quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Franz Kafka (Comunicado a uma Academia)




FRANZ KAFKA
(1883-1924 - Checoslováquia)

Pode parecer surpreendente, mas Franz Kafka costumava ler em voz alta e às gargalhadas alguns de seus contos para um grupo de amigos. 

Excentricidade de um gênio ou um humor tão pessoal que passa quase desapercebido do leitor comum? É possível achar graça lendo A Metamorfose, por exemplo? Kafkianamente, parece que sim. O humor de Franz K. não é cômico nem muito menos hilariante: é um fino humor racional, quase filosófico. E às vezes cruel, como esta sátira ao antropomorfismo antiecológico do homem moderno, onde a ironia subjacente ao texto é tão fundamental que sem ela o conto não poderia ser compreendido em sua profundidade.
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Eminentíssimos senhores,

Destes-me a honra de me solicitar que apresentasse eu à Academia um relatório sobre o meu passado de símio.

Não poderei infelizmente atender a tal convite, nos precisos termos em que me foi formulado. Separam-me da minha vida de macaco cerca de cinco anos, período de tempo talvez curto no calendário, mas que se torna infinitamente longo quando passado, como aconteceu comigo, pulando daqui para ali pelo mundo, acompanhado de excelentes homens, de conselhos, aplausos, músicas de orquestra, e no fundo sozinho, já que a minha companhia, para nada perder do espetáculo, se mantinha afastada dos palcos. 

Tivesse eu me obstinado a cismar em relação às minhas origens e recordações da juventude, e as proezas por mim praticadas teriam sido impossíveis. A primeira regra que me impus era exatamente a de renunciar a qualquer tipo de obstinação; ali estava eu, macaco livre, impondo a mim mesmo uma submissão. Em contrapartida a isto, minhas recordações progressivamente foram-se dissipando. No começo poderia ainda ter regressado, se assim tivessem desejado os homens, pela porta que o céu forma sobre a Terra: mas ela ia se tornando cada vez mais baixa e mais estreita à medida em que se processava a minha evolução, ativamente estimulada; melhor me sentia, mais integrado ao mundo dos homens; a tempestade que soprava do meu passado aquietou-se. Hoje não passa de uma corrente de ar que me sopra ligeiramente aos calcanhares e ao buraco do horizonte por onde ela entra e por onde passei um dia e que tornou-se tão pequeno que para o atravessar teria de ficar sem pele, admitindo que tinha eu ainda força e vontade suficientes para o tentar. Falando francamente - nestes assuntos gosto de usar imagens -, falando francamente, a vossa vida como macacos, meus senhores, se acaso vivestes já uma existência desta espécie, não pode estar mais longe de vós do que a minha está de mim. Mas acompanha de perto todos aqueles que vivem sobre a Terra, desde o pequeno sagüi até ao grande Aquiles. 

No entanto, num sentido bastante restrito, posso talvez corresponder ao vosso convite, e é até com prazer que o estou fazendo. A primeira coisa que me ensinaram foi o aperto de mão. O aperto de mão é um gesto de franqueza: assim, naquele dia em que atingi o ponto mais alto da minha carreira, que a franqueza das minhas palavras acompanhe sempre este primeiro aperto de mão. Uma tal franqueza não trará nada de novo a vossa Academia, e as minhas palavras muito aquém ficarão do que me foi pedido e do que eu não saberia dizer, independente da minha melhor vontade; irão mostrar, por outro lado, o caminho pelo qual um antigo macaco ingressou no mundo dos homens e aí se fixou. Mas nem sequer conseguiria eu dizer o pouco que se segue se não estivesse inteiramente seguro de mim mesmo e se não tivesse consolidado a minha posição em todas as cenas de cabaré do universo civilizado, de maneira a não conseguir ser abalada.

Sou originário da Costa do Ouro. Como fui capturado? Neste aspecto, fico reduzido ao testemunho dos outros. Um grupo de caçadores da empresa Hagenbeck - com cujo chefe depois esvaziei muitas garrafas - estava de emboscada numa mata junto ao rio onde eu costumava beber com o meu bando. Dispararam: fui o único atingido. Recebi duas balas. Uma no rosto, ferimento sem gravidade; mesmo assim me deixou uma cicatriz vermelha, sem um só pêlo, o que me deu o apelido de Peter, o Vermelho - epíteto repugnante, perfeitamente injusto e inventado por um verdadeiro macaco -, como se fosse somente essa marca avermelhada que me distinguisse do outro Peter, o macaco sábio recentemente falecido e que gozava naquelas regiões de uma merecida reputação. Isto apenas cá entre parênteses.

A segunda bala me atingiu na parte inferior da anca. Ferimento grave que é a causa de eu coxear um pouco até hoje. Li recentemente num artigo de uma destas dez mil aves de rapina que se lançaram nos meus encalços pelos jornais, que a minha natureza de macaco não estava ainda completamente domada e que a melhor prova disso era que, quando recebo visitas, costumo tirar as calças para mostrar o buraco da bala. Só desejava que saltasse das mãos, um a um, os dedos do sujeito que escreveu isto. 

Quanto a mim, tenho o direito de tirar as calças diante de quem bem entender; nada mais irão ver do que um pêlo cuidado e a cicatriz, vestígio de uma ação criminosa. 

Tudo isso se pode mostrar em plena luz do dia, nada há para esconder. Quando se trata da verdade, os mais altivos deixam o protocolo de lado. Se o escriba em questão tirasse as calças sempre que recebesse uma visita o quadro é claro seria totalmente diferente, e também admito, lógico, que a razão lhe impeça tal gesto. Mas a este respeito, ele e sua falta de tato que me deixem em paz.

Após os referidos tiros, acordei - e aqui é que começam minhas verdadeiras lembranças - numa jaula no porão da Hagenbeck. Não eua uma jaula propriamente, gradeada por todos os lados. Contentaram-se em adaptar grades sobre três dos lados de uma grande caixa. A própria caixa, portanto, formava o quarto lado. Era baixa demais para se ficar em pé e demasiada estreita para ficar sentado. Ali permaneci, acocorado os joelhos voltados para dentro e sempre tremendo, a cara virada para o lado da caixa, as barras das grades me ferindo a pele das costas, pois no princípio não queria ver ninguém e desejava simplesmente ficar no escuro. Este tipo de enjaulamento em geral é considerado como vantajoso nos primeiros tempos de captura de animais selvagens. Hoje, depois de toda a experiência que vivi, não posso negar a veracidade disto, sob o ponto de vista humano.

Mas naquela hora não me preocupava com isso. Pela primeira vez na minha vida, eu me encontrava num beco sem saída, por assim dizer. Ou se saída houvesse, eu é que não a via; diante de mim surgia apenas a parede da caixa com suas grandes tábuas solidamente unidas. Para falar a verdade, havia uma fenda de alto a baixo; quando a descobri, saudei-a com um grito de alegria, mas a fenda não servia sequer para passar o rabo - e eu não consegui alargá-la apesar de toda a minha força de macaco.

Conforme consegui avaliar pelo que me disseram depois, eu devia então não ser nem um pouco barulhento, donde concluíram que logo, logo, eu ia passar desta para melhor ou, se ultrapassasse o momento critico, me tornaria perfeitamente domesticável. Sobrevivi. As primeiras ocupações da minha nova existência eram soluçar contidamente, catar penosamente as pulgas, lamber com lassidão um pedaço de coco, bater com a cabeça na parte de madeira da jaula ou botar a língua para fora quando alguém se aproximava de mim. Mas no meio de tudo isso, um só sentimento: não havia saída. É claro que não consigo agora reproduzir em palavras humanas o que sentia como macaco naquela época, e o que eu disser sai forçosamente deformado, mas embora não consiga jamais reencontrar a verdade dos símios de outrora, nem por isso a minha narração deixa de assinalar a verdadeira direção por onde ela deve ser procurada. Disto não tenho a menor dúvida.

Tantas andanças tivera eu até aquele momento! Eis-me agora sem nenhuma. Fora apanhado. Se me tivessem crucificado, a minha liberdade domiciliar não teria sido mais restrita. E por quê? Por mais que me arranhasse até sangrar nos artelhos, não conseguia saber a razão. Por mais que fizesse força com as costas contra as grades, até ficar quase cortado em dois, nada conseguia descobrir. Não tinha saída e precisava de uma, não era possível viver sem uma saída. Encostado dentro daquele cubículo da jaula ia acabar estourando. Mas os macacos de Hagenbeck são destinados justamente a viver atrás das grades... Pois bem, eu deixaria então de ser macaco! Belo pensamento, raciocínio luminoso que se formou não sei como bem no fundo da minha barriga, pois os macacos pensam com a barriga.

Não sei se vocês compreendem bem o que entendo por "uma saída". Uso a palavra no sentido comum e em toda a sua amplitude. Propositadamente evito falar em "liberdade". Não é nesse grande sentimento de liberdade em todos os sentidos que eu penso. Como macaco, eu bem o conhecia e vi homens que por esse sentimento ansiavam. Todavia, no que me diz respeito, nunca exigi nem exigirei a liberdade. Com ela, diga-se de passagem, é que muitas vezes os homens trapaceiam entre si. Como a liberdade se encontra entre os mais sublimes ideais, e o logro que se lhe corresponde passa também por sublime. Quantas vezes não vi, em espetáculos de variedades, artes da minha apresentação, artistas trabalhando no trapézio voador! Projetam-se, balançam, saltam, voam para os braços um do outro e um deles segura o companheiro pelos cabelos. 

"Aquilo ali também é liberdade humana", pensava eu, "é um movimento de soberania". Oh, santa ilusão! O riso da categoria simiesca ante este quadro seria o suficiente para abalar o mais sólido dos prédios.

Não, não era pela liberdade que eu ansiava. Uma simples saída, à direita, à esquerda, fosse lá onde fosse. Não tinha outra exigência, mesmo que a própria saída fosse um logro. Pequena era a minha exigência, não poderia ser maior o meu logro. Avançar, avançar! Principalmente não ficar no mesmo lugar, de braços erguidos, colado às grades de uma jaula.

Vejo hoje nitidamente que, sem a maior calma interior, não teria conseguido fugir. E de fato, tudo aquilo que me tornei, devo talvez à calma que de mim se apossou ainda a bordo passados os primeiros dias. E esta tranqüilidade, sem dúvidas, fiquei devendo à tripulação do barco.

Apesar de tudo, era um pessoal admirável. Hoje ainda gosto de me lembrar o barulho pesado dos seus passos, ressoando na minha semi-sonolência. Tinham eles o hábito de tudo fazerem com grande lentidão. Quando precisavam esfregar os olhos, levantavam a mão como quem levanta um saco de areia. Suas brincadeiras eram pesadas mas cordiais. O seu riso acabava se misturando com uma tosse que poderia parecer perigosa mas que era sem nenhuma importância. Tinham sempre alguma coisa na boca pronta para ser escarrada e sem cuidado algum para onde a cusparada poderia cair. Passavam o tempo todo se queixando que pegavam pulgas de mim, mas nunca de fato me quiseram mal. Sabiam que as pulgas abundavam nos meus pêlos e que elas tinham necessidade de saltar: esta explicação lhes era suficiente. Quando não estavam de serviço, acontecia às vezes de sentarem-se em semicírculo à minha volta, sem falar, apenas se dirigindo uns aos outros através de surdos grunhidos. Fumavam cachimbo, deitados por cima das caixas; ao menor movimento da minha parte, eles davam uma palmada nos joelhos; de vez em quando um deles pegava um pedaço de pau e me coçava no lugar certo onde eu gostava. Se me convidassem hoje para fazer uma viagem naquele barco, com certeza que eu declinaria o convite, mas com certeza também que nem todas as lembranças daquela viagem seriam ruins.

A tranqüilidade que consegui em meio àquele pessoal me impediu de tentar fugir. Me parece, vendo tudo pelos olhos de hoje, que eu tinha pelo menos pressentido que necessitava encontrar uma saída se quisesse viver, mas que essa saída não podia estar na fuga. Não sei se a fuga seria possível, mas acredito que sim; para um macaco, a fuga deve ser sempre possível. Com os meus dentes atuais preciso de prudência até mesmo para quebrar uma simples noz, mas naquele tempo teria conseguido despedaçar a dentadas a fechadura da porta. Não o fiz. O que teria ganho cm isso? Assim que pusesse a cabeça de fora, eles teriam logo me recapturado e me encerrado numa jaula ainda pior; a menos que fugisse sem ser visto para o meio dos outros animais, como as boas serpentes ali em frente que me teriam dado a morte com um simples abraço. 

Talvez eu conseguisse escapar até o convés e dele saltar fora, caso em que eu teria boiado por alguns momentos na superfície do oceano, acabando logo por me afogar. 

Atos de desespero. Eu não raciocinava tão humanamente assim, mas a influência do entusiasmo me fazia crer que eu tivesse raciocinado. No entanto, se não raciocinava, pelo menos tranqüilamente ia observando tudo. Via as idas e vindas daqueles homens, sempre com as mesmas caras, sempre com os mesmos movimentos, muitas vezes me pareciam ser apenas um. Este homem, ou estes homens, moviam-se pois livremente. Mas diante de mim começava a surgir uma grande possibilidade. 

Ninguém me prometera abrir as grades, caso eu me tornasse como eles; nada se promete em troca de realizações que parecem impossíveis; mas uma vez realizadas estas realizações, as promessas aparecem imediatamente onde antes as tínhamos procurado em vão. Na verdade, nada havia naquelas pessoas que me seduzisse. Fosse eu partidário da famosa liberdade de que falávamos antes, teria com certeza preferido o oceano à saída que se entrevia no olhar turvo daqueles homens. Observara-os detidamente muito antes de pensar nestas coisas, e foram mesmo essas observações repetidas que me impeliram na direção que acabei optando.

Era tão fácil imitar os humanos! Logo nos primeiros dias eu já tinha aprendido a escarrar. Escarrávamos mutuamente um na cara do outro; a única diferença era que em seguida eu me limpava lambendo-me e eles não. Não demorei a fumar cachimbo como um veterano; se acontecia de eu pôr o polegar na parte acesa, eles deliravam como espectadores. Logo passei a distinguir um cachimbo cheio de fumo de outro vazio.

O que me causou maior repugnância foi a garrafa de aguardente. O cheiro me martirizava, eu me sentia terrivelmente agredido; levei semanas para conseguir me dominar. 

Era curioso que as pessoas levavam muito mais a sério estas lutas morais do que todas as outras distrações que eu lhes proporcionava. Não consigo distinguir estes homens, nem mesmo nas minhas lembranças, mas havia um que vinha sempre, só ou com seus camaradas, de dia ou de noite, nas horas mais desencontradas, alojava-se com a garrafa na minha frente e me dava uma aula. Ele não conseguia me compreender, mas parecia querer resolver o enigma do meu ser. Desenrolhava lentamente a garrafa e me olhava em seguida para ver se eu tinha compreendido. 

Confesso que eu olhava para ele sempre com uma atenção apaixonada e ansiosa; nenhum professor de homens terá jamais encontrado aluno como eu em todo o mundo; desarrolhada a garrafa, erguia-a na direção da boca; eu o seguia com o olhar até o gargalo; satisfeito comigo, hei-lo levando a garrafa aos lábios, com um aceno de cumplicidade; então eu, encantado por pouco a pouco ir compreendendo tudo, coçava-me e emitia pequenos guinchos ao acaso e pelo corpo; e ele, contente, emborcava o gargalo e bebia um gole; eu, desesperadamente impaciente para fazer que nem ele, jogava-me pela imundície da minha jaula, o que lhe trazia novamente uma grande satisfação, e então, afastando a garrafa com um gesto largo e trazendo-a para junto de si novamente com um movimento rápido e cheio de vigor, esvaziava-a de um só trago, inclinando-se para trás de um modo exageradamente didático. Esgotado pelos excessos do meu desejo, não conseguia mais segui-lo com os olhos e ficava ali, vacilante, encostado às grades, enquanto ele acabava minha instrução teórica e esfregava a barriga com uma careta de prazer.

Só então começavam os exercícios práticos. Não estava eu já cansado de tanta teoria? Com certeza, cansado e bem cansado. Era o meu destino. Mas agarro a garrafa que ele me estende da melhor maneira que posso; tiro-lhe a rolha, tremendo, mas o resultado obtido faz com que eu ganhe novas forças; ergo a garrafa e praticamente não me distingo mais do meu modelo; levo-a à boca e... afasto-a horrorizado, com repugnância, embora ela esteja vazia, exalando apenas seu odor característico; jogo-a no chão, cheio de asco. Para grande consternação do meu professor; para grande consternação minha. Nem aos olhos dele nem aos meus consigo reabilitar-me pele fato de, após ter jogado a garrafa fora, acariciar a barriga com uma careta de prazer.

Quantas vezes a aula não terminava assim! E devo dizer, em honra do meu professor, que ele não me levava a mal; às vezes encostava o cachimbo aceso nos meus pêlos em algum ponto difícil de eu alcançar, até ficar vermelho, mas ele imediatamente apagava com sua mão enorme e bondosa; até que ele gostava de mim, percebendo a sua maneira que combatíamos ambos do mesmo lado contra a natureza simiesca e que era a mim que cabia a parte mais dura de roer.

Mas a vitória, para ele quanto para mim, aconteceu quando uma noite, diante de um círculo de espectadores - talvez fosse dia de festa, um gramofone tocava, um oficial passeava por entre eles -, quando uma noite, dizia eu, em que não era observado, peguei inadvertidamente numa garrafa de aguardente deixada ao lado da minha jaula, tirei-lhe a rolha de acordo com todo o meu aprendizado e, diante de uma sociedade cuja atenção foi desperta pelo meu ato, levei-a aos lábios e sem hesitação, sem uma única careta. Assim, como um verdadeiro profissional, rolando os olhos, a goela tremendo, esvaziei-a de fato, literalmente, e atirei-a fora, ainda não em desespero mas com requintada arte; é verdade que me esqueci da carícia na barriga, mas em contrapartida, porque se impunha, porque era uma necessidade, porque já tinha os sentidos inebriados, em suma, por uma razão ou por outra, soltei um "ahhh! bem humano, entrei de imediato com esta exclamação na comunidade dos homens e o eco que me foi devolvido - "Ouçam só, ele está falando!" - espalhou-se como um beijo sobre meu corpo coberto de suor.

Repito: não me seduzia a idéia de imitar os humanos; se imitei foi porque procurava por uma saída e não por outra razão qualquer. Esta  vitória, aliás, não representou para mim qualquer tipo de progresso; imediatamente a voz me faltou; não a recuperei senão depois de meses; a repulsa pela garrafa de aguardente voltou com força redobrada. Mas de uma vez para sempre, tinha percebido a direção que deveria seguir.

Quando fui entregue em Hamburgo ao meu primeiro adestrador, não demorei para reconhecer as duas possibilidades que se abriam diante de mim: jardim zoológico ou espetáculo de variedades. Não hesitei Disse a mim mesmo: trata, com todas as tuas forças, de fazer com que te levem para o mundo dos espetáculos; é aí que está a saída, o jardim zoológico é apenas uma nova jaula. Estarás perdido neste último caso.

E aprendi, senhores! Ah, como se aprende quando é mais do que necessário encontrar uma saída! Aprende-se sem consideração por mais nada! A gente fica se vigiando de chicote em punho; à menor resistência, lá vai chicotada. A minha natureza simiesca distanciava-se de mim a olhos vistos, entrava na primeira cabeça que me aparecesse, de tal modo que o meu professor tornou-se ele próprio simiesco e se viu obrigado a renunciar às lições ingressando num manicômio. Felizmente não ficou muito tempo por lá.

Mas eu consegui muitos professores e, às vezes, vários ao mesmo tempo. Quando as minhas capacidades se afirmavam um pouco, quando o público começou a acompanhar os meus progressos e o futuro começou a se desanuviar, eu próprio escolhi meus mestres e coloquei-os de enfiada em cinco salas diferentes e tomei minhas aulas com todos ao mesmo tempo, correndo sem descanso de uma sala para a outra.

Ah, quanto progresso! Esta penetração no conhecimento cujos raios vêm de todos os lados iluminar um cérebro que desperta! Não nego: era nisso que residia a minha felicidade. Mas confesso também que, de maneira nenhuma eu me superestimava mesmo naquela época, e muito menos agora! Através de um esforço do qual não surgiu outro na face da terra, adquiri a cultura média de um europeu. Não seria grande coisa em si mesmo, mas já era um progresso no sentido em que me ajudou a sair da jaula e me ofereceu essa saída, uma saída humana. Todos vós conheceis com certeza a expressão "Pôr-se à vontade"; foi o que fiz, pus-me à vontade, não tinha outro caminho, já que decidira não optar pela liberdade.

Quando olho a minha evolução e os objetivos que a guiaram até aqui, não me lamento nem fico contente. Mãos nos bolsos, garrafa na mesa, mantenho-me meio sentado, meio deitado na cadeira de balanço e olho pela janela. Quando chega uma visita, recebo-a conforme a etiqueta. O meu empresário fica na sala de entrada: quando toco a campainha, ele aparece e escuta o que tenho para dizer. À noite, quase sempre tem espetáculo, e, sem dúvida, os meus sucessos nunca serão ultrapassados. Quando volto para casa, tarde da noite, vindo de banquetes, de sociedades eruditas ou de alguma conversa íntima agradável, está à minha espera uma jovem macaca com a qual me entrego aos prazeres da nossa raça. De dia, não quero nem vê-l:a; efetivamente, ela traz nos olhos a expressão perdida do animal evoluído; só eu consigo ver isso e não consigo suportar tal visão.

No conjunto, cheguei ao que eu queria conseguir. Não posso dizer que não tenha valido a pena. Aliás, não preciso de julgamento dos humanos, procuro a divulgar conhecimentos, contento-me em relatá-los; mesmo convosco, eminentíssimos acadêmicos, contentei-me em relatar.

Fonte:
Flávio Moreira da Costa (org.). Os 100 Melhores Contos de Humor da Literatura Universal. 5.ed. RJ: Ediouro, 2001.

Concurso de Trovas UNIVERTI (Resultado Final)


UNIVERSIDADE ABERTA DA TERCEIRA IDADE - UNIVERTI 

VENCEDORES

Seja qual for sua idade,
ouça a Univerti, que diz:
sem esperança e amizade,
ninguém pode ser feliz.
Hegel Pontes - Juiz de Fora / MG

A esperança é que sustenta
os sonhos da humanidade,
que a UNIVERTI complementa,
pelos laços da amizade.
Vanda Fagundes Queiroz - Curitiba / PR

Pelas sementes que lança,
na mente e no coração,
une a Univerti a esperança
e a amizade à educação.
Antônio Augusto de Assis - Maringá / PR

Tem a Univerti a esperança
de que um dia a sociedade
viva em paz, pela aliança
da cultura e da amizade.
Antônio Augusto de Assis - Maringá / PR

A UNIVERTI é força viva,
Manancial de esperança,
Amizade que cativa
E nos transforma em criança.
Messias da Rocha - Juiz de Fora / MG

Investindo na amizade,
na UNIVERTI a gente alcança
amor e felicidade
e volta a ter esperança!
Jota de Jesus - Saquarema / RJ

MENÇÕES HONROSAS

A UNIVERTI é grande exemplo
de esperança e de amizade:
o seu Magistério é um “templo
de amor” à terceira idade!
Ruth Farah Nacif Lutterback - Cantagalo / RJ

Nesta crise de AMIZADE
em que este mundo se lança,
a UNIVERTI, na verdade,
é nossa grande ESPERANÇA!
Sônia Maria Sobreira da Silva - Rio de Janeiro / RJ

Se a AMIZADE deixa traços
indeléveis na lembrança,
a UNIVERTI abre seus braços,
renovando uma ESPERANÇA!
Sônia Maria Sobreira da Silva - Rio de Janeiro / RJ

Pregando a fraternidade,
nossa Univerti comprova:
Cultivando-se a amizade,
a esperança se renova.
Hegel Pontes - Juiz de Fora / MG

A Univerti é uma irmandade.
Lá, qual roseira florida,
regada pela amizade,
a esperança tem mais vida.
Hegel Pontes - Juiz de Fora / MG

Junte alegria e esperança,
tempere com amizade;
com a UNIVERTI se alcança
vigor na terceira idade.
Eliana Ruiz Jimenez - Balneário Camboriú / SC

Ao cultivar a AMIZADE
a UNIVERTI é mais que isto...
– Luz de ESPERANÇA e bondade
seguindo as lições do Cristo!
José Valdez de Castro Moura - Pindamonhangaba / SP

Com a UNIVERTI, a amizade
faz surgir nova esperança,
pois traz à terceira idade
velhos sonhos de criança!
Renata Paccola - São Paulo / SP

A UNIVERTI compreendendo
que os sonhos não têm idade,
planta ESPERANÇA colhendo
Saúde, Paz, AMIZADE.
Wandira Fagundes Queiroz - Curitiba / PR

MENÇÕES ESPECIAIS

Na esperança de encontrar
acolhimento e amizade,
o idoso vai procurar
na Univerti a dignidade.
Angélica Maria Villela Santos - Taubaté / SP

A UNIVERTI, com esteios,
da esperança e da amizade,
consegue todos os meios
de unir a terceira idade!
Ederson Cardoso de Lima - Niterói / RJ

A amizade nos diverte,
A esperança nos domina
E nos umbrais da UNIVERTI
A vida se descortina.
Messias da Rocha - Juiz de Fora / MG

Cada concurso que lança
a UNIVERTI vê que a trova,
por ser fonte de ESPERANÇA
traz sempre AMIZADE nova.
Wandira Fagundes Queiroz - Curitiba / PR

A UNIVERTI abriu-me os braços...
renovou minha esperança
de, em amizades e abraços,
sentir-me outra vez, criança!
Dodora Galinari - Belo Horizonte / MG

Esquiva ao tempo que avança,
forjando ensino e amizade,
a UNIVERTI dá esperança
até na terceira idade!
Josafá Sobreira - Jacarepaguá / RJ

Na esperança de estudar
e de ter mais amizade,
fui na Univerti encontrar
a “inclusão” na sociedade!...
Roberto Tchepelentyky – São Paulo / SP

A UNIVERTI é uma aliança
entregue à terceira idade:
numa joia de esperança,
o ouro puro da amizade!
Renata Paccola - São Paulo / SP

UNIVERTI é a faculdade
que simboliza a esperança,
pois traz à terceira idade
amizade e confiança!
Renata Paccola - São Paulo / SP

Na partilha de ideais
se a Univerti dá o suporte,
a esperança cresce mais,
a amizade é bem mais forte.
Vanda Fagundes Queiroz - Curitiba / PR

Fonte:
http://poesiaemtrovas.blogspot.com.br 

Ângelo Machado (Lançamento do Livro “O Livro do Pé") em Belo Horizonte


A Fundação Municipal de Cultura realiza, na Biblioteca Pública Infantil e Juvenil de Belo Horizonte (BPIJ), dia 6 de outubro, às 11h, o lançamento de “O livro do pé” de Ângelo Machado com ilustrações de Flávio Fargas. O livro, publicado pela editora Lê, fala sobre a questão das diferenças, tendo como ponto de partida o formato dos pés dos animais. 

Desde agosto, Machado ocupa a cadeira de número 26 da Academia Mineira de Letras, sendo o mais novo imortal eleito pela Casa. Já foi professor de neuroanatomia e zoologia da Unversidade Federal de Minas Gerais e tem em seu currículo mais de 30 livros publicados. 

Flávio Fargas é ilustrador de livros infantis, graduado em Desenho pela UFMG. Seu primeiro trabalho para o livro “Poemares”, de José de Castro, foi selecionado para a Bienal Internacional de Ilustração Infantil de Bratislava na Eslováquia em 2007. Desde então, já trabalhou em outros 34 livros. 

Biblioteca Pública Infantil e Juvenil 
Rua Carangola, 288, Santo Antônio 
Entrada gratuita 
Informações: (31) 3277-8651

Fonte:
BH Cultura - Fundação Municipal de Cultura

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 685)



Uma Trova de Ademar  

Na “derradeira viagem” 
que nós faremos decerto, 
busco, com fé, a passagem 
para ver Jesus de perto! 
–Ademar Macedo/RN– 

Uma Trova Nacional  

Amizade é sol que aquece 
aonde quer que se vá; 
nem sempre o sol aparece 
mas se sabe que está lá. 
–Myrthes Mazza Masiero/SP– 

Uma Trova Potiguar  

Numa casa de fazenda 
vê-se aranha pequenina 
com o seu tear de renda 
tecendo sua cortina. 
–Prof. Maia/RN– 

Uma Trova Premiada  

2005   -   ATRN-Natal/RN 
Tema   -   FÉ   -   15º Lugar 

A fé, de crenças tamanhas,
é um rio largo e bendito
que vai transpondo montanhas
e deságua no infinito! 
–Eduardo Toledo/MG– 

...E Suas Trovas Ficaram  

Que pena, que uma pequena 
não teve pena de mim. 
E eu que dela fui ter pena, 
fiquei depenado assim... 
–J. Revoredo Neto/RN– 

U m a P o e s i a  

Casa sem luxo e sem graça
já quase virando escombros
reduto de malassombros
fazendo susto a quem passa,
telha suja de fumaça 
pela chaminé deixada,
cinza de lenha queimada
se espalhando pelo o ar;
tem muito o que se contar
de uma casa abandonada.
–Júnior Adelino/PB– 

Soneto do Dia  

PRIMAVERA. 
–Oscar Macedo/RN– 

Ei-la que vem triunfal. A Natureza 
para recebê-la, cobre-se de flores, 
no seu augusto trono de princesa; 
cheia de luz , de graça e de esplendores. 

Flora sorri de gozo e de surpresa 
vendo-a chegar. As aves multicores, 
vão esperá-la, alegres na devesa. 
O sol desprende em luz os seus fulgores. 

Que beleza, por tudo quanto eu vejo! 
Ouço na brisa, o doce som de um beijo 
das ninfas que se entregam pelo amor. 

É essa a doce quadra dos amantes. 
Numa festa de luzes cintilantes, 
canta e sorri a Natureza em flor.

Mia Couto (Os Negros Olhos de Vivalma)


Há mulheres que procuram um homem que lhes abra o mundo. Outras buscam um que as tire do mundo. A maior parte, porém, acaba se unindo a alguém que lhes tira o mundo.

Este foi o destino de Vivalma, mulher entre as mulheres, cheia de desgraça, nem o Senhor punha oração nela. Mulher gorda, exibia os seios em cacho, carnes de muito volume e herança. Tanta redondeza, aliás, suprimia a curva. Vivalma era esposa do latoeiro Xidakwa, homem zangadiço e com nervo florindo na pele.

A volumosa senhora saía de manhã para o serviço de sentar no bazar, em banca rente ao chão. Eram tão poucas e abreviadas as coisas que vendia que ela nunca fazia as contas. A vida é um por enquanto no que há-de vir. Vivalma se deixava no assento, mais vagarosa que orvalho. Até a mão dela poupava esforços, num mesmo gesto de ida e volta: para lá, enxotava mosca; para cá, chamava cliente. Seus braços eram tão curtos que nem era capaz de arregaçar as mangas.

Pois Vivalma se dava a conhecer pelo modo como zarolhava, olho deitado abaixo. Razão de que o marido lhe batia, por dádiva daquela palha. Nem carecia de motivo:  o murro era a língua dele, vingança de lhe fugirem desejos de sua vista. Todos se admiravam: Xidakwa até que parecia tranquilinho, sonolento, incapaz de violência. Mas os hematomas no rosto da mulher, o sangue pisado lhe enchendo a cotidiana pálpebra dela, eram provas indesmentíveis. Todos punham a devida pena na vendecora. Tão batidinha, coitada. E ainda por cima, sempre no mesmo olho. As colegas lhe sugeriam:

-  Você podia pedir a ele para variar-se: cada vez num lado, cada vez no outro- .

Ela sorria, parecia isenta de pensamento. A gordura era sua única resposta. Ela sabia: mais se engorda, menos se sofre. Com o volume a dor vai ficando mais e mais distante, perdida lá nas curvas das entranhas. As vendeiras lhe puxavam o brio:

-  Mas você Vivalma, nem viva nem alma?- 

Quem fala consente? E a mulher gorda suspirava:

-  Deus me reze, minhas amigas- .

Ela é que sabia. Xidakwa, seu marido, enganava era nas aparências. Ele era um mosca-viva, esgazelado, tratando-lhe a berro e fogo. Outros já lhe tinham chamado as atenções. Mas o latoeiro varria os reparos, explicando:

-  A vida é dura de mais para aceitar carícia: cabedal se cose é com dedal- .

As colegas do bazar insistiam:

-  Ora, Vivalminha, lhe deixe de vez, esse homem não vale uma vida. Você é como o nariz: toda a vida no meio, sem nunca fazer escolha- .

Em silêncio, Vivalma amealhava suas razões. Não que houvesse segredo: para ela, aquela era a ordem do mundo, estavam-se cumprindo destinos. Nem ela nem ele teriam tempo para uma outra ocasião. O mundo dele era de outra razão, um confim. Ele lhe queria à razão de pontapés? Que fosse. Ela não tinha querer nem ser. E quem não tem vontade, não tem lamento.

E era sem lamento que ela regressava a casa, tardes a fio, sempre última das vendedoras. Demorava os vinte  e quatro ponteiros no caminho. Perto de casa colhia uma flor mas, ao entrar no portão, a deitava no chão. No pátio se acumulavam pétalas brancas, secreto e perfumado lençol da noiva que nunca houve.

Até que, um dia, o olho negro de Vivalma se apresentou piorado, em feio e ampliado derrame. As vendeiras transbordaram-se. Não, aquilo era demais! E se conluiram para desafiar o marido violento. Sem que Vivalma suspeitasse, umas delas lá foram a casa de Xidakwa. Enquanto pisavam aquele mar de flores desfeitas souberam o espantável: que o dito marido, Xidakwa, há tempo que se fora, amanteado com outra. As vizinhas diziam e comprovavam. Os tais derrames que Vivalma exibia no rosto eram por ela mesma fabricados, sem infligência de mais ninguém.

As vendedores regressaram ao bazar, caladas, sob uma bategazinha de Verão. A chuva caía tristonha como um luto, cada gota uma mulher em Outono, chuviuvinha. Ingrata é a morte que não agradece a ninguém. Vivalma teatrava, para que ninguém suspeitasse de seu abandono? Pois as amigas se compustararam em igual disfarce. Na Natureza ninguém se perde, tudo inventa outra forma.

Sucedeu, por astúcia do acaso, o seguinte percalço: a nova mulher de Xidakwa ouviu dizer que Vivalma continuava a revalidar suas equimoças, olho da cor do chão. Se assim era, quem mais poderia ser o batedor senão o dito latoeiro? E a moça, mais nascida que a gorda vendeira, contraverteu caminho e foi agasalhar outra felicidade.

O homem, desconcertado, voltou a casa para afinar contas com Vivalma. Se admirou de ver o pátio varrido, limpo das habituais florinhas. Os vizinhos se surpreenderam, depois, a ouvir os gritos dele, batendo em sua original esposa.

Manhãzinha seguinte, viram Vivalma sair de casa, canteirando pelo jardim, a encher as mãos de petalazitas  brancas. Haveria quê nessas flores: alegria de quem se ilude vencer? Ou eram pequenitas raivas, desapercebidas como lágrimas em seu rosto molhado? Só ela, a matinal vendeira, sabe do valor dessas minusculinhas naturezas em seus dedos decepadas. Dizem, finalmente, que sob o véu de seus enegrecidos olhos havia, nessa manhã, uns fiapos de satisfação. Poderá ela, alguma vez, ser sabida? Se, como diz nenhuma canção, a água corre com saudade do que nunca teve: o total, imenso mar.

Fonte:
Mia Couto. Contos do Nascer da Terra. Porto: CPAC, 1998.

Notícias em Tempo da Câmara Brasileira do Livro


CARAVANA DE ESCRITORES FOI ABERTA NA QUINTA-FEIRA DIA 28/09

Duas comitivas de escritores inauguram a primeira temporada do projeto Caravanas de Escritores, organizado pela Fundação Biblioteca Nacional em parceria com a Câmara Brasileira do Livro. O objetivo do programa é promover leitura e literatura, viabilizando a participação de escritores na programação cultural dos eventos selecionados para o Circuito Nacional de Feiras de Livro e Eventos Literários. Por meio de atividades de promoção da leitura e valorização de escritores locais e de âmbito nacional, o projeto Caravana de Escritores dá oportunidade a escritores de renome e novos talentos de participarem de feiras de livros e eventos literários em todo o Brasil. Toda caravana terá três escritores de literatura brasileira sendo, um local, da cidade do evento e dois de fora. Os autores selecionados devem ter o mínimo de dois livros publicados com ISBN. Quem seleciona e convida os autores são as próprias entidades organizadoras dos eventos. O edital contempla os cachês e as passagens dos escritores de suas cidades de origem até o local das feiras. Os responsáveis pela realização dos eventos que oferecem como contrapartida, as hospedagens, alimentação, mediação, traslado e produção local. Quem se interessar pelo projeto pode entrar em contato pelo telefone 61 2024-2692 ou através do e-mail: caravanadeescritores@bn.br. Próximas caravanas previstas:

Taubaté/SP - 12 a 19/10 - Ligação: Literatura Infanto-Juvenil, Games e Artes em Ação. 

Presidente Prudente/SP - 18 a 28/10 - 3º Salão do Livro de Presidente Prudente. 

Rio de Janeiro/RJ - 20 e 21/10 - Fim de Semana do Livro no Porto 

São Paulo/SP - 23 a 25/11 – Primavera dos Livros 

Sarandi/SP - 26/10 - Feira do Livro na Praça 

Porto Alegre/RS - 26/10 a 11/11 - 58ª Feira do Livro de Porto Alegre 

Pelotas/RS - 31/10 a 18/11 - 38ª Feira do Livro de Pelotas 

Tomé-Açu/PA - 23 a 25/11 - I Feira do Livro do Município de Tomé-Açu. 

DIREITOS AUTORAIS E LIVRO DIGITAL

O curso “Direitos Autorais e Livro Digital”, oferecido pela Escola do Livro, da CBL (Câmara Brasileira do Livro), acontece no dia 31 de outubro, das 9h às 13h. 

O curso tem como propósito mostrar a evolução dos direitos autorais na era digital e a proteção legal do livro eletrônico. Na sociedade do conhecimento, a quebra do paradigma do suporte físico, é um dos temas abordados por esse curso. Além disso, melhores práticas para criação, produção, distribuição e compra de livros eletrônicos – o que deve constar nos contratos. 

As aulas serão ministradas pela Dra. Patricia Peck Pinheiro que é Advogada especialista em Direito Digital, formada na USP, com especialização em negócios pela Harvard Business School e MBA em marketing pela Madia Marketing School, com capacitação em inteligência e contra-inteligência pela Escola de Inteligência do Exército e Gestão de Riscos pela Fundação Dom Cabral. Sócia fundadora do Escritório Patricia Peck Pinheiro Advogados, é autora do livro “Direito Digital” e co-autora dos audiolivros "Direito Digital no Dia-a-Dia", “Direito Digital Corporativo” e “Eleições Digitais”, todos pela Editora Saraiva, além de participação nos livros "Direito e Internet II", "e-Dicas" e "Internet Legal". É colunista do Conta Corrente da Globonews, do IDG Now e articulista do Valor Econômico, Revista Visão Jurídica, Revista Partner Sales, entre outros. Possui experiência internacional nos EUA, Portugal, Coreia. Idealizadora do Movimento “Criança Mais Segura na Internet”. 

O investimento para o associado CBL é de R$ 280. Associados de entidades congêneres, professores e estudantes – R$ 444. Não associados – R$ 560. Mais informações do curso podem ser obtidas pelo e-mail escoladolivro@cbl.org.br ou pelo telefone (11) 3069-1300.

Fonte:
Câmara Brasileira do Livro

Casa do Poeta de Canoas (Convite)


Casa do Poeta de Canoas - 10 AnosALMOÇO COMEMORATIVO

Convidamos para o "Almoço Comemorativo" que realizar-se-á em:
06/10/2012 - Sábado - 12 horas
Restaurante Italianíssimo
Rua Coronel Vicente, 260 - Centro / Canoas
Além do almoço haverá Sarau Poético Musical e os lançamentos literários:

  • Coletânea da UBE -Núcleo Canoas

  • Coletânea Dasnieve Daspet e Amigos núcleo Canoas

  • e o livro "Amor de Alma" da escritora Neida Rocha

Contamos com o prestígio da presença de todos nosso associados, colaboradores e simpatizantes.
Maria Luci Cardoso Leite
Presidente da Casa do Poeta de Canoas

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 684)



Uma Trova de Ademar  

Fui reviver meu passado 
na casa que pai morou... 
Um velho espelho quebrado, 
foi tudo o que me restou! 
–Ademar Macedo/RN– 

Uma Trova Nacional  

São mistérios do viver!
Bate triste o coração,
que só bate por bater,
esperando teu perdão... 
–José Almir da Luz/PR– 

Uma Trova Potiguar  

Deixei de ser sonhador, 
passei a ser realista.. 
E você, meu ex-amor, 
eu quero é perder de vista. 
–Wellington Freitas/RN– 

Uma Trova Premiada  

2010  -   Montes Claros/MG 
Tema   -   RENÚNCIA   -   M/E 

Mesmo das lutas vencidas,
restou-me tanto cansaço,
que nas armas recolhidas
só vi renúncia e fracasso.
–Olga Agulhon/PR– 

...E Suas Trovas Ficaram  

Sou feliz! Não vivo ao lado 
das estrelas na amplidão, 
mas posso ter um punhado 
de vaga-lumes na mão. 
–Antônio Roberto Fernandes/RJ– 

U m a P o e s i a  

Se votava em presidente, 
não havia Petrobrás, 
não tinha fogão à gás, 
era tudo diferente. 
O povo mais consciente, 
não havia exploração, 
o barão era barão 
e a moeda não caía, 
e nem o dólar subia 
no tempo de lampião. 
–Augusto Macêdo/RN– 

Soneto do Dia  

PRIMAVERA. 
–Sarah Rodrigues/PA– 

Chegou setembro com buquês de flores, 
com seu sorriso, despertou verbenas, 
verteu orvalhos, recendeu olores 
nas tardes calmas, nas manhãs serenas. 

Beijou jardins das confissões de amores,
e na aquarela de saudades plenas
desponta o Sol que multiplica as cores,
que descortina a placidez das cenas. 

Neste mistério cai à noite, e traz
a primavera que adormece em paz,
enquanto a lua lá do céu espreita. 

E no cenário majestoso eterno,
a natureza com seu dom materno 
olha o silêncio solitário e deita.

1º Concurso do Jornal Leitura do Bairro (2011) (Resultado Final)


(Em ordem alfabética) 

Ana Guiomar dos Santos (São Paulo/SP) 
Ana Luiza Marcos Francisco (São Paulo/SP) 
André Luiz Alves Caldas Amora (Rio de Janeiro/SP) 
André Telucazu Kondo (Caraguatatuba/SP) 
Angela Aparecida Frade Domingues (Itapecericada Serra/SP) 
Angelo Pessoa Martins (Cordeiro/RJ) 
Antonio Carolino Bezerra (Nova Iguaçu/RJ) 
Arlinda de Paula Souza (São Paulo/SP) 
Carlos Eduardo Benites (São Paulo/SP) 
Celia Amorim de Freitas (São Paulo/SP) 
Clarinda de Moura (São Paulo/SP) 
Claudia Louzada (São Paulo/SP) 
Cléia Maria da Silva de Carvalho (São Paulo/SP) 
Cristovam Tadeu Martins (São Paulo/SP) 
Daniel Alves de Oliveira (São Paulo/SP) 
Daniel Fagundes Souza (São Paulo/SP) 
Denio Limeira (São Paulo/SP) 
Denio Oliveira da Silva (São Paulo/SP) 
Denivaldo Piaia (Campinas/SP) 
Diogo Cezar Borges (Flamengo/RJ) 
Edweine Loureiro da Silva (Saitama/Japão) 
Everaldo Soares (São Paulo/SP) 
Ewald Koch (São Paulo/SP) 
Fatima Soares Rodrigues (Belo Horizonte/MG) 
Fernanda Mendes Araujo (São Paulo/SP) 
Francisco Ferreira (Betim/MG) 
Geraldo Trombin (Americana /SP) 
Gil Horta Pina (São Paulo/SP) 
Gilberto Dionísio Almeida (São Paulo/SP) 
Gisele Pacola (Curitiba/PR) 
Helena Barbagelata (Almada/Portugal) 
João de Jesus Santos (São Paulo/SP) 
João Elias Antunes de Oliveira (Taguatinga/DF) 
João Paulo de Miranda Parisio Jaboatão do (Guararapes/PE) 
Johnnatan Ivens Antunes Nascimento (Belo Horizonte/MG) 
Jonas da Gama Junior (Fartura/SP) 
José Duarte de Melo (São Paulo/SP) 
Julio César Correia da Silva (Rio de Janeiro/SP) 
Kátia Nascimento Soldani (São Paulo/SP) 
Letticia Cecy Correia (Paranaguá/PR) 
Lilian Souza de Araújo (Anápolis/GO) 
Luciano Vargas Braga (São Paulo/SP) 
Lúcio Rodrigues Junior (Tietê/SP) 
Luiz Augusto Pereira da Silva (São Paulo/SP) 
Marcelo de Oliveira Souza (Salvador/BA) 
Marcio Dison da Silva (Florianópolis/SC) 
Maria Aparecida dos Santos Silva (São Paulo/SP) 
Maria Aparecida S. Coquemala (São Paulo/SP) 
Maria das Dores Oliveira (Ipatinga/MG) 
Maria Ferreira da Conceição (São Paulo/SP) 
Maria Marta Silva de Sousa (São José dos Campos/SP) 
Maria Rodrigues Damacena (São Paulo/SP) 
Maria Valdete de Araujo Sousa (São Paulo/SP) 
Nathalia da Cruz Wigg (Ilha do Governador/RJ) 
Nerino de Campos (Belo Horizonte/MG) 
Newton Elehu Garcia Genro Junior (São Paulo/SP) 
Nilson Vieira Moreno (São Carlos/SP) 
Patrícia Diniz Santos (Natal/RN) 
Patricia L. Gomes (São Paulo/SP) 
Paula Ramalho (São Paulo/SP) 
Paula Regina da Silva Santos (São José da Lapa/MG) 
Perpétua Amorim (Franca/SP) 
Priscila Christine da Conceição Mancussi (Sorocaba/SP) 
Reginaldo Costa de Albuquerque (Campo Grande/MS) 
Ricardo Xavier Dantas (São Paulo/SP) 
Roberto Ferreira Lima (São Paulo/SP) 
Roberto Sedano Carneiro (São Paulo/SP) 
Robson Leandro Soda (Santa Cruz do Sul/RS) 
Ronaldo Andrade (São Paulo/SP) 
Ronaldo da Mota Vieira (São Paulo/SP) 
Roque Aloisio Weschenfelder (Santa Rosa /RS) 
Saulo de Oliveira Campos (Itabira/MG) 
Sebastião Espiridião de Oliveira (Embu das Artes/SP) 
Sérgio Bernardo (Nova Friburgo/RJ) 
Silvio Benedito (São Paulo/SP) 
Simone Alves Pedersen (Vinhedo/SP) 
Suellen Cibele do Vale (Guarulhos/SP) 
Suely Aparecida Schraner (São Paulo/SP) 
Tatiana Alves Soares Caldas (Rio de Janeiro/SP) 
Terezinha da Silva Alves (São Paulo/SP) 
Vitor Afonso Mattos Harrington (São Paulo/SP) 

Mensagem dos organizadores: 

Nossa expectativa era abranger apenas a zona sul da cidade de São Paulo, visto que nosso veículo é um jornal de bairro. Mas, para nossa surpresa, tivemos participantes de outras cidades do estado de São Paulo, dos estados do Rio de Janeiro, Goiás, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte, Santa Catarina, Bahia, Pernambuco, Paraná, Distrito Federal, Mato Grosso e de países como Portugal e Japão. Ao invés de regional, o concurso alcançou o âmbito internacional. Isto valoriza o trabalho dos autores escolhidos. 

Para nós, estes fatores foram motivos de grande alegria e por isso só temos a agradecer a todos os participantes e, registramos, aqui, nosso incentivo para continuarem escrevendo, se aprimorando, porque todos, classificados ou não, têm muito talento. 

Aproveitamos a oportunidade para nos desculparmos pela demora na divulgação dos nomes classificados, mas esta se deu em virtude da quantidade de trabalhos inscritos. Além da abrangência inesperada, muitos participantes inscreveram cerca de 100 trabalhos próprios. Para estes, vão nossos votos de que em breve tenham a oportunidade de lançarem seus próprios livros, pois já têm bagagem suficiente para isto. 

Fonte: 
Http://concursos-literarios.blogspot.com  

domingo, 30 de setembro de 2012

Mário Quintana (Dos Leitores)


Vicência Jaguaribe (Complô no Reino da Fantasia)


Uma palavra para o leitor

Esta história não deve, de maneira alguma, causar-lhe estranheza, leitor, pois o fenômeno não é novo: não é a primeira vez que personagens de ficção saem das páginas dos livros, ganham autonomia e penetram no mundo real. Vou dar só um exemplo: na peça teatral Seis personagens à procura de um autor, do italiano Luigi Pirandello, seis personagens, ao serem rejeitadas por seu criador, entram na vida real e tentam convencer um diretor de teatro a encenar suas histórias.

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Conta-se — mas eu não assino embaixo — que, certa vez, viu-se, no castelo do Príncipe Rodolfo, herdeiro do reino da Appelândia, uma movimentação desusada: há três dias, cavalariços sonolentos limpavam as cocheiras e reorganizavam as baias para receber mais animais; fornecedores chegavam a todo momento para abastecer as despensas; criados domésticos limpavam e arejavam os aposentos fechados e com cheiro de mofo, trocando a roupa de cama, acendendo lareiras e enchendo as grandes tinas de banho, com uma água que talvez nem fosse usada — dizia-se, em surdina, que a maioria dos príncipes não gostava de banho —; chefes de cozinha de fama internacional começavam a preparar pratos que, só de olhar, despertavam não apenas a fome, mas a vontade de comer.

Sua Alteza Real receberia em seu castelo os príncipes que tinham suas vidas e aventuras registradas e deturpadas nos tradicionais contos de fada. Ele próprio fora atingido no papel que desempenha no conto “Branca de Neve e os sete anões”. Mas isso vamos deixar para depois.

Tudo pronto, o príncipe Rodolfo vestiu sua roupa principesca, com manto de príncipe, sapato de príncipe, chapéu de príncipe e tudo o mais de príncipe, e esperou. Se alguém duvidava ser ele um príncipe de verdade, a dúvida acabava ali, naquele momento. Ser príncipe estava em seu corpo e em sua alma: no jeito de olhar, de falar, de andar, de dar ordens, de amar e de odiar. Dizem que os príncipes fazem tudo isso diferente de nosotros. Não confirmo nem nego essa afirmação porque nunca em minha vida vi um príncipe de verdade.

Os convidados fizeram-se anunciar um a um para imprimir à entrada mais pompa e circunstância: 

Sua Alteza Real o Príncipe Nicolau, do Reino da Hipnolândia e da história “A Bela Adormecida”;

Sua Alteza Real o Príncipe Alexandre, do Reino da Cindelândia e da história “Cinderela”;

Sua Alteza Real o Príncipe Aníbal, do Reino da Ferolândia e da história “A Bela e a Fera”;

Sua Alteza Real o Príncipe Orlando, do Reino da Ursolândia e da história “Branca de Neve e Rosa Vermelha”;

Sua Alteza Real o Príncipe Alberto, do Reino da Bravolândia e da história “O príncipe que não temia coisa alguma”;

Sua Alteza Real o Príncipe Ambrósio, do Reino da Sapolândia e da história “Rei Sapo ou Henrique de Ferro”.

E foram anunciados outros príncipes de terras longínquas, cujas histórias eram pouco conhecidas. O príncipe Rodolfo encaminhou suas altezas a um grande salão decorado de espelhos e de lustres feitos do cristal mais puro. 

Todos entraram e a porta foi fechada. Aquela era uma reunião cuja pauta devia ficar em completo sigilo. Príncipes de reinos mais pobres olhavam aparvalhados para tanta beleza e luxo. Os do Oriente admiravam-se com a diferença do gosto e da noção de beleza. Os dos países mais próximos observavam tudo com uma pontinha, deste tamainho, de inveja.

Quando todos se acomodaram, o Príncipe Rodolfo, sentado na cabeceira da enorme mesa, abriu a reunião, falando o maravilhês, língua usada por todos os que vivem na dimensão da magia e do maravilhoso.

— Meus amigos, dignos Príncipes dos reinos vizinhos e dos reinos longínquos, vocês devem ter ficado curiosos e também preocupados com o meu convite. Deixem-me dizer-lhes o motivo pelo qual eu, presidente da Associação dos Príncipes dos Contos de Fada — APCF —, convoquei-os para esta reunião: rever a posição e a caracterização dos príncipes nos contos de fadas. Relendo, há pouco tempo, algumas obras famosas, tomei consciência de como somos tratados nas histórias. E não gostei do que descobri.

(Vamos dizer a verdade sobre o despertar da consciência crítica do Príncipe Rodolfo. Não foram os livros que ele diz haver lido, mas algo muito mais sério. Um dia, quando admirava aquela sala e seus lustres, acompanhado do pai, o Rei William, ouviu dele a informação do encantamento que envolvia o aposento: se uma pessoa tivesse certeza do que queria, se estivesse disposta a corrigir os erros de uma situação, ao fixar-se em um dos espelhos teria o senso crítico intensificado. Na primeira oportunidade, o Príncipe voltou ao salão e, ao mirar-se em um dos espelhos, enxergou a própria vida e a de muitos dos seus pares, como elas eram retratadas nas histórias. E não gostou do desvelamento feito pelo seu senso crítico agora aguçado.)

— Nossas vidas são exatamente como vou aqui expor. Digo, sem titubeio, que não temos nenhuma importância, nenhum carisma e, principalmente, não temos caráter ou personalidade.

— Vossa Alteza nos chamou aqui para nos falar de nossos defeitos e fraquezas? — Ouviu-se a vozinha fraca do Príncipe Sapo.

— Não. — Retomou a palavra o Príncipe Rodolfo. — Chamei-os para alertá-los sobre a maneira como os escritores nos apresentam em suas histórias. Eles desvalorizam nossas figuras. Esse é um ponto que atinge todos os príncipes dos contos maravilhosos, que só existem neles e por eles. Nesses contos, não temos nem nomes; somos conhecidos pelo nome da protagonista da história, que geralmente está presente no título da narrativa — o príncipe de “Branca de Neve”; o príncipe de “Rapunzel”, e assim por diante. Cada um de nós é simplesmente o Príncipe, como se não fôssemos indivíduos, mas entidades sociais ou pessoas jurídicas. Você, por exemplo, Príncipe Nicolau, seu nome não aparece uma única vez na história da Bela Adormecida. E, o que é mais, grave: amputaram o seu conto. Ele termina no seu casamento com a princesa ex-adormecida. Nada daquele final macabro, que faz até jacaré chorar.

— É verdade que o cortaram nesse ponto?! E o que fizeram com o restante?

— Ora! Amassaram e jogaram no lixo. Não vê que agora, no mundo do reality show, é proibido contar para as crianças certos detalhes das histórias. Também inventaram um tal de politicamente correto, que está levando os novos escritores a deformar as histórias tradicionais.

— Como pode ser isso? — Perguntou o Príncipe Ambrósio.

— Pode, meu amigo, no mundo do reality show, as coisas mais estapafúrdias acontecem. E tudo é muito contraditório. A minha história foi alterada: inventaram que  Branca de Neve acordou com um beijo meu. Imaginem se eu beijaria uma defunta ou uma quase! Os deuses me protejam! A verdade é que, quando a vi deitada no esquife, bela como eu jamais pensara que uma princesa pudesse ser, apaixonei-me. Tentei comprar o esquife, mas os anões negaram-se a vendê-lo. Quando, porém, entenderam que eu ficara profundamente apaixonado pela garota e ouviram minha declaração de amor — Dai-me, então, como um presente, pois não posso viver sem ver Branca de Neve.  —, tiveram piedade de mim e mandaram-me levar o caixão. Os servos que traziam o esquife para o meu castelo tropeçaram. A urna não caiu, mas balançou muito, o que fez a princesa expelir o pedaço da maçã envenenada preso em sua garganta. Imediatamente após o incidente, pedi a princesa em casamento.

E com sua história — “Rei Sapo ou Henrique de Ferro” —, Príncipe Ambrósio, ainda foi pior. Nem príncipe aparece. Em uma das versões modernas da história, o sapo se transforma, vejam só, em um corretor de imóveis, que planeja construir, na bela floresta do reino da Sapolândia, o que eles chamam de shopping- center. Outro detalhe: até o criado tem nome — Henrique. E Vossa Alteza, nada.

— Mas qual a razão de fazerem isso com a minha história?

— Acho que foi para denunciar a destruição das florestas que está acontecendo por lá, pelo mundo da realidade.

— E o que houve com minha história? — A pergunta vinha do príncipe Alexandre.

— A sua história, Alteza, já é ridícula desde que foi inventada — falou o príncipe Rodolfo, com sua franqueza habitual. Quem já viu um príncipe de sangue real ir de casa em casa com um sapato na mão, procurar a dona desse sapato, que poderia até ser uma plebeia, para com ela se casar! E, ainda por cima, Vossa Alteza prepara a festa, dança com a jovem desconhecida e ninguém sabe, nem a jovem, muito menos o leitor da história, que seu nome é Alexandre.

— Suas palavras me ofendem, príncipe Rodolfo. 

— Desculpe-me. É esta minha boca que insiste em ser sincera, por isso exagera na verdade.

— Desculpas aceitas, Príncipe Rodolfo.

— E sabe, Príncipe Alexandre  —, continuou o Príncipe Rodolfo — que os estudiosos descobriram uma versão da sua história muito mais antiga do que a europeia que conhecemos? E, talvez, bem mais interessante. É chinesa e parece ter sido a primeira versão escrita do conto “Cinderela” ou “Branca de Neve”.

— Interessante, muito interessante! Mas humilhante para este Príncipe aqui, que nem original é. — Choramingou o Príncipe Alexandre.

— Bem — retomou a palavra o Príncipe Rodolfo — para encerrar nossa reunião, um detalhe dos mais graves: todos nós, os príncipes, parecemos, nos contos de fada, uns idiotas. Apaixonamo-nos, à primeira vista, pela primeira jovem bonitinha que aparece e, rápido como a queda de um raio, contratamos casamento. E ainda somos apresentados como uns imbecis e preguiçosos, que levam a vida caçando, passeando e tentando encontrar dragão. Não temos nenhum papel no reino, a não ser procurar uma noiva e defendê-la dos dragões e das maldições das bruxas. Isso me deixa desolado. E tem mais: aquele felizes para sempre já está tão fora de moda! Quem é feliz para sempre, principalmente casando com as princesas mofinas dos contos de fada? Princesas que não fazem nada de proveitoso, não conseguem nem vestir-se sozinhas, passam os dias esperando a chegada de seus falsos heróis. São tão sensíveis, mas tão sensíveis mesmo, que sentem o desconforto causado por uma ervilha colocada sob vários colchões. Me dá vontade de falar como falam os príncipes e os não príncipes do mundo real: Minha amiga, me dá um tempo. Que tal se garantir um pouco e esperar menos?  Afinal de contas, o que as pessoas do mundo do reality show pensam que nós, moradores do mundo paralelo da fantasia, somos, para nos representar assim?

— É, a situação é grave e vergonhosa. O que Vossa Alteza sugere que façamos? — Perguntaram os príncipes ao mesmo tempo.

— Sugiro uma crise de ilustrações. Sem ilustrações, nada de livro para criança. Cada um de nós se encarregará de achar alguém com o poder de fazer desaparecerem todas as ilustrações das histórias que foram alteradas. Vamos marcar outra reunião para de hoje a um mês.

Satisfeitos, Suas Altezas dirigiram-se à sala onde serviriam o almoço, que foi digno dos deuses. Depois do almoço, repousaram uma meia hora e foram à caça. O Príncipe Rodolfo, com seu senso crítico hipertrofiado pela permanência na sala mágica, pensou um pensamento tão estranho quanto polêmico: Será que os contadores de histórias não estão certos na caracterização — ou falta de caracterização — dos príncipes? Parece que somos todos iguais: parasitas em busca de aventuras e de um amor instantâneo, feito leite em pó.

**********

P.S. A partir daquele dia, as editoras que trabalhavam com livros infantis foram processadas e tiveram que pagar boas indenizações aos clientes, por venderem livros cujas ilustrações se apagaram.

Fonte:
A Autora