terça-feira, 16 de outubro de 2012

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 698)



Uma Trova de Ademar 

Por conhecer meu valor, 
mesmo já no envelhecer, 
vou em busca de outro amor... 
Não tenho tempo a perder! 
–Ademar Macedo/RN– 

Uma Trova Nacional 

Vendo a descrença ao meu lado 
e a esperança por um triz, 
eu chego a achar que é pecado 
crer na vida e ser feliz! 
–Domitilla B. Beltrame/SP– 

Uma Trova Potiguar 

As minhas vistas já turvas, 
têm remédio afinal, 
quando pousam nessas curvas 
do teu corpo escultural. 
–Ubiratan Queiroz/RN– 

Uma Trova Premiada 

2005   -  ATRN-Natal/RN 
Tema   -  FÉ   -  1º Lugar 

Sem temor, meu barco avança,
seja qual for a maré,
pois no mastro da esperança
iço a bandeira da fé. 
–Wanda de Paula Mourthé/MG– 

...E Suas Trovas Ficaram 

Estudo trovas a fundo, 
mas persiste uma suspeita: 
A trova melhor do mundo 
até hoje não foi feita! 
–Miguel Russowsky/SC– 

U m a    P o e s i a 

A bíblia explica com classe 
a quem lê de vez em quando, 
mesmo na face apanhando 
deve dar a outra face, 
toda pessoa que nasce 
Deus quer que pratique o bem, 
disse o pastor de Belém 
o messias prometido: 
eu mesmo sendo ferido 
não devo ferir ninguém. 
–Nonato Costa/CE– 

Soneto do Dia 

ORGULHO.
–Luiz Otávio/RJ– 

Venho de longe... venho amargurado
pelas noites sem fim, nesse cansaço
de receber tão só, triste e calado,
a incompreensão do mundo passo a passo...

Eu trago a alma sem fé do revoltado
e o gesto do vencido em cada braço...
E tu me surges - Anjo imaculado -
a oferecer repouso em teu regaço...

Porém tua alma feita de inocência
serenidade e Luz, não avalia
a penumbra invulgar dessa existência...

Deixa-me, pois, seguir o meu caminho,
renunciar, viver nessa agonia,
mas tenho o orgulho de sofrer sozinho !...

José de Alencar (Ao Correr da Pena) 1 de Outubro : Fatis Agimur, Credite Fatis


(Crônicas publicadas no “Correio Mercantil”, de 3 de setembro de 1854 a 8 de julho de 1855, e no “Diário do Rio”, de 7 de outubro de 1855 a 25 de novembro do mesmo ano, ambos os jornais do Rio de Janeiro).

Meu caro redator. – Faço idéia do seu desapontamento quando receber esta carta em vez da nossa Revista costumada do domingos; mas tenha paciência, e lembre-se que o acaso é  um menino cheio de caprichos que nos dirige a seu modo, sem ter ao menos a delicadeza de nos consultar de vez em quando.

Fatis agimur, cedite fatis.

Sei que há de ficar maçadíssimo comigo, que me acusará de remisso e negligente, e acumulará sobre a minha cabeça uma série de sinônimos de igual jaez de envergonhar qualquer Cícero provinciano dos mais afamados na oratória.

É já prevenindo esta eventualidade que tomo o prudente alvitre de escrever-lhe, e não ir verbalmente desfiar o longo rosário de desculpas que a minha imaginação, sem que lho recomendasse eu, teve o cuidado de ir preparando apenas pressentiu os primeiros pródromos da preguiça.

O que vale é que a borrasca há de passar. Quanto maior for a zanga, tanto maior graça há de achar depois no logro que lhe preguei involuntariamente, está entendido; a por fim de contas, quando se lembra do seu tempo de folhetinista, estou certo que me há de dar carradas de razões. Previno-o, porém, desde já que não é preciso mandar-me à casa as tais carradas de razões; isto pode importar-lhe uma grande despesa de carretos sem necessidade.

Decidi contar-lhe confidencialmente a minha vida desta semana, para que não lhe reste a menor dúvida sobre a boa-fé com que procedi em todo este negócio, e para assim habilitá-lo a redigir uma daquelas desculpas da rotina, com que ordinariamente os jornais (compreendido o nosso por política) embaçam os leitores, logo pela manhã, e em jejum, ocasião esta em que naturalmente os carapetões são de mais fácil digestão.

Os nossos velhos da era antiga diziam que não havia domingo sem missa, sem segunda-feira sem preguiça. A primeira parte deste provérbio tem sofrido nos últimos tempos alguma modificação, principalmente a respeito dos redatores dos grandes jornais, que substituíram à missa o folhetim. Mas em compensação ninguém ainda se animou a contestar a segunda e última parte do anexim, e pó isso na segunda-feira redatores, folhetinistas, leitores e leitoras, todos desejariam poder saborear as delícias do dolce farniente.

Como isto não é possível a todos, o que se segue é que muitas vezes o corpo parece que trabalha, enquanto a mente, como uma sultana favorita, se embala molemente nas doces recordações do domingo e de toda a semana passada.

O redator estende a folha de papel para escrever o seu artigo de fundo; mas, quando procura pelo pensamento, vai descobri-lo no fundo de algum boudoir elegante, donde não há forças que o possam arrancar. Resulta daí que, depois de algumas horas de esforço baldado, o tal artigo de fundo fica no fundo do tinteiro.

A mocinha com os olhos quebrados e corpinho lânguido toma o seu bordado e começa a trabalhar. Pensa que está fazendo ponto de crochê! Qual! está fazendo namoro a crochê. Os olhos e a boquinha são os ganchos; cada ponto é um olhar provocador; cada malha um jogo vivo de sorrisos à direita e à esquerda. Quando a agulha fere-lhe um dos dedinhos rosados, sou capaz de apostar que lembrou-se de um despeito, ou de um arrufo no baile.

A respeito do folhetinista não falemos. Na segunda-feira tem a cabeça que é um caos de recordações, de faros, de anedotas e observações curiosas. A imaginação toma ares de pintor chinês, e começa a desenhar-lhe flores e arabescos de um colorido magnífico. As idéias dançam uma contradança no Cassino. A memória passeia no meio do salão, de braço dado com a ironia, gracejando e fazendo reflexões a propósito.

Enfim os cinco sentidos põem-se ao fresco, e largam-se a passear cada um para seu lado. O ouvido a Flâner recorda a cabaleta do Trovatore. O paladar e o olfato sentam-se comodamente à mesa da ceia. O olhar erige-se em dagueorreotipeiro e diverte-se em tirar retratos d’après nature. E o tato vai estudar praticamente o magnetismo, para descobrir as causas misteriosas dos estremecimentos que produz a pressão doce e tépida de uma mãozinha delicada.

À vista disto, meu caro redator, já vê que a segunda-feira é um dia inteiramente perdido, e que só vem na folhinha para encher o número dos sete que formam a semana, assim como sucede nas listas tríplices para senador. Acredite que não se faz nada, nem mesmo quando se possui a receita infalível, que eu tenho sobre a mesa, de um libelo ou de uns provarás, cujo efeito poderoso o senhor deve conhecer.

Os antigos tinham razão. E estou certo que, se Josué vivesse no nosso século, havia de adotar o anexim português, e, pedindo licença a Galileu, todos os domingos à meia-noite  faria parar o sol até terça-feira, para assim poder bem saborear o dia consagrado à preguiça, sem temer a claridade importuna que de madrugada, isto é, às desoras, vem bater-nos nas pálpebras, como um credor impertinente que não compreende a verdadeira organização do crédito.

Ora, eu sei que me podem objetar que a Bíblia manda trabalhar seis dias e descansar no sétimo. Mas aquele preceito foi inventado na primeira semana, isto é, quando não se tinha trabalho antes; e por isso podia haver preguiça na segunda-feira. Além de que, como ainda não se sabia ao certo o peso do trabalho da semana, julgou-se, que era bastante um só dia de descanso. Veja o senhor, que é deputado, o inconveniente de fazer leis sem primeiro estudarem-se profundamente as necessidades públicas.

Logo que os homens aprenderam por experiência própria quanto custavam os tais seis dias de trabalho, assentaram que era preciso pelo menos dois ou três dias de descanso. Daí veio que os antigos, pensando sobre a gravidade do caso, inventaram os dias santos para iludirem o preceito da Bíblia; e modernamente se instituiu nas semanas em que não há dias santos, o feriado da quinta-feira para estudantes e lentes, porém especialmente para estes. 

Enfim o nosso amável redator sabe que a própria astronomia confirma a convicção profunda em que estou de que pelas leis divinas e humanas a segunda-feira deve ser completamente consagrada à preguiça. A segunda-feira é o dia da lua, e ninguém ignora a influência poderosa que exerce esta senhora sobre os pobres mortais, a quem ela persegue como uma velha cheia de flatos e medeixes. Ora, não podendo o corpo assim indisposto entregar-se ao trabalho, é evidente que as próprias leis físicas, que  regulam a harmonia e o equilíbrio do mundo, destinaram a segunda-feira para a calaçaria.

Parece-me que tenho provado o ponto controvertido, com argumentos dignos de figurar em uma conclusão magna. Está a segunda-feira, portanto, fora de toda a questão; e por isso, tranqüilo na minha consciência, não tenho o menor escrúpulo em confessar-lhe que naquele dia não trabalhei.

Passei o dia, como faço-lhe a justiça de acreditar que passou o seu, sem dar atenção às misérias deste mundo; e tratando de realizar aquele dito de Marcial, que apesar de poeta (com perdão de V.S.) disse um dia uma coisa boa, talvez mesmo por não se muito forte na poesia: Vivere bis, vita posse priore fruire

Acho escusado dizer-lhe que, apesar de ser o dia inteiramente contemplativo, não me descuidei da carne, e tive o cuidado de almoçar, jantar e cear. À noite fui ao Teatro Lírico ouvir ainda uma vez o Trovatore e ver Leonora morrer depois de nos ter dado algumas horas de vida deliciosa.

Desejava trazer alguma idéia boa para o nosso folhetim. Mas o senhor sabe o que é uma idéia; é a coisa mais bandoleira e mais volúvel que eu conheço. As idéias são as borboletas do espírito; são, como diz um provérbio oriental a respeito das mulheres, a sombra do nosso corpo que nos acompanha sempre, e que nos foge apenas as queremos apanhar.

Esperei por conseguinte pela terça-feira, em que verdadeiramente devia começar o trabalho da semana, segundo os princípios que já tive a honra de lhe expender. Entretanto, servindo-me eu daqueles mesmos princípios com que provei que os antigos tinham toda a razão de destinar a segunda-feira para o santo ócio, sucedeu que tive na terça-feira ao acordar uma lembrança luminosa, cujo peso deixo ao seu alto critério.

Se os antigos, que não tinham baile, nem teatros líricos, nem concertos, nem clubes, nem corridas, e que se contentavam com algum sarau de vez em quando, inventaram os dias santos para filarem assim dois dias de descanso, nós, que temos durante a semana todo esse enorme acréscimo de trabalho imposto pela sociedade, nós que já fomos privados dos dias santos, devemos em todo o rigor da justiça lograr mais um dia de descanso, e juntar a terça-feira à segunda, a fim de poder na quinta encerrar o trabalho, com o espírito calmo e o corpo bem disposto.

Este argumento sem réplica calou-me no ânimo a convicção inabalável de que seria anti-racional e anti-filosófico trabalhar na terça-feira, principalmente estando todo preocupado com o baile do Cassino, que devia ter lugar à noite.

Por conseguinte, levei o dia literalmente a esperar pela noite, e a ler as notícias da Europa, chegadas pelo Maria 2.ª.

Tive um alegrão quando vi aquele carapetão da tomada de Sebastopol, inventado pelos passageiros do Candiá, que podem ser taxados de mentirosos, mas que pelo menos mostraram ser mais hábeis em estratégia e tática militar do que os generais franceses e ingleses, pois tomaram uma praça forte sem armas e sem soldados, somente com o auxílio da língua e de algum jeito para a petalogia.

Com este fato tinha eu base para um artigo brilhante sobre o futuro da guerra do Oriente; mas o meu contentamento foi passageiro, porque no dia seguinte li o desmentido do Jornal do Comércio, que nem sequer deixou à pobre notícia o tempo de correr.

A noite que eu esperava ansiosamente, chegou.Às 9 horas entrei no Cassino, onde tive o sumo prazer de encontra-lo, o que unicamente (espero terá a bondade de o acreditar) fez-me  passar algumas horas bem agradáveis.

Se a falta do nosso folhetim de amanhã, a qual deploro igualmente com o senhor, não o traz ainda atordoado a esta hora, deve lembrar o baile magnífico pela elegância das senhoras, e pela sociedade que aí se reuniu.

Havia naturalmente de notar, com o seu conhecido bom gosto, a justeza de uma observação que fez Arséne Houssae, provavelmente ao meio de algum baile como aquele: - Il y a des femmes qui sont roses, il y a des femmes qui sont épines, il y a des femmes qui sont des sourires, il y a des femmes qui sont des grimaces.

A este pensamento eu acrescentaria que há mulheres que são verdadeiras rosas, e que por isso têm para aqueles que se chegam um perfume e um espinho ao mesmo tempo.

Também havia de ver, como eu, surgir naquela noite uma estrela suave a deslizar docemente num céu de azul. Era uma verdadeira estrela, bela como suas irmãs, brilhando no céu; porque o céu é a pátria da candura e  da inocência.

Se não teve a felicidade de ver esta serena aparição no baile, tome o meu conselho. Vá a casa do Reis, na rua do Hospício n.º 72. É a melhor loja de instrumentos de óptica e de física que  há nesta cidade: aí encontrará um sortimento magnífico de binóculos, de telescópios e lunetas.

Escolha a melhor jumelle eliptique que ele  tiver, vá esta noite beneficiar os italianos ouvindo música italiana, e lá examine o céu do Teatro Lírico, que talvez tenha ocasião de ver a estrela de que lhe falei. Não fite muito o óculo; uma estrela é tudo o  que há mais puro e de mais casto neste mundo.

Voltando ao baile, creio que não estranhará se durante toda aquela noite nem sequer me lembrasse do folhetim. A uma hora despedi-me como os outros até a noite seguinte, na qual nos devíamos encontrar no baile militar, ou nos salões de um estrangeiro distinto, que recebia em sua casa a sociedade elegante desta corte.

Enfim veio a quarta-feira, o dia em que sensatamente se deve dar princípio ao trabalho. Não comece já a pensar que vou apelar para algum sofisma, a fim de inutilizar também este dia. Não: a quarta-feira é um dia muito útil, o mais útil talvez da semana

A quarta-feira é destinada para se dispor o homem a começar os seus afazeres. Depois de três dias de descanso, é impossível que se tenha disposições para encetar de chofre o trabalho. Seria mesmo anti-higiênico passar repentinamente do repouso ao movimento.

Motus est causa caloris. Consulte um bom médico, e verá que ele lhe diz que isto importa tanto como as transições rápidas do  frio para o calor e vice-versa, e que por conseguinte pode originar graves moléstias.

Não sei que sábio antigo disse que  a natureza não vai aos saltos: Natura non facit saltus. Todas as línguas vivas e mortas que eu conheço têm um rifão que, despida a forma, contém aquele mesmo pensamento.

Ora, logo que a sabedoria, a higiene e a experiência popular consagram um princípio inconcusso, não é possível deixar de aderir principalmente quando há uma atração irresistível para ele. Foi o que  me sucedeu, levei toda a quarta-feira a fazer tenções e cálculos de trabalho para o dia seguinte. A fim de melhor dispor o espírito, não deixei de ir à reunião de que lhe falei, e tive ocasião de apreciar a amabilidade dos hóspedes e a graça das lindas convivas.

Na quinta-feira, resolvi logo pela manhã por-me de ponto em branco, isto é, todo de preto, para ir ao convento de Santo Antônio, assistir a um ofício fúnebre que os estudantes de medicina fizeram celebrar pela alma de seu colega José Cândido de Almeida.

Embora já habituado a estas cenas de luto e de tristeza, a memória deste causa-me dolorosa impressão. Não me posso lembrar com indiferença daquele moço, cheio de vida e de talento, colhendo o germe da morte justamente quando, levado pelo amor do estudo, investigava com o escalpelo na mão os segredos da ciência.

O que consola o espírito quando me recordo deste fato é a efusão e a espontaneidade de sentimentos com que seus colegas demonstraram a mágoa que lhes deixou aquela morte prematura. Os estudantes de medicina deram nesta ocasião um exemplo, bem raro hoje, de espírito de classe; e nas demonstrações de sua dor substituíram quase para seu colega, morto longe do seio materno, as lágrimas sublimes de mãe.

A hora, que correu mais rapidamente do que eu pensava, obstou a realização do meu intento. Entretanto fiquei sempre debaixo daquela impressão, o que contudo não me afastava da idéia de começar decididamente o trabalho na quinta.

No correr do dia, refletindo melhor, assentei em duas coisas. Primeiro, que num clima tão doentio como é o do Rio de Janeiro todo mundo tem o direito incontestável de declarar-se doente pelo menos um dia por semana, ainda que não seja senão para poupar a saúde e não gasta-la toda de uma vez. Segundo, que todo o homem que cumpre exatamente os seus deveres durante todo o ano pode lá uma semana fazer um extra e destinar o dia para ir passar no campo e não fazer absolutamente nada, senão distrair-se.

E agora, meu caro redator, confesse francamente, não acha que é um impossível físico e moral fazer uma semana inteira com um dia somente, quando para isto é necessário em toda a folhinha sete dias e sete noites?

Como estou certo que não me responderá negativamente a esta pergunta, desde já me tenho por plenamente justificado para com a redação do jornal; lá quanto aos leitores, isto é coisa que lhe diz respeito, e na qual eu lavo as mãos.

Entretanto é pena que isto sucedesse, porque havia bastante que dizer-se sobre esta semana. Além dos divertimentos que lhe falei, do baile do Campestre, da chegada de um literato cego que nos veio pedir hospitalidade acompanhado de sua Antígone, houve um fato que interessa muito a população desta cidade.

O desembargador Figueira de Melo foi nomeado Chefe de Polícia desta corte, e deve tomar posse hoje, dia de São Jerônimo, seu patrão.

Não acha que esta coincidência é um presságio feliz para esta nomeação, e que o novo chefe de polícia continuará as tradições deixadas pelo Sr. Siqueira que durante a sua curta administração adquiriu títulos ao reconhecimento público? Eu inclino-me a crer que sim, e não estou longe de supor que nisso vamos de acordo. 

A empresa lírica começa a ser administrada pela nova diretoria, e também há razões de esperar das pessoas que a compõem, se não todos, ao menos alguns dos melhoramentos que exige o nosso Teatro para poder elevar-se ao estado que comporta a civilização e os recursos desta corte.

Veja que pena! Com tanta notícia importante, não temos artigo  hebdomadário! Mas console-se; a semana que vem não se anuncia menos brilhante. Teremos um baile esplêndido na Fileuterpe, e no Teatro de São Pedro um concerto vocal e instrumental, de música alemã e clássica, o que deve ser uma novidade artística digna de atrair todo aquele que se prezar de bom gosto. A  orquestra será regida por um jovem professor nacional, o Sr. Stockemeyer, que já tem dado provas do seu talento.

Não se amofine por conseguinte, e creia na minha boa vontade.

Seu, etc.
S.C. 30 setembro.   
Al.

P. S. Agora, quase ao fechar esta, lembrei-me de um expediente aproveitável em tão críticas circunstâncias. A liberdade do folhetinista é ilimitada, a carta longa: portanto escreva-lhe em cima o nosso título – Ao correr da pena – e mande para a composição. Não deixe transpirar coisa alguma; e amanhã o leitor com toda a sua finura pensará que isto foi uma idéia original que tivemos. Há de ver, que, no fim de contas, o negócio arranja-se às mil maravilhas.

Fonte:
José de Alencar. Ao Correr da Pena. SP: Martins Fontes, 2004.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 697)



Uma Trova de Ademar  

No momento em que eu nascia 
Deus colocou no meu ser, 
um mundo de fantasia, 
de poesia e de prazer... 
–Ademar Macedo/RN– 

Uma Trova Nacional  

Quantas bênçãos recebidas
quando se caminha aos pares:
um ideal, duas vidas
dois corações similares.
–Eliana Jimenez/SC– 

Uma Trova Potiguar  

A soledade é suspeita,
de sucumbir nossas mágoas,
em sintonia perfeita,
com as profundezas das águas. 
–Wellington Freitas/RN– 

Uma Trova Premiada  

2007   -   Nova Friburgo/RJ 
Tema   -   MENSAGEM   -   M/H 

À mensagem não me rendo... 
Não abro... não quero ler... 
Para não ficar sabendo 
o que eu finjo não saber. 
–Therezinha Brisolla/SP– 

...E Suas Trovas Ficaram  

Saudade - dor repartida
entre o que fica e o que vai.
Uma esperança perdida
num sonho azul que se esvai.
–Anis Murad/RJ– 

U m a P o e s i a  

Acordei cedo demais 
olhando pra o oriente, 
marchava a lua na frente 
e a estrela d’alva atrás; 
na copa dos vegetais 
soprava a brisa macia, 
o nevoeiro surgia, 
e o vento atrás empurrando, 
e a lua vinha beijando 
a linda barra do dia! 
–Olívio do Livramento/PB– 

Soneto do Dia  

PAUDARCO.
–Caio Cid/BA– 

Paudarco gigantesco! Pelos traços 
lembra um deus milenar, rude e iracundo, 
que detivesse, de repente, os passos 
e ali ficasse contemplando o mundo. 

Preso pela raiz ao chão profundo, 
a fronde a farfalhar pelos espaços, 
bebe a seiva nutriz no solo imundo, 
mas para o céu é que levanta os braços. 

Prometeu vegetal brame se estorce 
e, por mais que proteste e que se esforce, 
não se libera da imobilidade. 

Acorrentado ao pedestal da serra, 
embalde é o sonho de fugir à terra, 
o anseio de galgar a imensidade.

domingo, 14 de outubro de 2012

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 696)



Uma Trova de Ademar  

Política, era a vizinha. 
Ela trocou por Brasília 
todos empregos que tinha... 
Menos o bolsa família. 
–Ademar Macedo/RN– 

Uma Trova Nacional  

Sogra nem sempre é tropeço, 
e nem sempre o genro pena. 
-Basta que desde o começo 
ele faça o que ela ordena... 
–A. A. de Assis/PR– 

Uma Trova Potiguar  

Não sei se é desdita minha. 
na sorte não me destaco. 
É Deus me dando a farinha 
e o diabo rasgando o saco... 
–Zé de Souza/RN– 

Uma Trova Premiada  

1987   -   Nova Friburgo/RJ 
Tema   -   “TEMA LIVRE”   -   2º Lugar 

Olhando a sogra de pé,
com o rosto sujo de tinta,
viu que o "diabo” ainda é
mais feio quando se pinta!... 
–Edmar Japiassú Maia/RJ– 

...E Suas Trovas Ficaram  

Ou casamento ou cadeia!... 
E o pau-d’água, sedutor, 
ao ver aquela baleia 
gritou: – cadeia, doutor! 
–José Maria M. Araújo/RJ– 

Uma  Poesia  

Além de estar quebrado e já velhote, 
um fazendeiro em franca decadência, 
deu um golpe da maior inteligência, 
alardeando que a filha tinha um dote. 
De pronto um novo rico cai no trote 
acerta o casamento e marca a data. 
Casa e após uma festa rica e chata, 
recebe o dote o qual tanto ele espera... 
E você sabe esse tal “Dote” o que era? 
Um sardento cachorro vira-lata. 
–Francisco Macedo/RN– 

Soneto do Dia  

MINHA NORA VIDENTE. 
–Marcos Satoru Kawanami/SP– 

Achei, de minha parte, coisa boa 
os zelos e cuidados que agora 
ao meu filho dispensa minha nora, 
a qual varre, cozinha, e ensaboa. 

Pois, antes, nem sequer mesquinha broa 
degustava meu filho ao vir da aurora, 
moído a sustentar a tal senhora 
que ao banho não se dava, tão à toa... 

Hoje em dia, meu filho passa bem: 
a mulher tomou viço e se perfuma 
cuida do lar com ânimo também! 

Mas a transformação se deu, em suma, 
depois que um anjo lá chegou, de trem, 
por benzer as mulheres, uma a uma!

Agostinho Rodrigues (Seleção de Trovas Navegantes)


No presépio, um quadro lindo:
a jovem mãe e a criança.
- Era a ternura sorrindo,
amamentando a esperança!
 A. A. DE ASSIS/RJ/PR

Para matar as saudades,
fui verte em ânsias, correndo...
- E eu que fui matar saudades,
vim de saudades morrendo...
   [+]ADELMAR TAVARES/RJ

O amor cristalino é lindo
para quem deseja amar
e possui um dom infindo:
muito carisma a somar.
AGOSTINHO RODRIGUES/RJ
                         
A minha casa pequena,
modesta, embora, é querida!
Há nela a doce e serena
paz que eu almejo na vida.
       [+]ALBERTO ISAIAS RAMIRES/RJ/ES

Sou qual ave em vôo livre,
circulando na amplidão, 
os desenganos que eu tive
deixei jogados no chão.
    APARECIDA MARIANO DE BARROS/SP

Todo amor nos eterniza,
pois toda morte perece
e todo tempo agoniza
aonde uma paixão floresce.
          CARLOS AUGUSTO S. DE ALENCAR/RJ

A verdade atemoriza,
quando ela em nós ocorre,
que ela agoniza, agoniza,
agoniza, mas não morre!
       CÉLIA LEAL DE AZEVEDO/RJ

As vezes tenho vergonha
quando a noite chega ao fim:
pingos de dor sobre a fronha
por não tê-lo junto a mim.
DÁGUIMA VERÔNICA DE OLIVEIRA/MG

Não me negues teu retrato,
que isso é tola precaução,
pois já o tenho, de fato,
gravado no coração!
DIAMANTINO FERREIRA/RJ

Nas asas do desvario,
tentando um sonho alcançar,
eu despenquei no vazio,
mas... aprendi a voar!
EDMAR JAPIASSÚ MAIA/RJ

Esta vida me sequestra
numa espera de ilusão...
- Só o amor tem chave-mestra
para abrir meu coração.
ELIANA JIMENEZ–SP/SC

No tear da solidão,
rendeiro em dias tristonhos,
basta um fio de ilusão
para tecer os meus sonhos!
ELISABETH SOUZA CRUZ/RJ

Poeta é ágüem que procura
iluminar tudo e nada,
baseado na arquitetura
das nuvens da madrugada!
          [+] ENO TEODORO WANKE/PR/RJ

É seguindo sempre em frente
e buscando a perfeição
que a mulher inteligente
faz do trabalho, emoção.
ESTER FIGUEIREDO/RJ

Céu, mares, paisagens, flores,
cujo encanto nos seduz,
Refém de ti não recuo
réu do amor que me corrói:
cada sonho que construo
tua apatia destrói...
        GILVAN CARNEIRO DA SILVA/RJ

A música é tufo em fim
que traduz meu sentimento;
por isso que canto sim
o amor a todo momento.
GLEYDE COSTA/RJ

Quando a vida só nos traz
tristeza e desesperança,
por que não buscar a paz
num coração de criança?
HUGO ROMA/RJ

A poesia é toque n’alma,
um suave aceno de lenço;
filha dileta da calma,
que inebria como o incenso.
           HUMBERTO DEL MAESTRO/ES 

O silêncio, embora mudo,
tem poder envolvente
de, ao coração, dizer tudo
que passa na alma da gente!
JOAMIR MEDEIROS/RN

O homem nasce, cresce, morre, 
deixa o mundo, a ilusão.
Pois o que ninguém esquece, 
seu caráter, retidão.
JORGE FREGADOLLI/PR

Saudade melhor explica
quem dela sofre ou sofreu:
-Saudade é a raiz que fica
de uma flor que já morreu.
JOSÉ ANTÔNIO DE FREITAS/MG

Não há amor que resista
às brigas do dia a dia...
Prefiro nova conquista.
Já me entreguei à Poesia!
  JOTA DE JESUS/RJ

Seu convite amarelado
que hoje encontrei sem querer,
ressuscitou um passado
que eu vivo para esquecer.
MARIA NASCIMENTO S. CARVALHO/RJ

Muito tombo e tropeço
muita reta, muita esquina,
subi, voltei ao começo,
pois a vida sempre ensina. 
MARILU MOREIRA/RJ

No Natal, com harmonia,
muita paz, amor e luz,
festejamos com alegria,
nascimento de Jesus.
     NEIVA FERNANDES/RJ.

Quero um natal diferente
com muita paz e união;
que as bênçãos do Onipotente
alcance a toda Nação.
       ROBERTO PINHEIRO ACRUCHE/RJ

Mercador de ouvidos moucos,
a manhã passa, em andanças,
vendendo ilusões, aos poucos
com roupagem de esperanças.
       RODOLPHO ABBUD – Nova Friburgo/RJ

Mulher de rara beleza
não deve, jamais, pintar-se,
pois obra na natureza
não necessita disfarce.
RUTH FARAH/RJ

Bem raramente se alcança
o que temos na vontade,
por isso vale a esperança
muito mais que a realidade.
[+]TELLES DE MEIRELLES

Eu quisera num segundo
atender ao meu desejo,
sorver todo o amor do mundo
na volúpia do teu beijo!
[+] WALTER ROSSI/SP

Fontes 
Agostinho Rodrigues, editor dos jornais (abaixo) virtuais de onde as trovas acima foram retiradas
Alternativo Navegando nas Poesias
    Nº.  152 – dez 2011
Alternativo Navegando nas Poesias
Nº. 153 – jan/fev/mar - 2012
Alternativo Navegando nas Poesias
Nº 154 – abril de 2012

Nilto Maciel (O Que Significa Talento?)


Em literatura (e nas demais artes) há os imitadores. Não sabem (não conseguem) ir além dos modelos. Há também os que nem isso conseguem, mas insistem nessa labuta de sísifo. Alguns deles estão em jornais e revistas, academias, catálogos de editoras, nos festins, nas congratulações. Arremedam os descobridores, os inventores e os próprios copiadores. Não vão além dos modelos, dos moldes. São conformados. Aceitam tudo como destino. Reverenciam, sorridentes, a seleção natural, a evolução das espécies, a reprodução. Se são cachorros, nunca se veem gatos. Ou não se sentem aves. Apenas latem.

Capazes de tudo, aprendem, com louvor, as normas gramaticais; leem todos os clássicos; conhecem idiomas (pelo menos dois: o de sua pátria e o das multidões); sabem tudo de cinema, teatro, arqueologia, mitologia, filosofia. Dão lições de quase tudo: o uso da vírgula, o desuso de palavras, a morte de Sócrates, a vida de Platão. Não admitem, nem em sonho, a pecha de medíocres, copistas, conformados. Irritam-se, com facilidade, se criticados. Odeiam os críticos. Sentem-se pares dos descobridores e dos inventores. Nunca dizem “eles”, mas “nós”. Formam grupinhos, reúnem-se todas as noites. São gregários. Elogiam-se, riem muito, contam piadas, armam estratégias. Frequentam, juntos, bares e restaurantes, assim como salões de academias de letras, de retórica, de língua. São amigos uns de outros. Visitam-se amiudamente. Levam mimos para as esposas dos amigos, bonequinhas e bolinhas para os filhinhos dos compadres. Os de fora são os “bestas”, os “metidos”, os “doidos”. Os de fora são os talentosos, descobridores e inventores da nova literatura.

Irmão gêmeo do típico escritor comum é o “gênio incompreendido”, que escreve como se desenhasse labirintos. Para ele, é mais do que preciso enredar o leitor, confundi-lo, atá-lo com nós, sufocá-lo e matá-lo. O leitor é seu principal inimigo. E bate no peito: duvido da existência de alguém capaz de entender o que escrevo. Para ele, Fernando Pessoa é muito simples e, portanto, imitável: “Meu coração é um almirante louco / que abandonou a profissão do mar”. Bom, é verdade, mas deveria ter sido mais complexo. Mais plexo, mais exo, mais lexo, mais oxel, mais xelo, mais loxe. Para deixar o leitor, o crítico, o estudioso completamente enredados nas teias da grande aranha do verbo.

À mesa desses privilegiados seres, sempre farta e barulhenta, sentam-se os seus seguidores, os seus bajuladores. São os incapazes de ler cem páginas de um clássico. Muito cansativo! Os que não conseguem aprender nada e gritam: Abaixo a ditadura da gramática! Os que envelhecem e não passam do versinho adocicado. Os que veem em letras de samba ou de rock a poesia mais soberba. Os que acham que romance é uma história comprida. São os pobrezinhos da literatura, os miseráveis, os indigentes, os mendigos das letras. Destes, no entanto, nem é preciso dizer muito.

Os escritores comuns somos quase todos nós que convivemos com os pobres sonhadores e também com os talentosos. Com muita dedicação (e porque conduzem no cérebro algum gene diferenciado), alguns conseguem até engendrar uma ou outra obra valiosa. Assim como os talentosos geram muita mediocridade. Quase todos nós, porém, não passamos do soneto bem medido e rimado, do conto arrumadinho que constará de antologia estadual ou nacional, do romance estudado (por algum tempo) na Universidade.

Ao nosso lado, vivem os descobridores da boa literatura. “Viver ao lado” é modo de dizer. Sim, vivem na mesma cidade, são nossos vizinhos, mas não se misturam muito conosco. Em vez da vida social, preferem os livros. Nada inventam, porém sabem descobrir modelos (que a maioria nem percebe), artifícios de linguagem, entradas e saídas (de labirintos), técnicas de narrar e compor poemas, etc. São os chamados “escritores talentosos”, os capazes de fugir da pura imitação, do plágio e das lições da escola a que pertencem. São românticos que encontram o realismo (Machado de Assis), parnasianos que conseguem alcançar o simbolismo ou o modernismo (Augusto dos Anjos, Jorge de Lima), regionalistas que chegam ao universalismo (Graciliano Ramos, Guimarães Rosa). Não são muitos, razão pela qual são pouco vistos. E, quando percebidos, ninguém sabe sequer seus nomes.

Mais raros ainda são os inventores ou reinventores de literaturas. Também são chamados de gênios. Escrevem nova poesia, como Fernando Pessoa. Novo romance (ou nova prosa de ficção), como Kafka. Estes não vemos por aí, a não ser como estátuas ou em livros. Seria o caso também de James Joyce? Muito escritor torce o nariz: “Eu faço melhor do que ele. Invento coisas tão indecifráveis que até os hieróglifos do Egito se farão (faraós) fáceis (fósseis) diante delas. Nem Jean-François Champollion seria capaz de decifrar os meus finnegans wakes”. E completa: “Na verdade, somos muito parecidos, eu e Joyce. Ele, por seus estudos; eu, por meus…”

Deixemos, porém, esses devaneios para trás. E concluamos este verborrágico passeio com algumas perguntas: Inventar e reinventar são verbos da mesma classe? Joyce reinventou Homero? Quem inventou a Grécia? É possível imitar o gênio? O que significa talento?

Fonte:

Marilda Confortin (Poemas Avulsos)


GOTA A GOTA

Nasci. 
Era um poço raso, vazio; 
com cinco filtros perfeitos 
e um sexto, 
que às vezes fazia sentido.

Através deles, 
como um dreno ao viés,
a vida me foi preenchendo: gota a gota.

Primeiro, assentou pedras, as mais pesadas,
depositadas bem no fundo da infância.
Serviram para controlar a umidade da alma
e fixar meus pés no chão.

(Nasci tão leve e líquida. Não fosse esse peso,
eu seria um pássaro ou um peixe.)

Depois, a vida pregou-me outras peças.
Encaixou-as umas sobre as outras, 
deixando raros intervalos entre elas.
Por esses vãos,
circularam rios de sentimentos. 

E assim,  foi fazendo seu trabalho.
Construindo-me. 
Habitou-me de amigos, amores, filhos. 
Ergueu paredes, dividiu-me. 
Plantou jardins, porões, sótãos, teias. 
Quando percebi, estava cheia. 

Comecei a escavar-me.
Estou quase no  fim.
Purgando: gota a gota
Abrindo espaços dentro de mim.

APURANDO OS SENTIDOS - EM ITAPUà

Manhãs têm gosto de orvalho.
Pequenos Quixotes lutam contra ondas de espuma. 
Crianças: adultos ensaiando tsunamis. 

A tarde tem cor de sol.
Garotos pedalando na orla curvilínea. 
Adolescentes: homens ensaiando amor com suas magrelas.

A noite tem cheiro de vento.
Enamorados ensaiam pecados nos muros. 
A noite ilumina plânctons no mar. 
O amor fluoresce no escuro.

BIENAL 

Muita gente falando ao mesmo tempo 
e as palavras - mudas 
presas nos livros. 

CARTA À AMIGA 
Falando em cartas... essa escrevi há muito tempo, a uma amiga portuguesa

Estio

Perdoe a falta de assunto,
de acento
e os erros de Portugal. 

Talvez eu esteja assim
por ser outono ou nada, 
por não ser uma coisa
nem ostra,
apenas um hoje qualquer,
sem promessa de amanhã. 

Talvez só me faltem humos, 
humor, rumos, amor.

Ou quiçá essa falta de assunto
seja o estio que antecede
outra safra de cios,
Sinto tanto frio... 

FAÍSCA DE VIDA 

Fazia tempo que eu não via a lua,
não saia à rua,
não entrava na tua.

É que com o tempo,
o tempo fechou.
a neve caiu
e eu fiquei assim...
só 
a ver navios.

Não fosse o relâmpago dos teus olhos
eu nem lembraria
que um dia existiu céu.

CLARÃO DA LUA

O teu clarão entra pela janela
Invade as profundezas do meu coração
Que bate forte, feito bateria
Num concerto ao vivo, cheio de emoção

Me faz lembrar o tempo em que a vida
Era curar feridas feitas pelo amor
Em que habitavas todas as esquinas
Como lamparina a me fazer cantor

Mas que saudades da viola linda
Que te faz infinda como o céu e o mar
Das madrugadas, todas encharcadas
Com beijos de fadas, sempre a me amar

Das caminhadas pela noite adentro
Com tua presença a me acompanhar
Balet mais lindo, vinhas me seguindo
Um passo atrás do outro até quase alcançar

Estou sentindo aquela nostalgia
Parece magia, que me faz sair
Viola em punho, o sangue fervendo
Coração batendo, querendo explodir

Vem minha musa, sou teu seresteiro,
Vem, me toma inteiro, me faz recordar
Mais que amantes, éramos errantes
Sempre que o dia vinha nos matar

Mas que saudades, da viola linda
Que te faz infinda como o céu e o mar
Das madrugadas todas encharcadas
Com beijos de fadas, sempre a me amar

Minhas lembranças vão me absorvendo
E eu quase cedendo, acho que vou chorar
Não sei se vale, mas tô com vontade
De matar saudades de você, luar. 

AH MEU FILHO 

Ah... meu filho...
Quando é que você vai crescer?
Quando vai aprender
a descascar cebolas 
sem chorar por elas?

Protege esse peito do frio,
calce sapatos,
cuidado pra não se ferir
nos próprios cacos.

Quando é que você parar
de amar tanto,
deixar de ser santo
aprender a ser mau
igual àqueles que partiram,
que feriram seu coração?

Ah... Meu coração....

Quando é que vou aceitar
que você já cresceu
e não tem medo
de se machucar
feito eu? 

VOLÚVEL 

Tem hora, sou da paz.
Quero casa, casar,
morar num harém,
ser oásis, caça, 
presa, amélia, amém.

Às vezes, creio em buraco negro,
camada de ozônio, câncer no seio,
falta de hormônio, aids, escorbuto, 
mundo corrupto, degelo, desgraça,
apocalipse... Vixe!

Noutras, acho graça
do que disse. 
Quero viver mais cem anos
curtir a velhice, 
fazer planos,
artes plásticas,
ginástica,
poesia, música,
teatro, cinema,
amor...

Ontem te amei.
Hoje, não sei. 
  
SEM MEDIDAS

Quem mediu o dia
não nos conhecia,
nem sabia nada
sobre nosso amor.

Se soubesse,
não se atreveria
a findar o dia
ao amanhecer.

Hoje
vai ter tantas horas
que, quem sabe, agora
já seja amanhã.
No entanto, 
para nós,
é tão cedo ainda;
é ainda ontem;
ainda é dia,
nem anoiteceu.

Nosso amor ninguém mensura.
Dura enquanto o tempo para.
Para enquanto lua.
Lua enquanto há mar. 

Fonte: