quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Aluísio de Almeida (Três Contos Populares)



O BARBA DE OURO E A CARANTONHA

Havia um rei que tinha uma bonita barba de ouro. E um dia ele foi chamado ao quarto da rainha para ver a criança que acabava de nascer. Mas esse barba de ouro era encantado e mau. Assim que viu o lindo menininho, pegou e foi comendo-o à vista de todos.

A rainha, quando de novo estava esperando outra criança, combinou com a comadre para lograrem o rei. Arranjaram um coelhinho. Chamaram o barba de ouro e lhe apresentaram o filho. Ah! O rei comeu o coelhinho e gostou.

A comadre levou a criança, que era uma menina, para criar por uns camponeses a um outro reinado. A menina foi crescendo, crescendo. Os pais adotivos eram pobres, não sabiam o que fazer com ela. E já estava em ponto de casar.

Então mataram uma ovelha, tiraram-lhe a pele e vestiram com ela a mocinha, que ficou que nem um bicho. A madrinha, que era uma fada, pôs-lhe no dedo um anel que era para ela pedir o que precisasse. E subiram as água-furtadas da casa, despediram-se da moça e, dizendo-lhe que se fosse com Deus, pelo mundo, empurraram-na da janela.

Aquela coisa foi, foi, ao leu do vento e, enfim, caiu na floresta. O bicho ficou por ali, quieto. Ouvia as cornetas: tu, tu, ru, tu, e latidos dos cães. O rei estava à caça. E então apareceram os caçadores e já levavam a arma à cara, quando o rei ordenou: não atirem!

O rei desse reinado era moço e curioso. Achou esquisito aquele bicho que falava como gente. Levou-o para a cozinha do palácio e pôs-lhe o nome de Carantonha.

A Carantonha assistia às festas de longe.

Uma ocasião ouviu contar, na cozinha, de três grandes bailes que o rei ia dar em seguida, para escolher a sua noiva.

Em todo o reinado, era um reboliço fora dos costume e costureiras e alfaiates não tinham mãos a medir. As moças queriam ser princesas.

O rei gostava de ver sempre a Carantonha, que lhe prestava serviços, muito humilde.

Carantonha segurava a bacia de prata para o rei lavar as mãos.

– Vossa majestade me deixa ir na festa?

- Tu, Carantonha?

O rei falou assim e borrifou o rosto dela, brincando. O que é que ela ia lá fazer? Carantonha saiu chorando para o seu cantinho da cozinha. Só então é que se lembrou do anel. Esfregou-o e disse:

- Anel, pelo poder que Deus te deu, quero que me arranjes um vestido cor da terra e uns chapins muito bonitos! – Imediatamente Carantonha viu-se transformada naquela princesa mais bonita e procurou as salas de baile sem que ninguém percebesse. Opa! Foi um sucesso! O rei dançou com ela e quase só com ela. Perguntou-lhe donde era e Carantonha respondeu: - Eu sou da terra dos borrifos de água. E tratou de sair despercebida, para a cozinha, vestindo de novo a pele de ovelha.

No outro dia a criadagem não falava de outra coisa: da nova princesa que aparecera e ninguém sabia de que reinado era.

Quando ela foi apresentar a toalha ao rei, pediu-lhe licença para ir ao baile. O rei atirou-lhe a toalha: - Tu, Carantonha?

Lá foi a moça para o seu cantinho da cozinha, esfregou o anel, e:

- Hoje quero um vestido cor de céu. E já estava como uma princesa. E foi entrando com jeito no salão. Opa! Que sucesso! O rei dançou com ela até a madrugada. Perguntou-lhe donde era. – Eu? Eu sou da terra do joga a toalha. E tratou de escapulir-se.

No terceiro dia, enquanto o rei lavava as mãos depois do jantar, Carantonha pediu-lhe outra vez a licença para ir ao baile.

– Tu, Carantonha? E o rei deu-lhe um tapinha na cara, brincando.

A moça pediu ao anel o vestido cor do mar, muito mais lindo que os outros. E entrou no salão. Já o rei foi recebê-la e dançaram, dançaram.

– Donde és, bela princesa? Quero casar-me contigo, disse-lhe o rei.

– Eu? Eu sou da terra do leva um tapa.

Mais tarde a Carantonha escapou e foi vestir sua pele na cozinha.

Estava acabando o baile. O rei resolveu descobrir o enigma. A princesa acabava de desaparecer. Devia estar ainda no palácio. O rei mandou a polícia ocupar todas as saídas e quando as moças iam saindo examinava uma por uma a ver-lhe o vestido cor do mar e as feições do rosto, que muito bem lembrava. Nada! Ninguém! Examinou depois as camareiras do palácio. Carantonha pediu ao anel o mesmo vestido cor do mar, cobriu-se com a pele e ficou esperando. O rei estava certo que ninguém saíra. E então só faltava examinar a Carantonha. Ele já andava desconfiado. Por isso chegou de repente, puxou a espada e rasgou-lhe um pedaço da pele. Apareceu o vestido – Ah! É assim? – disse o rei, riscou a pele de alto a baixo e Carantonha apareceu se rindo, nos modos e no porte de uma princesa.

Os cortesãos estavam admirados! Que coisa!

Mas o rei, meio carrancudo, interpelou a moça.

– Tu estavas zombando de mim? Olha, que eu não sou para brincadeiras. Porque é que me dissestes que era da terra dos borrifos de água?

- Ué! Então vossa majestade não se lembra mais que quando pedi para ir ao baile da primeira noite me esborrifou a água no meu rosto?

- Ah! Tens razão. E porque na segunda noite disseste seres da terra do joga a toalha?

- Porque vossa majestade, quando pedi para ir ao baile, me jogou a toalha.

– Ah! É verdade. E na terceira noite tu erra da terra leva um tapa.

– Pois sim! Vossa majestade, quando lhe pedi para ir ao baile, me deu um tapa, brincando.

Em seguida, o rei apresentou a noiva aos cortesãos e convidados, marcou-se o dia das bodas. À hora do banquete, a nova rainha, como era costume, contou uma história. A história dela, a sua infância escondida, a caçada real, a madrinha boa fada. O barba de ouro era falecido, e a rainha mãe dela. Os pais adotivos vieram morar no palácio. Parece que ainda existem, arcadinhos, arcadinhos, mas contentes da vida!

* * *

Contou Luís Maria Ferreira, que lhe contou uma tia de seu pai lá por 1880, na Ilha da Madeira. Variante da conhecida Pele de burro com a Maria Borralheira, mais a interposição de um elemento novo, o barba de ouro, para explicar o motivo da transmutação, deixadas em paz as pobres madastras.

BOCA CALADA SALVA A VIDA

Havia um velho pai que não cansava de dizer aos filhos: - "Boca calada! Boca calada salva a vida!". Um dos filhos guardou bem o conselho e saiu pelo mundo.

Uma vez ele entrou numa casa, onde viu uma mulher enterrada no chão até a cintura.

Ficou com muita vontade de falar, de perguntar porque era aquele castigo. Mas quando ia abrir a boca, lembrava-se do conselho.

O homem da casa, então, começou a provocar o mocinho:

- Pergunte porque ela está enterrada? Vamos fale!

Acontece que esse homem mau matava quem perguntasse. O menino não dizia nada. Por fim, o homem ficou vencido. Ele se ajoelhou perante a mulher, lhe pediu perdão e a desenterrou, dizendo que esse menino era um justo.

* * *

Contou Maria Lima Rodrigues, de Itapetininga. Esta "estória" pertence à categoria das histórias de exemplo, moralizantes. Parece ser o resumo de outra mais comprida, que ouvimos em Sorocaba, e de que damos os pontos principais. Título: Pensar três vezes antes de falar qualquer coisa. Enredo: soldado que vai servir o rei. Um ano depois, em vez de soldo, recebe um bolo, para abrir só quando estiver com a família e aquele conselho. De volta, pede pousada numa casa, cujo dono lhe mostra a esposa enterrada até a cintura, mas ele nada pergunta, e, por isso, leva-o até uma sala cheia de armas, dando-lhe a melhor carabina. Explica-lhe: todos os que perguntaram matou-os confiscando-lhes as armas. A mulher estava sofrendo aquele castigo por ser linguaruda. Chegando em casa, o soldado abriu o bolo, e tilintaram muitas moedas de ouro que o rei ali fizera esconder. Era, de fato, um soldado obediente, mesmo depois de dar baixa... E merecia o pago.

A MULHER CURIOSA E O GALO

Era uma vez um homem que entendia a linguagem dos bichos. Passeava com a mulher pelo campo. Quando ouviu dois cavalos conversarem, e deu uma bruta risada.

A mulher perguntou-lhe porque se ria. O homem respondeu:

- Por causa da conversa dos dois cavalos.

Então, ela começou a instar com o marido para lhe referir a dita conversa.

– Eu bem podia contar a você o que os cavalos conversaram, mas na mesma hora que acabar de contar, morrerei.

– Mas eu quero saber! – retrucou a mulher curiosa.

– Então você quer que eu morra?

- Não sei nada disso! Tem de me contar a conversa dos cavalos!

A discussão durou muitos dias. O pobre homem ficou meio zonzo. Viu que não convencia a mulher e entregou-se.

- Olha, mulher sem coração! – falou ele – eu vou contar a você a conversa dos cavalos, mas melhor aprontar tudo para o enterro! (Dizia isto pensando que a mulher se arrependesse a última hora).

Mandou comprar o caixão, e as velas e assentou-se na rede muito triste.

O galo subiu no caixão, bateu as asas e cantou.

A cachorrinha, que estava num canto, pensativa, falou ao galo:

- Galo, coração de pedra! Você tem coragem de cantar na despedida de nosso dono?

- Canto e mais que canto. Ele vai morrer, porque é um moleirão e se entregou à mulher. Porque ele não faz como eu, que no terreiro tomo conta de vinte galinhas?

O homem ouvindo isso, criou coragem, de repente. Mandou o empregado trocar o caixão e as velas por um chicote.

E depois pegou o chicote e perguntou a mulher:

- Você ainda quer saber a conversa dos cavalos?
- Quero, como não?

- Pois foi assim.

E lepte, lepte, lepte, nas costas da mulher, que dava cada grito!

Parou um pouco.

– E... você ainda quer saber?

- Quero sim!

Continuou a tunda com todas as regras, até que a curiosa ajoelhou e pôs as mãos, murmurando entre soluços.

– Pelo amor de Deus! Chega! Maridinho do meu coração, não quero mais saber da conversa dos cavalos. Nunca mais!


Esta história contou-a em Sorocaba dona Guilhermina Borges. É de encantamento e exemplo ao mesmo tempo.

Agora abrindo as primeiras páginas das "Mil e uma noites", vemos que o vizir, pai de Sherazade, ao tentar dissuadi-la das núpcias mortais com o sultão, conta-lhe a história do burro e do boi, cuja conversa um homem ouviu e não quis referir à esposa. Esta resolve fazer greve de fome. O marido convoca os parentes da mulher e nada consegue. Ela quer mesmo saber o que o burro disse ao boi. Quando o homem vai desatar a língua, o cachorro se dirige ao galo censurando-o por ele continuar a viver com as galinhas, como antes. O galo retruca que pode dar conta de cinqüenta, e o homem se deixa dominar por uma. Este pega o chicote e... conta tudo tudo a mulher, que em prantos promete recomeçar a comer e ser boazinha. Os parentes dão os parabéns ao esposo e retiram-se.

A pequena diferença do caixão e velas é um colorido local...

E o galo cantando no caixão é para modificar o realismo um tanto chocante do conto oriental.

É evidente que o nosso conto foi tirado das Mil e uma noites, em época que nunca saberemos dizer, pois o que hoje se conta de boca em boca pode ser composição recente, antiga, antiqüíssima. Pode vir dos mouros da península...

A influência das Mil e uma noites é geral em todos os contos de encantamento. Por exemplo, no segundo deste artigo, onde aparece a mulher enterrada até a cintura é, não obstante, vivendo. Ora, logo nas primeiras noites daquele livro imortal, aparece o príncipe, rei das Quatro Ilhas, transformando em mármore, da cintura para baixo.

No primeiro conto vê-se, além do encantamento, a influência oriental nos três enigmas de nomes.

Cabe aqui uma reflexão de ordem geral. Os contos de encantamento não são incoerentes. O autor recorre ao milagre ou à magia, mas observa certos limites. Na revista Eu sei tudo, lemos a tradução de um conto de autor inglês ou americano, baseando-se nas Mil e uma noites, naquele primeiro trecho em que um pescador pesca um vaso com o selo de Salomão, e do qual sai um gênio. O escritor moderno tira grandes e alegres efeitos do motivo principal, obtendo, por exemplo, que o doutor vá tirar a pressão de um doente e ouça no fone um rádio... Logo adiante, o pescador pede ao gênio que transforme os três empregados do hospício ainda no carro de doidos, em três elefantezinhos cor-de-rosa. A cor de rosa atrapalhou o escritor que num lance feliz, nos mostra os três animais entrando a portaria do hospício e termina esse episódio passando para outro, com uma frase inesperada: "Bem, aí a incoerência
foi demais".

O povo que conta essas estórias não as inventa. Foi um do povo, um "intelectual", com licença da palavra, que as inventou de acordo com as tendências do povo, e o povo vai transmiti-las de geração em geração.

Fontes:
– Almeida, Aluísio de. "Três contos populares". Jornal O Estado de São Paulo, 4 de setembro de 1949

Elomar (O Poeta Cantador)


ACALANTO

Certa vez ouvi contar
Que muito longe daqui
Bem pra lá do são francisco, ainda pra lá...
Em um castelo encantado,
Morava um triste rei
E uma linda princezinha,
Sempre a sonhar...

Ela sempre demorava
Na janela do castelo
Todo dia à tardezinha, a sonhar...
Bem pra lá do seu castelo,
Muito além, ainda mais belo,
Havia outro reinado,
De um outro rei.

Certo dia a princesinha,
Que vivia a sonhar
Saiu andando sozinha,
Ao luar...

E o castelo encantado
Foi ficando inda prá lá
Caminhando e caminhando,
Sem encontrar.

Contam que essa princezinha
Não parou de caminhar,
E o rei endoideceu,
E na janela do castelo morreu,
Vendo coisas ao luar.
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CANTO DO GUERREIRO MONGOIÔ

Uiúre iquê uatapí apecatú piaçaciara
Unheên uaá uicú arauaquí ára uiúre Ianêiara
Depois, depois de muitos anos
Voltei ao meu antigo lar
Desilusões qui disinganos
Não tive onde repousar
Cortaram o tronco da palmeira
Tribuna de um velho sabiá
E o antigo tronco da oliveira
Jogado num canto prá lá
Qui ingratidão prá lá
Adeus vô imbora pra Tromba
Lá onde Maneca chorô
De lá vô ino prú Ramalho
Prú vale verde do yuyú
Um dia bem criança eu era
Ouvi de um velho cantador
Sentado na Praça da Bandeira
Que vela a tumba dos heróis
Falou do tempo da conquista
Da terra pelo invasor
Qui em inumanas investidas
Venceram os índios mongoiós
Valentes mongoiós
Falou de antigos cavaleiros
Primeiros a fazer um lar
No vale do Gibóia no Outeiro
Filicia, Coati, Tamand[ua
Pergunto então cadê teus filhos
Os homens de opinião
Não dói-te vê-los no exílio
Errantes em alheio chão
Nos termos da Virgem imaculada
Não vejo mais crianças ao luar
Por estas me bato em retirada
Vou ino cantar em outro lugar
Cantá prá não chorar
Adeus vô imbora do ri Gavião
No peito levarei teu nome
Tua imagem nesta canção
Por fim já farto de tuas manhas
Teus filtros tua ingratidão
De deixo entregue a mãos estranhas
Meus filhos não vão te amar não
E assim como a água deixa a fonte
Também te deixo prá não mais
Do exílio talvez inda te cante
Das flores a noiva entre os lenções
Dos brancos cafezais
Adeus, adeus meu-pé-de-serra
Querido berço onde nasci
Se um dia te fizerem guerra
Teu filho vem morrer por ti
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UM CAVALEIRO NA TEMPESTADE

- Quem é quem chega a estas horas
que insiste a demora
na porta a bater?
bandidos vagam às escuras
da noite à procura
de quem mal fazer
- abrí-me a porta ó senhora
um instante é a demora
só enquanto sossega
o corcel que transporta-me
através de tempos espaços e eras
sem poder negar a animal condição
medo ao fulgir do raio
e o rugir feroz do trovão
não temais pela donzela
da alcova as janelas travadas estão
o perigo é a descrença
e o inimigo avança
num mundo em falência
abrí-me senhora
porta ou consciência
não ouves cá fora
o rugir do trovão?
- buscam na noite os morcegos
sem trégua e sossego
o sangue a volar
em forma de anjo os demônios
com ardis mais medonhos
nos tentam enganar
- saí de vossos cuidados
por armas não porto
nem punhais nem dardos letais
só a espada de luz
a palavra do Sagrado Mestre
que vos acalenta
em vossas aflições
que bane a insegurança
respondo a paz nos corações
- mesmo em face à tempestade
é uma temeridade
vos a porta abrir
vejo a tormenta já é finda
no vadis ainda mais eu quero ouvir
- eis que é cessada a procela
vou indo embora
ao lume da estrela
meu nome? Se importa
assenteis nos livros
de anais desta Casa
quem em noite varrida
negastes guarida
aos guardiões da vida
a Fé e a Esperança
e a própria Caridade
==========

Fontes:
Letras extraídas dos Cds de Elomar
"Nas barrancas do Rio Gavião"
"Na quadrada das águas perdidas"
"Cartas Catingueiras"

Vinicius de Moraes (Elomar…das barrancas do Rio Gavião)


Texto de Vinícius de Moraes, para a contracapa do LP "Elomar ...das barrancas do Rio Gavião", de 1973:

"A mim me parece um disparate que exista mar em seu nome, porque um nada tem a ver com o outro, No dia em que "o sertão virar mar", como na cantiga, minha impressão é que Elomar vai juntar seus bodes, de que tem uma grande criação em sua fazenda "Duas Passagens", entre as serras da Sussuarana e da Prata, em plena caatinga baiana, e os irá tangendo até encontrar novas terras áridas, onde sobrevivam apenas os bichos e as plantas que, como ele, não precisam de umidade para viver; e ali fincar novos marcos e ficar em paz entre suas amigas as cascavéis e as tarântulas, compondo ao violão suas lindas baladas e mirando sua plantação particular de estrelas que, no ar enxuto e rigoroso, vão se desdobrando à medida que o olhar se acomoda ao céu, até penetrar novas fazendas celestes além, sempre além, no infinito latifúndio.

Pois assim é Elomar Figueira de Melo: um príncipe da caatinga, que o mantém desidratado como um couro bem curtido, em seus 34 anos de vida e muitos séculos de cultura musical, nisso que suas composições são uma sábia mistura do romanceiro medieval, tal como era praticado pelos reis-cavalheiros e menestréis errantes e que culminou na época de Elizabeth, da Inglaterra; e do cancioneiro do Nordeste, com suas toadas em terças plangentes e suas canções de cordel, que trazem logo à mente os brancos e planos caminhos desolados do sertão, no fim extremo dos quais reponta de repente um cego cantador com os olhos comidos de glaucoma e guiado por um menino - anjo a cantar façanhas de antigos cangaceiros ou "causos" escabrosos de paixões espúrias sob o sol assassino do agreste.

Elomar nasceu em Vitória da Conquista, cidade que também deu vez a Glauber Rocha e Zu Campos, e depois de formar-se em arquitetura pela Universidade Federal da Bahia, ocupa atualmente o cargo de Diretor de Urbanismo em sua cidade. Mas do que gosta realmente é de sua caatingueira, uma das mais ásperas do sertão brasileiro, onde cria bodes e carneiros. Já me foi contado que um de seus reprodutores, o famoso bode "Francisco Orellana", quando a umidade do ar apresenta seus índices mais baixos - que usualmente é 10 graus - senta-se em posição estratégica sobre as patas traseiras e não se peja de urinar na própria boca, de modo a aproveitar, num instintivo e engenhoso recurso ecológico, a própria água do corpo para dessedentar-se.

E tem a onça. Vez por outra, a madrugada restitui a carcaça sangrenta de um bode ou um carneiro, e todas as preocupações cessam, a não ser chumbar a bicha. E a conversa entre os fazendeiros fica sendo apenas essa: onça, suas manias, suas manhas, seus pontos fracos.

Todo mundo se oncifica. Elomar sai à noite para tocaiá-la, e quando a avista só atira nela de frente.
- Um bicho que vem de tão longe para matar meus bodes, esse eu respeito! - diz ele em seu sotaque matuto (apesar da boa cultura geral que tem) e que faz questão de não perder por nada, enojado que está da nossa suposta civilização.

Quando lhe manifestei desejo de passar uns dias em sua companhia e de sua família (Elomar é casado e tem um par de filhos, sendo que a menina tem o lindo nome de Rosa Duprado) para descobrir, em sua companhia e ao som do excelente violão que toca, essas estrelas reconditas que já não se consegue mais ver nos nossos céus poluídos, Elomar me disse:
- Pode vir quando quiser. Deixe só eu ajeitar a casa, que não está boa, e afastar um pouco dali minhas cascavéis e minhas tarântulas...

É... Quem sabe não vai ser lá, no barato das galáxias e da música de Elomar, que eu vou acabar amarrando um bode definitivo e ficar curtindo uma de pastor de estrelas..."

Vinícius de Moraes
Abril de 1973

Ricardo Lísias (Lançamento do "Livro dos Mandarins")



'O Livro dos Mandarins' é um retrato do mundo corporativo

Sujeito raro, Paulo tem um objetivo único. Diretor de um banco multinacional, ele pretende trabalhar na China para depois atuar na matriz da empresa, em Londres. Cumpre direito as obrigações, trabalha até tarde, comporta-se racionalmente, é fiel ao empregador. Perfil exemplar. Tudo daria certo. Mas Paulo esqueceu de combinar o seu desejo de sucesso com a vida: apesar dos planos, a condução de seu destino lhe escapa ao controle. Protagonista de "O Livro dos Mandarins", novo romance de Ricardo Lísias, Paulo representa um arquétipo do mundo corporativo.

"Ele é parecido com outros executivos, que têm um rígido código de comportamento, da roupa à linguagem", diz Lísias. "Eles não leem livros, somente autoajuda corporativa, têm celulares e relógios incríveis, costumam tratar com grosseria os funcionários inferiores." A marca principal desses indivíduos, segundo o escritor paulistano de 34 anos, é a espinha flexível, que se verga ao mandachuva de plantão. "Eles são práticos, aprendem a engolir sapos tirando lucro de tudo." São praticantes de uma ideologia, a do dinheiro obtido a qualquer custo, mesmo o humano. "Existe um ideário com discurso interessado que escamoteia as suas reais intenções."

Com lançamento na Livraria da Vila, às 18h30 de 4ª feira (28), "O Livro dos Mandarins" (Alfaguara, 344 págs.) levou quatro anos e meio para ficar pronto. Ele trata de um tema inédito na literatura nacional: a influência do mundo corporativo na organização da economia e da sociedade. Para escrever este romance, Ricardo Lísias estudou mandarim, assinou um jornal de economia e frequentou os mesmos lugares dos executivos que se metamorfosearam em personagens.

A China é o outro protagonista de "O Livro dos Mandarins". O país asiático ascendeu como o novo exemplo de economia pujante. "Os executivos achavam que a China era a solução para tudo." Quando lia o noticiário econômico, Lísias notava que se repetia apenas um ponto de vista. "Só falavam que a economia chinesa tinha saído ilesa da crise financeira mundial " Causou-lhe perplexidade nunca terem mencionado a existência de um Estado autoritário governando os chineses - "na verdade, uma ditadura comunista de direita".

A literatura, para ele, tem como uma de suas principais funções "expor os discursos soterrados". Por isso, Lísias falou, no romance, das relações ignoradas entre China e Sudão. "Ninguém mencionou que os chineses, com seus negócios no Sudão, ajudaram no massacre contra os sudaneses." Mas a limpeza étnica ocorrida no país africano, que matou milhares de pessoas nesta década, não tira o sono de Paulo. "Ele aceita as coisas perfeitamente, tem facilidade de se corromper sem refletir sobre isso."

"O Livro dos Mandarins" apóia-se em fatos históricos e cita personalidades políticas, como o presidente Lula e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, visto por Paulo como um mentor. "O protagonista tem saudade do governo FHC." Ao longo do enredo, dividido em três partes, Paulo sofre transformações. A única coisa que não muda é a dor nas costas, sentida desde a infância. Lísias não explica qual é a metáfora representada pelo problema na região lombar. Ele só afirma que as suas pesquisas revelaram o padecimento frequente da saúde dos executivos. "Eles tomam remédios e procuram tratamentos alternativos, como a terapia holística." Se não dói a consciência, o corpo deles reclama, segundo Lísias.

À medida que caminha para o final, a atmosfera do romance se torna mais cínica e doentia. Começam a brotar dúvidas na cabeça do leitor sobre a ida concreta de Paulo à China. "Tudo fica mais duro e a linguagem, mais fraturada", diz. "O grande desafio formal é adequar a linguagem às situações específicas."

A função de Paulo é obter informações seguras para os negócios do banco. Com o tempo, aquele mundo enquadrado e planejado vai se revelando um monte de ruínas. Um dos significados de mandarim é o de pessoa que, em virtude de seus títulos, diplomas, funções, se mostra cheia de importância e presunção. Alguma coisa Paulo talvez tenha aprendido. As aparências nunca salvam os sonhos de um homem. Mas isso não é tema para o livro de autoajuda que pretendia escrever.

TRECHOS
"O Paulo prefere as secretárias que trabalham com a boca fechada. A Paula, por sua vez, costuma ficar com a boca fechada a maior parte do expediente. Dessa forma, os dois acabam se dando muito bem: ela recebe os e-mails com as instruções pela manhã, tenta não esquecer nada, atualiza o serviço com as solicitações que chegam depois do almoço e, antes de colocar o portarretrato do Paulinho na bolsa e ir embora, confere tudo.

A bem da verdade, logo que foi transferida Paula achou estranho aquele jeito de trabalhar e se incomoda um pouco com o silêncio dos funcionários do setor do Paulo. Vai ver que é por isso que todos falam tanto durante o almoço, no elevador, na porta do banco, na fila do caixa eletrônico e por tudo que é lado. Mas ela ficou tão agradecida quando soube que o Paulo tinha defendido seu emprego no banco que, no final das contas, só olhar para o rosto do Paulinho já deixa as coisas mais leves. Mas o portarretrato tem que ficar escondido
."

SERVIÇO:
"O Livro dos Mandarins". De Ricardo Lísias. 344 págs. Alfaguara. Livraria da Vila. Rua Fradique Coutinho, 915, 3814-5811. Quarta-feira (28), 18h30.

Fonte:
Colaboração de Douglas Lara

IV Bienal Internacional do Livro de Alagoas



Realizada no período de 30 de outubro a 8 de novembro de 2009 a IV Bienal Internacional do Livro de Alagoas. A Bienal é uma realização da Universidade Federal de Alagoas, através da EDUFAL – Editora da Universidade Federal de Alagoas, com o apoio da ABEU (Associação Brasileira dos Editores Universitários), da CBL (Câmara Brasileira do Livro), da Prefeitura de Maceió, do Governo do Estado de Alagoas e demais parceiros de instituições públicas e privadas. O patrono dessa edição é o alagoano Professor Dr. José Marques de Melo.

O evento é bem localizado, no Centro Cultural e de Exposições Ruth Cardoso, em Jaraguá, com facilidade de acesso de estacionamento, dotado de segurança pública e particular, em uma área total de 5.537m², divididos em 4.727m² de área de Exposição que terá 130 estandes e 405m² de Foyer e Recepção. Conta também com cinco salas para oficinas literárias e de criação, uma sala com 180 lugares para palestras, debates, mesas redondas, um café literário para lançamentos de autores locais, um auditório para 500 lugares, além da praça de autógrafos, que possibilitará a interação entre autores independentes e o público visitante.

Com a proposta de continuidade da III Bienal, a quarta edição da Bienal do Livro tem o propósito de marcar a presença das editoras de várias partes do país junto ao público alagoano, através de seus últimos lançamentos, proporcionando aos estudantes de vários níveis, aos acadêmicos, professores e comunidade em geral a possibilidade de contato com material literário de várias áreas do conhecimento. A Bienal deve reunir representação de mais de 300 editoras universitárias e comerciais de todo o país, com aproximadamente 18 mil títulos, e receber a visita estimada de mais de 120 mil pessoas. Para esta edição, estão programadas 85 palestras, 10 eventos e 17 mesas-redondas, além de performances e espetáculos com contadores de histórias.

A rede de ensino pública e particular será mobilizada e as visitas pré-agendadas e monitoradas devem atender mais de 40 mil alunos. A visitação escolar dá a dimensão do papel do evento no contexto educacional. Significa para os estudantes um aprendizado especial e diferente da rotina das aulas. Para as escolas, é um momento único para estimular e conscientizar suas turmas sobre a importância do livro e da leitura e a amplitude do universo literário.

Seguindo os princípios de Leitura para Todos, a IV Bienal terá, em sua agenda cultural, 14 oficinas de literatura inclusiva nas mais diversas modalidades: braille, libras e oficinas voltadas para portadores de deficiências intelectuais e múltiplas.

Pela primeira vez, acontecerá em uma Bienal o Encontro do PROLER – Programa Nacional de Incentivo à Leitura –, vinculado à Fundação Biblioteca Nacional, órgão do Ministério da Cultura, e à Secretaria de Estado da Cultura. Além de fortalecer ações de estímulo à leitura, possibilitará aos gestores de bibliotecas públicas, comunitárias e rurais conhecer e visitar a Bienal.

A IV Bienal Internacional do Livro de Alagoas conta com a participação dos países já confirmados: México, Peru, Costa Rica, Colômbia, Portugal, França, Angola, Moçambique, Cabo Verde e Guiné Bissau, além de uma Exposição das Editoras Universitárias da América Latina e Caribe. O país homenageado é a França, e o evento faz parte das comemorações do Ano da França no Brasil. Por isso, a Edufal estará lançando na Bienal três livros franceses com o selo da editora: Sociologia das Relações Internacionais, de Guillaume Devin (traduzido por Milani, MF Durand), Transatlantique, de François Laplantine (traduzido por Rachel Rocha e Bruno César), A mesa, o livro e os espíritos, de Marion Aubrée e François Laplantine. Completando o ciclo de lançamentos internacionais, será lançado A Dinâmica nas Ciências Econômicas e Empresariais, livro organizado pelo português Renato Pereira.

Este ano, a Bienal, em parceria com a Ediouro e o Sesc, traz grandes atrações para encantar tanto o público infantil quanto o adulto. Em exposição, os visitantes poderão conhecer o maior livro do mundo, uma edição de 300 kg do clássico O Pequeno Príncipe, de Antoine de Saint-Exupéry, além de se divertirem com a maior palavra-cruzada direta do mundo e com um caça-palavra gigante.

A cobertura completa da Bienal, com os últimos acontecimentos e entrevistas com autores, estará disponível em posts exclusivos no blog do Portal Literal (www.portalliteral.com.br).

Para outras informações sobre a IV Bienal Internacional do Livro de Alagoas, acesse www.edufal.com.br/bienal2009 . Lá você poderá encontrar:

Autores participantes, com informações sobre vida e obra dos autores e oficineiros;
Sinopse das oficinas, os objetivos e público-alvo das oficinas;

Programação:
– Programação do Café Literário, espaço onde ocorrerão os lançamentos coletivos dos autores locais, com selo Edufal.
– Programação dos Estandes, onde você terá acesso às atividades culturais promovidas pelos expositores
– Programação Completa, com o horário de oficinas, palestras e mesas-redondas.
E muito mais!

Orientações para oficinas
– As inscrições para as oficinas são gratuitas e serão realizadas no local. Chegue com meia hora de antecedência para garantir sua vaga;
– Todas as oficinas têm um número limitado de vagas e fornecem certificado (nas oficinas com dois módulos, será obrigatória a presença em ambos para obter o certificado);
– Em frente à mesa de inscrições, posicione-se na fila correspondente à sala da oficina de sua escolha;
– Ao preencher a ficha de inscrição na mesa, você receberá um canhoto da inscrição;
– Para ter acesso à oficina, entregue o canhoto recebido ao monitor da sala;
– Os certificados serão entregues ao final das oficinas, na mesa de inscrições.

Lançamentos, espetáculos, palestras e mesas-redondas:
– Não é necessário inscrever-se para participar destes eventos, também gratuitos. Procure chegar com antecedência para garantir seu lugar, pois as salas têm capacidade limitada

Fonte:
http://www.edufal.com.br/bienal2009/

Aluísio de Almeida (O Ferreiro)

O Ferreiro (pintura à óleo de José Sobrinho)
Entremos agora na tenda do ferrador. Um pequeno galpão com portão grande para a rua e tudo aberto para o lado do quintal. Neste e ao ar livre ferram-se os animais junto ao mourão. A tenda se compõe de um fole de couro de cerca de um metro de comprimento, a forja, as tenazes (1) de vários formatos, uma bigorna maior, quase como do ferreiro, a bigorninha pequena, a tina de água para esfriar o ferro, os martelos.

Compra-se ferro maleável. Sem outro instrumento além do malho (2) e da bigorna o ferrador fabrica as ferraduras de vários tamanhos, e quente.

Chamam-se craveiras os furos para os cravos.

Batendo a quente com um ferro especial, e rapidamente, o ferrador faz com exatidão, três a direita e duas ou três a esquerda. A batida não é tão forte, que atravesse o ferro doutro lado. Já a frio é que com um ferro mais fino se completa o orifício, vinda assim, a cabeça do cravo a ajustar-se na craveira sem atravessar a ferradura.

Ferradores antigos faziam ferraduras de oitos cravos. Mais raramente, de sete. As duas pontas arqueadas e salientes, por onde a pata se afirma nas paredes são os rompões. Outrora o rompão era um só, ligando toda a volta.

Atualmente os cravos já vêm feitos em grande quantidade das fábricas. Três centímetros da ponta agução até a cabeça. Parece incrível, mas só no momento de ferrar, é que o mestre ferrador fazia as cabeças numa bigorna de menos de um palmo de comprimento, e a frio. A esta operação, em que ainda não aparece o cavalo, chamava-se atarracar o cravo.

Em seguida no quintal, o tropeiro segura o muar (3) ou cavalo, um ajudante levanta a mão do animal e o ferrador com um torquês – se é o caso – arranca os cravos e a ferradura velha. É mister cautela com os coices, manotaços (4) e mordidas. A posição do ferrador é com os joelhos um pouco arcado para frente.

Entra em cena o puxavante. O nome parece indicar objeto que puxasse outro. Nada! É como um formão de cabo grosso e forte, e ligando-se a folha com um outro pedaço de metal em ângulo. O aço afiado da ponta, que tem três a quatro centímetros de largura, corta o casco, preparando-o para nele assentar a ferradura e o casco.

Na posição difícil que fica, o ferrador ficaria ferido ou não faria bem o serviço, simplesmente cortando o casco com uma lâmina qualquer. Por isso assenta o pé do cabo sobre o peito, enquanto o ajudante segura a perna do animal, tomando o puxavante e, instintivamente quase, avança e puxa para trás do peito e o corpo cortando o casco sem ferir as outras partes. Antes ou depois de ferrar, ou antes e depois, usa a grosa (5), de tal jeito que se ajustem bem a ferradura e o casco.

Então vai pregar os cravos com jeito para não saírem fora nem dentro, sempre na muralha. Muralha é a parte exterior, que não dói o casco propriamente dito. Tem menos de 2 centimetros de largura em volta. A segunda parte para dentro, já é meio óssea, a taipa, e sensível à dor. Seguem-se cartilagens, e os ossos da ranilha, e enfim, a navicular. Ambas chegam até ao alto do casco.

Em viagem, o arrieiro (6) levava a bigorninha antes de haver cravos já atarrancados, e sempre a torquês e o puxavante. Consertava uma ferradura que ia cair, substituía um cravo perdido, tirava espinho, etc. Sempre o trabalho completo era o do ferrador.

Animais de montaria, de estimação, e mulas cargueiras de longas viagens eram sempre ferradas. Poréns matungos (7) lerdos e burros para pequenos serviços entre os sítios e vilas nem sempre se ferravam. Por descuido e pobreza.
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Vocabulário
1 – Tenazes: de ferrador de cavalos) Instrumento parecido com um alicate, com longos cabos, usado para tirar ou pôr peças nas forjas e para seguras ferro em brasas.
2 – Malho: grande martelo de ferro ou madeira
3 – Muar: animal pertencente à raça das mulas
4 – Manotaços: patadas
5 – Grosa: lima grossa pra desbastar madeira ou cascos de cavalgaduras
6 – Arrieiro: homem que guia bestas de carga
7 – Matungos: cavalo sem raça.

Fontes:
– ALMEIDA, Aluísio de. Vida e morte do tropeiro. São Paulo, Editora Martins, 1971
http://www.jangadabrasil.com.br/

Semana Aluísio de Almeida, em Sorocaba



Começou dia 3 e prossegue até domingo, a Semana Aluísio de Almeida, em homenagem ao monsenhor Luiz Castanho de Almeida, considerado uma das principais referências para historiadores do país.

A programação terá diversas atividades gratuitas para celebrar a vida e obra do homenageado, com exposição, palestras e missa. A abertura oficial acontecerá hoje, às 14h, no auditório da Biblioteca Municipal “Jorge Guilherme Senger”. Na ocasião, o presidente do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Sorocaba (IHGGS), professor Adílson Cézar, falará sobre “Aluísio de Almeida e a História de Sorocaba”.

Além de 24 livros editados, Aluísio de Almeida escreveu para diversas revistas e jornais, entre eles O Estado de S. Paulo e Cruzeiro do Sul. O historiador morreu em 1981. Sua residência foi transformada na Casa de Aluísio de Almeida (centro cultural e sede do IHGGS), com valioso acervo composto por obras e manuscritos ainda inéditos. A promoção da semana é da Prefeitura de Sorocaba, por meio da Secretaria da Cultura (Secult), em parceria com o IHGGS.

Exposição

Até domingo também, das 9h às 17h, os sorocabanos poderão conferir uma exposição de fotos na Casa Aluísio de Almeida. O material da mostra, que faz parte do acervo do IHGGS, foi elaborado e trabalhado pelos alunos do curso de comunicação visual do Colégio Politécnico de Sorocaba - Jornal Cruzeiro do Sul - FUA, sob orientação e coordenação do professor Marcos Eduardo Fasiaben. A entrada é franca.

Confira abaixo a programação completa:

TERÇA FEIRA:

Abertura e palestra “Aluísio de Almeida e a História de Sorocaba”, com o professor Adílson Cézar.
No Auditório da Biblioteca Municipal, 14h. Entrada gratuita.

QUARTA-FEIRA:

Posse como sócia efetiva da primeira-dama Denise Lippi, fazendo elogio a sua patrona Ana Paula Eleutério.
Na Casa de Aluísio de Almeida, 19h30. Entrada gratuita.

QUINTA-FEIRA:

Dia da cultura, de Ruy Barbosa;
reunião da Delegacia da Academia de História Militar Terrestre do Brasil “Aluísio de Almeida” em Sorocaba e Região;
posse do novo Delegado de Honra, Tenente Coronel Gilmar Antonio de Lima Ribeiro, posse do associado Coronel Francisco Pedro Azambuja Vieira, fazendo a saudação do seu patrono Bento Manoel Ribeiro e lançamento da plaqueta do Coronel Carlos Sérgio da Câmara Saú, sobre o Marechal Waldemar Levy Cardoso.
Na 14ª Circunscrição do Serviço Militar, 19h30. Entrada gratuita.

SEXTA-FEIRA:

Manhã
Homenagens ao Monsenhor Luiz Castanho de Almeida;
palavras de recordação pelo professor Adilson Cézar, presidente do IHGGS;
aposição de coroa de flores, oração e bênção pelo padre Tadeu Rocha Moraes, pároco da Catedral Metropolitana Nossa Senhora da Ponte de Sorocaba.
No Cemitério da Saudade, quadra 15, chapa 9820, 9h. Entrada gratuita.

Tarde
Missa “in memorian” de Monsenhor Luiz Castanho da Almeida (Aluísio de Almeida) e do Almirante-de-Esquadra Maximiano Eduardo da Silva Fonseca, presidida pelo bispo emérito de Araçatuba, Dom José Carlos Castanho de Almeida.
Na Catedral Metropolitana de Nossa Senhora da Ponte de Sorocaba, 18h15. Entrada gratuita.

Noite
Cerimônia de Investidura com a outorga da Medalha Cultural “Aluísio de Almeida”, oficializada pelo Governo do Estado de São Paulo e outras condecorações.
Participação especial dos lanceiros do Regimento Nove de Julho e apresentação dos músicos da Fundec.
Na Catedral Metropolitana de Nossa Senhora da Ponte de Sorocaba, 19h30. Entrada gratuita.
Jantar “Caldeirada do Leste” e Show com Banda Silvestrini, promovido pelo Rotary Club Sorocaba e IHGGS. Na Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), 20h30. R$ 70,00. Informações pelos telefones (15) 9121-6338, 7835-3294 e 3231.1669.

DOMINGO

Posse como sócio efetivo de Mário Cândido de Oliveira Gomes, fazendo o elogio ao seu patrono José Aleixo Irmão.
Na Casa de Aluísio de Almeida, 10h. Entrada gratuita.

SERVIÇO:
14ª Circunscrição do Serviço Militar - Avenida Senador Roberto Simonsen, 150, Santa Rosália.
Biblioteca Municipal “Jorge Guilherme Senger” - Rua Ministro Coqueijo Costa, 180, Alto da Boa Vista.

Catedral Metropolitana de Nossa Senhora da Ponte de Sorocaba - Praça Coronel Fernando Prestes, Centro.

Casa de Aluísio de Almeida - Rua Ruy Barbosa, 84, Vila Hortênsia. Telefone (15) 3231-1669.
Cemitério da Saudade - Praça Pedro de Toledo, Vila Carvalho.

Fonte:
– Colaboração de Douglas Lara, da Redação do Jornal Cruzeiro do Sul de 03/11/2009, na página 3 do caderno B.

Aluísio de Almeida (1904 - 1981)

(Aluísio de Almeida e a Historiografia Sorocabana: artigo de Cássia Maria Baddini, Mestre em História Social da USP)

Para compreender o conjunto de sua obra assinada por Aluísio de Almeida é importante considerar a trajetória da vida de seu autor: o Monsenhor Luiz Castanho de Almeida. Nascido em Guarei – SP, a 6 de novembro de 1904, era primogênito de uma família de cinco filhos. Seu pai, Aníbal Castanho de Almeida, foi figura destacada na política, sendo chefe local do partido republicano Paulista e homem empreendedor na cidade. Segundo biógrafos de Aluisio de Almeida, possuiu fabrica de descaroçar algodão e serraria e esteve diretamente implicado na promoção de um conjunto de melhorias urbanas: construção da nova Matriz de Guarei, encanamento de água potável, estabelecimento da rede telefônica local, de escolas reunidas, de posto policial na cidade. Era amigo pessoal de Julio Prestes. Faleceu em 1939.

Sua mãe Ana Carolina Rolim, era professora primaria e natural de Itapetininga. Faleceu em Sorocaba, 1957.

A educação sacerdotal de Luiz Castanho de Almeida começou em 1917 na cidade de Botucatu: no Ginásio Diocesano “Nossa Senhora de Lourdes” e, a partir de 1918, no Seminário Menor anexo ao Ginásio. Completou os estudos exigidos para o sacerdócio em 1924, mas sendo jovem não recebeu naquela ocasião as ordens sacras. Nesse mesmo ano, foi designado para secretario do bispado e secretario particular do bispo D José Carlos de Aguirre, que tomaria posse em 1ºde janeiro de 1925 ( a Diocese de Sorocaba havia sido criada naquele mesmo ano de 1924, tornando a Paróquia a ela subordinada).

Ficou nessa função até 1929, quando foi nomeado pároco de Araçoiaba da serra (*havia sido ordenado padre em 8 de maio de 1927, seguindo, no entanto para Itararé. No ano seguinte foi transferido para Itapetininga como pároco coadjutor, e ainda nesse ano foi nomeado para Guarei, voltando, pois para sua terra natal).

Ficou em Guarei até 1933, quando então volta à Sorocaba, como coadjutor da catedral. Foi, então, nomeado pároco da igreja Bom Jesus dos Aflitos (paróquia criada em 1926), exercendo essa função até 1937, quando a doença-esclerose múltipla-começou a comprometer suas atividades sacerdotais.

É nessa época a construção de sua casa, na rua Rui Barbosa-sede do Instituto Histórico, geográfico e Genealógico de Sorocaba. Morou ali com a família, e ali faleceu em 28 de fevereiro de 1981.

O título de Monsenhor receberia em 1962.

A prática da pesquisa parece ter se desenvolvido de maneira espontânea, intensificando-se a partir de seu recolhimento (1939). Não possuía formação de historiador: suas técnicas de pesquisa e metodologia são dificilmente percebidas em seus trabalhos, pois não explicita nunca os procedimentos de seleção, leitura e analise da documentação, nem tampouco indica as fontes consultadas. As citações de texto de época aparecem com a grafia modernizada, comprometendo sua leitura como fonte para a própria coleta de evidencias documentais.

Em função de suas limitações físicas, recorria constantemente à ajuda de amigos, que transcreviam suas passagens mal escritas ou anotavam seus textos ditados. Essa condição, associada a própria idéia que Aluisio de Almeida tinha sobre produção histórica-evitar pesquisas exaustivas, que resultassem na demora de publicações, das quais Sorocaba era tão carente-possibilitou um sem-numero de publicações e uma característica peculiar de sua escrita: textos truncados, frases descoladas, assuntos repetidos em varias passagens. Parecia haver pressa em publicar.

Em relação à documentação privilegiada para estudo, embora nunca indicada em seus textos (apenas referida), consultou a documentação da Cúria Diocesana, da Prefeitura municipal de Sorocaba e de cartórios da cidade, pesquisando também em arquivos de São Paulo e Rio de Janeiro. Tinha contato com centros de pesquisa, documentação e produção histórica, como Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (RJ), o Arquivo Municipal de são Paulo e instituições equivalentes do interior paulista.

Aproximou-se da produção de história paulista que então se fazia, estimulada, sobretudo pelo Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo. Construiu uma visão de história local justificado pelo caráter heróico do paulista na construção da nação: para Aluísio de Almeida, a história de Sorocaba espelhava o caráter de um povo destemido que edificou sua próproa grandeza, contribuindo para a unidade política e econômica da nação ao longo de sua história. O que era exatamente a imagem construída do paulista na produção do IHGSP e demais instituições comprometidas, naquele momento, com a legitimação de São Paulo no poder central. Tais estudos primavam por conceber a história do Brasil em função de uma certa história paulista, caracterizada pela promoção de “ciclos econômicos” fundamentais para a construção da nação: o “bandeirismo” e sua contribuição para o desbravamento do interior e unificação política daquelas regiões; o “tropeirismo” e a construção definitiva de uma unidade econômica no centro-sul do Brasil, afastando o perigo espanhol naquelas partes, o “café” e o enriquecimento da nação, garantindo também em caráter definitivo a sua entrada no “ciclo da industrialização”.

Essa leitura deixa evidente a visão de história linear, em progresso e determinada por condições econômicas tidas como homogêneas: a idéia de “ciclo econômico” pressupõe a inserção de toda sociedade, independente de condições específicas de cada localidade, a um mesmo propósito de engrandecimento nacional.

Aluísio de Almeida concebeu a história local a partir dessa perspectiva, grandemente influenciado por tais estudos: é conhecida a sua amizade com Afonso d´Escragnole Taunay, Diretor do Museu Paulista entre 1917 e 1946, período em que a mesma instituição passou por uma completa reestruturação, compondo o que até hoje verificamos como uma exposição que representa a história pátria justificada pela exemplar contribuição histórica dos paulistas. Os “ciclos econômicos” estão lá representados, as fases heróicas da trajetória dos paulistas, sempre em relação a edificação da nação. Justifica-se, assim, a proeminência de São Paulo no poder.

Os trabalhos de Aluísio de Almeida eram também citados por pesquisadores da história paulista, como o próprio Taunay e Alfredo Ellis Júnior, que fundamentou a existência de um “ciclo de muar” em artigo publicado na Revista de História, da USP, em 1950, utilizando inclusive trechos inéditos de Aluísio de Almeida sobre a passagem do gado por Sorocaba. O que acusa o contrato desses pesquisadores com a produção de Monsenhor Castanho.

Aliás, os temas privilegiados por Aluísio de Almeida sempre foram àqueles relativos a história paulista, notadamente do sul paulista. Também buscou resgatar o folclore e as tradições populares dessa região, escrevendo inúmeros artigos publicados especialmente na Revista do Arquivo Municipal de São Paulo nas décadas de 40 e 50. Essa revista demonstrava claramente a intenção de exaltar a história paulista, tornando-a fundamental para a construção da nação. Os escritos de Aluísio de Almeida também se inserem nessa ótica, com a particularidade de destacar a região de Sorocaba nessa explicação histórica.

Artigos publicados em outras revistas especializadas (Revista do IHGSP, do IHG Brasileiro, de Estudos Genealógicos, do IHGG Sorocaba, do Arquivo Municipal de São Paulo, Revista de História, Revista do Brasil (RJ), Revista Ilustração Brasileira (RJ) e em jornais locais ou da capital (Cruzeiro do Sul, O Estado de S. Paulo), Correio Paulistano) mostram tendência equivalente: na Revista de História em artigos que especificam a história de Sorocaba, Aluísio de Almeida não deixa de justificar a história local pela sua contribuição particular à construção da nação, destacando na sua explicação as fases que definiriam a trajetória histórica de Sorocaba: o bandeirismo, o tropeirismo, a industrialização. A especificidade de Sorocaba estaria no tipo particular de bandeirante que aqui residiu, no entrosamento articular da sociedade local com o tropeirismo, nas iniciativas individuais de destemidos empreendedores sorocabanos, de nascimento ou de adoção.

A história, assim, não precisa de explicação, mas de justificação. Ela já está dada, já está traçada. A singularidade de Sorocaba, ameaçada de se perder nessa leitura que tudo homogeneíza, dá-se pelo caráter de seu povo, imbuído de qualidades que o reconheceriam como legítimo construtor da nação: a bravura, a ousadia, a iniciativa, o espírito liberal.

Todos esses valores estão expressos na obra de Aluísio de Almeida, significando uma história legitimamente sorocabana. È sorocabana pela intenção de se definir uma identidade social (portanto política, econômica e cultural) à cidade, que seria extensiva à sua população como que por força do próprio destino histórico. O propósito que revela com essa visão de história é o de congregar toda sociedade, criando valores comuns e legítimos porque historicamente dados, e promover o progresso local, pois a história que se mostra é uma história em que os conflitos foram resolvidos ou acomodados, em que a cidade cresceu e se desenvolveu, em que as diferenças se justificam pelo projeto compartilhado de construir uma cidade – e, pois uma – rica e feliz.

Não só seus artigos se comprometem com essa visão, mas também seus livros, publicados algumas vezes com seus recursos do próprio autor. Dentre os que abordam Sorocaba de maneira especial, tem-se O tropeirismo e a feira de Sorocaba (1968), História de Sorocaba (1969), Vida e Morte do Tropeiro (1971), além de publicações mais antigas que tratam do liberalismo na cidade: Sorocaba, 1842 (1938), A Revolução Liberal de 1842 (1944).

É comum ouvir que Aluísio de Almeida escreveu sobre quase tudo a respeito de Sorocaba. Certamente escreveu muito em centenas de artigos e livros, e certamente seus textos servem e deverão servir para pesquisas sobre história local. Cabe a nós, historiadores de formação e preocupados com a explicação do passado e não mais apenas com o seu relato, interrogar o conhecimento produzido por Aluísio de Almeida enquanto um discurso contextualizado. A validade de suas obras não está numa interpretação correta dos fatos históricos ou no relato minucioso da evolução de Sorocaba. Já não se tem essa visão simplista da História como aquela que deve assegurar o controle social. A importância de sua obra está enquanto visão sobre a cidade construída no progresso e legitimação do domínio paulista. Ainda mostra suas repercussões em estudiosos que acreditam produzir uma historiografia genuinamente sorocabana nos dias de hoje, e encontra congênere em outras histórias de cidades do interior paulista, que se inspiram no modelo de progresso e evolução histórica proposto pelos primeiros estudiosos da história paulista.

È necessário, portanto, buscar caminhos que possibilitem questionar a própria idéia de uma história de cidade condicionada a temas nacionalistas, mesmo que na perspectiva revisionista (no caso de Sorocaba, temas consagrados como tropeirismo, imigração, industrialização). É preciso reavaliar a nossa própria concepção de cidade, de história, de participação social no processo histórico, para superar idéias um tanto cristalizado de especificar uma historiografia que seja “sorocabana”."

Fonte:
– Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Sorocaba.
http://www.ihggs.org.br/

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Ritinha (A Augusto dos Anjos)



Poesia participante do I Premio Talentos de Poesia 2009.
A autora cujo pseudônimo é Ritinha, é de Colombo (PR)
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Escritor frisador de um símbolo,
Que marcara sua vida desde o feto.
Iluminação de um mundo moribundo,
A infância prendada que o afeta.

Por viver entrelaçado ao desânimo,
Decadência de uma vida soberana,
Desviou-se para a vida arduânea,
Onde expressa-se igual: Filho da morte.

Pois o vejo entre todos os humanos
Sendo símbolo deste tamarindo amado,
A fujância vitalina conterrânea

És pra mim simbolicamente tudo
Que exprime essa minha inspiração
Sua vida foi de muita marcação.

Escrita ao tronco do Tamarindo... 16.11.86
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1º Encontro Poetas del Mundo em Belo Horizonte


Dias 11, 12 e 13 de novembro

O QUE É O MOVIMENTO POETAS DEL MUNDO?

Iniciou-se em 2005, em Santiago, Chile, pelas mãos do escritor e poeta Luiz Arias Manzo. É o encontro dos povos pela palavra renovada na Poesia. O propósito maior dos Poetas Del Mundo é o de agregar esforços e talentos na inquietude do trabalho contínuo, para a Paz e pela Paz mundial. Unidos em torno deste propósito, buscam clamar e proclamar ideais em defesa do amor, da paz, da humanidade e da vida no planeta, visando o desenvolvimento de ações culturais, com extensões sócio-políticas. Seu manifesto universal é um vigoroso apelo em favor da vida e pela união entre os povos.

Presente em 119 (cento e dezenove) países, o movimento conta com embaixadores nos países membros, cônsules nos estados e municípios e poetas associados, que somam mais de seis mil integrantes.

POETAS DEL MUNDO EM BELO HORIZONTE

Nos dias 11, 12 e 13 haverá uma programação feita com POETAS DEL MUNDO, de várias entidades literoculturais: Clube Brasileiro da Língua Portuguesa, Paz e Poesia, Semente de Poesia, Rede Catitu Cultural, Liber Livros e Mural dos Escritores, Alô Vida, Imersão Latina, Mulheres Emergentes, Munap, da Amulmig, Consulado de Portugal, Elos Clube, CCLB, ACLCL, ALJGR/PMMG, AFEMIL, Curadoria do Palácio da Liberdade, ANELCA, IHGMG, AMI, da Arcádia de Minas Gerais, UBT/BH, Academia Mineira de Letras, Academia de Letras do Brasil e outras.
Público Alvo: Humanistas, Poetas e Artistas do Brasil e exterior.

TEMA:

HORIZONTE – ARTE – LETRAS – PELA PAZ- “HALPPAZ”

H-Horizontes infindos
A-Arte que tudo torna capaz
L-Letras em temas bem-vindos
P-Pela busca que faz
P-PAZ transcender, ação refaz
A-Amor universal,
Z-Zelo ao meio ambiente.

Programação:

11 DE NOVEMBRO DE 2009 - QUARTA-FEIRA

18h – Entrega dos Crachás – Cafeteria Palácio das Artes – Subsolo.

12 DE NOVEMBRO DE 2009 - QUINTA-FEIRA

09h30min – Academia Mineira de Letras (AML) - Rua da Bahia, 1466.

09h30min Recepção e Identificação dos Convidados

Projeção de Vídeos – Poetas Del Mundo – BH – MG, outros estados e países.

10h – Atividades na Academia Mineira de Letras

Abertura

Hinos: Chile – Brasil – Poetas Del Mundo

Cerimonial: Kid Moreira – composição da mesa de trabalhos.

Abertura

Sílvia Araújo Motta – Cônsul Poetas Del Mundo de Belo Horizonte – pela coordenação geral do evento. Presidenta do Clube Brasileiro da Língua Portuguesa. Embaixadora Universal da Paz-Brasil, no Círculo Universal dos Embaixadores da Paz / Suisse / France).

Saudação Bilá Bernardes – Cônsul Poetas Del Mundo de Minas Gerais – pelo Estado de Minas Gerais.

Palavras de Delasnieve Daspet – Embaixadora dos Poetas Del Mundo e Secretária Geral para as Américas. Arias Manzo – Fundador e Secretário Geral dos Poetas Del Mundo – Chile.

Apresentação Musical

Diplomação de Cônsules e Poetas Del Mundo por Luiz Arias Manzo - Fundador e Secretário Geral dos Poetas Del Mundo; Delasnieve Daspet - Embaixadora dos Poetas Del Mundo para o Brasil e Sub-Secretária para as Américas, Bilá Bernardes – Cônsul dos Poetas Del Mundo em Minas Gerais e Sílvia Araújo Motta – Cônsul dos Poetas Del Mundo da Cidade de Belo Horizonte.

12h às 14h – Almoço Livre

14h – Associação Mineira de Imprensa (AMI) – Rua da Bahia, 1450.

Abertura
Execução dos hinos da França e Brasil.

Saudação:
Carlos Lúcio Gontijo – Poeta Del Mundo e vice-presidente da AMI.

Palestra:
Liberté, Egalité et Fraternité ecoam em minha alma verde e amarela – Diva Pavesi: Embaixadora Poeta Del Mundo para a França, Embaixadora da Paz no âmbito do Círculo Universal de Embaixadores da Paz, Membro e Delegada da Académie des Artes, Sciences et Lettres,Paris, França; Diretora do Festival de Cannes para o Brasil.

Apresentação Artístico-Cultural

18h – Recepção e Confraternização dos Poetas Del Mundo no Museu Arte Cultura (MAC): Manuel Antônio Carvalho – Casa da Luz e da Poesia – Rua Eduardo Porto, 612 – Cidade Jardim – (31) 7811-8362

Projeção de Vídeo.

Apresentação poética dos Embaixadores, Cônsules e Poetas Del Mundo e Convidados.

Apresentação musical.

13 DE NOVEMBRO DE 2009 - SEXTA-FEIRA

10h às 12h – Caminhada e visita à Exposição de Esculturas & Semente de Poesia, especial com Poetas Del Mundo no Parque Municipal.
Organização: Regina Mello.

12h – Almoço Livre.

14h às 17h – Passeio à Praça da Liberdade.

18h – Inauguração do Espaço Mix Cultural Liber Livros. Recital com participação de Poetas Del Mundo e Convidados.
Endereço: Avenida Getúlio Vargas, 622 – Savassi – Belo Horizonte.

Encerramento

Escolha dos Membros que redigirão a Carta - Manifesto abordando temas da PAZ – MEIO AMBIENTE – SOLIDARIEDADE ENTRE OS POVOS – VIOLÊNCIA – FOME – POESIA. Os nomes serão apresentados pela Organização do Evento e a Carta – Manifesto deverá ser entregue em até 15 dias após a data do encerramento.

14 DE NOVEMBRO DE 2009 - SÁBADO
Passeio a Ouro Preto (Opcional).

CONTATOS
Sílvia Araújo Motta.(Coordenação Geral) (31) 9928 – 2798
E-mail: silumotta@hotmail.com
Bilá Bernardes: (31) 9128 – 7347 E-mail: bilapsi@gmail.com

INSCRIÇÃO PARA O EVENTO:
E-mail:
brppoetasdelmundobrasil@gmail.com

Visite CLUBE BRASILEIRO DA LÍNGUA PORTUGUESA BH MG BRASIL em: http://clubedalinguaport.ning.com/

Fontes:
– Colaboração do Clube Brasileiro da Língua Portuguesa BH MG
http://www.guiaentradafranca.com.br/agendaG.php?idUrl=5279

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Volpone de Souza (Pra Riba, Descambeia!



Angélica era professora primária, recém-formada, jovem, formosa e delicada. Sempre viveu na cidade, estudou em bons colégios, leu muitas obras literárias e dominava a língua portuguesa na fala e na escrita. Em seu primeiro dia de trabalho, numa escola, sala multiseriada, entre crianças, galinhas, porcos, cachorros, gatos... começou a ensinar o beabá. Pegou giz branco e escreveu no quadro negro as vogais: A, E, I, O, U.

Os alunos copiavam em seus cadernos de caligrafia aquelas letras, menos Expedito, conhecido como “Dito”, menino calado, cabelo arrepiado e pés descalços balançando no ar, pois suas pernas eram curtas para a cadeira que sentava. A professora com muita paciência explicou novamente o movimento realizado para redigir aqueles símbolos. Dito tentou, mas não conseguiu. Calmamente, a jovem professorinha, sem perder o encanto, a doçura e a pronúncia das palavras, porém, tentando de forma mais simples e menos formal disse: – Expedito, você deve começar de baixo, traçando a letra para cima e para baixo, para cima e para baixo, para cima e para baixo...

Dito ainda não tinha entendido como deveria escrever a letra ‘A’.

Esgotada, suando frio, pois somente aquele menino não tinha compreendido a lição. As outras crianças, também aflitas, permaneciam em silêncio e tristes com o sofrimento da professorinha.

Frustrada de tanto tentar em vão, chorando, sentou-se, com as mãos na cabeça e exclamou: – Meu Deus dê-me força e sabedoria nesta hora! Foi quando Mariazinha, irritada, levantou, pegou o giz da mão da professora, foi até o quadro negro e apontando a atividade, gritou: – Dito, “seu burro”, pra riba, descambeia, pra riba, descambeia, pra riba, descambeia...

Então o menino compreendeu o que a professorinha queria explicar com palavras tão estranhas à realidade rural em que vivia.
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Esta foi uma das cronicas vencedoras do 4º. Concurso Literário Cidade de Maringá - 2008
O autor é de Bragança Paulista/ SP
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Fontes:
http://odiariomaringa.com.br/noticia/219511
Imagem =
http://www.eurekakids.net

Poemas Vencedores do 4º. Concurso Literário Cidade de Maringá - 2008



Poemas Livres

Antônio Rosalvo R. Accioly (Nova Friburgo – RJ)
POR CIMA DOS OMBROS DA TARDE

Pelos ombros da tarde
o sol espia.
Seu olho de luz penetra no silêncio do paiol.
Entre o murmúrio do córrego,
e o murmúrio do beija-flor,
ouve-se o troar-troando do velho cocão
das rodas do carro de boi.
Pai e filho debulham o corpo do milho.
O avô varre o terreiro,
da sua boca voam duas borboletas amarelas,
e ele diz: “Minhas unhas tem o pretume do chão da terra.”

Das encostas das vertentes
o vento do sul sopra,
e o seu sopro invade as asas das andorinhas.

“O vento sul é frio.” Diz a avó,
ajeitando um pau de candeia na boca do fogão.
A água do café ferve,
e ela oferece um gole ao avô – que bebe –
espiando pelos seus olhos velhos
o contorno branco das nuvens que povoam o céu.

No coração da macega,
a jaracuçu brejeira desdobra seu corpo de cobra,
e escorre silenciosa pela moita do napiê.

“Tiê-tiê!” Grita o tiê.
“Qui é! Qui é!”
Responde o gavião pinhé.

Pelos ombros da tarde,
a luz sangra seu último sol,
e o bacurau abre seus olhos de estrelas.
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Danieli Aparecida dos Santos Benatti (Maringá/PR)
LAVRA (DOR)

Das mãos calejadas
Do suor do seu rosto
O alimento dos meninos

Dos olhos brilhantes
Das costas arqueadas
O peso do mundo

Na face aflita
Na boca, nos dentes
Os sonhos caídos

Nos ombros pesados,
No sorriso apertado
A árdua vida

Da terra se fez homem
Da pedra se fez firme
Dos caminhos se fez justo

Com suas unhas
Percorre as entranhas da terra

Com seus braços
Devasta os caminhos do mundo

Com seus olhos
Alarga o sol no horizonte

Com seu corpo
Recebe a benção da chuva

O sol renasce em seus olhos
A água brota de sua fronte
A semente nasce em seu peito.
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Emerson Mário Destefani (Maringá/PR)
ÊXODO

Como levar aquilo que não existe mais?

Os verdejantes cafezais abotoados de rosetas brancas
As perobas fantasmas
As onças extintas
O alarido dos últimos pássaros que habitavam as brenhas
Como levar a textura rubra da argila?

No caminhão colocou duas velhas camas,
uma mala de sacos, suas ferramentas,
uma prateleira de tábuas,
cadeiras alquebradas e um fogão carvoento
Diluídas em meio aos utensílios
colocou suas exíguas esperanças,
sua família, o cão e a mula,
sua raiva, seu desencanto

Antes de partir
Sufocou um soluço
Pela dureza da constituição de homem rude
Forjado na terra
Filho do chão, grão de solo

Como levar o que não existe mais?
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Maurício Pindamonhangaba Cavalheiro (Pindamonhangaba/SP)
CASA DE ROÇA


Bate pilão
da reminiscência...

Ontem
na casa de pau-a-pique
pelas rendas das paredes
de argila
o sol mandava os seus raios
dizimarem pesadelos.

A brisa
vinha compor melodias
e arrefecer o calor.

Os orifícios
da casa de pau-a-pique
tinham remendos de estrelas
que a noite cerzia
enquanto mamãe cantava
canções de ninar.

Hoje
(prosperidade?)
debruço-me na janela
do arranha-céu
espiando a noturnidade
poluída...
Não consigo dormir.

Onde está o meu lençol de estrelas?
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Vilmar Ferreira Rangel (Campos dos Goytacazes/RJ)
SERTÃO

A tarde se espreguiça nas varandas,
dissolve sombras no alpendre,
prenunciando o crepúsculo
no tênue recorte dos montes.
Percepções baldias anunciam
que a noite já espreita
e se emoldura na canção dos grilos.
O lume dos vaga-lumes
ponteia por entre brumas.
Presença anfíbia,
batráquios em vigília
embalam bucólicas lembranças.

Daqui avisto
o luxuoso arranjo dos laranjais,
a comportada calha dos eitos,
e, sinuosa, a linha das estrias
onde os pés fazem trilha.
Daqui ouço o galope
de lépidos corcéis,
asas frementes alvoroçando o espaço,
e sons que dançam alvíssaras
no caprichoso desacerto do riacho.

Aqui adormeço,
saciado pelo cromatismo
que inunda o poente,
até que a lua se apague
e se renda à luz nascente
para a colheita da aurora.
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Fonte:
Academia de Letras de Maringá

Paulo Monteiro (A Trova no Espiríto Santo – Parte VII)

Pintura de Lucy Aguirre
CARLOS JOSÉ CARDOSO

Fluminense, Carlos José Cardoso é bancário e reside há pouco tempo em terras capixabas. Cursou Contabilidade e Filosofia, que não chegou a concluir. Nasceu em 2 de abril de 1953.

Coração, amante louco,
E que carrega em seu cerne,
De toda verdade um pouco
Que Deus, amando, concerne.

Traze-me, vento da noite,
Toda a paz que a alma precisa.
Afasta de mim o açoite
Dando-me amor por divisa.

Nem tudo na vida tende
Àquilo que nós queremos;
A vida de Deus depende,
A sorte, nós a fazemos.

Vento que passa em meu rosto
Lembra teu beijo, querida,
Traz ao meu corpo o desgosto,
Dando-me em ti nova vida.

CLÉRIO JOSÉ BORGES

Clério José Borges de Sant`Ana é capixaba de Vila Velha, onde nasceu em 15 do setembro de 1950. É funcionário público estadual e professor. Está concluindo cursos de Direito e Pedagogia. Poeta e jornalista. É a figura máxima do trovismo capixaba, nos dias de hoje, por seu dinamismo. Organizou algumas coletâneas com outros trovadores.

Que mimo, estás a meu lado
Tão próxima, tão fagueira,
Enquanto eu embaraçado
Fico mudo a noite inteira.

São luzes de certo os sonhos
cheios de graça infinita
a iluminar-nos risonhos
na escuridão da desdita.

O belo luar prateado
e as estrelas cintilantes
formam conjunto encantado
na FOLIA dos amantes.

ELMO ELTON

Elmo Elton dos Santos Zamprogno é natural de Vitória, cidade em que vejo à luz em 15 de fevereiro de 1925. Poeta e ensaísta, é autor de diversas obras. Durante vários anos residiu no Rio do Janeiro. Recentemente retornou ao Espírito Santo e foi eleito Rei dos Trovadores Capixabas.

Conheço bem teu valor,
trilhamos igual caminho:
- Sei que te chamam de flor,
mas, nessa flor, quanto espinho!

Minha filha, não te iludas
com os beijos que te vão dar,
que os descendentes de Judas
estão em todo lugar.

Este pranto, sentimento,
deixa eu chorá-lo, tristonho,
que ele alivia, óleo bento,
a cicatriz do meu Sonho.

Anda a caçar pirilampos,
e, se consegue prendê-los,
desses insetos faz grampos
para enfeitar os cabelos.

Bate este sino, às novenas,
chamando o povo à oração:
- meu coração bate, apenas,
chamando por Conceição!

ELVIRO DE FREITAS

O médico Elviro Athayde de Freitas, nascido em Vitória no dia 21 de março de 1914, é exímio sonetista e autor de um grande número de trovas, verdadeiramente antológicas. Entre outras entidades culturais, pertence à Academia Cachoeirense de Letras.

Pede-nos, Nosso Senhor,
Que amemos os inimigos.
E eu pergunto se, a rigor,
Amamos nossos amigos...

A quem, dos moços, deplora
O tino, um lembrete eu dou:
Todos nós somos, agora,
O que um menino traçou.

Dentro da frase singela,
Uma profunda lição:
É melhor acender vela
Que xingar a escuridão.

Se nos víssemos assim
Como os outros vêem a gente
Este mundo tão ruim
Seria tão diferente...

Falam com tanta insistência
Em amor, em amizade
E, com a mesma freqüência,
Haverá sinceridade?

EVANDRO MOREIRA

Na histórica cidade de Cachoeiro de Itapemirim, o poeta Evandro Moreira nasceu. Advogado, jornalista e cronista, pertence a muitas entidades culturais do país e do exterior. É funcionário do Banco do Brasil. Sua data do nascimento: 27 de novembro de 1939. Publicou diversos livros, em prosa e verso. É um dos maiores divulgadores da literatura em terras capixabas.

Se beijo desse sapinho,
como tanto se apregoa,
sua boca, meu anjinho,
era beira de lagoa.

Quis brincar o meu destino
com meus sonhos de ilusão:
- Deu-me um rosto do menino
e de um velho o coração.

Pretendo ser nesta lida
humilde como a candeia
que, esquecendo a própria vida,
ilumina a vida alheia.

Quando sofro ingratidão,
em lamentos não demoro,
porque tenho um coração
que descanta o mal que choro.

Para quem sonha é mais leve
suportar a realidade.
O encanto de um sonho breve
disfarça a rude verdade.

Perdi-me na curva infinda
deste mundo de meu Deus,
por partir sem ter ainda
toda a luz dos olhos teus.

A saudade mais dorida
somente a pode explicar
quem espera, toda vida,
a quem não pode voltar.

As margens do rio são
sinuosas como o veio...
por isso é que minha mão
tem a forma de teu selo.

Não maldigas todo o mundo
por uma pena sofrida.
- O sofrimento profundo nos
faz entender a vida.

Por ironia ou maldade,
por outras coisas sutis,
quem busca felicidade,
é quase sempre infeliz.

Fontes:
http://www.usinadeletras.com.br

Machado de Assis (O Califa de Platina)



O califa Schacabac era muito estimado de seus súditos, não só pelas virtudes que o adornavam, como pelos talentos que faziam dele um dos varões mais capazes de Platina. Os benefícios de seu califado, aliás curto, eram já grandes. Ele iniciara e fundara a política de conciliação entre as facções do Estado, animava as artes e as letras, protegia a indústria e o comércio. Se havia alguma rebelião, tratava de vencer os rebeldes; em seguida perdoava-lhes. Finalmente, era moço, crente, empreendedor e patriota.

Uma noite, porém, estando a dormir, apareceu-lhe em sonhos um anão amarelo, que, depois de o encarar silenciosamente alguns minutos, proferiu estas palavras singulares:

— Comendador dos crentes, teu califado tem sido um modelo de príncipes; falta-lhe, porém, originalidade; é preciso que faças alguma coisa original. Dou-te um ano e um dia para cumprir este preceito: se o não cumprires, voltarei e irás comigo a um abismo, que há no centro da Tartária, no qual morrerás de fome, sede, desespero e solidão.

O califa acordou sobressaltado, esfregou os olhos e reparou que era apenas um sonho. Contudo, não pôde dormir mais; levantou-se e foi ao terraço contemplar as últimas estrelas e os primeiros raios da aurora. Ao almoço, serviram-lhe peras de Damasco. Tirou uma e quando ia a trincá-la, a pêra saltou-lhe das mãos e saiu de dentro o mesmo anão amarelo, que lhe repetiu as mesmas palavras da noite. Imagina-se o terror com que Schacabac as ouviu. Quis falar, mas o anão desaparecera. O eunuco que lhe servira a pêra estava ainda diante dele, com o prato nas mãos.

— Viste alguma coisa? perguntou o califa, desconfiado e pálido.

— Vi que Vossa Grandeza comeu uma pêra, muito tranqüilo, e, ao que parece, com muito prazer.

O califa respirou; depois recolheu-se ao mais secreto de seus aposentos, onde não falou a ninguém durante três semanas. O eunuco levava-lhe a comida, com exclusão das peras. Não lhe aproveitou a exclusão, porque no fim de três semanas, apetecendo-lhe comer tâmaras, viu sair de dentro de uma o mesmo anão amarelo, que lhe repetiu as mesmíssimas palavras de intimação e ameaça. Schacabac não se pôde ter; mandou chamar o vizir.

— Vizir, disse o califa, logo que este acudiu ao chamado, quero que convoques para esta noite os oficiais do meu conselho, a fim de lhes propor alguma coisa de grande importância e não menor segredo.

O vizir obedeceu prontamente à ordem do califa. Naquela mesma noite, reuniram-se os oficiais, o vizir e o chefe dos eunucos; todos estavam curiosos de saber o motivo da reunião; o vizir, porém, mais curioso ainda que os outros, simulava tranqüilamente achar-se na posse do segredo.

Schacabac mandou vir caramelos, cerejas, e vinhos do Levante; os oficiais do conselho refrescaram as goelas, avivaram o intelecto, sentaram-se comodamente nos sofás e cravaram os olhos no califa, que depois de alguns minutos de reflexão, falou nestes termos:

— Sabeis que tenho feito alguma coisa durante o meu curto califado; contudo, ainda não fiz nada que verdadeiramente se possa dizer original. Foi o que me observou um anão amarelo, que me apareceu há três semanas e ainda hoje de manhã. O anão ameaçou-me com a mais afrontosa das mortes, em um abismo da Tartária, se no fim de um ano e um dia, eu não tiver feito alguma coisa positivamente original. Tenho cogitado dia e noite, e confesso que ainda não achei coisa que merecesse essa qualificação. Por isso vos convoquei; espero de vossas luzes o concurso necessário à minha salvação e à glória da nossa pátria.

O conselho ficou boquiaberto, ao passo que o vizir, a mais e mais espantado, não movia um único músculo do rosto. Cada oficial do conselho fincou a cabeça nas mãos, a ver se descobria uma idéia original. Schacabac interrogava o silêncio de todos, e sobre todos, o do vizir, cujos olhos, fitos no magnífico tapete da Pérsia que forrava o chão da sala, parecia ter perdido a vida própria, tal era a grande concentração dos pensamentos.

Ao cabo de meia hora, um dos oficiais, Muley-Ramadan, encomendando-se a Allah, falou nestes termos:

— Comendador dos crentes, se quereis uma idéia extremamente original, mandai cortar o nariz a todos os vossos súditos, adultos ou menores, e ordenai que a mesma operação seja feita a todos os que nascerem de hoje em diante.

O chefe dos eunucos e diversos oficiais protestaram logo contra semelhante idéia, que lhes pareceu excessivamente original. Schacabac, sem a rejeitar de todo, objetou que o nariz era um órgão interessante e útil ao Estado, porquanto fazia florescer a indústria dos lenços e ministrava anualmente alguns defluxos à medicina.

— Que razão poderia levar-me a privar o meu povo desse natural ornamento? concluiu o califa.

— Saiba Vossa Grandeza, respondeu Muley-Ramadan, que, fundado na predição de um sábio astrólogo de meu conhecimento, tenho por certo que, daqui a um século, há de ser descoberta uma erva fatal ao gênero humano. Essa erva, que se chamará tabaco, será usada de duas formas — em rolo ou em pó. O pó servirá para entupir o nariz dos homens e prejudicar a saúde pública. Desde que os vossos súditos não tenham nariz serão preservados de tão pernicioso costume...

Esta razão foi triunfalmente combatida pelo vizir e todo o conselho, a tal ponto que o califa, aliás inclinado a ela, deixou-a inteiramente de mão. Então o chefe dos eunucos, depois de pedir licença a Schacabac para exprimir um voto, que lhe parecia muito mais original que o primeiro, propôs que dali em diante o pagamento dos impostos passasse a ser voluntário, clandestino e anônimo. Desde que assim for, concluiu ele, estou certo de que o erário regurgitará de sequins; o contribuinte crescerá cem côvados ante a própria consciência; algum haverá que, levado de legítimo excesso, pague duas e três vezes a mesma taxa; e afinado deste modo o sentimento cívico, melhorarão, e muito, os costumes públicos.

A maioria do conselho concordou em que a idéia era prodigiosamente original, mas o califa achou-a prematura, e aventou a conveniência de a estudar e pôr em execução nas proximidades da vinda do Anticristo. Cada um dos oficiais propôs a sua idéia, que foi julgada original, mas não tanto que merecesse ser aceita de preferência a todas. Um propôs a invenção da clarineta, outro a proscrição dos legumes, até que o vizir falou nestes termos:

— Seja-me dado, comendador dos crentes, propor uma idéia que vos salvará dos abismos da Tartária. É esta: mandai trancar as portas de Platina a todas as caravanas que vierem de Brazilina; que nenhum camelo, se ali recebeu mercadoria ou somente bebeu água, que nenhum camelo, digo eu, possa penetrar as portas da nossa cidade.

Espantado com a proposta, o califa ponderou ao vizir:

— Mas que motivo... sim, é preciso que haja um motivo... para...

— Nenhum, tornou o vizir, e nisto consiste a primeira originalidade da minha idéia. Digo a primeira, porque há outra maior. Peço-vos, e ao conselho, que acompanheis atentamente o meu raciocínio...

Todos ficaram atentos.

— Logo que a notícia de semelhante medida chegar a Brazilina, haverá grande reboliço e estupefação. Os mercadores ficarão pesarosos com o ato, porque são os que mais perdem. Nenhuma caravana, nem ainda as que vêm de Meca, quererá mais parar naquela cidade maldita, a qual (permita-me o conselho uma figura de retórica) ficará bloqueada pelo vácuo. Que acontece? Condenados os mercadores a não mercar para cá, serão obrigados a fechar as portas, ao menos aos domingos. Ora, como há em Brazilina uma classe caixeiral, que suspira pelo fechamento das portas aos domingos, para ir fazer suas orações nas mesquitas, acontecerá isto: o fechamento das portas de cá produzirá o fechamento das portas de lá, e Vossa Grandeza terá assim a glória de inaugurar o calembour nas relações internacionais.

Apenas o vizir concluiu este discurso, todo o conselho reconheceu, unânime, que a idéia era a mais profundamente original de quantas tinham sido propostas. Houve abraços, expansões. O chefe dos eunucos disse poeticamente que a idéia do vizir era “. O califa manifestou o seu entusiasmo ao vizir, dando-lhe de presente uma cimitarra, uma bolsa com cinco mil sequins e a patente de coronel da guarda nacional.

No dia seguinte, todos os cádis leram ao povo o decreto que mandava fechar as portas da cidade às caravanas de Brazilina. A notícia excitou a curiosidade pública e causou certa estranheza, mas o vizir tivera o cuidado de espalhar pela boca pequena a anedota do anão amarelo, e a opinião pública aceitou a medida como um sinal visível da proteção de Allah.

Daí em diante, por espaço de alguns meses, um dos recreios da cidade era subir às muralhas a ver chegar as caravanas. Se estas vinham de Damasco, de Jerusalém, do Cairo ou de Bagdá, abriam-se-lhe as portas, e elas entravam sem a mínima objeção; mas se alguma confessava que tocara em Brazilina, o oficial das portas dizia-lhe que passasse de largo. A caravana voltava no meio dos apupos da multidão.

Entretanto o califa indagava todos os dias do vizir se constava que em Brazilina se houvesse procedido ao fechamento das portas aos domingos; ao que o vizir invariavelmemte respondia que não, mas que a medida não tardaria a ser proclamada como conseqüência rigorosa da idéia que havia proposto. Nessa esperança, iam voando as semanas e os meses.

— Vizir, disse um dia Schacabac, quer-me parecer que estamos enganados.

— Descanse Vossa Grandeza, retorquiu friamente o vizir; o fato vai consumar-se; assim o exige a ciência.

Pela sua parte, o povo cansou de apupar as caravanas e começou a notar que a idéia do vizir era simplesmente amoladora. Não vinham da Brazilina as mercadorias do costume, nem o povo mandava para lá as suas cerejas, os seus vinagres e os seus colchões. Ninguém ganhava com o decreto. Começou-se a murmurar contra ele. Um boticário (ainda não havia farmacêutico) arengou ao povo, dizendo que a idéia do vizir era simplesmente vã; que jamais o trocadilho das portas fechadas chegaria a ter a mínima sombra de realidade científica. Os doutores eclesiásticos não acharam no Corão um só versículo que pudesse justificar tais induções e esperanças. Lavrava a descrença e descontentamento; começava a soprar uma aragem de revolução.

O vizir não teve só de lutar contra o povo, mas também contra o califa, cuja boa fé começou a desconfiar do acerto do decreto. Três dias antes de chegar o prazo fatal, o califa intimou o vizir a dar-lhe notícia do resultado que prometera ou a substituí-lo por uma idéia verdadeiramente original.

Nesse apertado lance, o vizir chegou a desconfiar de si, e a persuadir-se que aventara aquela idéia, levado do único desejo de desbancar os outros oficiais. Disso mesmo o advertiu Abracadabro, varão exímio na geomancia, a quem consultou sobre o que lhe cumpria fazer.

Esperar, disse Abracadabro, depois de traçar algumas linhas no chão; esperar até o último dia do prazo fatal marcado ao califa. O que há de acontecer nesse dia, não o pode descortinar a ciência, porque há muita coisa que a ciência ignora. Mas faze isso. No último dia do prazo, à noite, tu e o califa deveis recolher-vos ao mais secreto aposento, onde vos serão servidos três figos de Alexandria. O resto lá saberás; e podes ficar certo de que será coisa boa.

Deu-se pressa o vizir em contar ao califa as palavras de Abracadabro, e, fiados na geomancia, aguardaram o dia último. Veio este, e depois dele a noite. Sós os dois, no mais secreto aposento de Schacabac, mandaram vir três figos de Alexandria. Cada um dos dois tirou o seu e abriu-o; o do califa deu um pulo, subiu ao teto e caiu logo no chão, sob a forma do famoso anão amarelo. Vizir e califa tentaram fugir, correndo às portas; mas o anão os deteve com gesto amigo.

— Não é preciso fugir, disse ele; não venho buscar-te; venho somente declarar, que achei verdadeiramente original a idéia do fechamento das portas. Certo é que não deu de si tudo o que o vizir esperava; mas nem por isso perdeu de originalidade. Allah seja convosco.

Livre da ameaça, o califa mandou logo que todas as portas se abrissem às caravanas de Brazilina. O povo aquietou-se; o comércio votou mensagens de agradecimento. E porque o califa e o vizir eram homens instruídos, práticos e dotados de boas intenções, e apenas tinham cedido ao medo, sentiram-se contentes com repor as coisas no antigo pé, e não se encontravam nunca sem dizer ao outro, esfregando as mãos :

— Aquele anão amarelo!

Fontes:
Publicado originalmente em O Cruzeiro 1878
– ASSIS, Machado de Assis. Páginas recolhidas

Manoel de Barros (Nos Primórdios)



Era só água e sol de primeiro este recanto. Meninos cangavam sapos. Brincavam de primo com prima. Tordo ensinava o brinquedo "primo com prima não faz mal: finca finca". Não havia instrumento musical. Os homens tocavam gado. As coisas ainda inominadas. Como no começo dos tempos.

Logo se fez a piranha. Em seguida os domingos e feriados. Depois os cuiabanos e os beira-corgos. Por fim o cavalo e o anta batizado.

Nem precisaram dizer crescei e multiplicai. Pois já se faziam filhos e piadas com muita animosidade.

Conhecimentos vinham por infusão pelo faro dos bugres pelos mascates.

O homem havia sido posto ali nos inícios para campear e hortar. Porém só pensava em lombo de cavalo. De forma que só campeava e não hortava.

Daí que campear se fez de preferência por ser atividade livre e andeja. Enquanto que hortar prendia o ente no cabo da enxada. O que não era bom.

No começo contudo enxada teve seu lugar. Prestava para o peão encostar-se nela a fim de prover seu cigarrinho de palha. Depois, com o desaparecimento do cigarro de palha, constatou-se a inutilidade das enxadas.

— O homem tinha mais o que não fazer!

Foi muito soberano mesmo no começo dos tempos este cortado. Burro não entrava em seus pastos. Só porque burro não pega perto.* Porém já hoje há quem trate os burros como cavalo. O que é uma distinção.
––––––––––––––––––––––-

Nota: Burro não pega perto é expressão pantaneira. Nas lides de campear o pantaneiro usa o cavalo, que é veloz e alcança a rês desgarrada rapidamente. O cavalo pega perto. Mas o burro, não sendo veloz, alcança longe a rês desgarrada. Por isso se diz que o burro não pega perto.

Fonte:
BARROS, Manoel de. Livro das Pré-Coisas. RJ: Record, 1985.