo.

A migração dos povos foi estudada por Elliot Smith, Maximo Soto Hall; os antigos egípcios seriam descendentes dos Maias que haviam emigrado para a África. A Atlântida, esse antigo continente, teria formado uma ligação natural entre a Europa e a América. Entretanto, conforme a notável teoria de Wegener sobre a separação dos continentes, a América seria um bloco que se desprendeu da Europa e da África. Realmente essa cisão parece que se produziu antes da aparição do homem. Contudo, se nos referimos ao sábio americano Libbey, que estudou as propriedades radioativas do carbono contido nos vestígios orgânicos (o “C 14”), nossas civilizações datariam de trinta mil anos (época pleistocena). Ora, há trinta mil anos, a Ásia e a América se juntavam: O Alasca e a Sibéria ainda não haviam sido separados pelo estreito de Behring. Canals Frau (Préhistoire de l’Amérique, 1953), é de opinião que grupos de emigrantes asiáticos aventuraram-se nas planícies norte-americanas, numa época imediatamente anterior ao último máximo da glaciação Wisconsiniana. Conforme os geólogos e Antevs, essa última glaciação, denominada Mankato, ter-se-ia produzido aproximadamente em 25.000 a. C.

Canals Frau supõe que nova onda emigratória asiática tenha-se produzido na época mesolítica; essa civilização esquimó teria, há três ou quatro mil anos, dominado a Sibéria e se teria fixado no litoral ártico da América. Esses homens teriam atravessado a América de norte a sul a fim de atingirem a Terra do Fogo.

É indiscutível que nossos antepassados viajavam e só a falta de documentos deu origem ao julgamento de que esses povos se ignoravam uns aos outros, Serviam-se das correntes naturais e a expedição Kon Tiki provou ser possível a travessia do oceano, de jangada, desde a América até os Mares do Sul. As monções favoreciam as viagens entre o Oriente e o Ocidente. Os malaios invadiram as ilhas polinésias com a ajuda de grandes vapores providos de balanceiros.

Os monumentos deixados pelos habitantes da antiga América testemunham uma civilização adiantada injustamente podada em todo o vigor da sua seiva, quando da invasão espanhola, no século XVI. Eis porque, nas margens do Mississipi, os rochedos estão eivados de caracteres que parecem ser fenícios; rochedos trêmulos que evocam monumentos druídicos; no hemisfério austral, imensas ruínas de outeiros assemelham-se às sepulturas do norte da Ásia. A admirável pirâmide de Paplanta, a fortaleza européia de Xochialco, o emprego do cimento no templo situado nas imediações de Santa Fé, fazem supor que a América era conhecida pelas civilizações hindus e européias antes da viagem de Cristóvão Colombo; a tradição deve ter-se apagado um pouco e a mensagem das antigas civilizações nem sempre foi transmitida.

Eis porque, nas imediações de Montevidéu, uma pedra tumular registra, em caracteres gregos, que um capitão heleno aportou nessa terra americana no tempo de Alexandre. Um contemporâneo de Aristóteles também pisou o solo brasileiro. Nas crônicas, Madoc, filho do príncipe de Gales, abriu velas em 1170, dirigindo-se para o oeste e descobriu terras férteis; porém, já em 942, os normandos haviam aportado na Groenlândia passando pela Islândia. Isto justificaria terem tribos do Missouri também falado a língua céltica. Humboldt admite que os tártaros e os mongóis tenham passado do norte da Ásia às regiões setentrionais da América antes do século VI; os chineses comerciaram com os americanos bem como o cartaginês Himilcon. Salomão e Hiram enviaram os fenícios para as regiões americanas conhecidas, sem dúvida, pelo nome de Ofir e Társis.

É um erro julgar que os povos antigos eram selvagens e bárbaros; nossa falta de conhecimentos a esse respeito não prova essa asserção. Cristóvão Colombo deve ter ficado surpreendido quando encontrou entre esses “selvagens” a nossa cruz latina que figurava ainda nas esculturas colossais da cidade de Palenque, no México.

Depois da sensacional descoberta do Vixenu, por René joffroy (1952), compreende-se que o prestígio das artes gregas e italianas estendia-se à Gália céltica. O oppidum do monte Lassois (perto de Châtillon-sur-Seine) seria uma base dessa rota do estanho; e os móveis funerários, as jóias ítalo-gregas do século VI antes da nossa era, a bacia de bronze de fabricação etrusca, encontradas nessa parte setentrional da Borgonha, então somente céltica, colocam um enigma que provoca dúvidas sobre as influências da Etrúria ou das regiões greco-cíticas de passagem pela Grécia.

Os egípcios conheciam os movimentos planetários e as dimensões do nosso globo terrestre quando Galileu quase foi queimado vivo por ter adotado o sistema de Copérnico. Nossas descobertas modernas já haviam sido precedidas pela Escritura, nossas verdades físicas foram por muito tempo desconhecidas e ignoradas, enquanto que os Livros Sagrados ficam no limite da verdade e na harmonia de nossas mais recentes observações, cuja exatidão são apenas confirmadas por nossas pesquisas científicas; em compensação não havia na Antigüidade a mesma concepção do tempo e do seu emprego de hoje; conhecimentos provinham de uma reflexão amadurecida no recolhimento e no silêncio, alheio a qualquer agitação.

Além dos mercadores, as guerras muito contribuíram para a divulgação dos contos. Essa divulgação deve-se às conquistas de Alexandre da Macedônia e ao período helênico (do fim do IV ao II séculos antes da nossa era); depois as conquistas árabes (1.o milênio da era cristã) e finalmente à época das cruzadas (do X ao XII séculos).

A transmissão oral foi muito importante. Foi dessa forma que Pitágoras tomou conhecimento das religiões da Índia, quando já convivia com os magos da Caldéia. Esse sábio grego, contemporâneo de Buda — que talvez tenha encontrado — e de Confúcio, participava das idéias do hindu e do chinês e esses três homens pregavam o mesmo evangelho. As descobertas e os pensamentos existem, pois, no tempo e se transmite de forma desconhecida.

Walter Scott observa que a impressão era inexistente, os vedas e os edas noruegueses, a Bíblia só foram escritos depois de haverem sido transmitidos oralmente. Deve-se à inspiração popular a criação da Odisséia e dos Niebelungen.

Fonte:
BAYARD, Jean-Pierre. História das Lendas. (Tradução: Jeanne Marillier). Ed. Ridendo Castigat Mores

Escritores Canoenses em Porto Alegre



Livros dos Escritores Canoenses na 55ª Feira do Livro de Porto Alegre (de 30/10/09 a 15/11/09)

Barraca 87 (Editora Alternativa)

ACE (I Coletânea) Contos/Cronicas
ACE (II Coletânea) Contos/Cronicas
Ancila/Mari Rigo (Nas Asas da Poesia) poemas
Canabarro Tróis (À Procura de Deus e do Outro) poemas
Casa do Poeta (I Coletãnea) poesias/contos
Casa do Poeta (II Coletânea) poesias/contos
Casa do Poeta (III Coletânea) poesias/contos
Etevaldo Silveira (Caravelas Sinistras) poemas
Etevaldo Silveira (A Saga da Castorina) História
Etevaldo Silveira (O Choro da Casa Triste) Contos
Gerson Colombro (Solilóquio) Contos
Jairo Souza (Quem Diria...Matemática) infantil
Jairo Souza (Maraiana) infantil
Jairo Souza (Alma Nua) Poemas
Mª Luci Leite (Expressões D’alma) poemas
Marina Lima Leal (20º Núcleo CPERS) Artigos
Marina Lima Leal (Contruindo a Escola Democrática) Artigos
Marina Lima Leal (A Gestão Democrática da EP) Artigos
Neida Rocha (Danilo, sua Mochila e seus Amigos) infantil
Neida Rocha (Minha Não Metade) poemas
Neida Rocha (Efemérides) poemas
Nelsi Urnau (In quietude) poemas
Nelsi Urnau (Cecília e Amigos) infantil
Nelsi Urnau (Zé Toquin) infantil
Nemézio Meirelles (Estrelas cadentes) poemas
Nestor Mayer (Memória Ambiental da Cidade de Canoas) Artigos
Nestor Mayer (A Teia da Vida) crônicas
Roberto Pires (Sociedade Alternativa) crônicas

Fonte:
Neida Rocha