sábado, 20 de março de 2010

Estante Virtual presente em 50 cidades de 22 a 26 de Março

Depois de revolucionar a Bienal do Livro no Rio de Janeiro com o serviço de troca de livros, vai novamente materializar a Estante Virtual! E dessa vez não será em apenas um lugar, mas em 50 cidades ao mesmo tempo!

De 22 a 26 de março, a Estante vai ter postos de busca em mais de 70 universidades de todo o país. De Pelotas/RS a Boa Vista/RR, os stands serão pilotados por sebos, livreiros virtuais e até mesmo leitores, que se engajaram nessa divulgação, como a Samia, de Rio Branco/AC, e o Tiago, de Santa Maria/RS.

Em cada posto de busca, os visitantes vão se deparar com um desafio: descobrir um livro que não esteja no portal! Isso mesmo, o desafio agora é achar algum título que não está na Estante.

Quem conseguir realizar a proeza, preencherá um cupom eletrônico para concorrer a R$100 em livros por posto de busca. E, claro, para tornar as coisas mais emocionantes, o tempo será limitado: 1 minuto, medido por uma ampulheta (de verdade, com areia!), que será também presenteada ao ganhador, como troféu. Já quem encontrar todos os livros que procurar (o caso mais comum!) também vai concorrer a 10 vales de R$ 100 em livros, estes sorteados entre todos os visitantes, de todos os 70 stands. Os nomes dos ganhadores serão divulgados no blog no dia 31/03/2010

O objetivo disso tudo é mostrar para todo o país que os sebos brasileiros, com acervos reunidos aqui na Estante, têm todos os tipos de livros. Ou seja, não servem apenas para se procurarem raridades, como muita gente boa ainda pensa, mas para qualquer demanda de livro. Seja ele lançado há 10 anos ou há poucos meses, seja ele um livro comum ou um best-seller, via de regra você pode comprá-lo nos sebos - e por um preço muito mais acessível do que nas livrarias!

Acompanhe na próxima semana, no blog da Estante , toda essa movimentação nacional! Vamos postar fotos e vídeos de toda a parte do Brasil. Veja também o regulamento da campanha e a lista das mais de 70 universidades com postos de busca.

André Garcia
Criador / Diretor
http://www.estantevirtual.com.br/

PS: As cidades em que se materializará:
Aracaju/SE,
Belém/PA,
Belo Horizonte/MG,
Boa Vista/RR,
Brasília/DF,
Camaçari/BA,
Campina Grande/PB,
Campinas/SP,
Campo Grande/MS,
Canoas/RS,
Criciúma/SC,
Cuiabá/MT,
Curitiba/PR,
Dourados/MS,
Florianópolis/SC,
Fortaleza/CE,
Goiânia/GO,
Ijuí/RS,
Iratí/PR,
João Pessoa/PB,
Juiz de Fora/MG,
Leme/SP,
Londrina/PR,
Macapá/AP,
Maceio/AL,
Manaus/AM,
Maua/SP,
Natal/RN,
Palmas/TO.
Pelotas/RS,
Petrópolis/RJ,
Piracicaba/SP,
Porto Alegre/RS,
Porto Velho/RO,
Recife/PE,
Ribeirão Preto/SP,
Rio Branco/AC,
Rio de Janeiro/RJ,
Salvador/BA,
Santa Maria/RS,
São Bernardo do Campo/SP,
São José dos Campos/SP,
São Leopoldo/RS,
São Luis/MA,
São Paulo/SP,
Sorocaba /SP
Teresina/PI,
Tubarão/SC,
Uberlândia/MG,
Vitória da Conquista/BA,
Vitória/ES,

Fonte:
Newsletter da Estante Virtual. edição 30.

Nilton Manoel (Trovas Avulsas)

Canta o galo, nasce o dia!
do chão da praça sem nome,
põe num canto a moradia,
para lutar contra a fome.

vida com seus mistérios
mostra-nos e muito bem
que no Poder, homens sérios,
são sérios se lhes convém.

Dia da árvore, na escola,
faz-se festa às derrubadas;
a folhagem, sempre amola
sujando pátio e calçadas.

O mundo vive pedante;
grita e clama por socorro!
Gasta-se alto a todo o instante,
Não com gente... com cachorro!

Casa velha, quanto encanto!
tem cobras, cupins, lagartos...
uma história em cada canto
e fantasmas pelos quartos.

Na feira da corrupção
dois produtos têm destaque:
-laranja na execução;
pepino na hora do baque!

Meu filho só dá trabalho...
diz, na escola, o pai irado!
e o mestre olhando o pirralho...
por isto estou empregado!
======
Fonte:
Colaboração do autor

Nilton Manoel



Poeta e prosador, normalista, pedagogo, especialista em Educação, contabilista, jornalista; dedica-se a artes visuais, a numismática e a filatelia.

Autor de Didática da Trova, Cem anos de jornalismo escolar, co-autor de Alfabetização e Letramento. No momento pesquisa a importância dos textos literários do programa Ler e Escrever e a didática poética dos textos do PNLD de 2010.

Pertence a Institutos Históricos e Geográficos, clubes de leitura e entidades de genealogia, Academia Virtual Brasileira de Letras, Academia Brasileira Poesia. Pertenceu a grupos de teatro e a Escola Municipal de Belas Artes.

Foi produtor e apresentador radiofônico de Cultura em Movimento, ex-Conselheiro Municipal de Cultura (3 gestões).

Em Educação: coordenou um dos núcleos do Mobral; ex-PCP da DRE/SP. Cursista dos projetos: Ipê, Profa, Letra e Vida, Teia do Saber, Escola Cidadã, Circuito de Gestão, Tecendo Saberes, TDAH, informática educacional básica e avançada, etc.

Tem comendas e prêmios recebidos.

Realiza, anualmente, os Jogos Florais Internacionais e Estudantis de Ribeirão Preto.

Livros reeditados: Cenas Urbanas, Trovas da Juventude; Caviar, Gororoba e Sal de Frutas, Sandálias de Peregrino, Poesia Mágica.

Fonte:
Colaboração do autor

sexta-feira, 19 de março de 2010

Trova 129 - Sinclair Pozza Casemiro (Campo Mourão/PR)

Antonio Abel Fernandes (Cascata Poética)

INSPIRAÇÃO

Novamente estou feliz hoje...
A alegria chegou no meio da madrugada
Como uma gaivota de asas prateadas
Planando leve como pluma ao vento...
Chegou como chega uma saudade,
Como chega uma verdade...

Como chega um esperado momento...
Chegou silenciosa...
Como pétala de rosa
Desprendida
E livre...

Chegou como uma folha de outono
Carregada pela brisa fresca e perfumada...

Chegou como um fiapo de algodão ao vento...
Como um leve e etéreo pensamento...
Como o sonho de uma criança feliz...
Como o som de palavras que um jovem enamorado diz
À sua amada...

Chegou como o eco de uma música distante...
Como o canto de um pássaro errante...
Como a primeira gota de chuva em terra quente...
Como o brilho fugaz e tremulante
De uma estrela cadente...

Chegou discreta,
Sem ruído...
Como chega o poeta
Em sua mesa predileta...
Num cantinho qualquer
De um bar
Por aí, perdido...

Chegou de mansinho
Como águia em seu ninho,
Como chega ao telhado o passarinho...
Mas chegou para ficar!
Pois aqui é o seu lugar!

RESPIRAÇÃO

De uns tempos para cá
Estou sentindo algo inusitado!...
Sinto-me feliz, em paz e relaxado!...

Já não me preocupo mais com o presente,
Nem com o futuro...
Esse tirano obscuro
Esse algoz inexorável
Que arrasta tanta gente
A um sofrimento inútil e interminável...

Nem me preocupa mais o meu passado...
O que fiz ontem de certo ou de errado
Tudo já caiu no esquecimento...
Creio até que já fui perdoado!

O amanhã, para mim,
Já não é mais assustador!...
Já não sinto mais aquele medo de doença ou “dor”...
Ouço apenas as batidas do meu coração...
E o ruído agradável e aveludado
Da minha respiração...

Há, sem dúvida alguma
Uma ligação
Entre o meu respirar
E o pulsar
Compassado
Do meu coração...

É no meu respirar que está o mistério,
O segredo
E o sagrado...
Durante o dia eu pratico uma respiração ritmada...
O ar entra e sai dos meus pulmões
Como o descer e o subir harmonioso
Dos degraus de uma perfeita escada!...

De uma forma tranqüila, sem pressa.
E sem agitações...
Sinto uma energia boa percorrendo a espinha...
E uma alegria
Diferente
Que é só minha!...

Creio que é nesta minha habitual atitude
Que está o segredo do meu bem-estar continuado...
E do meu prazer de viver
Pleno de saúde,
Sem tédio e sem enfado!...
--------------
Fonte:
Colaboração do poeta.

quinta-feira, 18 de março de 2010

Trova 128 - Marcelo Zanconatto (São Paulo)

Antonio Manoel Abreu Sardenberg (Meu Velho Pião)


Peguei a fieira fina,
Enrolei no meu pião.
Dei um impulso com o pulso
Lancei o brinquedo ao chão.
Vi meu passado girando
E aos poucos fui lembrando
As voltas que vida dá
E que não podem voltar
Como o giro de um pião!

Gira, meu velho pião,
Não perca tempo com o tempo
Pois que a vida é momento,
O resto é só ilusão...

Não adianta remorso
E nem arrependimento...
O que girou, já girou,
O passado já passou,
Pode esquecer que é besteira,
É pião que foi lançado
E com o punho arremessado
Pela ponta da fieira...
_______________

Fonte:
Colaboração do Poeta

Orlando Silva (Pião)


Tempo alegre de menino
Cheio de sonho e ilusão
Acreditava na vida
Ria e jogava pião
Mas tu foste no meu destino
Um brinquedo multicor
A minha ilusão perdida
Um lindo sonho de amor

O pião corre assim na calçada
A rodar, a rodar, a rodar
Eu invejo a feliz garotada
A salvar, a cantar, a brincar
O destino puxou a fieira
Desse pobre romance de amor
Hoje eu fico tristonho a chorar
E tu segues na vida
A rodar, a rodar
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Fonte:

Beatriz Nassif (O Pião)



O filho ganhou um pião do pai que lembrou como ficou feliz quando ganhou seu primeiro pião de seu pai. O filho falou “Legal” e logo perguntou:

- Isso é uma escultura de pêra?
-Não! Isso é um pião!
-Ah! Uma escultura de pêra se chama peão! E eu achando que peão era uma peça de xadrez!
-Filho, peão é uma peça de xadrez.
-Ah!
- Entendeu agora?
-Sim. Peão tem mais de um significado!
- Pelo amor de Deus! Isso é um pião, mas se escreve com “i”.
- Ah! É um “pião”! E como é que se usa?
- Filho, para usar um pião, você enrola uma cordinha no pião, que vem no pacote, e solta, assim ele começa a girar.
- Ah! Que nem os que vêm nos salgadinhos, só que nesse tem cordinha.
- É, mas o dos salgadinhos é sem graça! Até que enfim você entendeu!
- Pai!

O pai pensou “Ai meu Deus” e disse:

- O que filho?
- Porque você não me deu as instruções? É bem mais fácil!
- Porque não tem.
- Mas por quê?
- Porque…- ele pensou que ia dar o maior trabalho para explicar e disse:
- Deixa pra lá.

Depois de um tempo, o pai encontrou o menino na frente da tevê, com o pião novo ao lado, mexendo nos controles do videogame. Algo chamado “Monster Top” (pião monstro). O pai pensou: “Na próxima vez vou dar um carrinho…” Ele olhou novamente para o menino e continuou pensando: “Pensando bem, um videogame com carrinho”.
__________
Baseada na crônica Bola, de Luís Fernando Veríssimo

Fonte:
http://beatriznassif.wordpress.com/2008/10/23/o-piao/

Célio Simões (Um desastrado jogo de pião)


Todo dia a exasperante rotina se repetia. Eu tinha que seguir pela rua Dr. Machado até a Farmácia Esculápio, esquina com a Bacuri, descer com o freio de mão puxado no rumo da beira, dobrar a direita no Chocron e entrar na “Casa Careca”, para comprar cinco pães e cem gramas de manteiga marca “Aviação”, acondicionadas em latas amarelas. Depois de pesada, era embrulhada numa praga de papel celofane, do qual escorria para o meu braço parece mingau de crueira, derretendo a olhos vistos sob o implacável calor da manhã. E eu ainda aturava o repetitivo chiste de rima pobre do italiano:

- Seu Caporal, quero cinco pães.

- Pães não hães!

Que lindo! A mesma graça, entra ano sai ano. Feita a compra, tinha início o percurso contrário. Subida da ladeira da Dr. Machado a partir do Chocron, cheiro de morcego exalando do solar do Barão do Solimões, uma parada para ver seu Galúcio soldando peças feitas no torno com perfeição de artista, olhos protegidos da chuva de centelhas incandescentes com óculos pretos de escafandro. Depois, nova parada para observar como estava o guarda-chuva do padre do velho Vidal. Lembram dele?

Segundo apregoava seu sócio Crispim, um sujeito branquelo, careca e bonachão, a quem faltava um generoso pedaço da orelha esquerda, esse sacerdote era sábio na previsão do tempo. Pregado na parece do interior da mercearia, a miniatura do religioso envergando batina preta e um inseparável guarda-chuva constituía atração à parte. Quando o sol estava a pino, o equipamento inclinava-se para trás, evidenciando ser dispensável; quando o toró se aproximava, o mesmo retornava a sua posição normal, protegendo o beato do aguaceiro que se avizinhava. Na verdade, tudo era controlado por um bastão de mercúrio, que oscilava ao sabor da temperatura ambiente. Para mim, moleque abestado, o tal padre era a quintessência da prestidigitação, espécie de segredo insondável que os donos da loja guardavam a sete chaves e morreram sem me revelar.

Depois dessas estratégicas paradas, a descida pela rua de terra até em casa, passando em frente ao Grupo Escolar José Veríssimo, até que era rápida. Nessas alturas, porém, o feixe de cinco pães enrolados numa tirinha miserável de papel já se soltara e não raro algum caía pelo chão, incômodo que era secundado pela melequeira geral da manteiga se espalhando por todos os lados, prenúncio de ralho ou coisa pior por parte de d. Lady. Mas o que realmente me invocava era a postura daquele sujeito, ar superior, sentado calmamente na calçada da casa do seu José Batista, vendo meu desespero, sem poupar-me do desafio:

- E aí Célio, a gente vai ou não jogar pião hoje?

O cara vivia me enchendo a paciência. Éramos vizinhos e parceiros de aventuras durante o verão, quando o vento arfante do Laguinho estufava nas alturas os coloridos papagaios empinados, porfiando entre si fiados na eficácia das linhas enceradas com vidro de magnésia moído no pilão, supostamente o melhor que existia. No jogo de peteca demonstrávamos quase a mesma habilidade, ora eu ganhando, ora ele, de modo que nunca nossos estoques de “bolivianas” ficaram desfalcados por uma que outra imprevisível derrota. Porém, o seu ostensivo desafio no jogo de pião tinha uma clara razão de ser. Ele era dono de um alentado pião do melhor jacarandá feito no torno, cujo certeiro e preciso arremesso com linha americana o tornou imbatível entre os moleques que freqüentavam o antigo matadouro. Por sua notória perspicácia, sabia ele que eu não dispunha de um igual ao seu, nem de dinheiro para comprar de quem quer que seja, fato que o estimulava às constantes provocações.

Naquele ano de 1958, quando o Brasil pela vez primeira ganhou a Copa do Mundo com um timaço de fazer inveja a esse simulacro de Seleção que hoje existe (Gilmar, Djalma Santos, Belini, Orlando e Nilton Santos; Zito e Didi; Garrincha, Pelé, Vavá e Zagalo), o Amazonas foi de uma generosidade franciscana para com os obidenses. No trapiche em frente à usina da Companhia Paulista de Aniagem, onde se prensava toda a juta da região, fila de estivadores bamburravam na captura do jaraqui, com o sincronizado bailado de suas tarrafas antes de mergulharem no caudal barrento, para voltarem à superfície prenhes do peixe símbolo dos Pauxis. Menino pra todo lado gritando “pega o resto!” a cada lance mais ousado dos tarrafeadores; outros juntando as sobras para um cozido na mesa modesta dos moradores do Cariazal; outros mais, simplesmente se refrescando no banho gostoso do traiçoeiro remanso e o sujeito lá, olhando-nos de cima para baixo, escorado no poder do belo pião enfiado na ilharga do calção, pronto para o enfrentamento, mesmo ali sendo lugar de pescaria e não de uma disputa terrestre.

Paciência tem limite. Aquilo não podia continuar. Fui me aconselhar com o “Rato Branco”, serviçal da casa do Silvestre Reis, escrachado até no apelido, que tinha o diabo no couro mas sabia das coisas, tanto que era respeitado pelos demais porque era bom de porrada e (diziam) introduzira sob a pele do braço direito uma veia de poraquê, que o tornava imbatível nas competições de queda de braço na fila do mercado. Contei-lhe meu problema. Disse que aquele camarada, ao mesmo tempo meu amigo e meu vizinho, sonhava em duelar comigo num jogo de pião, mas eu não dispunha de nenhum, nem de dinheiro para comprar. Terminado o relato, ouvi compenetrado as orientações do ilustre roedor:

- Tem mesa ou cama de madeira na tua casa?
- Claro. Meus pais iam comer ou dormir aonde?
- Claro uma p... Não chateia. Tu quer ou não o conselho?
- Por que essa pergunta sobre a mesa e a cama?
- Tem serrote na tua casa?
- Tem. Mas espera aí. O que mesa, cama e serrote têm a ver com jogo de pião?
- Tu faz o seguinte. Pega o serrote, serra o pé da cama, acerta as bordas com um terçado e coloca um prego na ponta que vira um pião. Se não der, leva pro seu Inácio, bem no lado da Igreja, que ele fabrica caixão de defunto e faz pra ti. Quando ele te desafiar, pode disputar que tu vai acabar ganhando...

Com aquela idéia, larguei a pescaria de jaraqui e entrei furtivamente em casa, esgueirando-me no rumo do quarto dos meus pais. Lá estava a bela cama e para minha sorte, os quatro pés já eram torneados em formato de cone invertido, tornando desnecessária a tarefa de usar o terçado. Arranjei o prego, cortei a cabeça com um alicate, amolei na calçada e fiquei de tocaia esperando todo mundo sair para que o serrote, de ruído escandaloso, fosse utilizado. A chance apareceu quando meus velhos foram fazer compra na “A Pernambucana”, que recebera um enorme estoque de casimira “Aurora” e a Risete avisou que o preço estava uma pechincha. Apanhei a serra e decepei o pé da cama, que obviamente ficou capenga. O jeito foi quebrar um pedado do muro do quintal da dona Domingas, mãe da d. Maria Menezes (precursora das modernas cabeleireiras, ela frisava as madeixas das moças com água quente e não raro uma delas ia para a festa sem um pedaço do couro cabeludo...), nivelando-a na parte posterior, próximo à parede, para que ninguém notasse o estrago. Consegui com o Amadeu, vizinho e comandante do “Sialpe”, um pedaço de linha americana e me senti pronto para duelar com meu antagonista.
Sete e meia da manhã, um sol desmaiado surgiu atrás da Serra da Escama. Morto de preguiça fui tangido para meu dever cívico de comprar os pães e a abominável manteiga na padaria do Careca.

- Seu Caporal, quero cinco pães.
- Pães não hães!

Carcamano f.d.p. um dia tu me paga, pensei. Comprei os pães cacetes e a praga da manteiga “Aviação” que logo viraria mingau e voltei no mesmo passo. Vi seu Galúcio fabricando soldando suas peças na oficina e o padre do velho Vidal tentando cobrir a cabeça num sinal claro que iria chover. Passei pelo quintal do Dr. Emanoel Rodrigues e olhei a quantidade de motores de popa prontos para a próxima caçada de pato do mato, esporte favorito do famoso advogado. Confronte à esquina do José Veríssimo lá estava ele, posudo, com seu pião de jacarandá. Na oportunidade, novo repto me foi lançado:

- E aí Célio, é hoje?
- Como tu quiser. Agora já tenho meu pião...

Deixei na parte que me pareceu mais limpa da calçada os pães e a nojenta da manteiga, riscamos um círculo no chão para “tirar o ponto” e demos início à peleja. Infelizmente perdi (ele era mesmo um craque...) e meu pião feito da perna da cama dos meus pais foi para a roda. Em seguida, após enrolar caprichosamente a linha americana no seu garboso artefato, como que sorvendo prazerosamente cada segundo da minha angustiante expectativa, mirou, aprumou e soltou o golpe fatídico com tamanha violência, que a ponta de ferro do petardo penetrou na frágil peça de cedro improvisada, ficando encravada na mesma, inutilizando-a por completo. Adeus pé da cama, que nunca mais recuperou a performance, nem com o reparo que lhe fez o carpinteiro Vevé.

Julho de 2008. Eu acabara de jogar a preliminar de Mariano X Paraense no Estádio Ary Ferreira, em Óbidos, num calor dos infernos. Troquei de roupa e junto com o Sérgio, meu filho, posicionamo-nos na arquibancada para assistir o prélio entre as equipes titulares desses famosos times locais. Com a voz embargada por incontáveis doses da tinhosa, eis que aparece meu velho opositor, deu-me um abraço e sem meias palavras lançou dessa vez um outro desafio.

- Precisas escrever sobre o nosso jogo de pião, quando tu serraste o pé da cama do teu pai... mas não te esquece que fui eu que ganhei!
- Mas como eu vou contar um negócio que nem me lembro mais?
- Te vira, apela pra tua memória, mas não esquece. Meu pião inutilizou o teu!

No Baile dos Pauxis tornei a encontrá-lo, acompanhado de sua digna esposa. Lá mesmo comecei a reconstituir os fatos, tarefa interrompida com justiça pelo desfile de Monique, a bela Garota Óbidos 2008. Meu estimado amigo João Cândido de Amorim Pinto, não se trata de proselitismo de perdedor, porém, cinqüenta anos depois daquela peleja, está resgatado meu compromisso de narrar o episódio tal como ele aconteceu. Em contrapartida você, sempre brilhante em tudo que faz, ainda tem na consciência um pecado a ser remido. A responsabilidade, embora indireta, por uma cama de apenas três pernas, que me custou uma senhora surra com corda de manilha e até hoje não sei que fim levou.

Fonte:
http://www.obidos.com.br/

quarta-feira, 17 de março de 2010

1a. Bienal do Livro do Paraná



No dia 10 de março aconteceu, no Estação Convention Center, o coquetel de lançamento da 1ª Bienal do Livro do Paraná.

Bienal do Livro do Paraná acontece em Curitiba em outubro de 2010. Evento segue os moldes consagrados da Bienal do Livro do Rio de Janeiro: uma grande festa da Cultura, Literatura e Educação.

De 1º a 10 de outubro de 2010, Curitiba será a capital da literatura. A cidade vai receber a Bienal do Livro do Paraná, no Estação Embratel Convention Center.

A Bienal será uma realização da Fagga Eventos, em conjunto com o Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL) e a Câmara Brasileira do Livro (CBL).

O objetivo do evento é incentivar o hábito da leitura e democratizar o acesso aos livros e a literatura, fortalecendo a Educação e a Cultura no país. A Bienal do Livro do Paraná seguirá o modelo já consagrado da Bienal Internacional do Livro do Rio de Janeiro, que em 2009 chega à sua 14ª edição, e das Bienais do Livro de Minas Gerais e da Bahia, sendo muito diferente do evento literário recentemente realizado em Curitiba.

Uma grande festa do livro. Assim será a Bienal do Livro do Paraná. Uma vasta programação cultural, direcionada para todos os públicos – de todas as idades – irá proporcionar o encontro dos leitores com seus autores, incluindo palestras, debates, sessões de autógrafos e visitação escolar. A expectativa é receber, durante os 10 dias de evento, público de aproximadamente 200 mil pessoas – sendo 40 mil alunos de escolas da rede pública e privada. O evento ocupará dois auditórios do Estação Embratel, um total de 246 metros quadrados de área. São esperados 60 expositores na edição de 2010. Uma das grandes atrações da Bienal será o Café Literário, palco de encontros informais e descontraídos entre autores e público. A programação diversificada possibilita que sejam apresentados temas como humor, processo criativo e preferências literárias, entre outros.

Com foco no público infanto-juvenil, a Bienal vai oferecer uma série de atividades especiais que irão estimular o prazer pela leitura. Uma área será transformada no Circo das Letras, com direito a picadeiro e luzes coloridas, onde serão realizadas oficinas de leitura e apresentação de contadores de histórias.

O evento contará com uma diversificada programação cultural, incluindo a atração Café Literário, que vai reunir autores e público em um bate-papo e debates sobre diferentes temas. A bienal acontecerá no Estação Embratel Convention Center. A curadoria do evento está nas mãos do jornalista Rogério Pereira, fundador do jornal literário Rascunho. A promoção é da Fagga Eventos, também responsável pela tradicional Bienal do Livro do Rio de Janeiro. A edição paranaense recebe o apoio do Sindicato Nacional dos Editores de Livros e da Fundação Cultural de Curitiba.

Segundo Andréia Raspold, vice-presidente da Fagga Eventos, a Bienal do Livro Paraná já era um sonho antigo da empresa e que agora poderá ser concretizado. “O nosso foco é trabalhar o autor e o livro. A ideia é fazer um evento atrativo, que chame as pessoas e que elas se divirtam. Não queremos somente o público leitor, mas também formar leitor”, comenta.

A programação também tem foco no público entre 7 a 13 anos por causa deste objetivo. Haverá atividades infantis e também o Arena Jovem, um espaço voltado para a interação dos jovens com autores e personalidades. A atração Circo das Letras vai despertar o prazer pela leitura de uma forma lúdica. A Bienal do Livro Paraná ainda possui o projeto Visitação Escolar, para a participação de alunos do Ensino Fundamental das escolas municipais, estaduais e particulares da cidade. Especificamente para os estudantes da rede pública, o valor do ingresso será trocado por um voucher. Este poderá ser utilizado na compra de um livro nos estandes das editoras presentes. Para participar da iniciativa, as escolas devem enviar projetos pedagógicos, como a criação de um Clube do Livro na sala de aula. Uma maneira de formar isto é a aquisição de um livro diferente por cada estudante. Os professores terão acesso livre à bienal.

Serão 10 dias de evento, com expectativa de reunir 200 mil visitantes durante toda a bienal. A programação final, com as atrações especificadas, deve ser divulgado um mês antes da realização da Bienal do Livro Paraná. A Fagga Eventos também é responsável pelas bienais do livro de Minas Gerais e Bahia, além da do Rio de Janeiro, promovida há mais de duas décadas.

O diretor de marketing da Fundação Cultural de Curitiba, Eduardo Pimentel Slaviero, afirma que a Bienal do Livro Paraná vai resultar em benefícios para a cidade. De acordo com ele, toda ação que incrementa as áreas literária e cultural da cidade vai contar com o apoio da Prefeitura de Curitiba, por meio da fundação. “Este é um evento muito importante para a cidade porque coloca Curitiba em evidência no cenário nacional. Esperamos que a bienal tenha sequência aqui em Curitiba, como acontece com a Bienal do Rio”, revela. A Fundação Cultural de Curitiba tem intensificado ações na área da literatura, com programas de incentivo à leitura e produção literária, mediante oficinas, cursos e palestras.

Serviço:

Bienal do Livro do Paraná

Data: 01 a 10 de outubro de 2010

Local: Estação Embratel Convention Center – Avenida Sete de Setembro 2.775 - Curitiba

Realização: Fagga Eventos, Sindicato Nacional dos Editores de Livros – SNEL, Câmara Brasileira do Livro – CBL. Mais informações: www.bienaldoparana.com.br

Fonte:
Simultaneidades.

Roberto de Souza Causo (Anjo de Dor)


artigo de Gian Danton para o Digestivo Cultural.

Até há pouco tempo existia um grande preconceito contra a literatura de terror brasileira. Acreditava-se que uma história passada em São Paulo, com personagens com o nome de Ricardo, não conseguiriam chegar aos pés dos livros escritos nos EUA, com personagens chamados, por exemplo, Richard. Era um preconceito que dominava a literatura do gênero, incluindo a ficção científica. Editoras colocavam banners em seus sites com os dizeres: "Não aceitamos originais de ficção científica" ou "Não aceitamos originais de terror".

Felizmente as coisas mudaram, e muito. O sucesso dos vampiros de André Vianco (Os sete) e da fantasia de Orlando Paes Filho (série Angus) abriu os olhos das editoras para os talentos nacionais. Graças a isso, podemos hoje ler obras como Anjo de dor (Devir, 2009, 212 págs.) de Roberto de Sousa Causo.

Roberto Causo é um dos mais importantes e respeitados nomes da literatura desse gênero, no Brasil. Começou a publicar profissionalmente no início da década de 1990, mesmo período em que organizou a I Convenção de Ficção Científica do Brasil, em Sumaré, São Paulo. O evento contou com a presença do badalado escritor Orson Scott Card. Roberto foi um dos classificados no Concurso de Contos Jerônymo Monteiro, promovido pela célebre Isaac Asimov Magazine, editada pela Record, que marcou época, influenciando toda uma geração de fãs e escritores. Colaborou com a revista publicando, além de contos, entrevistas e resenhas.

Desde então, tem publicado textos sobre o gênero de horror nos mais diversos veículos, de Playboy à Cult. Também é um conhecido organizador de coletâneas, como Dinossauria Tropicalia (GRD, 1994), Rumo à Fantasia (Devir, 2009) e Os Melhores Contos Brasileiros de Ficção Científica (Devir, 2008), além de ter publicado romances, como A corrida do rinoceronte (Devir, 2006).

Anjo de dor, sua mais recente publicação, mostra que o preconceito contra o horror nacional é apenas isso: preconceito. Causo começou a escrevê-lo em 1990, num barracão que foi o que restou da cozinha e do banheiro da casa de seus pais, derrubada pela prefeitura de Sumaré para ampliação de uma avenida. Antes dele, quem ocupava o lugar era um ex-pugilista chamado Ricardo. O texto era escrito de madrugada, em uma velha máquina Olivetti. O clima em que foi escrito certamente influenciou a obra. O ex-pugilista deu nome ao protagonista, um barman de uma casa noturna, e a história se passa toda em Sumaré.

Anjo de dor inicia com a chegada à cidade de uma cantora talentosa e bonita, mas repleta de mistérios, Sheila Fernandes. O responsável por pegá-la na rodoviária é justamente o barman Ricardo. Começa aí uma relação de paixão e desconfiança que desembocará no terror quando o passado da cantora a alcançar.

O romance tem óbvia influência de Stephen King (o filme Cemitério Maldito é inclusive citado em um trecho em que o protagonista vai ao cinema, e a primeira epígrafe do livro é justamente de King), inclusive no estilo, mais próximo do chamado dark fantasy (em que uma narrativa aparentemente realista vai se distorcendo até ser dominada por elementos fantásticos) do que do terror puro. No livro O cemitério maldito, de King, acompanhamos a vida normal de um médico, salpicada aqui e ali de elemento de terror, como um pesadelo, ou a história de um cemitério de animais de estimação, capaz de fazê-los renascer. O terror em si só começa muito lá na frente, quase no meio do livro, mas aí já estamos plenamente fisgados pela história, simpatizando com os personagens como se fossem vizinhos. King usa muito bem o realismo na primeira parte, para introduzir aquilo que os roteiristas de cinema chamam de suspensão de descrença: a partir de determinado ponto, o leitor acreditará em qualquer coisa.

Anjo de dor segue uma estrutura semelhante. A trama fantástica propriamente dita só começa na página 73. Até ali acompanhamos Ricardo em sua vida aparentemente contraditória de homem capaz de usar a violência a qualquer momento, mas, ao mesmo tempo, vegetariano.

Antes disso, há pequenos elementos de suspense, que deixam entrever o desenlace, como na página 50: "Fugindo. Sheila, aos gritos no salão superlotado, para os ouvidos de todos, dizia-lhe que estava fugindo. De quem, ou de quê?", que procuram manter o interesse. São poucos e o leitor mais apressado talvez largue o livro pela metade. Se persistir, encontrará uma trama envolvente, um thriller de perder o fôlego e um livro muito bem escrito.

O domínio da narrativa ajuda a manter o leitor. Frases como "O silêncio da cidade adormecida é o silêncio das histórias não contadas" lembram Alan Moore (que revolucionou o terror com Monstro do Pântano na década de 1980) e ajudam a manter o leitor enquanto a trama não engrena.

Uma curiosidade da história é a inclusão, na trama, de elementos de espiritismo. Esse talvez seja um diferencial do terror nacional. O Brasil é o único país em que o espiritismo fez sucesso como religião, talvez por conta das influências indígenas e negras. O brasileiro, mesmo o católico, acredita em comunicação com espíritos com uma naturalidade que não é encontrada em outros países, muito menos no racional EUA, lar da maioria dos escritores de terror de sucesso. O próprio King já disse que não acredita em espíritos e não tem nenhum interesse na comunicação com eles.

Roberto Causo parece não só acreditar em espíritos, como tem com eles uma relação de naturalidade kardecista. É como se o romance dissesse: o terror não está no mundo dos espíritos, mas no coração dos homens encarnados.

Anjo de dor é, portanto, um livro que não se prende a simplesmente copiar o terror norte-americano, embora, evidentemente, o autor tenha aprendido muito bem com ele. E, mais do que um bom livro de terror, é uma boa obra.

Fonte:
Digestivo Cultural. 22/02/2010

Retratos da Leitura revela que brasileiro está lendo mais



O brasileiro lê, em média, 4,7 livros por ano. Este é um dos principais indicadores a que chegou a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, encomendada pelo Instituto Pró-Livro ao Ibope Inteligência. O estudo constatou que somente a leitura de livros indicados pela escola, o que inclui os didáticos, mas não só, chega a 3,4 livros per capita. A leitura feita por pessoas que não estão mais na escola ficou em 1,3 livro por ano.

Em algumas regiões, esse número é ainda maior, como é o caso do Sul, onde foram apurados 5,5 livros lidos por habitante/ano. Em seguida, vem a região Sudeste (4,9), o Centro-Oeste (4,5), o Nordeste (4,2) o Norte (3,9). Os leitores lêem mais nas grandes cidades (5,2 livros por habitante/ano) do que nas pequenas localidades do interior (4,3 em municípios com menos de 10 mil habitantes). A pesquisa também confirma que as mulheres lêem mais que os homens – 5,3 contra 4,1 livros por ano. Os jovens leitores ganham destaque na pesquisa. O público entre 11 e 13 anos chega a ler 8,6 livros por ano. De 5 a 10 anos, lêem 6,9 e de 14 a 17 anos o volume é de 6,6 livros por ano.

Essa média sobe entre os que possuem maior escolaridade. Entre aqueles que possuem formação superior, ela é de 8,3 livros/ano. Esse número é de 4,5 livros para quem tem ensino médio completo, 5 para quem cursou entre 5ª e 8ª série do ensino fundamental e 3,7 para quem tem até a 4ª série.

A Retratos da Leitura no Brasil também constatou que, apesar dessa média de leitura, os brasileiros não compram muitos livros: 1,1 livro adquirido por ano (as compras no mercado, por sinal, aparecem empatadas com os empréstimos particulares no quesito principal canal de acesso aos livros). O Brasil possui 36 milhões de compradores de livros e, entre eles, a média é de 5,9 livros exemplares adquiridos por ano.

Por se tratar de uma nova metodologia desenvolvida pelo Centro Regional de Fomento ao Livro na América Latina e no Caribe (Cerlalc/Unesco), que incluiu crianças e adolescentes com menos de 15 anos e pessoas com menos de três anos de escolaridade, os novos números não podem ser comparados com aqueles apurados na primeira edição, em 2000. Para efeito de estudo sobre o comportamento leitor da população, o Ibope separou uma amostra semelhante (população acima de 15 anos, com mais de três anos de escolaridade e que leu pelo menos um livro nos três meses anteriores). Nesse grupo – que não dá para ser extrapolado para o conjunto da população – o índice cresceu de 1,8 para 3,7 por habitante.

Fonte:
Jornal Guatá – Cultura em movimento. Foz de Iguaçu.

Helena Límia (No Limiar da Poesia)



O que deseja o poeta?

Viver de poesia ou viver a poesia?

A página da poesia está tão imensa que dá voltas e voltas no mundo e o que resta ao poeta de hoje?.

Qual a motivação do poeta além da expressão do seu ser com plenitude? o papel do poeta na sociedade sempre foi ambíguo assim como o papel da arte em si; porém "ser poeta" sempre foi um caso a ser discutido. A palavra é uma forma absoluta de expressão, um meio que justifica um fim fora da sua atuação poética por isso um ato além do ato de escrever versos.

Nesse sentido, cabe ao poeta dialogar com o mundo ou apenas consigo mesmo o que também é justo em todos os aspectos, mas é isso queremos realmente? Fechar-nos numa porta "de" dentro da poética? Trancafiar-nos num "conhecimento" específico que na prática sem prática é tão banal quanto qualquer outro por quê?

O poeta é um ser específico por natureza, alguém de alcance incalculável - todos os artistas o são alguém diria - mas eles abusam de algo que é de propriedade de ninguém mas onde a vida entregou ao poeta a bandeira. Mas do que uma razão íntima em sua essência o poeta tem a razão de trazer a poesia à luz mesmo que essa seja escura. O poeta é a poesia?

O poeta é o ato

A poesia é a razão desse ato.

Nessa declaração traiçoeiramente poética não basta afirmar que a poesia está em tudo e em todos
se nossa poesia não está em tudo nem para todos. Não basta escrever? diriam... Basta apenas sonhar?

A poesia só encontra a razão de ser depois que mostrada, lida, gostada ou odiada, ela não é um ato isolado num subsolo imaginário do poeta ela é nossa carta dizendo...

SOMOS TODOS POETAS!

Fonte:
Poetas de Marituba.

Pedro Du Bois (Ao Poeta)


AO POETA

Talvez ao poeta baste o ritmo das palavras
em desafios murmurantes e os gritos explosivos;
o desafio do andor carregado e a luz introduzida
sob o manto; ser o ocorrido e a versão descontrolada
do início: indícios não bastam ao poeta
que continua e termina e recomeça.

Talvez ao poeta baste a incompreensão
dos ares satisfeitos dos bonecos alçados
à condição de estetas; profetas
em voz alta ensaiam temas preferidos
aos tontos espíritos desnecessários.

Talvez baste ao poeta a sensação de antes
de a matéria ser solidificada e flutue em asas
descobertas aos ventos de solidário espaço.

Talvez ao poeta baste o atentar sereno
das noites antagônicas e os dizeres gravados
nos panfletos que são entregues anônimos.

Talvez baste ao poeta o fruir da fruta ao gosto
menos azedo das notícias participando mortes
antes do tempo (todo o tempo é antes) previsto
na antecipação frígida das esperas.

Talvez ao poeta baste levantar a mão e pedir
ao garçom a bebida de sempre, a comida
deixada sobre o prato, o distrato entre amigos
após a ceia: cada um em seus afazeres.

Talvez ao poeta baste saber-se nu diante da hora
acertada para a volta; ser da revolta o ânimo
e da crueldade explicitada em nomes o anônimo
revoar das aves; sobre as aves ao poeta cabe
recriminar a mão que oferece o pouco.

Talvez baste ao poeta ser poeta. Adivinhar no texto
a descoloração do átimo, o pátio de desertadas árvores
infrutíferas; o desfolhar do outono, o renascer
primaveril das flores em pétalas abertas.

Talvez ao poeta baste discorrer em mãos agitadas
ao vazio sobre a perdição, a contrição, a educação
adulterada em números e cientificamente expor
ao todo o menos; ao menos cabe o protesto.

Talvez ao poeta baste a consecução do plano
invertido em sonhos de descidas aos infernos
particularizados no extrato do infortúnio;
ser seu próprio oposto de reescritas notas
no esforço desconcentrado ao nada.

Talvez baste ao poeta o anúncio do amor distanciado
em dias, meses, anos e décadas: o reencontro
no aperto sentido – o grafite quebrando a ponta –
como lâmpada queimada: a tortura acompanhada
à porta pelo degredo do segredo sendo revelado.

Talvez ao poeta baste o reconhecimento da presença
e a indiferença rente ao caminho não percorrido;
o banco da praça ocupado pelo corpo despreparado
em ocorrências e a decorrente história mal contada.

Talvez ao poeta baste olhar o perto e retirar o longe
desconhecido em físicos acidentes: a geografia
estanque do planeta; o lento deslocar das placas.

Talvez baste ao poeta a necessidade da urgência
intercalada ao langor do isolamento. Saber ficar
estático e revolver as cinzas em busca do acidente.

Talvez ao poeta baste alisar o pelo do animal
sobre o colo deslocado, descobrir ensinamentos
simiescos ensimesmados aos ensinamentos.

Talvez ao poeta baste possuir a chave enferrujada
da porta secundária por onde entram minotauros
instalados nas peças lendárias dos amantes.

Talvez ao poeta baste realizar o sonho da criança
perdida em crescimento: recuar ao tempo anímico
das paredes sendo preenchidas em riscos
produzindo imagens do dia acondicionado.

Talvez baste ao poeta se desvencilhar da hora
categórica dos negócios, perder o prumo, o rumo,
desviar das pedras rolantes dos embustes; salvar
a pele do desconsolo e o tédio dos amantes.

Talvez ao poeta baste se dizer distante o tanto
permitido, perto o quanto possuir de forças
para se entranhar nas notícias repetidas.

Talvez ao poeta não baste o descobrimento
de novas terras, exija reconhecer a profundeza
espacial dos mares e o executar da sinfonia
dos cometas: em suas caudas, sabe o poeta,
trafegam poeiras estelares.
---------------
Fonte:
Colaboração do Autor

Elizabeth Fonseca (Ser Poeta)


Quem quiser no pensamento
De um poeta viajar,
Conhecerá a serenidade da lua.
Conhecerá do mundo os verdores,
Terá sai alma hipnotizada de amores.

Ser poeta é ter um realejo na alma,
Marcando presença por onde passar.
É cantar o amor em poemas e versos.
É verter sentimentos latentes a um altar,
Onde Deus é amor, a paz do universo.

O amor que o poeta suplica e chora
É um lindo e rubro botão de rosa,
Que em lágrimas se abre purpúreo,
Embelezando a tristeza, a dor que aflora,
Carregando, no peito, a paixão vida afora.

Ser poeta é ver num embrião
O doce sabor que a vida tece.
É reverdecer o coração de esperança,
Quando as flores emurchecidas fenecem.
É acreditar na utopia, tendo o coração em prece.

Ser poeta é justificar a dor.
É ser dono da Terra e do Céu.
É bordar as letras em louvor,
Sentindo na alma um alento.
Ser poeta é somente ser dono do Amor!
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Fonte:

União Brasileira dos Escritores - Mato Grosso do Sul

terça-feira, 16 de março de 2010

III Concurso Literário Internacional Letras Premiadas



Autora homenageada:
Professora e Escritora Ilda Maria Costa Brasil

Prêmio de incentivo à leitura e produção textual
Poesia: 1º lugar – R$1.000,00
Crônica: 1º lugar - R$ 1.000,00
Conto: 1º lugar - R$ 1.000,00

Contribuição para cada texto:
( ) Máster: poesias, Contos e Crônicas - R$ 10,00
( ) Estudantes até 21 anos: Somente Poesia - R$ 5,00

Tema Livre – Textos inéditos

Participam deste Concurso textos em português, espanhol e italiano
enviados por autores residentes em diversos países.

1. Endereço: Envie uma cópia do texto(s), uma fotografia e teu currículo para:
gaya.rasia@hotmail.com ou alpasxxi@hotmail.com
Ou: ALPASXXI - Rua Benjamin Constant, 71 – Centro
Cruz Alta – RS – 98025-110

2. Prazo até : Até 30.04.09

3. Contribuição: Cheque nominal a Rozelia Scheifler Rasia ou depósito CC 35 0242960-0 Ag. 0190 – Banrisul ou Banco Itaú - Ag 0335 - Cc 30022- 4.

3.1 Os bancos estaduais fazem remessa para o Banrisul.

3.2 Remessa do exterior: MoneyGran ou Western Union.

4. Diplomas: Diploma de Destaque Literário para os dez primeiros textos classificados.

5. Resultados Os resultados serão divulgados no BLOG da ALPAS XXI em maio de 2009 e em vários jornais de grande circulação.

6. Premiação: 1º lugar em cada categoria: R$1.000,00

7. Evento de Premiação dos classificados com Certificado de Destaque Literário

8 Os textos classificados poderão participar da Coletânea Cooperativada ‘Olhos andarilhos’
Data: 23 de outubro de 2009 em Cruz Alta – RS.

9 Características: Tema Livre - Textos inéditos.

10 Limite de textos: 4 textos por categoria.

Obs: Estão isentos de contribuição os autores e alunos que não puderem pagar.

Instruções:
I – Sugerimos aos autores que registrem seus textos na Biblioteca Nacional.

II - Formatação do texto em A4; fonte 12, arial ou times.

III - Solicitamos criteriosa correção gramatical: ortografia, concordância e sintaxe.

IV - Os textos participantes do BLOG são expressamente excluídos dos Concursos.

V – Estudantes – Somente poesia: Indique a série, o grau, a escola ou universidade (nome e endereço).

Vamos imprimir uma cópia de cada texto concorrente para o Memorial da Cultura ALPAS XXI com os dados do autor e três cópias para os jurados sem identificação.

O Currículo e a fotografia irão para o Memorial da Cultura ALPAS XXI e Galeria de autores, posteriormente serão usados para a divulgação dos vencedores. O envio da fotografia não é obrigatório.

Fonte:
Movimento de Poetas e Trovadores

segunda-feira, 15 de março de 2010

Rodrigo Leste (Quero Estar em Suas Mãos)


Já faz uns cinco ou seis anos que não saio desta estante; às vezes perco a conta. Ou seriam seis ou sete anos?... Você que começa a ler esta minha pequena história talvez nunca tenha parado para pensar na dura realidade dos livros sem leitor. Não quero aborrecê-lo com queixas inócuas, mas é da natureza dos seres da minha espécie, os livros, a vontade, o incontido desejo de servir a vocês, os humanos. Esta é a nossa razão de ser, de existir. Ser esquecido em uma estante por anos a fio é a maior frustração que pode ocorrer na vida de um livro. E olhe que não devia estar me lamentando tanto: meu vizinho, “O Corcunda de Notre Dame”, comentou outro dia que já deve ter bem uns quinze anos que ninguém o retira da estante. Melhor sorte tem outro vizinho, o Senhor Brás Cubas: suas Memórias Póstumas foram solicitadas nas listas de leituras obrigatórias de alguns vestibulares e ele não para mais no lugar, sempre é retirado por jovens leitores.

— As traças me apavoram! É terrível, à noite, quando as luzes são apagadas e ouvimos, aterrorizados, o monótono e contínuo ruído do movimento de suas mandíbulas mastigando indefesas páginas. A monotonia de viver confinado às estantes produz melancolia, enfado. Não poucas vezes, quando consigo mergulhar em um sono mais profundo, sonho que fui tomado por empréstimo por algum leitor e saio outra vez para o mundo exterior, vendo-me livre dos muros desta masmorra em que se converte a biblioteca para os que são abandonados nas estantes. Que alegria ver de novo a luz do sol! Que prazer compartilhar a vida, o intenso e caloroso pulsar do mundo nas mãos de um leitor ou de uma leitora. Que delícia percorrer ruas, praças, parques, entrar na casa dele, ir aos lugares aonde vai e ser manuseado por ele ou por ela. Nada é melhor para um livro do que a sensação de ter na pele de suas páginas os olhos atentos de uma leitora. Nestes mágicos momentos, desfruto da grata satisfação de sentir que me torno um manancial de sonhos e desejos, indagações e dúvidas, divagações e certezas. Delicio-me quando cismo com ele à beira do abismo da existência e depois voamos juntos com as asas da imaginação das histórias que carrego no meu corpo.

Mas pior ainda do que as traças (posso afirmar que este medo aflige também aos meus semelhantes) é ser degradado à condição de um reles xerox ou ser aviltado pelos nefastos resumos que pululam na internet e se arvoram a traduzir em umas poucas e mal construídas linhas toda a complexidade de uma obra que algum escritor levou, às vezes, anos para elaborar. Estes dois sujeitos, xerox e resumo, são inimigos mortais nossos, os livros. É a danação da nossa espécie, é a traição maior que pode ser cometida contra os livros verdadeiros que devem ser lidos de forma integral em suas versões originais. Não quero me meter a herói, mas em nome de todos os livros, declaro guerra aos clones! E creio poder falar também em nome de todos os escritores, poetas, ilustradores e por que não, dos leitores conscientes que sabem que é preciso preservar os livros originais! Para encerrar, gostaria de pensar que em um futuro próximo não venha ser só um sonho voltar a ter leitores em profusão. Quero acreditar que voltaremos a fazer parte da vida de pessoas de todos os tipos e idades que vão encontrar neste “admirável mundo novo” dos dias de hoje, com toda a sua complicada modernagem, a paz, o sossego, na simples companhia de um bom livro.

— Humanos: somos seus cúmplices eternos, sempre solidários; nossa missão é estar prontos e dispostos para ser abertos e nos oferecer inteiramente aos que nos queiram. Nossa entrega é completa, sem restrições. Querida amiga, querido amigo, quero estar em suas mãos!
==================
RODRIGO LESTE foi co-editor de jornais alternativos que na década de 70 fizeram história em Minas como “Gol-a-Gol”, “Vapor” e “Circus” e é poeta, ator e produtor cultural, atuando no teatro desde 1974.

Fonte:
Suplemento Literário de Minas Gerais. Novembro de 2009. n. 1326.

Baptista Nunes (100 Trovas)


1
As dores e os desencantos
têm dois destinos diversos:
- ou se dissolvem nos prantos,
- ou se desfazem nos versos.
2
Minha mágoa, quando é grande,
faz da trova confidente.
- Uma angústia que se expande
não sufoca a alma da gente.
3
As saudades nunca morrem,
tê-las sempre, é nosso fado;
- são farrapos de nossa alma
que ficaram no passado.
4
Das horas sempre ditosas,
muitas o tédio nos furta ...
A glória maior das rosas
é terem vida tão curta.
5
Olha o céu, contempla o mar,
mira a campina florida,
fita a estrela, goza o luar...
Por que só vês tua vida?
6
Não sei que mágoa mais funda
destas tristezas decorre:
- se da saudade que vive,
- se da esperança que morre.
7
Ao sonhar contigo, eu sinto
amor mais puro e profundo!
No sonho, as almas se encontram
fora da carne e do mundo...
8
Reparaste quanto é fácil
desculparmos os defeitos,
se a criatura, além de grácil,
tem seus dezoito já feitos?
9
Olhando a vida vivida,
esta pergunta passou:
- fui eu que fiz minha vida,
ou fez-me a vida o que sou?
10
Quão larga seria a messe
de surpresas, de tormentos,
se o simples olhar pudesse
devassar os pensamentos ...
11
O luar é tão triste e doce,
tem tal encanto e magia,
que acredito que assim fosse
o olhar da Virgem Maria.
12
No inicio da vida, o mundo
parece um reino encantado!
Não há erro mais profundo,
nem logro mais bem pregado.
13
É milagre dos mais puros,
como só os faz Jesus,
- pôr em teus olhos escuros
tanta treva e tanta luz!
14
A nossa alma se reparte
pelos filhos que nos vêm;
temos sempre nossa parte
nos destinos que eles têm.
15
E preciso pôr um cobro
ao lamento que enfraquece;
quem se queixa sofre o dobro
do tormento que padece.
16
O amor um milionário,
gaste os beijos que gastar,
tantos mais, o perdulário,
terá sempre para dar!
17
Nossa casa é qual um ninho
escondido num pomar;
dentro dela há um bercinho.
Que mais posso desejar?
18
Mais do que o próprio desdém,
nada nos deixa tão sós,
como saber que ninguém
sente saudades de nós...
19
Volta o sol... a chuva é mansa
sol e chuva, faz lembrar
o sorriso da criança
quando acaba de chorar.
20
Mãe não precisa de rima.
Nome de tal esplendor,
diz tudo, para que exprima,
sozinho, um poema de amor!
21
Música! Enlevo sublime,
sua magia dimana
do que existe de divino
no mistério da alma humana!
22
Coração, bate baixinho,
pois, a ouvir-te, ó desventura,
conto os passos do caminho
que conduz à sepultura ...
23
Há no mundo muita gente
que só maldades proclama;
é que os sapos, certamente,
só são felizes na lama.
24
Tesouro que, dividido,
vai crescendo, vai subindo,
- é amor de Mãe, repartido
pelos filhos que vêm vindo!
25
Tens um sinal junto à boca,
fonte de todo o meu mal:
ao beijá-lo, fui punido
por "avançar o sinal"...
26
Solidão que não tem par,
ausência cruel, atroz,
é viverem dois num lar
como se estivessem sós.
27
Não queiras muito da vida;
vê bem que a felicidade
muita vez é percebida
só depois de ser saudade...
28
Canta, canta as tuas mágoas,
que a trova nos traz conforto,
quando morre um sonho, a trova,
guarda a alma do sonho morto.
29
Senhor! Que sorte mesquinha
e digna de compaixão:
- termos o espírito livre
e os pés chumbados ao chão!
30
Mãe ... Olhando o teu retrato,
meus olhos fitos nos teus,
penso que estás a meu lado
por uma Graça de Deus!
31
Meus anseios ... tristes frades,
numa angústia indefinida,
vivem presos entre as grades
das clausuras desta vida ...
32
Velhos, distantes, embora,
não nos sentimos tão sós,
quando os amigos de outrora
inda se lembram de nós.
33
Mistérios de enternecer
a lei da vida contém:
- quanta vez nosso prazer
não custou a dor de alguém?
34
Se uma fada perguntasse
qual a ventura que almejo,
eu diria: - a que consiste
em não ter nenhum desejo.
35
Construímos nosso ninho,
mas é justo assinalar:
- fiz, apenas, uma casa
e dela fizeste um lar.
36
Teu sorriso é uma alvorada
que acende na tua face
o rubor que a madrugada
põe no céu, quando o Sol nasce!
37
Magoada flor da quaresma,
tens das saudades a cor;
- meu passado é todo um bosque
de quaresmeiras em flor.
38
Velhice não é tristeza
quando somos venerados;
o que dói é a certeza
de só sermos tolerados.
39
Águas de um rio não lavam
nem um pecado, somente;
lágrimas puras, sentidas,
lavam toda a alma da gente.
40
Há belas trovas ... mas creio,
nenhuma pode igualar
às lindas trovas que leio
no fundo do teu olhar!
41
Quando a ilusão me conduz
ao desengano tristonho,
faço da trova uma cruz
na sepultura do sonho.
42
Águas do lago, tão calmas ...
Olhando-as, fico a cismar:
- por quê, Senhor, há nas almas
essa inquietude do mar?
43
A árvore eterna da Fé,
no mundo a plantou Jesus;
foi regada com seu sangue,
teve a forma de uma cruz.
44
Quando a injustiça te doer,
ou quando alguém te magoar,
esquece, pois esquecer
é bem mais do que perdoar.
45
Da esperança malograda,
da ventura que findou,
guarda a trova, desolada,
a lembrança que ficou.
46
Quanto és bela, que grandeza,
cidade vista do alto!
Quanta dor, quanta baixeza,
ao nível do teu asfalto...
47
Gratidão, no ser humano,
em geral é raridade,
pois, sendo o orgulho um tirano,
não tolera essa humildade.
48
-Quem casa não se governa,
tenho, até, vergonha às vezes,
pois quem manda em minha casa
é um pirralho de três meses!
49
Essa figura risonha
que pouco tem de nascida,
é uma vida que inda sonha,
e sonho que se fez vida!
50
Quando parte um velho amigo
rumo às paragens sem fim,
sinto que um pouco da vida
morreu, também, dentro em mim.
51
Pode ser pura ilusão,
mas nunca a gente se cansa
de plantar no coração
a semente da esperança.
52
O mundo é um só, quem duvida?
Mas para as almas, no fundo,
há tantos mundos na vida,
quantas vidas há no mundo.
53
O orvalho frio das noites
vem do pranto de saudade
das tristes mães que deixaram
seus filhinhos na orfandade.
54
Teu amor é tão sincero,
que adivinhas o que almejo,
pois nunca te disse "eu quero
para ter o que desejo.
55
Desde que a sorte, Querida,
este lar nos concedeu,
vivo mais a tua vida
que a vida que Deus me deu.
56
Creio em alma feminina
- quem assim pensa, não peca -
quando vejo uma menina
a ninar uma boneca.
57
Homens egoístas, ouvi
este conceito fecundo:
- quem vive só para si,
vive sozinho no mundo.
58
Quando a aurora se incendeia,
toda a passarada, em festa,
ergue um hino à Natureza
na catedral da floresta!
59
Os detentos nos comovem ...
Há suplício parecido:
- ter-se uma alma sempre jovem
presa a um corpo envelhecido.
60
Deus, que uniu as nossas almas,
mais bondoso foi depois,
quando, para unir-nos mais,
pôs um filho entre nós dois.
61
Só as mães, ao filho enfermo,
embalam numa canção,
tendo o sorriso nos lábios
e um punhal no coração.
62
Para evitar, precavida,
qualquer infidelidade,
quando ela vai de partida,
deixa comigo a saudade.
63
A luz que o Sol irradia
é feita de sete cores.
- A alma de luz de Maria
formou-se de Sete Dores!
64
Nem sempre meu mal existe.
Querida, não te desoles,
às vezes finjo de triste
só para que me consoles.
65
Se em teu rosto resplandece
a aurora do teu sorriso,
é como se eu estivesse
pertinho do Paraíso!
66
Vida ... Perene esperança
de que, não se sabe bem...
Feliz de quem não se cansa
de esperar o que não vem.
67
Se mais na vida se avança,
maior angústia é sentida,
por ser tão longa a esperança
e ser tão curta esta vida.
68
Veio na noiva ditosa,
aos pés do altar, a sorrir,
uma esperança radiosa
interrogando o porvir. .
69
Não só o aroma, também
o gosto lembra o que é bom:
- estou saudoso, meu bem,
do "gosto do teu batom"
70
Saudade e rio corrente
ligam dois pontos distantes:
- o rio leva à nascente,
a saudade, ao que era dantes. .
71
Agora, não sei por quê,
meu relógio faz maldades.
Numa hora sem você,
marca sessenta saudades!
72
Desta feliz ignorância
decorre grande ventura:
- não sabermos que distância
vai do berço à sepultura.
73
Bem pouca gente procura
aceitar esta verdade:
- antes ser bom sem ventura,
que ser feliz sem bondade.
74
Feliz daquele que alcança
o lenitivo que quer,
- num sorriso de criança
- num carinho de mulher,
75
O beijo é moeda de amor
que tem um câmbio engraçado:
- dado só, baixa o valor,
vale mais, se for trocado!
76
Tem qualquer coisa de heróico
quem, pela vida a lutar,
sabe, com ânimo estóico,
sofrer, sorrir... e calar.
77
Que se diga afortunado
aquele que não tiver,
como nuvem, no passado,
uma sombra de mulher.
78
Guardo esta amarga impressão:
depois de tanto viver,
só hoje sinto a extensão
do que deixei de fazer...
79
Mãe feliz! É tão novinho,
e teu seio já reclama!
Dois corações tens agora:
um que pulsa, outro que mama
80
Nós vogamos, coração,
numa perene ansiedade,
entre a esperança e a ilusão,
entre a ventura e a saudade
81
Tuas cartas... que saudade!
Quando as tenho em minha mão,
olho as linhas... e em verdade,
quem as lê é o coração.
82
Como dói a gente ver,
sem conseguir consolar,
uma criança a sofrer,
uma velhinha a chorar...
83
Foi um dia, o Beneficio,
se casou co'a Precisão;
por diabólico artifício,
quem nasceu? A Ingratidão!
84
Já vivemos outras vidas,
e, se digo isto é porque
às vezes tenho sentidas
saudades ... não sei de que !
85
Há saudades que nos falam
de maneiras desiguais:
umas dizem: "pode ser" ...
muitas outras: "nunca mais"
86
Quando me fitas, morena,
com teus olhares maganos,
tenho pena, imensa pena,
de não ter vinte e dois anos.
87
Eu te explico o acontecido:
- se roubei teu beijo, amada,
foi por ter-me parecido
que querias ser roubada...
88
Dar aquilo que nos sobra,
não tem grande validade;
repartir o que mal chega,
isto, sim, é caridade.
89
Na tua face entrevejo
transformação milagrosa:
- da semente do meu beijo,
nasce o rubor de uma rosa!
90
Creio que o poeta é tristonho
porque sua alma se encerra,
perenemente, num sonho
que não se vive na terra.
91
A trova parece espelho
miraculoso, porque
reflete as coisas do mundo,
e mais o que não se vê.
92
Costureirinha adorável,
sem que tua alma degrades,
tens virtude mais louvável
que a da freira, atrás das grades.
93
Guardo um remorso comigo,
que mortifica minha alma:
- quando estive a sós contigo,
fui duma calma ... uma calma
94
Muita gente é infeliz
mas será por culpa alheia?
Cada qual, como se diz,
colhe aquilo que semeia.
95
Dizes que gostas de mim,
se gostas, nunca senti;
teu gosto é outro, isto sim,
gostas que eu goste de ti.
96
Dá adeus quem parte e se vai ...
- que expressiva afinidade! -
com estas letras se escreve
o que nos fica: saudade!
97
A trova é canto dorido?
A trova é prece de amor;
reflete o mundo sentido
pela alma do trovador.
98
Faz-me temer a partida
esta ironia da sorte:
- teus olhos, que me dão vida,
chorarem por minha morte.
99
O prazer que a gente goza
guarda, em si, melancolia,
pois a hora que é ditosa,
há de ser saudade um dia.
100
Vida ... mistério celeste
que acorrenta uma alma escrava...
Nada pedi, mas me deste
muito mais do que esperava!
G G G G G G G G

Fonte:
J. G. de Araujo Jorge e Luiz Otávio. 100 trovas de Baptista Nunes. Coleção Trovadores Brasileiros vol. 3. RJ: Editora Vecchi – 1959.

Andrade Jorge (Poesias Escolhidas)


DESENCANTO

“Entre pedras e solo árido
a flor luta pra sobreviver...”

Enquanto cantas
e pelas ruas encantas,
sigo a correnteza
desse rio promessa de (in) certeza.

Enquanto refugias em si,
silenciosamente abri
a alma expondo-a nua
aos olhos da lua.

Enquanto procuras as verdades
em bocas loucas que soam maldades,
não busco texto,
nem palavra sem contexto.

Enquanto escutas vãs cantigas
de tristes atrizes antigas,
o dia findou o tempo passou
a noite se fez e nosso encanto cessou.

MORTE DA REALIDADE

Quatro velas velam a nua realidade
no fundo espaço frio,
cova do fruto da desilusão,
aonde jaz
no eterno vazio.
A vida traz
noite sem luz,
noite sem lua,
a carpideira contrita chora,
a mão crispada ordenadamente
encena o sinal da cruz,
depois levanta, olha e vai embora,
afinal a vida continua!

E a morte?
Ah! Quem quer saber
da morte?

ENCONTRO

Conheço-Te Há Pouco Tempo
mas parece uma eternidade,
são sonhos deslizando
pelas paredes do coração,
ora acendendo, ora apagando,
a emoção no contraponto da razão;
Conheço-te há pouco tempo
porém parece eternidade,
a efemêra felicidade
ronda, baila com leveza
apresenta-se decidida
para em seguida
mostrar o caminho da incerteza;
Conheço-te há pouco tempo,
todavia parece eternidade,
pela intensidade, densidade,
contido nesse projeto de amor,
arquitetado sem muito desvelo,
motivo de duros dizeres,
seccionando friamente
muitas horas de prazeres,
assim crescemos sabiamente;
Conheço-te há pouco tempo
entretanto parece uma eternidade,
que nos remete na infinita imensidão
mapeando rumos, tateando encantos
driblando a desilusão,
suspiro no vento
e na sua boca busco alento
pra alimentar minh’alma
que estava ao relento.
assim foi nosso encontro,
seres tão diversos
que se encontraram
nos rabiscos dos versos.

ANJO MENINO

Anjo, anjo,
luz estelar
flutua nesse espaço,
corre nesse chão colorido,
encanta o mundo
num segundo
com seu sorriso florido;
Anjo, anjo,
pequeno sol aqui na terra
futuro que se anuncia,
no brilho daqueles olhinhos;
De repente
a realidade diz presente,
a besta apocalíptica, demonios do mal
nefasta visão à sua frente
prenunciam o final,
e o anjo menino
cai vítima da sanha maldita
daqueles amaldiçoados,
a mãe desdita
chora, grita,
o povo agita,
e o céu chorou
quando o anjo voou
mais além...
Pouco tempo pra viver
uma eternidade pra não esquecer.

João Helio menino anjo vitimado por bandidos no Rio de Janeiro.
Andrade Jorge

HIATO

O tempo passa,
remontam momentos,
repassam fatos,
juntam atos,
a vida indo,
inexoravelmente seguindo,
outras surgirão, é verdade,
mas e eu e você?
Ficamos assim constrangidos
da alegria despidos?
O tempo passa,
você surgindo,
a vida indo,
eu seguindo,
aonde vamos?
Assim infelizes,
nos tropeços, nos deslizes.
O tempo passa,
a vida indo,
você seguindo,
eu perseguindo,
juntando atos,
explicando fatos,
como?
Deve haver um hiato
um parêntese,
onde possamos parar
e aprender querer, gostar, amar.

RESOLUÇÃO

Então está resolvido,
o sonho não tem hora
prá ser vivido
nem prá ir embora;
Está explicado,
então
somos resultado da trama
da invisível mão
que faz os roteiros
e os capítulos
do nosso drama.
G G G G G G G G G

Alexandra Dias Ribeiro (O Tempo e os Olhos que Falam por Si)


Sou uma mulher como outra qualquer. Como conseqüência adoro um espelho! Em algumas ocasiões fujo deles, temo a resposta à fatal pergunta: “Espelho, espelho meu...”.

Nesta noite foi diferente de todas as passadas. Após rever antigas fotografias, resolvi tirar a prova dos nove. Busquei por mim mesma vestígios daquela menina de quinze anos com a atual.

Em uma mão a foto antiga, amarelada pelo tempo. Parada em frente ao espelho tudo o que vi foi uma estranha, que assim como a foto trazia marcas do tempo. Apenas uma coisa aquelas duas pessoas tinham em comum... Os olhos. Não é por menos que dizem que nossos olhos são o espelho da alma.

O fato é que pela primeira vez em muitos anos enxerguei-me. Aquele rosto pareciam pertencer a outra pessoa, no fundo eu ainda era aquela menina de outrora.

A foto acabou esquecida em minha mão. Os olhos da estranha me olhavam profundamente desvendando segredos que eu achava que estavam esquecidos. Que bobagem a minha, quando acreditei por tanto tempo que era imutável ao tempo! Gozado, os anos deixaram marcas profundas em minha pele, mas não afetaram aqueles olhos.

Passou-se algum tempo e continuei olhando aquele fantasma diante de mim. Agora percebia que durante muito tempo procurara o espelho, mas apenas via o que deseja ver, não a realidade. Naquele momento surge do nada uma borboleta, bela por sinal, dessas coloridas que enfeitam o jardim, havendo uma coincidência. Logo atrás de mim havia pendurado um quadro. Não fora pintado por ninguém famoso, e a imagem era muito clara para se ter interpretações. Era simplesmente uma borboleta. Pintada de maneira tão realista que mais parecia uma que realmente estivesse pousado ali. Suas asas eram de um colorido vibrante, como o arco íris, contornado de um grafite. Nunca soube ao certo o porquê de minha fascinação por aquele quadro. Passei a mão na figura sentindo sua textura, acompanhando seu relevo. Difícil dizer quanto tempo fiquei ali, talvez minutos ou horas. Mas independente do tempo, foi o suficiente para eu entender o motivo daquela fascinação pelo o quadro. Sem perceber comparei-me com ela. Primeiro é simplesmente uma lagarta, depois se recolhe em seu casulo e quando volta para ver o sol o milagre aconteceu... É uma borboleta. Eu também apesar de que por pontos diferentes também já estive em um casulo, ou melhor, ainda estava.

Voltei àquela estranha no espelho... Ela continuava lá. Espreitando-me, como se perguntasse “E aí chegou alguma conclusão?”. Só que havia algo naquele olhar que eu não havia reparado antes, estavam risonhos.

Diante disso sorri, mostrando para aqueles notáveis olhos que compreendia e eles pareciam concordar... Somos como um saboroso vinho... quanto mais tempo tem a safra, se é melhor. Já dizia alguém: Mais vale a experiência, do que quantos aniversários se comemorou.

Adeus casulo.
G G G G G G G

Fonte:
Colaboração da Autora.

Caldeirão Literário do Mato Grosso do Sul (2)



Vanda Ferreira
Árvores

Braços múltiplos,
Mãos e dedos adornados
Com preciosos anéis;

Pés de confetes
Cipós, Flores,
Pernas vestidas
Com pele de musgo;

Corpo perfumado
Seiva de cheiro matuto;

Singra em mim
Acolhimento para poesias.
==================

Ileides Muller
Amor Concluído

Julgamento a revelia
no tribunal da razão.
A sentença:
“Amor concluído”.
“ARQUIVE-SE.”
==================

Ruberval Cunha
Corpos meditando

A solitude invade o universo.
Todo mundo tão sozinho, tão disperso,
Um em cada canto do universo.

Mas eu sou um sonhador
E ainda acredito,
Na extinção da solidão,
Pelo amor.

Almas se unindo
Corpos meditando.
O fim será o começo
E o começo está chegando.

O homem quer companhia,
Mas constrói a solidão
E sobrevive a cada dia,
No iceberg da razão.

Mas eu sou um sonhador
E ainda acredito,
Na extinção da solidão,
Pelo amor.

O fim será o começo
E o começo está chegando.
Almas se unindo,
Corpos meditando.
====================

Nena Sarti
Imagens

Toda virgem
Deveria pousar
Para fotografias
Antes de serem flechadas
Pelo senhor desejo
Esse transformador de sentimentos.

Nos retratos
Eternamente sem toques:
Os sorrisos puros,
Olhares cândidos,
Saudoso deleite.
=============================

Luzia Ozarias
Flor de outono

Feito flor de outono
Tempo árido, manhãs frias
No alforge d’alma o que traria
Envolta em tão excelsa luz?

Doce essência, servindo a Divina ciência
No sutil aroma perfumando os ares
Envolvente, inebriante...ah, quem me dera!
Ter-te em meu jardim, e permanente.

Trouxe beleza que abraça e contagia
Nos olhos quase negros e brilhantes
Transformando a íris torturante
Em sereno aconchego. Quem diria!

Trouxe a esperança da bondade incansável
Refletindo o Doador imensurável
No viver de eterna bonança.

Trouxe fé inquebrantável e perene
Flor de outono, coração cálido
Seu nome é Luciene.
=============================

Elias Borges
Mar e Fé

(para Maria Rejane Fernandes Borges)

Outorgou-me
esperança.
O fogo lambendo
seus olhos.
Troando em
minhas retinas
águas profundas.
==========================

Toninho do Arapuá
Por Ti Amar

De mim já não precisa mais, meus sentimentos tanto faz,
Esquece que tirei as pedras do seu caminho,
Ofereci-lhe tanto carinho, sem nada lhe cobrar.
Na hora do seu desespero, fui eu o seu parceiro,
Aquele que lhe tirou do sufoco, hoje recebi um troco,
Sua atitude a nada posso comparar.

O que me deixou mais triste, foi à maldade que em você existe,
Quando consegue o que quer, é um salve-se quem puder,
Não importa a quem vai machucar.
Preocupa somente com seus direitos, esse é o seu pior defeito,
E ainda se faz de vítima, mas nada justifica,
Minha pessoa querer julgar.

Lamento com tristeza porque lhe conheci,
Por te amar muitas vezes não percebi,
Um sonho vivido pela metade, esta é a triste verdade,
Que demorei para aceitar
Porém, já esqueci minha magoa, na minha vida você é água passada,
O destino comigo foi caprichoso, mas o meu diário amoroso,
Seu nome consegui apagar.
=====================================

Tânia Gauto
Taperas

Não há cultura!
Ajudem! Rabisquem histórias.
Ergam costumes deliciosos.
plantem pés Mbaiá,
colham ritos Guarani,
encham o mar Xarayé.

Salguem carnes moças,
Temperem almas pobres.
Cantem noites vazantes,
Debrucem ais Paiaguá.
Vistam manhãs bonitas,
Namorem Maracajús.

Nas prateleiras de Barros
guardem bugras Conceições,
soldem nas calhas do tempo
Ferreiras, florais e Baís,
abram Mirandas estradas
salvem lendas Terena.

Proseiem Helenas horas
em dez cordas afinadas
e marquem de céu a chão
com as sementes, sangue porã,
que não há cultura nas águas,
mas, taperas escondidas nos Homens,
a serem catalogadas.
===========================

Delasnieve Daspet
Sombras de Mulher!

Sou uma menina.
De meia idade.
De acordar preguiçoso.
Da tardes ensolaradas,
Dos beija-flores coloridos!
Sou uma menina levada
Que se fez mulher
Que se fez sombra
Para viver.
Uma sombra nas nuvens.
Uma avezinha canora,
Que dentro da gaiola
Morre de saudades!
Sou uma sombra
Que não teve poder
Para gerar o que
Foi gerado.
Que queria apenas amar,
Mas que amor busquei?
Será este argamassado
Em lágrimas?
Uma sombra bela.
Que martela na pedra.
Que corta o barro.
Para dar seu produto:
A inspiração!
Sou sombra.
Que se desespera.
Que errou por lugares longínquos.
Sou hera.
Colada na tristeza dos edifícios!
Sou desespero,
Que emerge do fundo dos ser.
Sou paixão.
Não posso repetir façanhas
Do passado,
Reincidir.
Sou sombra.
Apenas uma sombra de mulher.
Em busca de luz.
As liberdade desse amor que
foi
E é minha expiação!
==================
Fonte:
União Brasileira dos Escritores do Mato Grosso do Sul

domingo, 14 de março de 2010

Trova 126 - Izo Goldman (Sao Paulo)

Hoje, excepcionalmente não é uma trova humoristica que coloco. Vim a saber que o Magnifico Trovador Izo Goldman não está bem de saúde já há alguns meses. Grande amigo, mestre e inspirador quero deixar aqui minha homenagem (pequena é verdade, mas nunca será grande o suficiente para este grande trovador) pelo quadro da vida que me ajudou a pintar. Foi ele que me deu a palheta de cores. Nada mais justo do que colocar uma trova dele mesmo.

Oremos pela sua rápida recuperação.

14 de Março (Dia Nacional da Poesia)

A poesia ganhou um dia específico, sendo este criado em homenagem ao poeta brasileiro Antônio Frederico de Castro Alves (1847-1871), no dia de seu nascimento, 14 de março.

Castro Alves ficou conhecido como o “poeta dos escravos”, pois lutou grandemente pela abolição da escravidão

Justamente por conta das ideias do escritor, que morreu com apenas 24 anos, o Brasil elegeu seu aniversário para comemorar a poesia.

Quando surgiu, a apresentação dos textos era acompanhada por um instrumento musical chamado lira, por isso a inclusão da poesia no chamado gênero lírico, independentemente do texto retratar tragédias.

Poesia é uma arte literária e, como arte, recria a realidade. O poeta Ferreira Gullar diz que o artista cria um outro mundo “mais bonito ou mais intenso ou mais significativo ou mais ordenado – por cima da realidade imediata”.

Para outros, a arte literária nem sempre recria. É o caso de Aristóteles, filósofo grego que afirmava que “a arte literária é mimese (imitação); é a arte que imita pela palavra”.

Declamando ou escrevendo, fazer poesia é expressar-se de forma a combinar palavras, mexer com o seu significado, utilizar a estrutura da mensagem. Isto é a função poética.

A poesia sempre se encontra dentro de um contexto cultural e histórico. Os vários estilos poéticos, as fases de cada autor, os acontecimentos da época e tantas outras interferências muitas vezes se misturam à obra e lhe dão novos significados.

Aos quatorze dias do mês de março, no ano de 1847, nasceu António Frederico de Castro Alves, na fazenda Cabaceiras, a sete léguas da vila de Curralinho, hoje cidade da Bahia. Era filho do Dr. António José Castro Alves e D. Clélia Brasília de Castro Alves.

Passou a infância no sertão natal, e em 54 iniciou os estudos na capital baiana.

Aos dezesseis anos foi mandado para o Recife. Ia completar os preparatórios para se habilitar à matrícula na Academia de Direito. A liberdade aos 16 anos é coisa perigosa. O poeta achou a cidade insípida. Como ocupava os seus dias? Disse-o em carta a um amigo da Bahia: "Minha vida passo-a aqui numa rede olhando o telhado, lendo pouco fumando muito. O meu ‘cinismo passa a misantropia. Acho-me bastante afctado do peito, tenho sofrido muito. Esta apatia mata-me. De vez em quando vou à Soledade." Que era a Soledade? Um bairro do Recife, onde o poeta tinha uma namorada. O resultado dessa vadiagem foi a reprovação no exame de geometria. Mas em 64 consegue o adolescente matricular-se no Curso Jurídico. Se era tido por mau estudante, já começava a ser notado como poeta. Em 62 escrevera o poema "A Destruição de Jerusalém", em 63 "Pesadelo", "Meu Segredo", já inspirado pela atriz Eugénia Câmara, "Cansaço", "Noite de Amor", "A Canção do Africano" e outros. Tudo isso era, verdade seja, poesia muito ruim ainda. O menino atirava alto. "A poesia", dizia, "é um sacerdócio — seu Deus, o belo — seu tributário, o Poeta."

O Poeta derramando sempre uma lágrima sobre as dores do mundo. "É que", acrescentava, "para chorar as dores pequenas, Deus criou a afeição, para chorar a humanidade — a poesia." Mas, no dia 9 de Novembro de 1864, ao toque da meia-noite, onde morava, o poeta, que sem dúvida se balançava na rede, fumando muito, sentiu doer-lhe o peito, e um pressentimento sinistro passou-lhe na alma.

Pela primeira vez ia beber inspiração nas fontes da grande poesia: essa a importância do poema "Mocidade e Morte". Uma dor individual, dessas para as quais "Deus criou a afeição", despertou no poeta os acentos supremos, que ele depois saberá estender às dores da humanidade, aos sofrimentos dos negros escravos (O Navio Negreiro), ao martírio de todo um continente (Vozes d'África).

Não era mais o menino que brincava de poesia, era já o poeta-condor, que iniciava os seus voos nos céus da verdadeira poesia. Naquela mesma noite escreve o poema, tema pessoal, logo alargado na antítese mocidade-morte, a mocidade borbulhante de gênio, sedenta de justiça, de amor e de glória, dolorosamente frustrada pela morte sete anos depois.

A versão primitiva do Poema foi conservada em autógrafo, documento precioso porque revela duas coisas: o poeta não se contentava com a forma em que lhe saíam os versos no primeiro momento da inspiração; na tarefa de os corrigir e completar procedia com segura intuição e fino gosto. Cotejada a primeira versão com a que foi publicada pelo poeta em São Paulo, por volta de 68-69, verifica-se que todas as emendas foram para melhor. Baste um exemplo: o sexto verso da segunda oitava era na primeira versão "Adornada" com os prantos do arrebol, substituído na definitiva por "Que" banharam de prantos as alvoradas, verso que forma com o anterior um dístico de raro sortilégio verbal.

"vem! formosa mulher — camélia pálida,
Que banharam de pranto as alvoradas".

Quase a meio do curso, em 67, o poeta, apaixonado pela portuguesa Eugénia Câmara, parte com ela para a Bahia, onde faz representar um mau drama em prosa — "Gonzaga" ou a "Revolução de Minas". Era sua intenção concluir o bacharelado em São Paulo, aonde chegou no ano seguinte. A sua passagem pelo Rio assinalou-se pelos mesmos triunfos já alcançados em Pernambuco.

Em São Paulo, nos fins de 68, feriu-se num pé com um tiro acidental por ocasião de uma caçada, do que resultou longa enfermidade, em que teve o poeta que se submeter a várias intervenções cirúrgicas e finalmente à amputação do pé. O depauperamento das forças conduziu-o à tuberculose pulmonar, a que sucumbiu em 71 no sertão de sua província natal.

Antes de regressar a ela, publicara, em 70, o livro "Espumas Flutuantes", cantos por ele definidos como rebentando por vezes, ao estalar fatídico do látego da desgraça", refletindo por vezes "o prisma fantástico da ventura ou do entusiasmo".

No "O Navio Negreiro" evocava o poeta os sofrimentos dos negros na travessia da África para o Brasil. Sabe-se que os infelizes vinham amontoados no porão e só subiam ao convés uma vez ao dia para o exercício higiênico, a dança forçada sob o chicote dos capatazes.

Em 70 cumpre distinguir o lírico amoroso, que se exprimia quase sempre sem ênfase e às vezes com exemplar simplicidade, como no formoso quadro do poema "Adormecida", o poeta descritivo, pintando com admirável verdade e poesia a nossa paisagem, tal em "O Crepúsculo Sertanejo", cumpre distingui-lo do épico social desmedindo-se em violentas antíteses, em retumbantes onomatopeias. A este último aspecto há que levar em conta a intenção pragmática dos seus cantos, escritos para serem declamados na praça pública, em teatros ou grandes salas —, verdadeiros discursos de poeta-tribuno. E há que reconhecer nele, mau grado os excessos e o mau-gosto ocasional, a maior força verbal e a inspiração mais generosa de toda a poesia brasileira.

Em fevereiro de 1870 seguiu para Curralinho para melhorar a tuberculose que se agravara, viveu na fazenda Santa Isabel, em Itaberaba. Em setembro, voltou para Salvador. Ainda leria, em outubro, «A cachoeira de Paulo Afonso» para um grupo de amigos, e lançou «Espumas flutuantes». Mas pouco durou. Sua última aparição em púbico foi em 10 de fevereiro de 1871 numa recita beneficente. Morreu às três e meia da tarde, no solar da família no Sodré, Salvador, Bahia, em 6 de Julho de 1871.

Seus escritos póstumos incluem apenas um volume de versos: A Cachoeira de Paulo Afonso (1876), Os Escravos (1883) e, mais tarde, Hinos do Equador (1921). É um dos patronos da Academia Brasileira de Letras (cadeira número 7).

Fonte:
Portal CEN.